Acórdão nº 01765/12.2BEBRG-A de Tribunal Central Administrativo Norte, 18 de Dezembro de 2020

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução18 de Dezembro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório A Associação Nacional das Farmácias, a C., Lda., e a Farmácia (...), Lda., tendo vindo a interpor Recurso Extraordinário de Revisão do Acórdão do TAF de Braga de 6 de fevereiro de 2015, proferido na ação administrativa especial de impugnação de ato do INFARMED, apresentado pela Associação de Socorros Mútuos Familiar (...), e uma vez que por sentença proferida no mesmo Tribunal, em 9 de Abril de 2018 foi julgada “…verificada a exceção de ilegitimidade ativa invocada nestes autos e, consequentemente, mantêm-se a decisão recorrida”, vieram recorrer dessa decisão para esta instância.

Apresentaram as Recorrentes as seguintes conclusões de Recurso: “1. Transitado em julgado, o Acórdão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga de 6 de fevereiro de 2015, proferido no Proc. n.º 1765/12.2BEBRG, pode, nos termos do disposto nos artigos 154.º a 156.º do CPTA, ser objeto de um Recurso Extraordinário de Revisão, destinado a rescindir o aí julgado e, consequentemente, a determinar um novo julgamento das questões decididas; 2. Tendo em conta que as três Recorrentes (i) não tomaram parte no processo de onde emerge o Acórdão revidendo e (ii) estão em vias de sofrer prejuízos – económicos e institucionais – que resultam da execução desse Acórdão, dispõem de legitimidade recursal para a sua interposição, ex vi segunda parte do n.º 2 do artigo 155.º do CPTA; 3. Para avaliar da existência desses prejuízos, não pode o Tribunal “a quo”, como fez, simplesmente comparar os fins que são prosseguidos pelas entidades do setor social e pelas entidades privadas que exploram farmácias, para concluir que, estando em causa entidades que por natureza prosseguem fins distintos, a atividade de umas não afeta a atividade das outras; 4. Tal conclusão é obviamente precipitada e infundada: ainda que as entidades do setor social prossigam fins em abstrato distintos de empresas privadas, as farmácias privativas daquelas entidades não deixam de poder efetivamente causar um prejuízo económico às farmácias do setor privado - assim sucederá sempre que for previsível que ocorra um desvio de clientela das segundas para as primeiras; 5. Se assim for, então os proprietários das farmácias que estarão sujeitos a esse desvio são manifestamente prejudicados por uma sentença que reconheça a existência de uma habilitação legal para o licenciamento da instalação da farmácia social, e têm o direito de interpor recurso de revisão dessa sentença se, como sucede no caso em apreço, esta se basear em pressupostos juridicamente incorretos; 6. Ora, no caso em apreço, ficou demonstrado que a Segunda e Terceira Recorrentes, proprietárias de farmácias do setor privado sofrerão, na sua esfera jurídica, prejuízos económicos com a entrada em funcionamento da farmácia social da Recorrida; 7. Com efeito, tendo em conta a localização das referidas farmácias – que se situam num caso, a menos de 500 metros, e no outro a menos de 1300 metros da farmácia a instalar pela Recorrida – é evidente que o licenciamento desta terá como consequência normal e inevitável a captação de clientela das farmácias da Segunda e Terceira Recorrentes, passando a disputar pelo menos parcialmente o mesmo mercado de venda de medicamentos; 8. Deve pois considerar-se preenchido, quanto à Segunda e Terceira Recorrentes, o pressuposto da legitimidade do recurso de revisão previsto no n.º 2 do artigo 155.º do CPTA, estando em causa sujeitos que estão “em vias de sofrer [prejuízos com] a execução da decisão a rever”; 9. Neste quadro, também a ASSOCIAÇÃO NACIONAL DAS FARMÁCIAS, Primeira Recorrente, é detentora de legitimidade, uma vez que, sendo afetados desta forma interesses de alguns proprietários seus associados, são também os seus interesses institucionais, enquanto entidade destinada a velar pela defesa da posição dos seus associados e, em geral, a combater atividades ilegais e anti concorrenciais no mercado farmacêutico, que são afetados. Termos em que: (i) Deve ser reconhecida a legitimidade das Recorrentes para a interposição, nos termos do n.º 2 do artigo 155.º do CPTA, de Recurso Extraordinário de Revisão do Acórdão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga de 6 de fevereiro de 2015; (ii) Deve a Sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que, reconhecendo essa legitimidade, aprecie e julgue procedente o referido Recurso Extraordinário de Revisão.” A Recorrida Associação de Socorros Mútuos Familiar (...) apresentou as suas contra-alegações de Recurso em 30 de maio de 2018, tendo-se pronunciado relativamente às conclusões do Recurso, nos seguintes termos: “Estamos agora em condições de apreciar as conclusões do Recurso aqui em causa: 1. Transitado em julgado, o Acórdão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga de 6 de fevereiro de 2015, proferido no Proc. nº 1765/12.2BEBRG, pode, nos termos do disposto nos artigos 154.º a 156.º do CPTA, ser objeto de um Recurso Extraordinário de Revisão, destinado a rescindir o aí julgado e, consequentemente, a determinar um novo julgamento das questões decididas" Os recorrentes invocam a parte final do nº 2 do artigo 155º do CPTA como fundamento para a sua legitimidade "não tendo tido oportunidade de participar no processo, tenha sofrido ou esteja em vias de sofrer de sofrer a execução da decisão a rever'.

