Acórdão nº 183/20.3BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 03 de Dezembro de 2020

Magistrado ResponsávelH
Data da Resolução03 de Dezembro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os juízes que compõem a 1.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul l – RELATÓRIO B... - ARTIGOS DE VESTUÁRIO PARA SENHORA CRIANÇA, LDA, deduziu junto do Tribunal Tributário de Lisboa (TT), reclamação decisões do órgão de execução fiscal (OEF), ao abrigo do artigo 276.º do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT), contra o despacho da Chefe do Serviço de Finanças do Lisboa 2., que indeferiu o pedido de reconhecimento da prescrição das dívidas no âmbito dos processos de execução fiscal (PEF) n.º 3... e outros, alegando, em síntese, que o mesmo é ilegal uma vez que sobre os factos tributários e sobre a citação para a execução já passaram mais de 8 anos.

O TRIBUNAL TRIBUTÁRIO DE LISBOA, por decisão de 03 de março de 2020, julgou improcedente a reclamação e, consequentemente, manteve na ordem jurídica o despacho recorrido.

Inconformada, B... - Artigos de Vestuário para Senhora Criança, Lda., veio recorrer contra o decidido, tendo apresentado as suas alegações e formulado as seguintes conclusões: «A. Os processos de execução fiscal objecto da reclamação judicial, referem-se a dívidas tributárias em que os repectivos factos tributários ocorreram há mais de 8 anos atrás.

B. Nos processos de execução fiscal acima mencionados, as citações da RECORRENTE, ocorreram por VIA POSTAL, entre maio de 2003 e Outubro de 2011, com excepção para o processo n.º 32... em que a interrupção ocorreu em 24/12/2011, começando, a partir dessas datas, a correr novo prazo de prescrição, o qual se completou entre 15/05/2011 e 26/09/2019, e em 24/12/2019 relativamente à execução atrás referida.

C. A citação postal, efectuada nos termos do disposto no art.º 191.º do CPPT, tem um efeito interruptivo da prescrição meramente instantâneo, começando a correr novo prazo a partir da data de ocorrência do facto interruptivo.

D. Desde a data da ocorrência dos factos tributários, que as fases de liquidação dos tributos e da execução das dívidas prosseguiram os seus trâmites legais, sem qualquer iniciativa por parte da Executada.

E. À luz do disposto no n.º 1 do art.º 48.º da LGT, as dívidas tributárias, a que respeitam os processos executivos acima identificados já se encontram prescritas.

F. O prazo de prescrição interrompeu-se nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 49.º da LGT, com as citações.

G. Ou seja, as dívidas tributárias, a que respeitam os presentes processos de execução fiscal, prescreveram entre 15/05/2011 e 26/09/2019, e em 24/12/2019 relativamente à execução n.º 32...

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H. Pelo que a sentença Recorrida, violou o disposto no n.º 1 do art.º 48.º e n.º 1 do art.º 49.º da LGT.

Sem conceder com o supra exposto e por cautela de patrocínio importa referir o seguinte: I. Contrariamente ao referido na sentença recorrida, a interrupção da prescrição, decorrente da citação, tem um efeito instantâneo, reiniciando-se, a partir desse momento, a contagem do prazo de prescrição.

J. O regime previsto no n.º 1 do art.º 327.º do cc, está pensado e estruturado para o contencioso civil de plena jurisdição, não sendo aplicável à relação tributária, uma vez que este apresente profundas diferenças em relação ao contencioso civil.

K. A aplicação do regime previsto no n.º 1 do art.º 327.º do CC, viola o regime previsto no n.º 1 do art.º 49.º da LGT.

L. Sendo outrossim violador do regime da legalidade tributária previsto no n.º 1 e alínea a) n.º 2 do art.º 8.º da LGT.

M. À luz do disposto no art.º 11.º da LGT, que não é possível interpretar este preceito, no sentido de ser atribuído efeito duradouro à interrupção da prescrição, ocorrida com as citações nos processos de execução fiscal sub judice, no sentido de o prazo de prescrição só reiniciar após a decisão de põe termo ao processo de execução.

N. Tal entendimento viola outrossim o princípio da legalidade, ínsito no n.º 2 do artigo 103.º da CRP, conjugado com o disposto no n.º 4 do artigo 11.º da LGT, O. Isto porque o legislador tributário quis regular de forma completa na LGT o regime da prescrição, estabelecendo os prazos especiais e os eventos que determinam a sua interrupção e a suspensão.

