Acórdão nº 4016/13.9TBVNG.P1.S3 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Dezembro de 2020
Magistrado Responsável | TOMÉ GOMES |
Data da Resolução | 16 de Dezembro de 2020 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na 2.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: I – Relatório 1. AA (A.) instaurou, em …/05/2013, ação declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra BB (1.ª R.) e contra CC e cônjuge DD (2.ºs R.R.), alegando, em síntese, o seguinte: .
Pertence ao A. a propriedade de um imóvel integrado pelos artigos rústicos 1583.º e 1585.º, do qual fazia parte de um prédio urbano sito na Rua …, em …, …, …, inscrito na matriz sob o artigo 541 (urbano) e uma terra de cultura, sito em …, inscrito sob a matriz 1584.°, constituindo toda a descrição predial n.º 37998 e, atualmente, a descrição predial n.º 192 da … Conservatória do registo predial de …, .
Tal prédio foi herdado pelo A. e sua mãe, a 1.ª Ré BB, sendo depois partilhado, ficando o A. com 1/5 do mesmo, e dividido em … /06/2012, por escritura de divisão de coisa comum, .
Porém, em …/05/2008, a 1.ª R., mãe do A., outorgou escritura pública de justificação notarial e de compra e venda, na qual declarou que o referido prédio rústico lhe havia sido doado verbalmente, em 1970, pelos seus pais, já falecidos, nele tendo construído, em 1977, um prédio urbano composto de casa de um só piso e logradouro, ali declarando também vendê-lo aos 2.ºs R.R., que acabaram por ocupá-lo, nele construindo a sua habitação.
Pediu o A. que: a) – Fosse considerado impugnado o facto justificado na escritura de justificação outorgada em …/05/2008; b) – Fosse declarada a ineficácia daquela escritura; c) – Fosse ordenado o cancelamento de quaisquer registos efetuado ou a efetuar, tendo por título a mesma escritura; d) – Fosse declarado que o prédio em causa, atualmente urbano sob o art.º 2148.°, foi construído no terreno que fazia parte da herança do pai do A., EE, o qual, na partilha a que se procedeu pelo óbito deste, estava inscrito sob o art.º 198.º da matriz rústica da freguesia de …, …, atualmente inscrito sob o artigo 1583.°, e registado na … Conservatória do Registo Predial de …, aquando dessa partilha, sob as descrições n.ºs. 22.437 e 37.998, mas atualmente descrito sob o n.° 3729 daquela Conservatória, e que, no inventário a que se procedeu, foi adjudicado aos filhos menores do falecido, incluindo o A., que hoje é o seu único proprietário.
e) – Fosse declarado nulo ou anulável o ato de compra e venda exarado na sobredita escritura de …/05/2008, da qual consta que a 1.ª R. vendeu aos 2.ºs R.R. e estes compraram o identificado prédio de que ela não tinha qualquer posse nem do mesmo era proprietária e que dos mesmos não recebeu o preço nele declarado; f) – Fossem condenados os R.R. a entregar ao A. o referido prédio livre de pessoas e bens e ordenado o cancelamento de quaisquer registos que sejam titulados por aquela escritura de compra e venda.
2.
Só os 2.ºs R.R. apresentaram contestação-reconvenção, requerendo ainda a intervenção principal ativa dos irmãos do A., FF, GG, HH, II e respetivos cônjuges, sustentando que: .
O imóvel em causa foi prometido vender pela 1.ª R., mãe do A., e pelos irmãos deste, em 1984; .
Desde então, os R.R. contestantes estão na posse do mesmo, adquirindo-o por usucapião; .
Os mesmos R.R. realizaram obras de ampliação melhoramentos da pequena casa que existia naquele prédio, benfeitorias estas de que, na hipótese de proceder o pedido de entrega do imóvel, pretendem ser ressarcidos.
Pediram os 2.ºs R.R. que: a) – Fosse reconhecido o seu direito de propriedade plena sobre o prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo 2148.° e respetivo logradouro com a área de 2.323 m2, sito na Rua …, …, …, …, incluindo tudo o que aí foi construído pelos R.R., registado a seu favor, na … Conservatória do Registo Predial de …, em virtude de o terem adquirido por usucapião; b) – Fosse o A. condenado a abster-se de praticar no prédio atos lesivos desse direito de propriedade; c) – Fosse declarada a nulidade da escritura de divisão de coisa comum e adjudicação ao A. relativa ao prédio inscrito à matriz sob o artigo 1583.º e descrito na referida Conservatória com o n.º 3729-…, efetuada pela escritura pública outorgada no dia …/06/2012, no Cartório Notarial de …; d) – Fosse ordenado o cancelamento do registo, a favor do A., do prédio inscrito na matriz sob o artigo 1583.º e descrito sob o n.º 3729-…, ap. 2…22 de 2012/06/…, da … C. R. P. de …; E pediram, subsidiariamente, para o caso de improcedência do acima referido e do abaixo sucessivamente pedido, que: e) – Fosse proferida sentença, nos termos 830.º do CC, que produzisse os efeitos da declaração negocial do A. e restantes intervenientes, nomeadamente a venda ao 2.º R. dos prédios inscritos à matriz sob o artigo 1583.º e 2.148.º descrito sob o n.º 3729 - …, na mesma … Conservatória, de forma a dar-se cumprimento ao que ficou estabelecido no contrato-promessa de compra e venda outorgado entre o 2.º R., o A., a 1.ª R. e os intervenientes, a …/05/1984; f) – Fossem condenados o A. e os intervenientes, outorgantes do contrato promessa, a pagar aos 2.ºs R.R. a quantia de € 300.000,00, acrescida de juros legais, desde a notificação ao A. e a citação dos intervenientes, até efetivo pagamento, correspondente ao valor atual do prédio, estando já deduzido o preço convencionado e a restituição do montante pago pelos R.R., por incumprimento definitivo do contrato-promessa de compra e venda com culpas imputáveis ao A. e irmãos intervenientes; g) – Fossem o A. e irmãos intervenientes condenados a pagar aos 2.°s R.R./Reconvintes a quantia de € 320.000,00, acrescida de juros legais, desde a notificação do A. e da citação dos intervenientes, até pagamento efetivo a título de indemnização pelas benfeitorias efetuadas e valorização do prédio objeto do contrato promessa de compra e venda, no montante de € 280.000,00 e dobro do sinal (2x € 20.000,00) = € 40.000 Pediram, por fim, a condenação do A., como litigante de má-fé, em multa e em indemnização.
