Acórdão nº 1001/20.8BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 04 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelANA CELESTE CARVALHO
Data da Resolução04 de Fevereiro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I – RELATÓRIO A..........

, nacional da Gâmbia, melhor identificado nos autos, de ação administrativa urgente instaurada contra o Ministério da Administração Interna, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida em 25/09/2020, pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, que julgou a ação improcedente, absolvendo a Entidade Demandada do pedido de impugnação da decisão do Diretor Nacional Adjunto do SEF, de 24/04/2020, que considerou o pedido de proteção internacional infundado, sendo outro o Estado responsável pelo pedido, e que a ação seja julgada procedente, sendo a decisão impugnada substituída por outra que permita a análise do pedido de proteção internacional que formulou pelo Estado Português, por o mesmo ser responsável.

* Formula o Recorrente, nas respetivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem: “a) O Recorrente peticiona a revogação da Sentença que deu provimento à decisão proferida em 24/04/2020 pelo SEF que considerou inadmissível o pedido de protecção internacional e determinou a sua transferência para a Itália e a sua substituição por outra decisão que reconheça o Estado Português como o Estado responsável pela análise do referido pedido.

b) Subsidiariamente, o Recorrente peticiona a revogação da Sentença que deu provimento à decisão do SEF e que seja determinada a anulação da decisão impugnada e a condenação do SEF a proceder a nova instrução do procedimento com informação fidedigna, actualizada e detalhada sobre o procedimento de asilo italiano e as condições actuais do Requerente com respeito e observação dos princípios violados e das formalidades preteridas.

c) Subsidiariamente, o Recorrente conclui ainda que o Estado Português é o Estado competente para analisar o pedido com base no n.º 1 do Artigo 19.º do Regulamento de Dublin III e no Despacho n.º 3863-B/2020 de 27/3/2020 e que a Sentença recorrida deve reconhecê-lo.

d) Subsidiariamente, o Recorrente acusou a violação do princípio da imparcialidade na apreciação do seu pedido.

e) Acusou ainda a falta de elaboração do Relatório que implicou a violação do direito de informação, participação, audição prévia e defesa do Recorrente consagrados nos Artigo 82.º, Artigos 12.º e 121.º e seguintes, todos do CPA, o N.º 1 e N.º 5 do Artigo 267.º da CPR e o N.º 1 e N.º 2 do Artigo 17.º da Lei do Asilo.

f) A Sentença recorrida padece de erro na fixação, apreciação e valoração da prova e na apreciação da matéria de facto e, por sua vez, o erro quanto à matéria de facto levou ao erro no julgamento de direito e levou o Tribunal a quo a aplicar normas jurídicas que não são subsumíveis ao caso dos autos.

g) Da Sentença resulta evidenciado que o Tribunal a quo não ponderou, analisou ou considerou os factos descritos na Petição Inicial, em concreto, no ponto «II. Da omissão da adequada ponderação da situação no país de origem, das condições de acolhimento de Itália no momento em que o Autor ingressou naquele País e das condições actuais de acolhimento de Itália», Artigos 46.º a 104.º da Petição Inicial, provados através da prova documental junta aos autos, e ali identificada.

h) Os factos descritos nos Artigos 46.º a 104.º da Petição Inicial estão provados através das páginas 3 a 8 do Documento 2, dos Documentos 13 e 14, dos links indicados nas notas de rodapé 1 e 2, do Documento 16, 17, 18 e 19 e dos links indicados nas notas de rodapé 6 e 10.

i) Os factos provados através dos Documentos 13 e 14 e notas de rodapé 1 e 2, Documento 19 e notas de rodapé 6 e 10, acima indicados, tratam-se de factos que não carecem de alegação ou de prova por tratarem-se de factos notórios.

j) Ao não atender à prova documental junta e aos factos notórios alegados a Sentença recorrida violou o disposto no Artigo 413.º do CPC conjugado com o Artigo 1.º do CPTA e Artigo 362.º do Código Civil e o disposto no Artigo 412.º do CPC ex vi Artigo 1.º do CPTA.

