Acórdão nº 22701/16.1T8LSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Janeiro de 2021
Magistrado Responsável | MANUEL CAPELO |
Data da Resolução | 14 de Janeiro de 2021 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça Relatório AA instaurou acção declarativa, com processo comum, contra Ageas Portugal – Companhia de Seguros, SA, pedindo a condenação da ré a pagar-lhe: a) - 1755,26€ a título de danos patrimoniais, acrescidos de juros desde a citação; b) - 57 500€ a título de danos não patrimoniais acrescidos de juros desde a citação; c) - Quantia a liquidar posteriormente, a título de danos futuros, a determinar em função da incapacidade que lhe vier s ser fixada.
Alegou que seguia pelo passeio no Largo do ..., ..., e foi colhido por veículo automóvel de segurado da ré, sendo atingido na parte esquerda do seu corpo; ficou inconsciente e foi conduzido ao Hospital; sofreu lesões corporais, que refere, e foi sujeito a intervenção cirúrgica; teve danos em roupa e despesas hospitalares, que menciona; careceu de ser assistido, por terceira pessoa, a sua esposa que teve de deixar de trabalhar durante dois meses, estimando um custo de 1.600€; sofreu dores e angústia. A sua recuperação ainda decorre não sendo ainda possível determinar o grau de incapacidade de que ficará afectado.
A ré contestou impugnando a versão do acidente relatada pelo autor, dizendo que o veículo seguia na faixa de rodagem e o autor no passeio e, no momento em que o veículo passava pelo autor iniciou a travessia da faixa de rodagem indo contra a parte lateral do veículo junto à porta, arrancando o espelho retrovisor e provocando várias amolgadelas no veículo; com o embate, o autor foi projectado para o passeio dando origem às manchas de sangue na berma do passeio. O acidente deu-se por culpa exclusiva do autor e, por isso, a ré não está obrigada a indemnizá-lo.
… … Instruídos os autos e realizada audiência de julgamento foi proferida sentença que julgou a ação improcedente e, em consequência, absolveu a ré dos pedidos formulados.
Inconformado, o autor interpôs Apelação pedindo a revogação da sentença e a sua substituição por decisão que condene a ré nos pedidos.
O Tribunal da Relação de … julgou o recurso improcedente, confirmando a decisão recorrida.
O autor interpôs recurso de Revista concluindo que: “1ª – O douto acórdão do Tribunal da Relação …… – salvo o devido respeito que é muito – não subsumiu justamente os factos ao direito, conforme visto de vencido, merecendo, uma nova apreciação.
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– O aqui recorrente apresentou recurso para o tribunal da Relação de …, da decisão proferida em primeira instância, acima transcrito para o qual se remete os Exmos. Desembargadores.
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– No Tribunal da Relação .…, foi proferido douto acórdão, agora posto em crise, improcedendo o recurso, tendo havido voto de vencido com o seguinte fundamento: “Declaração de voto Votei vencida o acórdão que antecede, pois entendo que o recurso procede pelas razões que passo a expor: Desde logo, considero existir erro de julgamento relativamente à decisão sobre a matéria de facto.
Com efeito, foi dado como provado no ponto 20.º dos factos provados o seguinte: “No momento em que o veículo de matrícula ..-JR-.. passava pelo autor, este iniciou a travessia da faixa de rodagem, indo embater na parte lateral direita do veículo automóvel, junto à porta, partindo o espelho retrovisor do lado direito da viatura e provocando amolgadelas no guarda-lamas do lado direito no painel, friso e porta do mesmo lado”.
O apelante impugnou a decisão quanto a este facto. A meu ver com toda a razão. Ouvida a prova gravada, designadamente a testemunha BB e o condutor do veículo interveniente – CC-, tal prova não permite concluir no sentido que foi dado como provado.
A testemunha BB referiu que viu o carro à sua frente a encostar-se muito ao passeio e a bater no peão, batendo com o espelho retrovisor nas costas da pessoa que seguia no passeio. Por sua vez o condutor referiu que não se apercebeu de nada, não viu nada, não viu o peão e apenas ouviu um barulho que o levou a olhar pelo retrovisor e foi quando observou uma pessoa no ar.
Perante estes depoimentos, porque o depoimento da testemunha “não se coaduna com o depoimento do condutor do veículo”, tal como se refere na fundamentação de facto da sentença recorrida, o Tribunal a quo optou por recorrer “às regras da experiência comum” para “concluir pela dinâmica do acidente descrita nos factos 18 a 21 e não a descrita nas alíneas A) e D)”.
Ora, perante a prova produzida, perante uma testemunha a dizer que o peão foi atropelado no passeio e o condutor a dizer que não viu o peão nem sabe como ocorreu o embate, não existe prova suficiente que sustente a tese de um atravessamento da via que ninguém viu. As “regras de experiência comum”, nas circunstâncias em apreço, não são suporte idóneo para se poder afirmar que alguém “iniciou a travessia da faixa de rodagem”.
De qualquer modo, optando por recorrer às regras da experiência comum, sempre caberá dizer o seguinte: não sendo crível que o condutor tenha subido o passeio em andamento, pois, eventualmente, isso causaria danos na jante e o veículo não...
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