Acórdão nº 20227/18.8YIPRT-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 16 de Dezembro de 2020

Magistrado ResponsávelARISTIDES RODRIGUES DE ALMEIDA
Data da Resolução16 de Dezembro de 2020
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Incidente de dispensa do dever de sigiloECLI:PT:TRP:2020:20227.18.8YIPRT.A.P1 * Sumário:...........................................

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Acordam os Juízes da 3.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto:I. Relatório: b…, Lda., pessoa colectiva e contribuinte fiscal n.º ………, com sede em …, Felgueiras, instaurou procedimento de injunção contra C…, S.A., pessoa colectiva e contribuinte fiscal n.º ………, com sede no Porto, para obter desta o pagamento de capital de €94.949,96, acrescido juros de mora €892,97.

Alegou para o efeito que no exercício da sua actividade profissional vendeu à requerida 36.569,41 kg de kiwis da campanha de 2017, ao preço unitário de €3,68, apurado em conformidade com os valores de mercado, uma vez que a requerida não apresentou contas sobre a campanha daquele ano. Em 29-12-2017, a requerente emitiu a factura n.º 2017/3, no valor de €134.575,43, com vencimento imediato, ao qual foi deduzido a quantia de €45.000,00, o que perfaz a quantia de €89.575,43, a que acresce IVA à taxa reduzida de 6%, no total de €94.949,96.

A requerida deduziu oposição, alegando que na colheita de 2017 apenas foram vendidos 71% das frutas fornecidas pelos consumidores, tendo os restantes 29% sido destruídos, pelo que, conforme acordado entre as partes, dos 36.569,40 Kg. entregues pela requerente apenas são devidos 71%, isto é, 25.964,27 Kg., por conta de cujo preço a requerente já pagou o valor de €45.000,00. O preço que a requerida indica aos produtores para a aquisição dos kiwis já inclui os custos de embalamento da fruta, mas no presente caso o embalamento foi executado por uma sociedade que pertence aos mesmos sócios da requerente e à qual a requerida pagou directamente o embalamento no valor de €36.569,40, o qual deve ser descontado ao montante a pagar. A requerente apenas forneceu kiwis da categoria Premium, cujo preço unitário é de €3,81/kg., pelo que o preço global da colheita é de €98.923,87. Assim, apenas está em dívida o valor de €17.354,47, a que acrescerá o IVA à taxa de 6%. Em reconvenção, pede a condenação da requerente a pagar à requerida o valor €36.569,40 relativo ao custo do embalamento.

Notificada pelo tribunal a apresentar o seu requerimento inicial através de articulado, a requerente apresentou articulado, terminando-o com o requerimento dos meios de prova, onde requereu o seguinte: «B – Prova Documental: 1. Requer, ao abrigo do disposto no artigo 429º do CPC, seja a Ré notificada para juntar aos autos, os extractos contabilísticos, nomeadamente das conta-correntes, comprovativos dos preços finais de compra assim como de venda por kg, relativamente aos anos de 2015 e 2016; 2. Requer, ao abrigo do disposto no artigo 429º do CPC, seja a empresa D… sociedade anónima, pessoa colectiva de direito francês com o n.º ……….., com sede em .., …, …… … – France, da qual a Ré é uma subsidiária em Portugal, notificada para juntar aos autos, os extractos contabilísticos, nomeadamente das conta-correntes, comprovativos dos preços finais de compra assim como de venda por kg, relativamente aos anos de 2015 e 2016.» Mediante despacho proferido na audiência prévia foi ordenado o seguinte: «Notifique a Ré e a sociedade D…, para, em 15 dias, procederem à junção dos documentos requeridos, conforme arts. 429.º a 432.º do Código de Processo Civil».

A sociedade D…, com sede em França, não foi notificada.

A ré, notificada, veio escusar-se da junção dos documentos com o argumento de que estes estão sujeitos a sigilo, nos termos dos artigos 42.º e 43.º do Código Comercial e 64.º da Lei Geral Tributária, para além de que a autora não identifica minimamente, em concreto, os documentos cuja junção pretende, nem os factos que com tais documentos quer provar, nem alega que não tem à sua disposição qualquer outro meio de provar os seus intentos.

A autora respondeu, defendendo a junção dos documentos.

O tribunal declarou que perante o impasse criado teria de ser suscitado o incidente do levantamento do sigilo invocado.