Como é evidente o que aqui se diz é que tem legitimidade quem, não estando no processo, teria que estar na qualidade de contra interessado.

Por outro lado, a previsão da norma não refere quem tenha "eventuais" prejuízos" com a decisão no plano mediato, mas apenas quem esteja em vias de sofrer a própria "execução" da sentença a rever.

É o que resulta da anotação ao artigo 155º do CPTA de Mário Aroso Almeida e Carlos Cadilha em Comentário ao CPTA, 2005, Edição Almedina, página 774: "O nº 2 estende a legitimidade para requerer a revisão a "quem, devendo ser obrigatoriamente citado no processo, não o tenha sido e quem, não tendo tido a oportunidade de participar no processo, tenha sofrido ou esteja em vias de sofrer a execução da decisão a rever." Uma vez que se trata de uma norma especial, que se sobrepõe ao regime da lei processual civil, subsidariamente aplicável, deve entender-se que ela alarga o campo de aplicação típico da alínea g) do artigo 771º do (PC. Não estamos, portanto, perante a mera situação de revelia do réu, que essa disposição prevê, mas perante a revelia de outras pessoas com interesses contrapostos ao do autor, e que, como tal, deveriam ter sido chamados ao processo, na qualidade de contrainteressados, Para além disso, porém, a norma contempla duas situações distintas: (a) as pessoas que deveriam ter sido identificadas, no processo, como contrainteressados e obrigatoriamente demandados (como é o caso das situações previstas nos artigos 57º e 68º, nº 2); (b) as pessoas que, não devendo ter sido obrigatoriamente chamadas ao processo, por se não encontrarem diretamente envolvidas no procedimento administrativo ou na relação jurídica material em causa, acabem por ser afetadas pela decisão proferida.

A previsão do nº 2, afigura-se ser, assim, mais abrangente do que aquela que constava do artigo 100º, nº 3, do RSTA, na medida em que estende a legitimidade para requerer a revisão a quem, embora não devesse ter sido obrigatoriamente citado no processo, se deva concluir que teria pelo menos sido conveniente que tivesse sido chamado a intervir, na medida em que, estando destinado o sofrer a execução da decisão, fica legitimado a defender-se dessa execução, pondo em causa a sentença exequenda. Pense-se no beneficiário de um ato consequente cuja queda resulte de uma sentença de anulação proferida em processo no qual o ato consequente não tenha sido impugnado e em que, por isso, não lhe tenha sido dada a oportunidade de participar.

O que parece dever concluir-se é que estes contrainteressados - que não surgiam, no momento em que o processo foi proposto, como possíveis prejudicados pela decisão a proferir - têm de demonstrar um interesse em agir, para efeito de impugnarem a sentença através do recurso de revisão, alegando que foram afetados pela execução da sentença ou estão em vias de o ser (cfr., entretanto, o artigo 173º, nº 3 e 4).

Nesta parte, a revisão das sentenças do contencioso administrativo passa a funcionar também como um processo de oposição de terceiro (sem...

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