3.
O A. deduziu réplica, respondendo à matéria da reconvenção, concluindo pela sua improcedência e reiterando o inicialmente peticionado.
4.
Entretanto, tendo a 1.ª R. falecido sem que ninguém pudesse ser tido por habilitado para prosseguir a causa em sua representação, em sede de saneador, foi julgada extinta a lide relativamente aos pedidos respeitantes à impugnação da justificação notarial deduzidos pelos A. enunciados nas alíneas a), b) e c) do ponto 1, conforme decisão de fls. 250-251, de …/03/2015. 5.
No decurso da audiência final, o A. requereu a ampliação do pedido no sentido de ser declarado que a propriedade do imóvel inscrito sob a matriz 2148.º abranja a obra implantada no terreno do mesmo.
Por sua vez, os 2.ºs R.R. deduziram também ampliação do pedido reconvencional, no sentido de lhes ser reconhecido o direito de propriedade do prédio urbano inscrito na matriz sob o ar.º 2148, sito na Rua …, n.° …, …, …, e o prédio rústico inscrito à matriz antiga sob o art.º 198, atual 1583, e de ser ordenado o cancelamento do registo, a favor do A., do prédio inscrito à matriz antiga sob o art.º 1583.
6.
Realizada a audiência, foi proferida a sentença de fls. 434-563, de 28/06/2016, a julgar a ação parcialmente procedentes a ação e a reconvenção, decidindo-se: A - Quanto à ação, ordenar o cancelamento do registo de aquisição do direito de propriedade descrito na … Conservatória do Registo Predial de … sob o n.º 3…20/200…03, a favor do R. CC, absolvendo-se os R.R. de todos os restantes pedidos formulados pelo A..
B – Quanto à reconvenção; i) – Declarando-se que os 2.ºs R.R., CC e mulher, são os proprietários do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo 2148.º e logradouro sito na Rua …, n.º …, …, …, registado a favor do R. na referida Conservatória sob o n.º 3…20/200…03 de …/12/1987.
ii) – Ordenando-se o cancelamento do registo de propriedade, a favor do A., do indicado prédio descrito sob o n.º 3729-…, ap. 2722 de 2012/06/… daquela Conservatória.
6.
Inconformado, o A. recorreu para o Tribunal da Relação do Porto, em sede impugnação da decisão facto e de direito, tendo sido proferido o acórdão de fls. 667-693, de 27/07/2017, no âmbito do qual foi rejeitado o recurso quanto a impugnação da decisão de facto (fls. 686) e, no mais, improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida. 7.
Interposta revista, foi a mesma concedida, no sentido de anular o acórdão recorrido e determinar a baixa do processo à Relação com vista a convidar o Recorrente a aperfeiçoar as conclusões e, em caso disso, conhecer do objeto da apelação sobre a impugnação da decisão de facto, conforme acórdão de fls. 836-842, de …/04/2018.
8.
Aperfeiçoadas que foram tais conclusões, foi proferido o acórdão de fls. 879-907, de …/07/2019, aprovado por unanimidade, no qual foi apreciada a matéria de facto impugnada, que foi mantida (fls. 900), julgando-se, no mais improcedente a apelação com a confirmação da sentença recorrida.
9.
Desta feita, veio o A. interpor revista, em primeira linha, por via normal e, subsidiariamente, a título excecional, formulando, no essencial, as seguintes conclusões: 1.ª – O acórdão recorrido, ao sufragar a sentença da 1.ª instância violou, de uma forma manifestamente grave, normas do direito substantivo quer normas processuais, no que concerne à sua interpretação, e aplicação, o que conduziu a flagrante erro de julgamento e, consequentemente, à errada determinação das normas, tal como se alega, tendo, pois, por fundamento o que dispõe o art.º 674.º do CPC que aqui invoca; 2.ª - O art.º 679.º...
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