Acórdão nº 036/20.5BEPDL de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 17 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelISABEL MARQUES DA SILVA
Data da Resolução17 de Fevereiro de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:- Relatório - 1 – A…………………. LDA, com os sinais dos autos, vem, ao abrigo do disposto no artigo 285.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) interpor para este Supremo Tribunal recurso de revista excepcional do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 30 de setembro de 2020, que negou provimento ao recurso por si interposto da sentença do TAF de Ponta Delgada que, na reclamação por si deduzida contra o ato de indeferimento tácito que se formou sobre o requerimento de anulação da venda de imóvel, efetuada pelo Serviço de Finanças de Velas no âmbito do processo de execução fiscal n.º 2780201802009710 julgou extinta a ação, por intempestividade do pedido de anulação de venda.

A recorrente termina as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: Objeto do recurso 1. Em primeiro lugar, o Tribunal Central Administrativo Sul fez afirmações erradas acerca do que foi e não foi alegado pela A. e Recorrente como fundamento para anulação da venda.

  1. Em segundo lugar, no entendimento da A. e Recorrente, mantém-se por julgar corretamente a questão do início da contagem do prazo de que a mesma dispunha para requerer a anulação da venda, ao abrigo do disposto no artigo 257.º n.ºs 1 al. c) e 2 do CPPT: em 29/10/2019 ou em 03/01/2020.

    Admissão do recurso 3. O recurso é interposto nos termos do artigo 285.º, n.º 1 do CPPT e pelos dois motivos: relevância jurídica ou social e melhor aplicação do direito.

  2. No acórdão recorrido, o Tribunal Central Administrativo Sul fez uma errada interpretação e aplicação, ao caso sub judice, do quadro normativo constante do artigo 257.º, n.ºs 1, al. c) e 2 do CPPT, que regula o prazo de arguição de nulidade da venda em processo executivo tributário.

  3. Na verdade, o Tribunal Central Administrativo Sul – na mesma senda do que já havia feito o Tribunal de 1.ª Instância – entendeu que o simples facto de ter sido comunicado ao gerente da Executada, aqui A. e Recorrente, a data de fim do leilão eletrónico ou da venda (28/10/2019) é suficiente para fazer iniciar, a partir dessa data, a contagem do prazo de 15 dias para arguição da nulidade da venda, independentemente de o executado já ter ou não, nessa data, conhecimento do fundamento da nulidade da venda.

  4. Ora, a questão em dissídio tem relevância jurídica e social, na medida em que, todos os dias, em Portugal, se realizam centenas de leilões eletrónicos através do Portal das Finanças, em que milhares de pessoas participam, licitando os bens anunciados.

  5. Tal matéria goza de relevância jurídica e social fundamental, revelando-se ser possuidora de impacto sociocomunitário em várias dimensões, até pelas consequências que possam ser geradas em decorrência e aplicação concreta da decisão. E trata-se igualmente de matéria dotada de complexidade e cuja elucidação assume relevo jurídico, sendo que a mesma se mostra como suscetível de ser repetível e recolocada em casos futuros, reclamando a necessária intervenção deste Supremo Tribunal Administrativo.

  6. Urge, por isso, clarificar se a simples comunicação da data de fim do leilão eletrónico ou, se se quiser, de venda, é, por si só, suficiente para que se inicie a contagem do prazo de 15 dias para se arguir a nulidade da venda, independentemente de o interessado (neste caso, executado) já saber ou não do fundamento dessa nulidade.

  7. Se se considerar que é suficiente, concluir-se-á que o Tribunal a quo decidiu bem; se não se considerar suficiente, concluir-se-á que o Tribunal a quo decidiu mal, pelo que, o pedido de anulação da venda do imóvel dos autos foi tempestivamente apresentado pela A. e Recorrente, ali Executada. Por outro lado, 10. O objetivo do presente recurso de revista excecional é obter um consenso em termos de servir de orientação, a executados e proponentes em leilões eletrónicos, a fim de tomarem conhecimento da provável interpretação com que poderão contar, das normas aplicáveis, por forma a obter-se uma melhor aplicação do direito relativo à anulação da venda coerciva em processo de execução fiscal.

  8. Importa, assim, que este Supremo Tribunal Administrativo profira uma decisão que clarifique qual o limite temporal em que o executado pode pedir a anulação da venda resultante de leilão eletrónico.

  9. Com essa decisão, este Supremo Tribunal Administrativo dará mais um passo no sentido de esclarecer a comunidade quanto a eventuais dúvidas que ainda restem, relativas ao regime jurídico da anulação da venda, contribuindo, assim, para uma certa “uniformização” do entendimento jurisprudencial.

  10. Flui do exposto a necessidade de intervenção clarificadora deste Tribunal, e daí que se justifique a admissão da revista.

  11. E, a final, se o recurso de revista for apreciado, deverá ser julgado procedente.

    Fundamentos do recurso 15. Em primeiro lugar, cumpre esclarecer este Supremo Tribunal de que são erradas as afirmações contidas no acórdão proferido pelo Tribunal a quo, que acima se realçaram e sublinharam na transcrição parcial, e que aqui se reproduzem, por comodidade: Nesta conformidade, o fundamento invocado para a anulação da venda consubstanciado em falta de notificação da “efetivação da venda” , improcede.

