Acórdão nº 2084/17.3T8STR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 14 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelMARIA DOMINGAS
Data da Resolução14 de Janeiro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo 2084/17.3T8STR.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Santarém Juízo Local Cível de Benavente I. Relatório (…) Seguros, S.A., com sede social na Av. da (…), n.º 200, em Lisboa, instaurou contra (…), casada, residente na Rua (…), n.º 3, (…) do Ribatejo e (…), casado, com ela residente, a presente acção declarativa, a seguir a forma única do processo comum, pedindo a final: a) fosse declarado nulo o contrato de seguro celebrado com a 1.ª Ré e melhor identificado nos artigos 1.º e 2.º da petição inicial; b) e, por consequência, fossem os demandados solidariamente condenados a restituir à demandante as quantias pagas por conta do sinistro, não abrangido por um contrato válido, no valor de € 12.650,50, acrescidas dos juros de mora calculados à taxa de juro civil, contados desde o dia 26 de Janeiro de 2015 até efectivo e integral pagamento; c) caso assim não fosse entendido, sempre o co-réu (…) devia ser condenado a restituir à autora a aludida quantia de € 12.650,50, com fundamento em enriquecimento sem causa, acrescida de juros de mora e legais acréscimos. Em fundamento alegou, em síntese, que no exercício da sua actividade seguradora celebrou com a 1.ª Ré contrato de seguro de acidentes de trabalho por conta de outrem, titulado pela apólice que identificou, tendo esta, na qualidade de entidade empregadora, indicado como seus trabalhadores o aqui 2.º R e ainda (…), respectivamente o seu marido e filho. No cumprimento das suas obrigações contratuais, e tendo-lhe sido participado um sinistro ocorrido em 14 de Julho de 2014 envolvendo o 2.º R., a demandante despendeu na regularização do mesmo o montante global de € 12.650,50. Mais alegou que, tendo procedido a averiguações, concluiu que nunca o sinistrado foi trabalhador por conta da 1.ª Ré a qual, ao invés do declarado, se encontra reformada, não desenvolvendo qualquer actividade empresarial. Tal facto determina a nulidade do contrato de seguro celebrado nos termos do art.º 43.º, n.º 1, do DL n.º 72/2008, de 16.04, nulidade que é oponível ao 2.º Réu e importa na restituição dos montantes pela A. despendidos. Subsidiariamente, e caso assim se não entenda, sempre o 2.º Réu se encontra obrigado a restituir a quantia reclamada com fundamento em enriquecimento sem causa, que expressamente invocou. * Citados os RR, contestaram nos termos da peça que consta de fls. 126 a 141 dos autos, na qual esclareceram que a proposta apresentada à autora e por esta aceite nada tem a ver com aquilo que fora solicitado ao mediador (…), tendo-se a ré limitado a assinar tal proposta no local por este indicado, nada mais tendo preenchido ou sequer informado, com excepção da data do início e fim dos contratos e salário acordado, únicos elementos que lhe foram perguntados. Deste modo, o identificado mediador apresentou uma proposta à autora contendo factos que bem sabia não corresponderem à verdade, o que fez com o desconhecimento dos contestantes, sendo o único responsável pela nulidade do contrato celebrado e não celebração daquele que os RR pretendiam celebrar, o que determina a absolvição dos contestantes do pedido. Sustentando que, no caso de virem a ser condenados, têm direito de regresso contra o indicado mediador, requereram a intervenção provocada de (…). * Por despacho proferido em 09 de Maio de 2018, foi o chamado admitido a intervir como interveniente acessório – cfr. fls. 157 a 159. Citado o interveniente, ofereceu contestação, peça na qual se defendeu por excepção, nesta sede tendo invocado a caducidade do direito da A. Impugnou ainda, na sua essência, a factualidade alegada pelos RR, que disse conhecer apenas do seu contexto profissional, tendo apresentado à autora a proposta subscrita pela 1.