Acórdão nº 1860/15.6T8FAR.E2-A de Tribunal da Relação de Évora, 28 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelISABEL PEIXOTO IMAGIN
Data da Resolução28 de Janeiro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os Juízes no Tribunal da Relação de Évora I – As Partes e o Litígio Recorrente / Reclamante: (…) – Serviços de Gestão, SA Recorridas / Reclamadas: (…) e (…) – Serviços de Gestão, Lda. e outros Trata-se de uma ação declarativa de condenação através da qual a A demandou 14 RR peticionando que sejam condenados: a) a absterem-se de praticar atos contrários às normas e usos honestos da atividade económica, e, em especial, desviar clientes da A. para a 1.ª R., utilizarem segredos e informações confidenciais da A. e angariar clientes da A.; b) Serem os RR. condenados, em solidariedade, no pagamento à A. das seguintes quantias: (i) A título de lucros cessantes, o montante de € 1.654.719,00 (um milhão, seiscentos e cinquenta e quatro mil e setecentos e dezanove euros); (ii) A título de despesas em que a A. teve que incorrer para pôr cobro à situação provocada pelas RR, nomeadamente a título de despesas com trabalhadores, administradores e consultores, deslocações, ascendem tais custos ao montante total calculado de € 319.500,00 (trezentos e dezanove mil e quinhentos euros); (iii) Pelos danos de imagem sofridos pela A. o montante de € 500.000,00 (um milhão e quinhentos mil euros); c) Serem os RR. considerados solidariamente responsáveis no pagamento à A. no pagamento das custas, procuradoria e mais legal; d) Ser determinada a publicidade da sentença nos três jornais de maior circulação no Algarve e que cubram a zona de Almancil e Albufeira.

À ação foi atribuído o valor de € 2.474.219,00 (dois milhões, quatrocentos e setenta e quatro mil e duzentos e dezanove euros).

Por decisão transitada em julgado, a ação foi julgada improcedente. As custas do processo foram imputadas na totalidade à A.

As partes foram notificadas da conta de custas, cabendo à A a obrigação de pagamento da quantia de € 133.824,00. Foi deferido o pagamento dessa quantia em 12 prestações mensais.

II – O Objeto do Recurso Os RR. apresentaram nos autos 13 notas de custas de parte “complementares” ou “suplementares” no valor total de € 894.336,00 (oitocentos e noventa e quatro mil e trezentos e trinta e seis euros).

A A apresentou reclamação a todas essas notas. Não procedeu, contudo, ao depósito da totalidade do valor das notas invocando o seguinte: - o art. 26.º-A do RCP não tem aplicação ao presente processo; - o n.º 2 do art. 26.º-A do RCP, ao impor o depósito de cerca de € 900.000,00, assume caráter inconstitucional por violação dos princípios do acesso ao direito e da igualdade.

Foi proferido despacho donde consta, designadamente, o seguinte: «A exigência de depósito da totalidade das custas não padece, salvo melhor opinião, de qualquer inconstitucionalidade, apenas visando garantir que não sejam feitas reclamações sem motivo fundado e com vista a retardar os pagamentos devidos, sendo certo que não há qualquer violação do princípio da igualdade na medida em que, caso a reclamação seja procedente, tal valor é devolvido ao reclamante (situação idêntica ocorrendo nos embargos de executado), sendo evidente que a parte que litiga, ainda mais na qualidade de Autora, numa ação de valor elevado, necessariamente sabe das consequências, em termos de custas, da improcedência da causa.

