Acórdão nº 00266/16.4BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 05 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução05 de Fevereiro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:* I Relatório O Município de (...), devidamente identificado nos autos, no âmbito da ação administrativa intentada por J.

e M., tendente, designadamente e em síntese à sua condenação a executar as obras de urbanização previstas para o loteamento titulado pelo alvará n.º 1/2011, em substituição do titular do mesmo, inconformado com a Sentença proferida em 23 de janeiro de 2020, no TAF de Mirandela, no qual se decidiu julgar “(...) procedente a presente ação e, em consequência, condeno o R. Município de (...) a realizar as obras de urbanização referentes ao loteamento titulado pelo alvará n.º 1/2011”, veio interpor recurso jurisdicional.

Formula o aqui Recorrente/Município nas suas alegações do Recurso Jurisdicional, apresentado em 26 de fevereiro de 2020, as seguintes conclusões: “A. A sentença ao reconhecer aos Recorridos terceiros adquirentes de lote o direito de demandarem a Câmara Municipal para obter sentença que condene o Recorrente a executar as obras de urbanização do loteamento titulado pelo alvará nº 1/2011 faz errada interpretação e aplicação dos art.°s 84 e 85 do RJUE B. O art. 84 e 85 do RJUE preveem um regime excecional em matéria de execução de obras de urbanização, segundo o qual essas obras não são realizadas pelo titular do alvará mas por terceiros, sejam eles a Câmara Municipal ou adquirentes de lotes C. Nos termos do regime excecional referido na conclusão anterior, tem legitimidade para a execução das obras por substituição sub-rogatória, em primeira linha a Câmara (art. 84) e em segunda linha os terceiros adquirentes de lotes (art. 85) D. O regime excecional referido na Conclusão B. é taxativo quanto aos meios de que dispõem a Câmara e o terceiro adquirente para a substituição sub-rogatória E. A legitimidade da Câmara e do terceiro adquirente do lote para promover a realização/execução das obras de urbanização é sucessiva.

F. A jurisprudência, designadamente o Acórdão de 04.10.2017, Proc. 124/07.5BELLE do TCAS citado na sentença (fls. 14/22), confere que: “Assim, o promotor do loteamento é, perante a lei, o 1º cumpridor.

Depois, se esse promotor não realizar o seu dever passa a haver um poder dever da Câmara de se lhe substituir. E só se esta última entidade quebrar a sua obrigação, é que se configura uma última possibilidade: a do terceiro interessado se substituir aqueles dois inadimplentes” G. Trata-se da “última possibilidade” porque, de facto, outra não existe prevista na lei, designadamente, a possibilidade de o terceiro adquirente do lote demandar a Câmara Municipal para o efeito, pois como supra se referiu, o regime em causa é taxativo.

H. Não se alcança como a sentença, depois de se referir a esta “última possibilidade” venha a concluir que, afinal, “nada obsta” a que os terceiros interessados “demandem a câmara municipal para obterem a condenação no cumprimento desse poder-dever de execução das obras de urbanização nos termos do art. 84 do RJUE” I. Para atingir aquele fim da execução da obra de urbanização o terceiro adquirente só pode lançar mão desse mecanismo sub-rogatório, taxativamente fixado na lei, sendo que a sua legitimidade se esgota na utilização das fases sucessivas dessa modalidade substitutiva e não tem legitimidade para demandar judicialmente a Câmara Municipal para se substituir ao promotor, como é entendimento assente.

