Acórdão nº 00239/20.2BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 18 de Dezembro de 2020

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Apar
Data da Resolução18 de Dezembro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO M., S.A., com sede na Avenida (…), instaurou acção de contencioso pré-contratual contra o MUNICÍPIO DE (...), com sede no Jardim 1º de Maio, indicando como Contrainteressada V., S.A., com sede na Avenida (…), na sequência da decisão de adjudicação proferida no âmbito do procedimento de consulta prévia para “Aquisição de Serviços de Comunicações Fixas e Móveis para os serviços da Câmara Municipal de (...)”, formulando o seguinte pedido: “(…) DEVE A PRESENTE ACÇÃO SER JULGADA PROCEDENTE POR PROVADA E, EM CONSEQUÊNCIA: Conclui-se que à Autora M. tem necessariamente de ser adjudicado o Procedimento: A. Por esta cumprir, integral e escrupulosamente, os requisitos constantes expressos e sindicáveis do Caderno de Encargos; B. Por violação por parte do Júri dos Princípios Gerais da Contratação Pública, nos termos legais supra mencionados, em particular pelos Princípios de Comparabilidade das Propostas e de Concorrência.

  1. Porquanto a proposta adjudicada à V. está ferida pelas várias ilegalidades da aludida, com expresso incumprimento do Caderno de Encargos; D. Adjudicando-se o procedimento à Autora por, tendo-se cumprido os critérios, apresentar a proposta válida e legal, inversamente à da Contrainteressada que deve ser excluída! E. Excluída por incumprimento dos requisitos expressos no Caderno de Encargos, não submetidos à Concorrência!”.

    Por sentença proferida pelo TAF de Mirandela foi decidido assim:

    1. Julgar não verificada a excepção dilatória da inimpugnabilidade do acto impugnado; b) Julgar a presente acção totalmente procedente e, em consequência, anular o acto administrativo impugnado, excluir do procedimento de concurso a proposta da contrainteressada e adjudicar o contrato de “Aquisição de serviços de comunicações fixas e móveis para os serviços da Câmara Municipal de (...)” à proposta apresentada pela autora.

    Desta vem interposto recurso pela Contrainteressada.

    Alegando, formulou as seguintes conclusões: A. O presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, que julgou a acção de contencioso pré-contratual instaurada pela M., ora Recorrida, procedente, tendo então: i) determinado a anulação do acto de adjudicação do procedimento à V. e, inexplicavelmente, ii) condenado o Réu a adjudicar o mesmo procedimento à proposta da Autora.

  2. A sentença recorrida incorreu em erro de julgamento quando considerou que a proposta da V. era omissa relativamente a termos e condições constantes do Caderno de Encargos, porquanto se não exigia no Convite deste procedimento, nos termos do art.º 57.º, n.º 1, alínea c), do CCP, um ou mais documentos que contivessem uma adesão específica, e muito menos detalhada e pormenorizada, sobre a forma como os concorrentes se comprometiam a cumprir tais termos e condições.

  3. Desde logo, ao contrário do que considerou a sentença recorrida, nada no Convite (ou na lei) permite concluir que as propostas a apresentar tinham de cumprir aquela exigência. E é no Convite que as Entidades Adjudicantes têm de indicar quais as exigências a que as propostas a apresentar se encontram submetidas.

  4. Na sentença parte-se de uma Cláusula do CE, a 26.ª, n.º 2, para se sustentar a afirmação de que tal era obrigatório, o que de nenhuma forma se retira daquela Cláusula, desde logo pelo seu elemento literal, e pela sua inserção sistemática no corpo do CE.

  5. Acaba assim, por incorrectamente interpretar e aplicar o previsto no Ponto 2 do Convite, bem como a referida Cláusula 26.ª, n.º 2, do CE.

  6. A V., seja através da Declaração que apresentou nos termos do art.º 57.º, n.º 1, do CCP, seja pelas diversas declarações de compromisso face ao previsto no CE, cumpre de forma suficiente e global a exigência de vinculação que se exigia neste procedimento, sendo por demais evidente que por nenhuma forma se pretendeu furtar ao cumprimento do previsto no CE em caso de adjudicação.

  7. Nem isso lhe seria possível, seja pela forma como se comprometeu através da sua proposta, seja pelo previsto no art.º 96.º, n.º 5, do CCP, que sempre imporia, em caso de alguma divergência, que prevalecesse o disposto no CE.

  8. Aliás, nem a própria sentença se atreve a referir que a proposta da V. viola o CE.

    I. Resulta assim também violado o disposto no art.º 70.º, n.º 2, alínea a), do CCP, porquanto esta norma deve ser lida em conjugação com o previsto no art.º 57.º, n.º 1, alínea c), do CCP, não se encontrando exigido o cumprimento desta norma pelas peças do Concurso.

  9. Fica, pois, bem demonstrado que a proposta da V. contempla todos os termos e condições do CE, em especial o que se dispõe nas Cláusulas 25.ª, alínea i), e 35.ª, n.º 2, alínea cc), do CE.

  10. Acresce que resulta inequivocamente da lei (cfr. artigo 71.º, n.º 2, do CPTA), que só é possível condenar a Administração a praticar um concreto acto administrativo quando se revelar inequívoco que a actuação da administração posterior à emissão da sentença seja uma só.