    (…) Dito isto, damos conta de que a recorrente não logrou, em momento algum especificar qual o facto que lhe serve de base ao pedido de anulação da venda, limitando-se, de forma, aliás prolixa, a referir que não teve conhecimento da efetivação da venda.

    (…) Nesta conformidade, o fundamento invocado para a anulação da venda consubstanciado em falta de notificação da “efetivação da venda”, está, também ele, condenado ao insucesso.

  12. Ora, ficou claro na PI que o fundamento da anulação da venda realizada no processo de execução fiscal a que respeitam os presentes autos foi a falta de notificação após penhora, da executada, aqui A. e Recorrente, no processo em que se realizou a venda coerciva e nunca a falta de notificação da venda.

  13. Mais uma vez, por uma questão de comodidade, transcrevem-se os concretos pontos da PI que referem o fundamento da anulação da venda invocada pela A. e Recorrente: 12. No caso em apreço, não foi dado cumprimento a estas duas normas, na medida em que o Serviço de Finanças não notificou a Requerente do ato de penhora no processo em que a mesma se veio a realizar (n.º 2780201801009710), mas noutro processo (n.º 2780201801007874) em que não ocorreu qualquer venda coerciva.

  14. Assim, não foi dado cumprimento às normas do artigo supra citado, isto é, foi omitida notificação após penhora da executada nos termos consagradas no artigo 753.º, n.º 2 e 4 do CPC.

    Em segundo lugar, 18. Ora, ficou provado nos autos que em 04/10/2019 o gerente da A. e Recorrente tomou conhecimento de que o leilão eletrónico iria encerrar no dia 28/10/2019.

  15. Segundo o raciocínio do Tribunal de 1.ª instância e do Tribunal Central Administrativo Sul, se houve conhecimento da data de fim do leilão eletrónico, isso quer dizer, sem mais, que houve conhecimento da venda, logo, está-se no âmbito da primeira parte da al. c) do n.º 2 do artigo 257.º do CPPT: o prazo [para arguição da nulidade] contar-se-á da data da venda.

  16. Isto foi quanto bastou ao Tribunal de 1.ª instância e ao Tribunal Central Administrativo Sul para julgarem extemporâneo o pedido de anulação da venda deduzido pela A. e Recorrente em 10/01/2020.

  17. Mas pergunta-se: o mero conhecimento da data de fim de um leilão eletrónico ou de uma venda é suficiente para, automaticamente, se considerar iniciado o prazo de arguição de nulidade dessa mesma venda? E isto, independentemente de o executado conhecer ou não, antes ou na data de fim do leilão eletrónico ou da venda, o fundamento para anulação da venda? 22. No entendimento da A. e Recorrente, uma coisa é saber-se a data de fim do leilão eletrónico; outra coisa distinta é saber-se a data em que ocorreu a venda propriamente dita; e outra coisa ainda mais distinta é conhecer-se o fundamento de anulação de uma venda! 23. Não existe no processo de execução fiscal, nem foi carreado para os autos qualquer comunicação da AT para a A. e Recorrente, comunicando-lhe a efetivação da venda. Assim, a Fazenda Pública não alegou nem provou que, entre 28/10/2019 (data da venda) e 10/01/2020 (data da PI), a aqui A. e Recorrente tivesse sido notificada da venda.

  18. O que ficou provado nos autos foi: “posto que chegou ao efetivo conhecimento do gerente que a venda iria ter lugar no dia 28 de outubro de 2019, à luz do disposto no artigo n.º 1 do artigo 41.º, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, deve considerar-se que a reclamante foi notificada da data da venda”.

  19. A venda iria ter lugar em 28/10/2019 (indicativo condicional). Tratou-se de um mero agendamento/marcação/calendarização. O que queremos dizer é que o Tribunal, em nenhum momento, deu por provado que a A. e Recorrente tomou conhecimento da efetivação da venda, em 28/10/2019.

  20. Nem tão pouco resultou dos autos ou ficou dado por provado que a Recorrente tenha sido notificada da apresentação de propostas por interessados, da decisão subsequente que determinou a venda, da específica data em que se realizou a venda ou de quaisquer outros atos subsequentes à notificação do despacho que agendou/marcou/calendarizou a venda.

  21. O gerente da A. e Recorrente, quanto muito (sem prescindir), soube que o fim do prazo para as licitações eletrónicas era às 16:30 horas do dia 28/10/2020. Ora, isto não é o mesmo que saber que ocorreu, de facto, a venda.

  22. Podia o leilão eletrónico ter ficado deserto. Podiam as propostas eventualmente apresentadas terem ficado abaixo do valor mínimo de venda, ou não ter sido pago o remanescente do preço ou o IMT/Imposto de Selo, no prazo de 15 dias, ou no prazo mais extenso previsto na lei para valores de venda superiores a 500 unidades de conta.

  23. A comunicação realizada ao gerente da A. e Recorrente (sem prescindir) em 04/10/2019 apenas informou do agendamento/marcação/calendarização do leilão...

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