P. A prescrição, em direito tributário, tem de ter um prazo efetivo e esse prazo tem de ter um fim igualmente efetivo, não sendo legalmente admissível propugnar, designadamente pela aplicação do normativo civil, no sentido de que o prazo de prescrição só se inicia com o fim do processo de execução fiscal.

Q. Atendendo ao disposto nas alíneas a) e b) do n.º 1 do art.º 176.º, n.º 1 do art.º 264.º e n.º 1 do art.º 269.º, todos do CPPT, é inequívoco que o processo de execução fiscal só termina com o pagamento, voluntário ou coercivo.

R. Se o prazo de prescrição apenas se inicia com o fim do processo de execução fiscal, como se defende no despacho impugnado, e se o processo de execução fiscal só finda com o pagamento, em rigor o prazo de prescrição nunca chega sequer a iniciar-se, o que é um absurdo.

S. A prescrição dos créditos tributários constitui uma das garantias dos contribuintes, maxime a necessidade de segurança jurídica para os contribuintes, consagrada no artigo 2.º da CRP.

T. O entendimento da sentença recorrida leva a que, no caso vertente, apesar de estarmos em 2020, e da dívida se reportar a factos ocorridos entre 2002 e 2011, o prazo de prescrição ainda nem sequer se tenha iniciado, pois ainda não cessou o processo de execução fiscal (!!??!!).

U. O instituto da prescrição, previsto no art.º 48.º da LGT é incompatível com o entendimento vertido na sentença recorrida [efeito duradouro do facto interruptivo], porquanto torna juridicamente impossível a sua aplicação, o que consubstancia outrossim a violação do princípio da defesa e da proteção jurisdicional efetiva, estabelecidos nos artigos 20.º n.º 1 e 268.º n.º 4 da CRP e no art.º 9.º da LGT.

V. Da sentença recorrida resulta que a prescrição dos créditos tributários, na prática, jamais ocorre, o que é incompreensível, se atentarmos na intenção do legislador de encurtar o prazo de prescrição para 8 (oito) anos.

W. Acresce que no caso vertente, a matéria de facto dada como provada refere dois autos de penhora, um dos quais em 2010 e outro em 2017.

X. Desde 2010, data da citação, que a AT poderia e deveria ter promovido de forma diligente os processos executivos, efectuando penhoras de bens móveis.

Y. Os autos mostram que só em 2010 e em 2017 foram realizadas penhoras sendo que, volvidos mais de sete anos sobre estas diligências, nada mais foi efectuado pela AT.

Z. A AT demorou quase sete anos [tantos quanto a totalidade do prazo de prescrição] para iniciar diligências de penhora sem que existisse qualquer incidente processual que o justificasse, por inércia, ineficiência ou de forma intencional para contornar o prazo de prescrição, sendo que, nenhuma destas razões pode ser imputada ao contribuinte.

AA. A AT tem sido absolutamente inerte na promoção da cobrança dos créditos executivos, com o único propósito de evitar a declaração de falhas, controlando, assim, de acordo com a sua conveniência de credora, o prazo de prescrição.

BB. Há muito que a AT sabe que os bens penhorados são de valor muito reduzido, e que, nessa medida, são insuficientes para obter o pagamento dos seus créditos.

CC. Conforme consta do despacho reclamando, não houve ainda reversão contra os responsáveis solidários.

DD. Sendo certo que, atento do disposto no n.º 2 do art.º 48.º da LGT, tal não se afigura neste momento legalmente possível.

EE. Note-se que alguns dos processos foram instaurados há mais de 17 anos.

FF. A AT mantém os presentes processos de execução fiscal em aberto, com o único propósito de evitar a declaração de falhas.

GG. No caso vertente, a invocação pela AT do efeito duradouro da interrupção da prescrição, ao abrigo do disposto no n.º 1 art.º 49.º da LGT, constitui uma flagrante situação de abuso de direito, pela AT, na vertente do “venire contra factum próprio”, conduta esta que é proibida pelo art.º 334.º do CC.

Termos em que, com o mui douto suprimento de V.Exas., se requer seja dado provimento ao presente recurso PER SALTUM, revogando-se a decisão recorrida, substituindo-a por outra que julgando procedente a reclamação judicial apresentada pela RECORRENTE, declare a prescrição de todas as dívidas tributárias a que correspondem os processos executivos identificados na reclamação judicial declarando os mesmos extintos.

Com o que se fará a...

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