k) Com relevo para a decisão, o Tribunal a quo deveria ter considerado como provados os factos seguintes: a. «A realidade vivida na Gâmbia tem sido noticiada e tem sido alvo de crítica internacional.»; b. «A República da Gâmbia é um País com uma profunda instabilidade social e política, sendo palco de vários conflitos militares.»; c. O Recorrente fugiu da Gâmbia porque «não confiava no sistema de justiça do seu país: «Saí do meu país porque tive problemas com a justiça na Gâmbia. Eu tinha uma namorada com 15 anos de idade, que perdeu a virgindade comigo. Quando a mãe dela soube foi fazer queixa à polícia e eu fui preso por ter tido relações com uma menor de idade. Após 2 meses fui liberto e fugi do meu país.»; d. «O A. tem medo de regressar ao seu País de origem pois sente-se impossibilitado de o fazer atendendo à sistemática violação de direitos humanos que ali existe e que é do conhecimento público, bem como por saber que corre o risco sério de sofrer ofensas graves caso regresse.»; e. «Em 10/12/2019, o Estado Italiano expulsou o Autor de Itália, tendo-o abandonado à sua sorte (…), o que inculcou no Autor o receio de ser forçado a regressar ao seu País de origem e motivou a vinda do Autor para Portugal para encontrar a protecção internacional que lhe foi recusada por Itália (…)»; f. «a situação calamitosa que se viveu nos anos mais recentes, e continua a viver, em Itália é conhecida de todos.»; g. «em consequência da afluência de elevado número de migrantes e requerentes de asilo, as capacidades de acolhimento dos mesmos por parte da Itália tem-se degradado nos últimos tempos, apresentando falhas sistémicas nesse mesmo acolhimento, em especial para requerentes vulneráveis.»; h. O Estado Italiano «tem vindo a adotar uma política cada vez mais restritiva no que concerne ao acolhimento de migrantes»; i. «o Governo italiano recusou, em Agosto de 2019, a atracagem de um navio contendo 134 migrantes resgatados do Mar Mediterrâneo por organizações não governamentais» e j. «a entidade administrativa não promoveu quaisquer diligências instrutórias que lhe permitissem averiguar com mais detalhe a situação pessoal do Autor, nem promoveu quaisquer diligências instrutórias que lhe permitissem averiguar a situação de acolhimento de cidadãos refugiados em Itália a fim de certificar-se se o Estado Italiano tem capacidade para assegurar ao Autor o cumprimento e respeito de todas as regras nacionais, comunitárias e internacionais à luz do direito interno italiano (Costituzione della Repubblica Italiana), da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e da Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU) e outros instrumentos jurídicos de relevo em matéria de direitos humanos, asilo e protecção internacional.».

l) Os factos que antecedem (a.

a j.

) têm que constar do elenco dos factos provados e indicados na parte “III. Fundamentação de Facto:” da Sentença e, nessa medida, tidos e ponderados na fundamentação de facto e de direito.

m) O Estado Português é o Estado Responsável pela apreciação do pedido de protecção internacional do Recorrente à luz do n.º 3 do Artigo 19.º do Regulamento de Dublin III e do n.º 1 do Artigo 33.º da Convenção de Genebra de 1951.

n) O Tribunal a quo deveria ter considerado como responsável pela apreciação do pedido do Recorrente o Estado Português e não o Estado Italiano, aplicando e respeitando as normas constantes do n.º 3 do Artigo 19.º do Regulamento de Dublin III e do n.º 1 do Artigo 33.º da Convenção de Genebra de 1951, ao não fazê-lo violou-as.

o) Através do Despacho n.º 3863-B/2020, de 27 de Março foi concedida autorização de permanência em território nacional ao Recorrente com efeitos em tudo iguais aos efeitos da tradicional autorização de residência em território português.

p) A alegada responsabilidade do Estado Italiano pela análise do pedido do Recorrente sempre cessaria em virtude do acto emanado por via do Despacho n.º 3863-B/2020, de 27 de Março ao abrigo do n.º 1 do Artigo 19.º do Regulamento de Dublin III, pelo que ao não atender a essa hipótese a douta Sentença violou o disposto no n.º 1 do Artigo 19.º do referido Regulamento, aplicável ao caso concreto.

q) Relativamente ao deficit instrutório apontado ao procedimento administrativo, conclui-se que se tivesse sido levada a efeito a inclusão na matéria dada como provada dos factos atrás enunciados a propósito da fixação dos factos provados, o sentido da Sentença recorrida teria que ser diferente.

r) A situação calamitosa que se viveu nos anos mais recentes, e continua a viver, em Itália está provada nos autos através dos documentos e notícias juntos com a Petição Inicial.

s) A existência de falhas sistémicas e a situação degradante que se viveu e vive em Itália em matéria de asilo e protecção internacional constitui um facto público e notório, como tal, não carece de concretização ou prova, bastando a sua alegação, o que foi feito pelo Recorrente na PI.

t) Não é necessário que o Recorrente prove que foi ou poderá vir a ser alvo de tratamentos inumanos e degradantes bastando que existam indícios.

u) O SEF não promoveu quaisquer diligências instrutórias que lhe permitissem averiguar com mais detalhe a situação pessoal do Recorrente, nem promoveu quaisquer diligências instrutórias que lhe permitissem averiguar a situação de acolhimento de cidadãos refugiados em Itália a fim de certificar-se se o Estado Italiano tem capacidade para assegurar ao Recorrente o cumprimento e respeito de todas as regras nacionais, comunitárias e internacionais à luz do direito interno italiano (Costituzione della Repubblica Italiana), da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e da Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU) e outros instrumentos jurídicos de relevo em matéria de direitos humanos, asilo e protecção internacional.

v) A letra da lei, que não exige que o Requerente alegue ou prove os factos...

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