Acórdão nº 1182/08.9BESNT-A de Tribunal Central Administrativo Sul, 07 de Janeiro de 2021
Magistrado Responsável | ANA PAULA MARTINS |
Data da Resolução | 07 de Janeiro de 2021 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I – RELATÓRIO J..., melhor identificado nos autos, intentou acção administrativa especial contra a FORÇA AÉREA PORTUGUESA, pedindo a anulação do despacho do General Chefe de Estado Maior da Força Aérea, de 28 de Outubro de 2008, que condicionou o seu pedido de abate ao quadro permanente ao pagamento da quantia de € 90.961,55.
Por sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, de 30.06.2015, a acção foi julgada totalmente improcedente e, em consequência, foi a Entidade Demandada absolvida do pedido.
Inconformado, o Autor apresentou reclamação para a conferência que, por acórdão de 03.07.2017, foi julgada improcedente, confirmando-se a sentença reclamada.
Ainda inconformado, o Autor interpôs recurso do referido acórdão, concluindo as suas alegações da seguinte forma: I - Não foi, conforme obrigam as normas aplicáveis, comunicado ao recorrente, tendo este aceite, a existência de qualquer período mínimo de permanência, uma vez concluído o internato complementar, conforme resulta do despacho CEMFA nº. 18/06/A, o qual no seu ponto n.º 5 estabelece que, antes da nomeação para a frequência do curso de especialização, deve o militar assinar documento que comprove ter conhecimento do tempo mínimo de serviço efectivo que terá de prestar, prova que caberia à entidade recorrida, cfr. artº. 342º/2/CC.
II - Logo o acto impugnado é ilegal, por vicio de violação de lei, o que dita a sua anulação, e consequente diferimento do pedido de abate do A. aos QP da força aérea, sem o pagamento de qualquer indemnização, já que este é manifestamente violador dos princípios da legalidade e da boa-fé, por não ter sido ao recorrido previamente fixado qualquer prazo adicional de permanência nos quadros da FA após a conclusão da especialidade; III - Conforme já vertido nos autos, ao A. não é aplicável o despacho n.º 40/2007, de 1 de março, o qual não lhe foi comunicado; IV- Acresce que o pedido de compensação deduzido pela Recorrida, sancionado na decisão sindicada, assenta em errada aplicaçao da lei já que é sustentado pelo dispositivo contido no artigo 170.º n.º 3 quando ao caso dos autos se deverá aplicar o dispositivo contido no artigo 198.º n.º 3.
V - A norma contida no n.º 3 do artigo 170.º - que comporta o advérbio “designadamente” - é aplicável aos militares que não tenham cumprido o tempo mínimo de serviço efetivo, fixado no n.º 2 do artigo 170.º do EMFAR, não sendo este o caso do recorrente; VI - A norma aplicável ao caso dos autos – n.º 3 do artigo 198.º do EMFAR, conjugado com os despachos do CEMFA n.ºs 18/06/a e 40/2007 – que não comporta o advérbio “designadamente”, é aplicável aos militares que tenham frequentado com aproveitamento um curso de especialização, como é o caso do recorrente.
VII - Ainda que o dito despacho fosse aplicável as condições fixadas para o abate decorreriam de despesas tidas pela recorrente com a formação do recorrido, as quais “in casu” não ocorreram nem sequer foi com base nestes elementos que foi fixada a quantia exigida pela R. e com base na qual condicionou o pedido de abate ao quadro; VIII - Acresce que a compensação exigida assenta na devolução das remunerações auferidas pelo recorrido o que viola claramente o direito à retribuição fixada pela constituição da república portuguesa, artigo 59.º nº1 alinea a) da constituição da república portuguesa; IX - Qualquer limitação à liberdade de trabalho só será admissível dentro dos limites impostos pelo interesse colectivo ou inerentes à própria capacidade de cada um, e de forma razoável e proporcional, critérios ou valores que no caso não se verificam, sob pena de ilegal por violação dos artigos 47º e 18º daquele texto constitucional; X - Uma interpretação dos artigos 170.º n.º 3 e 198.º n.º 3 do EMFAR, que permita que se condicione o pedido de abate ao quadro de um oficial médico, ao pagamento ou restituição de todas as quantias por este auferidas, em efetividade de funções, é inconstitucional por violação do direito à retribuição, pelo trabalho prestado, consagrado no artigo 59.º n.º1 alínea a) da CRP, liberdade de trabalho consagrado no artigo 47.º da CRP e 18.º n.º 2 do mesmo diploma legal por violação dos princípios da legalidade de proporcionalidade, reclamando o recorrido que o tribunal declare tal inconstitucionalidade e ou ilegalidade.
Termos em que deverá o recurso de apelação interposto ser julgado procedente, revogando-se a decisão recorrida, desta forma fazendo Vªs. EX.ªs, Venerandos Senhores Juízes Desembargadores, a costumada Justiça.
