Acórdão nº 00342/15.0BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 05 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelPaulo Ferreira de Magalh
Data da Resolução05 de Fevereiro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I - RELATÓRIO A UNIVERSIDADE (...), inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, datada de 08 de novembro de 2019, pelo qual julgou procedente o pedido formulado na Petição inicial [atinente à nulidade do despacho do Reitor da UNIVERSIDADE (...), datado de 26 de fevereiro de 2014, que determinou a abertura do concurso de Professor Associado na área disciplinar de Biologia, bem como a nulidade consequente de todos os actos praticados a posteriori do procedimento concursal e do contrato de trabalho celebrado ao abrigo desse concurso], e consequentemente declarou a nulidade do acto administrativo consubstanciado no despacho do Reitor da UNIVERSIDADE (...), de 26 de fevereiro de 2014, bem como de todos os actos concursais subsequentes, incluindo o contrato de trabalho celebrado entre a UNIVERSIDADE (...) e o docente H..

No âmbito das Alegações por si apresentadas [Cfr. fls. 370 e seguintes dos autos, SITAF]], elencou a final as conclusões que ora se reproduzem: “CONCLUSÕES A) A Recorrente não pode concordar com o entendimento perfilhado na douta Sentença do Tribunal a quo, que decidiu declarar a nulidade do ato administrativo consubstanciado no Despacho do Reitor da UNIVERSIDADE (...), de 26 de fevereiro de 2014, bem como de todos os atos concursais subsequentes, incluindo o contrato de trabalho celebrado entre a UNIVERSIDADE (...) e o docente H.; B) Na verdade, o ato em crise não padece de nenhum dos vícios que lhe são apontados, estando de acordo com o quadro legal aplicável; C) O Edital posto em crise nos presente autos não estabelece nenhum requisito mínimo de produção científica para a admissão ao procedimento concursal, tendo sido garantido o princípio da liberdade de candidatura e, consequentemente, de acesso ao concurso, para todos os possíveis opositores, detentores de grau de doutor em Biologia há mais de cinco anos; D) Foram publicados dois editais (quase) em simultâneo que visavam a contratação de dois professores associados para a área disciplinar de Biologia, sendo que se pretendeu distribuir os possíveis candidatos (detentores de grau de doutor em Biologia há mais de cinco anos), entre os dois procedimentos concursais, em função da (eventual) área de investigação; E) Os domínios referidos nos editais (Ciências Ambientais e Ecologia, Biologia Marinha, Biologia Aquática, Zoologia e Botânica), todos eles domínios reconhecidos e estandardizados internacionalmente, abarcam todos os domínios da área disciplinar da Biologia, lecionados na UNIVERSIDADE (...); F) Na verdade, a UNIVERSIDADE (...) adotou o procedimento que permitiu avalisar a contratação de dois professores associados, com perfis distintos, de modo a garantir a continuação de Mestrados e/ou Programas Doutorais na área da Biologia, ministrados na UNIVERSIDADE (...), canalizando os candidatos para o procedimento concursal mais adequado à respetiva área de atividade, sem, no entanto, impor um requisito de mínimo de produção científica para a admissão ao procedimento, nem beliscar os poderes/competências do júri do procedimento; G) A UNIVERSIDADE (...) adotou, portanto, o procedimento que melhor se adequou à satisfação do interesse público, que está obrigada a cumprir, sem restringir o universo dos possíveis candidatos, nem afetar nenhum interesse legítimo; H) A solicitação aos candidatos da indicação de que a sua produção científica recaia numa determinada área não consubstancia, de forma alguma, um requisito mínimo de produção científica para a admissão ao procedimento, tendo sido garantido o princípio da liberdade de candidatura e, consequentemente, de acesso ao concurso, para todos os possíveis opositores, detentores de grau de doutor em Biologia há mais de cinco anos, num dos dois procedimentos concursais publicados em Diário da Repúblico em março de 2014; I) O procedimento concursal não violou, portanto, o direito enunciado no artigo 47.º, n.º 2, da CRP, nem os princípios fundamentais previstos no artigo 266.º, n.º 2, da CRP, não padecendo de nenhuma invalidade; J) Todavia, ainda que se entendesse que o Edital do procedimento concursal posto em crise impõe um requisito mínimo de produção científica, o que não se concede, esse requisito não seria contra legem, uma vez que o legislador concedeu aos órgãos das Instituições de Ensino Superior a competência para definir, ao abrigo da autonomia científica, os requisitos e condições necessários à gestão do pessoal docente, mormente ao recrutamento de docentes de carreira; K) Assim, decorre do ECDU que o legislador entregou às Instituições de Ensino Superior espaço para determinar/concretizar, ao abrigo da sua autonomia científica, os requisitos especiais aplicáveis aos procedimentos concursais.