Veio então a autora suscitar o incidente de levantamento do sigilo que termina formulando o pedido de que seja «a Ré obrigada a apresentar a documentação contabilística requerida, quer em sua posse, quer na posse da sociedade D…, de quem é subsidiária em Portugal» Para o efeito, alegou o seguinte: «[…] 5- A Autora é uma produtora de Kiwis com contrato de exclusividade na venda da variedade Kiwi Arguta com a D… (que por sua vez cedeu os direitos de comercialização em Portugal à D…).

6- […] a Autora apenas pode vender o seu produto em Portugal à Ré D….

7- É a Ré, […] que pode comprar e vender a totalidade da colheita da Autora.

8- […] a Autora tem vindo a reclamar […] que a Ré demonstre o verdadeiro preço por Kg de Kiwi vendido e quem foi o seu comprador.

9- Tal demonstração só poderá ser feita apenas com a documentação em poder daquela (facturação).

10- Esta informação é crucial pois dela depende o apuramento do valor final a pagar ao produtor pela fruta entregue.

11- […] a Ré faz depender do preço final a pagar aos produtores, o preço de mercado a que conseguiu vender os kiwis comercializados.

[…] 13- […] a Ré ao longo dos anos não demonstra aos produtores como chega aos resultados apresentados.

14- Tratando-se de uma relação comercial equiparada a um clube de produtores, seria no mínimo expectável que essa informação fosse prestada.

15- Tanto mais que a Ré vende quase 100% da fruta que compra aos produtores nacionais à sociedade D…, de quem é subsidiária.

16- Ora se a Ré vende a fruta à sociedade de que é subsidiária, não estamos perante o cálculo de preço de marcado.

17- Pois o único cliente da Ré é uma sociedade de quem esta está dependente.

18- Encontrando-se a Autora e a Ré juntas na mesma organização produtiva e de distribuição, em virtude dos contratos celebrados, a partilha da informação contabilística e conta corrente devem ser de consulta obrigatória por todos os intervenientes e não sujeita a sigilo.

19- Uma vez que a Ré se recusa a fornecer tal informação, para a Autora é fundamental a consulta da informação contabilística da Ré para que se possa aferir a quem é que esta vendeu a totalidade da fruta entre 2015 e 2016 e a que preço.

20- Relativamente à D… é fundamental perceber a quantidade e a que preço por Kg esta comprou os kiwis à Ré, e a que preço os vendeu no mercado internacional e que quantidade nos anos 2015 e 2016.

21- Só assim a Ré pode demonstrar como atinge o valor a pagar por quilo em cada campanha.

22- Ora se não apresenta dados concretos, a dúvida subsiste.

22- Sendo certo que em comparação com o mesmo produto vendido no mercado livre, o preço pago pela Ré é sempre inferior.

23- A Autora sabe que esta variedade de kiwi é vendida no mercado livre a um preço superior ao pago pela Ré, conforme faturas já juntas.

24- A Ré em conjunto com a sociedade D…, detém o controlo da produção e venda deste tipo de Kiwi relativamente aos produtores nacionais aderentes por força dos acordos comerciais celebrados.

25- Existindo o monopólio da compra e comercialização deste tipo de kiwi e se o preço final a pagar ao produtor está dependente do valor de mercado apurado pela Ré, 26- A informação a quem é que esta vendeu, que quantidade vendeu, e a que preço, deveria ser informação mínima e essencial a fornecer aos produtores.

27- O cálculo do valor final a pagar por cada Kg de Kiwi pela Ré à Autora tem por base o preço de mercado.

28- A Ré não fornece qualquer tipo de informação relativamente à forma como calcula o valor de mercado apresentado à autora nos anos de 2015 e 2016.

29- A Ré apenas impõe um valor final, sempre mais baixo do que a fruta vendida em mercado livre.

30- Apenas com a junção da documentação contabilística em posse da Ré e da Sociedade D… se pode aferir o verdadeiro valor de mercado do Kg de Kiwi, em 2015 e 2016.» Recebidos os autos nesta Relação e verificando-se que os autos foram mandados subir sem previamente se ouvir a parte contrária sobre a matéria do incidente e que a sociedade terceira francesa nem sequer fora notificada para juntar os documentos, determinou-se a baixa dos autos à 1.ª instância para a necessária regularização da instância.

Na 1.ª instância foi notificada a Ré para responder, querendo, ao incidente e, a sociedade francesa D… para juntar a documentação requerida pela autora.

A ré pronunciou-se por fim sobre a matéria do incidente retomando as razões que havia alegado para recusar a junção dos documentos e defendendo a improcedência do incidente também quando à sociedade de direito francês D….

Esta veio, entretanto, fazer sua a posição assumida nos autos pela ré quanto à junção dos documentos pretendidos pela autora e juntar outros documentos que entendeu poderem satisfazer o...

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