ª Ré, e que traduz a vontade desta, a quem esclareceu todas as dúvidas suscitadas. Tal proposta foi aceite, não podendo, todavia, a autora prevalecer-se da nulidade do contrato quando poderia ter tomado facilmente conhecimento das verdadeiras condições de risco mediante a mera solicitação à proponente de esclarecimentos complementares, dadas as lacunas e elementos contraditórios constantes da proposta que lhe foi apresentada. Invocou finalmente o instituto do abuso de direito como forma de obtemperar ao exercício pela autora do seu direito a invocar a nulidade do contrato. * Realizou-se audiência prévia, aí tendo sido cumprido o contraditório quanto às excepções invocadas, tendo os autos prosseguido com identificação do objecto do litígio e enunciação dos temas da prova (cfr. acta de fls. 196 a 202). Teve lugar a audiência final, nos termos da qual foi proferida sentença que, tendo julgado improcedente a excepção de caducidade invocada pelo interveniente, decretou a absolvição dos RR do pedido formulado. Inconformada, apelou a autora e, tendo desenvolvido nas alegações apresentadas as razões da sua discordância com o decidido, formulou a final as seguintes conclusões: “I. O contrato de seguro em análise é nulo; II. Esta nulidade é oponível ao segurado/lesado – cfr. Artigo 48.º, n.ºs 1 e 5 e 147.º do RJCS; III. A recorrente em nada contribuiu para a invalidade do contrato, podendo, por isso, prevalecer-se dos seus efeitos; IV. A recorrente, ao receber a proposta de seguro que esteve subjacente à celebração do contrato de seguro sub judice, preocupou-se em verificar se os elementos ali vertidos respeitavam as regras de subscrição deste tipo de seguro, elaboradas pela sua área técnica, designadamente: 1) seguro temporário de acidente de trabalho por conta de outrem, exclusivamente na modalidade de prémio fixo com nomes; 2) contratos celebrados pelo período máximo de 1 ano; 3) destinados, em exclusivo, a trabalhadores por conta de outrem; 4) C.A.E. 2012 – Exploração florestal; 5) salário máximo diário: € 70,00; V. Analisando a proposta de seguro junta com a petição inicial sob o Doc. n.º 3, constatamos: que o seguro a contratar é de acidentes de trabalho; é temporário (válido entre os dias 03-06-2014 a 31-07-2014); por conta de outrem (…), tem a indicação e identificação dos 2 trabalhadores a cargo da tomadora; o CAE (2012) está correcto (actividade florestal); e o salário mensal seguro é no valor de € 1.500,00, a que correspondem € 50,00/dia; VI. Não era exigível à recorrente nenhuma diligência no sentido de sindicar o conteúdo da proposta; VII. Isto, porque a recorrente não teve qualquer dúvida em aceitar a celebração do contrato proposto, emitindo a competente apólice, pois as regras técnicas impostas para a sua aceitação verificavam-se, todas, no caso em apreço; VIII. Não resultando da proposta qualquer circunstância fora da normalidade que recomendasse uma diligência adicional de verificação e sindicância do seu conteúdo; IX. A pretensa incongruência derivada do NIF da tomadora ser (eventualmente) de uma pessoa singular não assolou o espírito da recorrente; X. A recorrente verificou que os elementos constantes da proposta de seguro estavam em conformidade com as regras de subscrição do dito seguro, logo, não vislumbrou, como se afirma na douta sentença recorrida, uma manifesta incongruência, derivada do facto de a tomadora ser uma pessoa singular, e de o NIF ser de uma pessoa singular. XI. Isto, porque o teor da proposta poderia consubstanciar, em abstrato, uma situação perfeitamente normal e verificável no dia-a-dia da actividade seguradora, a saber, um tomador, enquanto empresário em nome individual/singular, a contratar seguros com a mesma fattispecie daquele que se encontra junto aos autos, em que, por uma questão de facilidade procedimental e de economia de escala – constituir uma sociedade comercial para operar, apenas, numa campanha de tiragem de cortiça, que pode não durar mais de 2 meses –, figuram, como se alegou supra, como empresário em nome individual. XII. O NIF atribuído pela Autoridade Tributária às pessoas singulares tout court e aos empresários em nome individual tem o mesmíssimo recorte numérico, ou seja, o 1.º dos 9 dígitos que compõem o NIF começam por 1 ou por 2 – Vide, a propósito, cópia documento extraído da página da AT, consultável em www.nif-das-empresas.pt, que se junta – Doc. n.º 1; XIII. Ora, in casu, o NIF da tomadora, aposto na proposta, tinha o n.º (…), ou seja, começava por 1, logo, a recorrente não tinha razão para “desconfiar” que algo estava incorrecto, e que lhe exigisse um dever-extra de diligenciar no sentido de clarificar e perceber “… que empresa regularmente constituída era esta…”; XIV. Tratava-se, tratou-se, de mais uma...

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