  1. O legislador limitou-se a proibir que fosse fixado como critério de admissão ao concurso de professor associado uma condição relacionada com a experiência docente, sem, no entanto, vedar, nem expressa nem tacitamente, a fixação pelas universidades de outros requisitos de admissão, desde que, obviamente, esses sejam objetivos, máxime, fundados nas exigências do lugar a prover e relacionados com a finalidade do procedimento concursal; M) O conjunto de normas do ECDU aplicáveis aos concursos não impõe portanto como único requisito de admissão a um concurso para professor associado a titularidade de grau de doutor há mais de cinco anos, remetendo para as Instituições de Ensino Superior, ao abrigo do princípio da autonomia universitária, a determinação das regras aplicáveis à execução das disposições do ECDU, nomeadamente a definição dos requisitos de admissão aos concursos de recrutamento dos docentes de carreira.

  2. Diga-se ainda que, ainda que se entendesse que o Edital contém um requisito de admissão ao concurso contrário à Lei, o que não se concede, por não ser verdade, verifica-se que não houve nenhuma ofensa ao conteúdo essencial do direito consagrado no artigo 47.º, n.º 2, da CRP, porquanto a celebração do contrato de trabalho foi precedida pela abertura de um procedimento concursal, de âmbito internacional, que foi amplamente divulgado, tendo sido garantido um período de 30 dias úteis para a apresentação das candidaturas que foram apreciadas por um júri composto maioritariamente por membros externos à UNIVERSIDADE (...).

  3. Pelo exposto, bom de ver é que a douta Sentença recorrida padece de erro de julgamento na interpretação e aplicação das normas ao declarar a nulidade do ato administrativo consubstanciado no Despacho do Reitor da UNIVERSIDADE (...), de 26 de fevereiro de 2014, bem como de todos os atos concursais subsequentes, incluindo o contrato de trabalho celebrado entre a UNIVERSIDADE (...) e o docente H..

Termos em que Com o douto suprimento de vossas Excelências, deve ser dado provimento ao presente Recurso, revogando-se a decisão recorrida, como é legal e de inteira Justiça.” ** O Recorrido Ministério Público apresentou Contra alegações [Cfr. fls. 392 e seguintes dos autos, SITAF], no âmbito das quais, a final, elencou as conclusões que ora se reproduzem: “Conclusões: 1) A douta sentença proferida nos presentes autos, a qual julgou procedente a acção interposta pelo Ministério Público, declarando, em consequência, a nulidade do acto administrativo consubstanciado no despacho do Reitor da UNIVERSIDADE (...) de 26 de Fevereiro de 2014 (publicado no Edital n.º 252/2014, Diário da República, 2.ª Serie, n.º 60) bem como de todos os actos consequentes, incluindo o contrato de trabalho celebrado entre a Ré e o Contra Interessado Professor Doutor H., nenhum reparo nos merece.

2) Conforme se pugnou em sede de acção, e teve acolhimento na douta sentença, dispõe o art. 47º, nº 2, da C.R.P., sob a epígrafe “Liberdade de escolha de profissão e acesso à função pública”, o seguinte: “Todos os cidadãos têm o direito de acesso à função pública, em condições de igualdade e liberdade, em regra por via de concurso”.

3) E, no art. 266º, nº 2, da mesma Lei Fundamental, sob a epígrafe “Princípios fundamentais”, estipula-se o seguinte: “Os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à lei e devem actuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé.” 4) Consagra-se, assim, nessas disposições constitucionais, o princípio da igualdade de oportunidades no acesso à função pública, matéria que constitui um direito fundamental dos cidadãos.

5) Por força da natureza do direito fundamental de acesso à função pública, consagrado no n.º 2 do artigo 47.º da Constituição, é pacífico que as restrições a tal direito só podem ser impostas por lei, pelo que os únicos requisitos aos candidatos são os que constarem na lei, não podendo a administração instituir outros que àqueles acresçam.

6) Resulta, no caso em apreço, do artigo 41.º do Estatuto das Carreiras de Docente Universitário e Politécnico, quais são os requisitos gerais e especiais que os candidatos têm de possuir para poderem ser opositores aos diversos concursos para a carreira de professor, e dele não consta qualquer alusão à produção científica.

7) Diga-se, ainda que, “A natureza taxativa das causas de exclusão dos candidatos deriva da integração do direito de acesso à função pública no catálogo constitucional dos direitos fundamentais – cfr. artigo 47 n.º 2 da CRP(…)”, como se refere no Acórdão do 2.º Juízo do CA Tribunal Central Administrativo Sul, de 25-6-2009, no processo 5060/08. Daí que, continua o mesmo Acórdão: “6. Sendo matéria sujeita a numerus clausus sob a forma legal, ex vi artigo 18. n.º 2 (reserva de Lei restritiva) e artigo 47, n.º 2 da CRP (direito de acesso à função pública), trata-se de vício (vício decorrente do desrespeito dos requisitos legais) cuja sanção integra o regime próprio dos actos nulos por ofensa de conteúdo essencial de um...

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