    L. Ou dito de outro modo, e sob pena de uma intolerável violação do princípio da separação de poderes, os Tribunais só podem condenar a Administração a praticar um determinado acto quando se esteja perante uma situação em que a sua conduta seja estritamente vinculada (não lhe cabendo qualquer margem de apreciação).

  11. Ora, é por demais evidente que não é esse aqui o caso. Com efeito, anulado o acto de adjudicação em favor da V., competirá à Administração (ao Júri e, depois, ao órgão competente para a decisão de contratar) reformular o Relatório Final e verificar se também a proposta da Autora, ORA Recorrida M., não padece das mesmas deficiências.

  12. Ora, e se é inequívoco que, caso a sentença proferida nos autos viesse a transitar em julgado naqueles moldes, o Júri se encontraria obrigado a propor a exclusão da proposta da V., não o é menos que nada o impedia de vir a proferir idêntica decisão quanto à proposta apresentada pela Autora (que, como a V. não se cansou de referir na contestação apresentada nos presentes autos, padece das mesmíssimas falhas que a proposta da Autora).

  13. Ou seja, e competindo necessariamente ao Réu a execução da sentença proferida, é impossível não ignorar que a Entidade Adjudicante sempre teria de, aquando da reelaboração do Relatório Final, ter em conta as exigências que, no entendimento do Tribunal, resultavam do Caderno de Encargos, P. Pelo que, padecendo a proposta da Autora daquelas falhas, o Júri teria sempre de propor a exclusão da mesma.

  14. Acrescente-se, aliás, que inexiste qualquer palavra na sentença recorrida quanto ao preenchimento pela proposta da Autora dos requisitos que, segundo a sentença recorrida, resultariam do Caderno de Encargos, pelo que nunca a sentença recorrida poderia ter concluído que a reformulação do Relatório Final implicaria, necessariamente, a adjudicação do concurso à proposta.

  15. Desse modo, ao considerar que o Réu se encontra vinculado a, no seguimento da anulação do acto de adjudicação proferido naquele procedimento, a Entidade Adjudicante se veria obrigada a adjudicar o presente concurso à proposta da Autora, a sentença recorrida incorreu num evidente erro de julgamento.

  16. Violou, assim, o disposto no art.º 71.º, n.º 5, do CPTA, bem como o princípio da separação de poderes constitucionalmente consagrado.

    Nestes termos, e nos que suprirão, deverá ser concedido provimento ao presente recurso, com o que farão JUSTIÇA! A Autora juntou contra-alegações, concluindo: A. Inexiste fundamento legal para considerar que a Sentença não cumpre com os ditames legais! B. A Sentença recorrida não merece qualquer censura do ponto de vista jurídico-legal.

  17. A Sentença do Tribunal a quo efectua uma absoluta e correcta aplicação da Lei Processual, subsumindo os factos ao Direito.

  18. Tendo o Tribunal a quo bem fundamentado a Sentença e devendo a decisão por este proferida ser mantida pelo Tribunal ad quem.

    Pelo que, nestes termos e nos melhores de Direito que suprirão, deve o presente Recurso ser julgado totalmente improcedente e, consequentemente, mantida a decisão recorrida, Fazendo-se assim Justiça! O Senhor Procurador Geral Adjunto, notificado ao abrigo do disposto no artigo 146º/1 do CPTA, não emitiu parecer.

    Cumpre apreciar e decidir.

    FUNDAMENTOS DE FACTO Na sentença foi fixada a seguinte factualidade: 1. Em 22/06/2020 o réu iniciou o procedimento de consulta prévia nº 38/2020, destinado à contratação de aquisição de serviços denominado “Aquisição de serviços de comunicações fixas e móveis para os serviços da Câmara Municipal de (...)” (cfr. despacho do Presidente da Câmara Municipal de (...), aposto na informação de fls. 451-452); 2. Do convite para apresentação de proposta consta, entre o mais, o seguinte (cfr. convite para apresentação de proposta de fls. 453-456): “(…) O MUNICÍPIO DE (...), doravante designado por MMC, entidade adjudicante (…) por despacho do Sr. Presidente da Câmara Municipal datado de 22/06/2020, pretende proceder, ao abrigo do artigo 20º, nº 1, alínea c) do Código de Contratos Públicos, doravante designado por CCP, à adjudicação de proposta, por consulta prévia em função do valor, para “Aquisição de Serviços de Comunicações Fixas e Móveis para os serviços da Câmara Municipal de (...)”, a qual será executada de acordo as regras vertidas no caderno de encargos que acompanha o presente Convite.

    Para cumprimento do disposto no artigo 115º do CCP, formaliza-se convite à V/ empresa para apresentar proposta, obedecendo o procedimento adjudicatório aos termos e condições indicados em seguida: (…) 2. Documentos que instruem as propostas 2.1. Na qualidade de concorrente deve instruir a sua proposta com os seguintes documentos:

    1. Declaração de acordo com o modelo constante do Anexo I do presente Convite; b) Declaração do preço contratual, de acordo com o modelo constante do Anexo III ao presente convite, do qual faz parte integrante.

      2.2 A declaração de aceitação do conteúdo do...

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