(Na vigência do RJUE publicado pelo DL nº 448/91 de 29/11 e por referência ao art. 48, com o título de Execução das obras de urbanização por terceiro – José Miguel Sardinha in Novo Regime Jurídico das Operações de Loteamento e de Obras de Urbanização, Comentado e anotado, Coimbra Editora 1992, pag. 109 referia que: “No entanto, se se verificar que a Câmara Municipal, por negligência ou desinteresse nada fizer, então estaria justificada a intervenção dos particulares perante a omissão camarária, nada mais restando a estes do que socorrerem-se do disposto da autorização judicial aqui previsto” Júlio Pereira da Cunha in Regime de Licenciamento de Obras Particulares e de Operações de Loteamento e Obras de Urbanização, anotado, 2ª Edição, Edição ATAM, pág. 260, escrevia em anotação ao mencionado art. 48 o seguinte: “Face à inércia da Câmara no sentido da adoção das medidas antes mencionadas são conferidos poderes aos que se encontrem nas situações previstas no nº 1 para requererem autorização judicial com vista à execução direta das obras de urbanização” Adalberto Costa e António Eurico Silva in Regime Jurídico de Urbanização e Edificação, Anotado e Comentado, Vida Económica, 2003, pag. 104, consideram que: “ 1. Além da CM, tem a legitimidade para executar as obras de urbanização em caso de incumprimento por parte do titular do alvará os adquirentes dos lotes (…) Acresce que estes terceiros só podem promover a realização das obras de urbanização, se o titular do alvará as não realizar ou se a CM não as promover “ João Pereira Reis, Margarida Loureiro, Rui Ribeiro Lima in Regime Jurídico da Urbanização e de Edificação, Anotado, 3ª Ed. Coimbra Almedina, pag. 240 refere: “Estes (terceiros, perante a inação do município e mediante autorização judicial, podem substituir-se a titular de alvará … e executar as obras de urbanização “ Fernanda Paula Oliveira, Dulce Lopes e Maria José Castanheira Neves in Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, 4ª Ed., Coimbra, Almedina, 2016, pag.592 a 593, a propósito do nº 3 do art. 85 do RJUE, ilustram que: “A realização de obras e urbanização pelos adquirentes dos lotes é, assim, assumida como a última das soluções a adotar …”) J. O poder-dever de execução substitutiva das obras por parte da Câmara nos termos do art. 84, não é geral nem incondicional, e, pelo contrário, apenas é conferido à Câmara quando se verificam os requisitos para salvaguarda e proteção dos valores e interesses seguintes:  Qualidade do meio urbano  Qualidade do meio ambiente  Segurança das edificações  Segurança pública  Proteção do 3º adquirente de lotes, no caso de obras de urbanização K. A apreciação e decisão sobre a necessidade, de salvaguardar esses valores e de proteger esses interesses em causa, é feita pela Câmara no exercício da sua discricionariedade técnica ou das escolhas/opções para prossecução do interesse público tal como observam João Pereira Reis, Margarida Loureiro e Rui Ribeiro Lima in Regime Jurídico de Urbanização e de Edificação, Anotado, Coimbra Editora, 3ª Ed., pág. 243 “Não se verificando estes requisitos, parece que a câmara municipal não terá legitimidade para executar as obras em substituição do titular do alvará … “ L. A atuação da Câmara não é vinculada contrariamente ao afirmado na sentença, fls. 19/22.

M. A Câmara, no uso da sua discricionariedade técnica, verifica as situações em que poderia/deveria atuar nos termos do art. 84 do RJUE, estando vedado ao tribunal sindicar a conveniência e oportunidade da atuação da Câmara N. Caso a Câmara tenha também faltado a esse dever não promovendo as obras em falta, pode um terceiro adquirente de lotes executar essas mesmas obras em falta mediante autorização judicial nos termos do art. 85 do RJUE O. Este é o regime excecional fixado na lei – RJUE – para garantir aos terceiros adquirentes a execução efetiva das obras de urbanização que a licença do loteamento confere, como se descreve na Conclusões anteriores P. No âmbito do regime excecional fixado nos art. 84 e 85 do RJUE, que é taxativo, não se contempla a possibilidade de o terceiro adquirente demandar judicialmente a Câmara pedindo a condenação da realização das obras de urbanização nos termos do art. 84 do RJUE.

Q. A interpretação feita pelo Recorrido de que o poder-dever que é atribuído à Câmara no art. 84 é vinculado, não tem qualquer correspondência com o sentido e o alcance dessa norma, como se confirma quando no citado Acórdão do TCAS de 04.10.2017 Proc. 124/07.5BELLE, se escreve a fls. 6/12 que: “Apreciando este dever – poder da Câmara, João Pereira Reis e Margarida Loureiro indicam o carácter excecional, a necessária parcimónia no uso da medida e alertam para a exigência da verificação dos requisitos legais, quanto aos fins a salvaguardarem (cfr. Reis, João Pereira, Loureiro, Margarida – Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação – Anotado, 2ª Ed. Coimbra, Almedina” (pag. 208 -209) R. João Pereira Reis e Margarida Loureiro...

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