Assim sendo, por falta de depósito da totalidade do valor das notas discriminativas e justificativas, não admito a reclamação apresentada pela Autora.» Inconformada, a A Reclamante apresentou-se a recorrer, pugnando pela revogação da decisão recorrida, a substituir por outra que admita a reclamação às notas de custas de parte apresentada, dispensando o depósito do valor das notas de custas de parte apresentadas pelos Reclamados. Conclui a sua alegação de recurso nos seguintes termos: «1. Na sua Reclamação às notas de custas de parte apresentadas pelos réus Apelados, a Apelante sustentou que o art. 26º-A, n.º 2, do RCP não se aplica a esta ação, por só se aplicar às ações instauradas após a entrada em vigor dessa norma, aditada ao RCP pela Lei n.º 27/2019, de 28 de março; 2. Sucede que a decisão recorrida não apreciou esta questão de direito relativa à aplicação no tempo do disposto no art. 26º-A, n.º 2, do RCP, tendo analisado a aplicabilidade deste preceito legal, única e exclusivamente, à luz de um outro fundamento da Reclamação da Apelante, a arguição de inconstitucionalidade; 3. Como dispõe o art. 608º, n.º 2, do CPC, o Tribunal a quo devia ter apreciado este fundamento da Reclamação da Apelante, o que não fez, daqui decorrendo a nulidade da decisão recorrida por omissão de pronúncia, nos termos do art. 615º, n.º 1, d), do CPC; 4. Atendendo a que a presente ação foi proposta em 2015, não se lhe aplica o disposto no art. 26º-A, n.º 2, do RCP, aditado pela Lei n.º 27/2019, de 28 de março; 5. Com efeito, quando, no art. 11.º da Lei n.º 27/2019, a Lei menciona as execuções, concretamente nos seguintes termos: “a presente lei entra em vigor no prazo de 30 dias após a sua publicação, aplicando-se apenas às execuções que se iniciem a partir dessa data”, o legislador pretendia referir-se a todas as ações, incluindo as ações declarativas, e não apenas às execuções; 6. A letra da Lei diz menos do que o espírito da Lei, dado que esta Lei, segundo o seu preâmbulo e o seu art. 1.º, tem por objeto as execuções; por essa razão, na letra do art. 11º, o legislador apenas referiu as execuções, mas o espírito da norma abrange as ações declarativas; 7. É totalmente desprovido de fundamento, nem mesmo fazendo sentido, que o novo art. 26º-A, n.º 2, do RCP só se aplique às ações executivas instauradas após a sua entrada em vigor, mas se aplique às ações declarativas pendentes na data da sua entrada em vigor; 8. Não se concebe sequer a existência de razão para distinguir, para o efeito aqui em causa, as ações executivas das ações declarativas (como é o caso da presente ação); por que razão, para reclamar duma nota de custas de parte em ações pendente na data da entrada em vigor da Lei n.º 27/2019, de 28 de março, o valor da nota de custas de parte não tem de ser depositado se se tratar de uma ação executiva, mas já tem de ser depositado se se tratar duma ação declarativa? 9. Não se vislumbra qualquer razão atendível para distinguir, a este respeito, as ações executivas das ações declarativas; 10. Assim, quando o legislador disse que a Lei n.º 27/2019, de 28 de março, entraria em vigor no prazo de 30 dias após a sua publicação, aplicando-se às execuções que se iniciassem a partir dessa data, quis dizer que a lei apenas se aplicaria às ações, fossem executivas, fossem declarativas, que se iniciassem após a sua entrada em vigor; 11. De onde resulta que o art. 26º-A, n.º 2, do RCP não se aplica a esta ação, e assim, para reclamar das notas de custas de parte, a Apelante não está obrigada a depositar o valor dessas notas, incorrendo a decisão recorrida, ao entender diversamente, em violação das normas legais citadas e também do artigo 9º do C.C.; 12. O art. 26º-A, n.º 2, do RCP é patentemente inconstitucional, a inconstitucionalidade manifesta desta norma, mesmo tendo em conta o recente acórdão n.º 370/2020 do Tribunal Constitucional; 13. Mesmo à luz dos expressos fundamentos deste acórdão, a consideração dos termos concretos da presente ação evidenciam que, ao impor-se à Apelante que depositasse mais de novecentos mil euros (ou mais de um milhão de euros, somando as notas de custas de parte apresentadas nos presentes autos e as apresentadas no apenso B, relativo à apelação) evidencia que, para poder impugnar as notas de custas de parte, a Apelante está sujeita ao puro arbítrio dos réus Apelados; 14. Verifica-se uma primeira arbitrariedade, uma falta total de controlo do valor das notas de custas de parte, quando se toma em conta que a taxa de justiça imputada à Apelante na conta de custas notificada às partes em 1 de junho de 2020 foi no valor de € 133.824,00, e aplicando a este valor o critério dos 50% do somatório das taxas de justiça pagas pela parte vencida e pela parte vencedora previsto no art. 26º, n.º 3, c), do RCP, resultaria a imputação à Apelante do valor de € 66.912,00 a título de custas de parte; só que, na realidade, as notas de custas de parte apresentadas nestes autos imputam à Apelante a obrigação de pagar € 962.268,00 – um valor cerca de 1430% (mil quatrocentos e trinta por cento) superior aos referidos € 66.912,00; 15. Segunda arbitrariedade: os 6ª e 9º RR. litisconsortes foram patrocinados nesta ação pela mesma Mandatária, que subscreveu e apresentou uma contestação e sustentou no processo uma defesa; estes RR. litisconsortes subscreveram e apresentaram duas notas de custas de parte, no valor de € 68.952,00 euros cada uma, interpretando e aplicando o art. 26º, n.º 3, c), do RCP no sentido de lhes conferir o direito a haver...

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