* A Recorrida contra-alegou, apresentando as seguintes conclusões: a) O Autor foi médico militar do quadro permanente da Força Aérea, tendo solicitado, com pleno conhecimento dos condicionalismos legais e estatutários vigentes, a cessação do seu vínculo profissional e estatutário com este ramo das Forças Armadas; b) O despacho do CEMFA de 28.10.2008, que determinou o abate, estabeleceu, no respeito pelos normativos vigentes, as condições de abate ao QP; c) Nos termos do artigo 170.°. n.° 1, alínea c) do EMFAR, o militar que pretenda o abate antes de ter prestado o tempo mínimo de serviço após o ingresso no QP, fica sujeito ao pagamento de indemnização, a fixar pelo CEMFA; d) Por força do DL n.° 519-B/77, de 17DEZ, com as alterações do DL n.º 322-86, de 02OUT (Estatuto da Carreira Médico-Militar), os oficiais médicos obrigam-se ao cumprimento de dez anos de serviço contados a partir da data da obtenção do grau de especialista; e) O cálculo indemnizatório foi efectuado com base no disposto nos Despachos do CEMFA nºs 18/06/A de 17FEV e 40/2007, de 01 MAR, que não foram impugnados; f) Ao CEMFA competia, por imposição legal, fixar o montante indemnizatório a liquidar pela não prestação do tempo mínimo de serviço prestado ao Estado; g) Há jurisprudência constante em casos semelhantes aos do ora Autor; h) As decisões judiciais invocadas - Supremo Tribunal Administrativo, Tribunal Central Administrativo Sul, TAC de Lisboa, TAF de Almada e agora – por duas vezes – o TAF de Leiria, vão todas no reconhecimento da legalidade da posição do General Chefe do Estado-Maior da Força Aérea em estabelecer e determinar valores indemnizatórios por cessação de vínculo profissional, mas condições em que o Recorrente o fez! Pelo que deve ser negado provimento ao presente recurso e, em consequência, mantido o acórdão do colectivo do TAF de Leiria, por conforme à lei, reconhecendo-se o dever do Recorrente em indemnizar o Estado pelo não cumprimento do tempo mínimo de serviço enquanto médico militar e após a obtenção de grau de assistente.
* O Ministério Público junto deste Tribunal, nos termos e para efeitos do disposto nos artigos 146º e 147°, do CPTA, emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.
* O processo colheu os vistos legais.
* II – OBJECTO DO RECURSO As questões suscitadas pela Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, nos termos do disposto no nº 4 do artigo 635º e nos nºs 1 e 2 do artigo 639º, do CPC ex vi nº 3 do artigo 140º do CPTA, consistem, no essencial, em saber se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento, ao considerar ser devido, pelo Recorrente à Recorrida, o pagamento da quantia de € 90.961,55, pelo abate ao quadro permanente requerido por aquele.
* III – FUNDAMENTAÇÃO De Facto O acórdão recorrido considerou provados os seguintes factos, que, por não impugnados, se mantêm: A) À data da entrada da p.i., o A. J... era Capitão Médico (1...-K) a prestar serviço no Centro de Medicina Aeronáutica do Hospital da Força Aérea – cfr. PA.
B) Em 16 de Setembro de 2008, o A. solicitou o seu abate ao quadro permanente, ao abrigo da al. d), do artigo 170.º do Estatuto Militar das Forças Armadas (EMFAR), indicando 30 de Outubro de 2008, como data para a efectiva produção de efeitos –cfr. PA.
C) Invocou o desenquadramento no âmbito da especialidade médica, motivos pessoais e motivos de saúde com prejuízo da condição militar, para fundamentar a cessão da sua vinculação e obrigações militares – cfr. PA.
D) Na sequência do pedido de abate apresentado pelo A. entendeu o General Chefe de Estado Maior da Força Aérea, por despacho de 28 de Outubro de 2008, que o abate deveria ser concedido, condicionando o pedido de abate ao pagamento da compensação, tendo o mesmo que liquidar a quantia de € 90.961,55, valor resultante da aplicação do parágrafo 2 do Despacho do CEMFA n°40/2007 de 1 de Março conjugado com o parágrafo 10 do Despacho CEMFA n°18/06/A de 17 de Fevereiro – cfr. PA.
E) É o seguinte o teor do despacho exarado pelo General Chefe do Estado – Maior da Força Aérea, de 28 de Outubro de 2008: “1-Por requerimento datado de 16SET 08, o CAP MED 1...-K J..., veio requerer o abate ao Quadro Permanente (QP) com efeitos a partir de 30OUT08.
2-Para tanto invocou a alínea d) do n.º 1 do artigo 170.º do Estatuto dos Militares das Forças Armadas (EMFAR).
3-O Requerente ingressou no QP, na especialidade de médicos, em 01JUL2001.
4-Contudo, depois de ingressar no QP, o Requerente frequentou e conclui o internato complementar de cardiologia, entre 01JUL01 e 24FEV06, o que lhe conferiu, nesta última data, o grau de assistente na correspondente área profissional.
5- Ora, o n.º 1, do artigo 11.º da Carreira Médico-Militar, aprovado pelo Decreto – Lei n.º 519- B/77, de 17 de Dezembro, rectificado pela Declaração, publicada no Diário da República, n.º 18, I Série, de 21 de Janeiro de 1978 e com a redacção introduzida pelo Decreto – Lei n.º 332/86, de 2 de Outubro, prevê uma norma especial sobre o abate aos QP de oficiais médicos, ao estatuir que “ os oficiais médicos das Forças Armadas obrigam-se, após o ingresso nos quadros permanentes, ao cumprimento de 10 anos de serviço a partir do grau de assistente, contados a partir da data da obtenção desse grau de carreira médico – militar”.
6- Nestes termos, verifica-se que o tempo mínimo de serviço efectivo do...
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