Acórdão nº 767/14.9T9FAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 24 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelBEATRIZ MARQUES BORGES
Data da Resolução24 de Novembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na 2ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I. RELATÓRIO 1. Da decisão No Processo Comum Singular n.º 767/14.9T9FAR do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, Juízo Local Criminal de Faro, Juiz 1, realizado julgamento foi proferida sentença: NA PARTE CRIMINAL

a) Absolvendo a arguida (...) da prática, em autoria material, de um crime de homicídio por negligência, previsto e punível pelos artigos 15.º, alínea b) e 137.º, n.º 1 do CP; c) Condenando o arguido (...) pela prática, em autoria material, de um crime de homicídio por negligência, previsto e punível pelos artigos 15.º, alínea b) e 137.º, n.º 1 do CP, na pena de cento e cinquenta dias de multa, à taxa diária de seis euros, perfazendo o montante total de novecentos euros; d) Condenando o arguido (...) no pagamento dos encargos do processo (artigo 514.º, n.º 1 do CPP), fixando-se a taxa de justiça em três UC (artigo 8.º, n.º 9 do RCP e Tabela III a este anexa), sem prejuízo do apoio judiciário concedido (cf. fls. 146 a 148).

NA PARTE CÍVEL - Condenando a demandada “AGEAS – Companhia de Seguros, SA” a pagar ao “Centro Hospitalar Universitário do Algarve, EPE” a quantia de dez mil, cento e sessenta e seis euros e onze cêntimos, acrescida dos juros, contabilizados à taxa legal, desde a data da notificação do pedido até efetivo e integral pagamento.

  1. Do recurso 2.1. Das conclusões da demandada “AGEAS – Companhia de Seguros, SA” Inconformada com a decisão a demandada interpôs recurso extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões (transcrição): “A) O presente recurso sobe da sentença que condenou a Recorrente no pagamento ao CENTRO HOSPITALAR UNIVERSITÁRIO DO ALGARVE, EPE da quantia de €10.166,11 (dez mil, cento e sessenta e seis mil euros e onze cêntimos), acrescida de juros, contabilizados à taxa legal, desde a data da notificação do pedido até efetivo e integral pagamento, pois entende aquela que o Tribunal não apreciou devidamente os factos, nem deu cumprimento às normas aplicáveis ao instituto da prescrição, bem assim à impugnação de documentos, dando como provada matéria assente em documentos impugnados.

    1. E assim, o presente recurso tem somente por objeto a matéria conexa com o pedido de indemnização cível e a sua apreciação em sentença (artº 403, nºs 1 e 2, alínea b) do CPPenal).

    2. A Recorrente impugna a decisão do Tribunal a quo sobre a matéria considerada provada e constante da parte final do Ponto 28 e o Ponto 29, por considerar que se não fez qualquer prova sobre a mesma.

    3. Para prova de tal matéria articulada pelo Demandante Cível, este limitou-se a alegar nos artºs 2 e 3 do seu articulado factos, que a Recorrente referiu em sede de contestação desconhecer se eram ou não reais, por não serem do seu conhecimento pessoal, o que conduz à sua impugnação (artº 574, nº 3 do CPCivil), juntando ainda uma fatura, emitida em 24.06.2019, que indica apenas o seguinte “episódio internamento 14020377 de 10-2-2014 a 12-12-2014. GDH 558. Causa: queda. SMS 594460618”, a qual foi impugnado por esta.

    4. Cabia, assim, ao Demandante Cível fazer prova em audiência, nomeadamente juntando outros documentos e/ou inquirindo testemunhas sobre os factos, o que não sucedeu, porquanto a Demandante não esteve presente, nem se fez representar pelo seu Ilustre Mandatário em qualquer uma das sessões de julgamento (vd. Atas das audiências de julgamento de 11.02.2020, 2.03.2020,29.05.20205.06.2020, constantes dos autos).

    5. E relativamente à prova arrolada pelo Demandante Cível, nenhuma delas foi inquirida ou se pronunciou sobre os factos alegados pelo Demandante Cível, bastando para tanto, analisar os seus depoimentos constantes das gravações constantes do Sistema Integrado de Gravação Digital para se verificar tal.

    6. Face à inexistência de depoimentos sobre a matéria hospitalar (tratamentos, intervenções, custos), não pode o Recorrente indicar concretamente os pontos dessas gravações onde as testemunhas, inquiridas, se pronunciassem sobre tais questões, porque eles inexistem, pelo que a única prova constante dos autos a analisar por V.Exªs é a fatura junta ao pedido cível e que foi impugnada pelo Recorrente, porque versava sobre matéria controvertida, que fora também por si impugnada.

    7. Deste modo, cabendo ao Centro Hospitalar a prova da prestação de cuidados de saúde (artº 5 do DL 218/99) e não a tendo feito, não poderia o Tribunal a quo dar como provada tal matéria constante da parte final do Ponto 28 e ainda a matéria do Ponto 29 e, assim, face à inexistência dessa prova cujo ónus pertencia ao Demandante Cível, deveria o Tribunal a quo absolver a Recorrente do pedido.

      POR OUTRO LADO, I) A Demandada, ora Recorrente, foi citada para contestar o pedido de indemnização cível deduzido contra si em 16.12.2019, sendo essa a primeira vez tomou contacto com a reclamação do Centro Hospitalar e com a fatura junta por este, sendo que não foi em nenhum outro momento interpelado por parte da Demandante, nem o poderia ter sido antes, quando a fatura hospitalar só fora emitida em 26.04.2019 (vd. Doc. junto ao pedido de indemnização cível); J) a Recorrente invocou a prescrição da divida, como ponto prévio, sendo que a prescrição constitui uma exceção perentória, cuja prova conduz à absolvição do pedido (artºs 576, nº 1 do CPCivil).

    8. Tendo o acidente ocorreu dia 10.12.2014, tendo o menor falecido em 12.12.2014, e a Recorrente sido citada para estes autos em 16.12.2019, o pedido do Demandante Cível ocorrera, quer por força do disposto nos artºs 118, nº 1, c) e 137, nº 1 e 15, alínea b), ambos do CPenal e artº 498 do CCivil, quer por força do disposto no DL 218/99 de 15 de Junho, face ao seu artº 3.

    9. A Recorrente foi citada para estes autos em 16.12.2019, não tendo sido em qualquer outro momento anterior objeto de qualquer ato por parte da Demandante, demonstrativo da sua intenção em demandar aquela, nomeadamente através de notificação judicial avulsa que nem sequer alegou, e a ter acontecido exigiria que a fatura não tivesse sido emitida tardiamente em 26.04.2019; N) As despesas reclamadas pelo Demandante decorreram de “episódio internamento nº 14020377 de 10.12.2014 a 12.12.2014”, conforme resulta da fatura junta ao pedido de indemnização cível, internamento e tratamento que cessou no dia 12.12.2014, face ao falecimento do menor ocorrido em 12.12.2014, pelo que este conhecia já em 12.12.2014 o direito a reclamar o pagamento junto da Recorrente, não o tendo exercido atempadamente, o que sempre poderia ter feito , decorrendo o processo de inquérito , face ao disposto no artº 72, nº 1, alínea a) do CPPenal.

    10. Por outro lado, a prescrição invocada – independentemente da norma – deveria ter sido apreciada face ao normativo do referido DL 218/99, diploma este especificamente publicado para regulamentar o regime de cobrança de dividas pelas instituições e serviços integrados no Serviço Nacional de Saúde, enquanto lei particular, impor-se-ia sempre ao instituto da prescrição definido nos termos do artº 498 do CCivil.

    11. Consagrando o artº. 3º do DL nº 218/99, de 15 de Junho, que “Os créditos a que se refere o presente diploma prescrevem no prazo de três anos, contados da data da cessação da prestação dos serviços que lhes deu origem.” e que o Demandante Cível está integrado no Serviço Nacional de Saúde, deveria o Tribunal “a quo”, julgar de acordo com esta norma, face à invocada prescrição, até porque o Tribunal não está adstrito à invocação do Direito pelas Partes.

    12. Deste modo, tendo os alegados tratamentos ocorridos no período de 10 a 12.12.2014, cessando nesta data por falecimento do menor, gerou-se nesta data o direito do Centro Hospitalar Universitário do Algarve a reclamar da seguradora o pagamento da divida, pelo que o prazo prescricional inicia-se em 13.12.2014 e teve o seu termo 3 anos depois, ou seja, em 13.12.2017, logo, muito antes da data invocada pelo tribunal a quo – 07.05.2019 - como momento de interrupção da prescrição.

    13. Entende-se, assim, que o Tribunal a quo ao dar como provada a matéria da parte final do Ponto 28 e ainda a matéria do Ponto 29, apenas apoiado em documento/fatura impugnado e cuja veracidade e conteúdo não resultou de prova produzida em audiência de julgamento, para além de não ter considerado a invocada prescrição , violou o disposto nos artºs 444 e seguintes do CPCivl, o artº3 do DL 218/99 de 15 de Junho, os artºs 498, nº 3 e 576, nº 1 , ambos do CPCivil, merecendo assim a sentença sindicada censura.

      NESTES TERMOS, E nos mais de Direito (…) deve ser dado inteiro provimento ao presente recurso e, em consequência, julgar-se como não provada a matéria da parte final do Ponto 28 e ainda a matéria do Ponto 29 e, sempre, considerar a reclamada divida como prescrita, revogando-se a sentença recorrida nessa parte e, em consequência, absolvendo-se a Recorrente do pedido formulado pelo Demandante Cível (…)”.

      2.2. Das contra-alegações do “Centro Hospitalar Universitário do Algarve, EPE” Motivou o “Centro Hospitalar Universitário do Algarve, EPE” defendendo o acerto da decisão recorrida, concluindo nos seguintes termos (transcrição): “1. A total procedência do enxerto cível desta instituição pública justamente decretada pelo Tribunal “a quo” terá/deverá ser conservada na nossa rica Ordem Jurídica.

  2. Já no que tange aos fracos motivos que a recorrente SA engendrou para tentar abalar esse segmento da decisão, dizer que, não podem ter um qualquer amparo nesse alto, sábio e, muito experiente Tribunal pois, esta sentença é isenta de uma qualquer crítica e/ou reparo.

  3. Na verdade, da factualidade dada como provada pelo Mmª Juiz “a quo” e que não é despicienda, ficou muito bem fundamentado que, na sequência da conduta criminosa do arguido que circulava com o veículo seguro na Recorrida SA, o menor aqui assistido escorregou e, embateu contra os bancos do veículo seguro na Seguradora recorrente, tendo, em consequência disso, partido os dois fémures (vide, o ponto n.º 14 dos factos provados).

  4. Por outro lado, da...

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