Acórdão nº 0153/19.4BEFUN de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 03 de Dezembro de 2020
Magistrado Responsável | MARIA DO CÉU NEVES |
Data da Resolução | 03 de Dezembro de 2020 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO 1. RELATÓRIO A…………., residente no ……….., nº…, .., 9060-…., Funchal, devidamente identificado nos autos, intentou no Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal (TAF) contra a Secretaria Regional da Educação, Ciência e Tecnologia, providência cautelar de suspensão da eficácia da decisão do Secretário Regional de Educação, do Governo Regional da Região Autónoma da Madeira, proferida a 28 de Fevereiro de 2019, no Processo Disciplinar (PD) n° ………, que o pronunciou como autor de infracções disciplinares e lhe aplicou a pena de suspensão, graduada em cento e oitenta (180) dias, peticionando: “A anulação – Ser o procedimento disciplinar considerado prescrito; - Ser o procedimento disciplinar considerado nulo por ter sido violado o princípio da imparcialidade e da legalidade; - Ser considerada nula a decisão sob censura, em virtude de recorrentes omissões de pronúncia e violação das regras da determinação da sanção; - Ser anulada a decisão do Sr. Secretário Regional de Educação, em virtude vícios que sustentam a sua motivação; Ou ainda, em limite, - Ser aplicada a pena de escalão inferior, por verificação das atenuantes, mas sempre; - Ser a mesma suspensa na sua execução”*O TAF do Funchal, por decisão proferida em 15 de Dezembro de 2019, antecipando a decisão da causa principal, julgou a acção totalmente procedente, e, em consequência, anulou o acto do Secretário Regional de Educação de 28 de Fevereiro de 2019 que determinou a aplicação da sanção disciplinar de suspensão de 180 (cento e oitenta) dias ao Autor.
*O Réu apelou para o TCA Sul e este, por acórdão proferido a 18 de Junho de 2020, indeferiu a reclamação apresentada e confirmou a decisão sumária do relator que concedeu provimento ao recurso, revogou a sentença recorrida na parte em que julgou a ação administrativa de impugnação de acto tempestiva e determinou a absolvição da instância da Entidade Demandada, por caducidade do direito de acção (art 89º, nºs 2 e 4, alínea k) do CPTA).
*O Autor, inconformado, veio interpor o presente recurso de revista, tendo na respectiva alegação, formulado as seguintes conclusões: «I.
Não obstante o TCAS consolidar o entendimento do TAFF, em matéria de prescrição do procedimento disciplinar que conduziu a aplicação da pena disciplinar de suspensão de 180 dias do Recorrente, o certo é que concedeu parcial provimento ao recurso apresentado, julgando a acção de impugnação do acto intempestiva.
II.
Aqui reside a razão de discordância do Recorrente que, ao contrário do douto acórdão proferido pelo TCAS, seguindo a linha motivacional do TAFF, considera a primeira decisão totalmente intocável e, nesse entendimento, a acção de impugnação do ato perfeitamente tempestiva. Vejamos melhor.
III.
O TAF do Funchal – antecipando a decisão da causa principal, nos termos do art. 121.º do CPTA – julgou a acção totalmente procedente e, em consequência, decidiu anular o acto do Secretário Regional de Educação de 28 de Fevereiro, de 2019.
IV.
A sentença do TAFF, sobre a excepção de caducidade do direito de acção, entendeu ser a acção tempestiva por ocorrerem dois eventos que determinaram o efeito suspensivo da contagem do prazo de impugnação contenciosa do acto administrativo que puniu o recorrido.
V.
Efectivamente, em 25/03/2019, o ora Recorrente veio deduzir reclamação da decisão que aplicou a sanção disciplinar. Do indeferimento de tal reclamação foi o então Autor notificado através de carta registada com AR, assinada em 12/04/2019 (não pelo destinatário da mesma, ora signatário).
VI.
Daqui concluiu o TAFF estar verificado um evento que implicou a suspensão da contagem do prazo de impugnação contenciosa do acto administrativo: de 25/03/2019 e 12/04/2019 – por 19 dias.
VII.
O acto que indeferiu a reclamação não seguiu com a respectiva notificação, ficando esta comprometida, por não obedecer ao preceituado na alínea a), do n.º 2, do artigo 114.º, do CPA.
VIII.
Por tal motivo, o Autor, a 23/04/2019, volta de novo a interpelar a Entidade Demandada, no sentido de que lhe fosse dado a conhecer o conteúdo dessa mesma decisão, ou seja “o ato administrativo firmado pelo Senhor Secretário Regional” (sic.) – decisão essa que só lhe foi comunicada a 03/05/2019, com a remessa da cópia do despacho de indeferimento e respectiva motivação, contendo os fundamentos que levaram ao despacho.
IX.
Neste sentido, entre 23/04/2019 e 03/05/2019 – 11 dias – ocorreu um segundo evento que determina o efeito suspensivo da contagem do prazo de impugnação contenciosa do acto administrativo (n.º 4, do artigo 59.º, do CPTA).
X.
O então Autor, ora Recorrente, enquanto destinatário do acto administrativo desfavorável para a sua esfera jurídica, não tinha todos os elementos obrigatórios que permitissem conhecer o acto administrativo, e respectiva fundamentação, constituindo-se, assim, uma circunstância impeditiva de contagem do prazo, para o exercício do direito de acção.
XI.
Interpretação diferente vem acolhida no douto acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul, ao considerar que o ofício de notificação, de 10/04/2019, satisfaz as exigências do art. 114.º, do CPA, e o pedido do autor, de 23/04/2019, a solicitar a notificação do acto, não teve a virtualidade de interromper o prazo de impugnação em curso.
XII.
E aqui reside a razão da discordância com o douto acórdão proferido pelo TCAS.
XIII.
A reclamação apresentada pelo então Autor (ora Recorrente) sustentando-se na factologia documental constante dos autos, e bem assim, nas regras de direito aplicadas ao caso, pugnava pela anulabilidade do despacho punitivo de 28 de Fevereiro de 2019, considerando-o sem efeitos e sem consequências práticas, por vir estribado em procedimento disciplinar prescrito.
XIV.
Em resposta a tal reclamação recebeu o Autor (ora Recorrente) apenas uma informação remetendo para uma “III-conclusão”; conclusão essa que começava por “Face ao exposto...”, muito embora se desconheça o que viria exposto.
XV.
Contudo, desconhece-se por completo de que faz parte tal conclusão! Conclusão de quê?, Quais os fundamentos (de facto e de direito) que a estribam? Qual o texto que a incorpora? Que apreciação crítica foi feita dos factos, das normas legais invocadas na reclamação, das conclusões e do pedido que o Reclamante apresentou? XVI.
Tinha o Recorrente necessidade de saber mais do que apenas “quem era o autor” e “a data do acto”. Acima de tudo, pretendia conhecer o itinerário cognoscitivo e valorativo da decisão. Pretendia conhecer o texto integral do acto administrativo, incluindo a respectiva fundamentação, completa e sem rodeios, como (e onde) foram apreciados os argumentos reclamativos.
XVII.
Por isso se viu compelido a apresentar o requerimento de 23/04/2019. E o certo é que, dias depois, justamente a 03/05/2019, acabou o interessado por receber o que suscitou: o texto integral da decisão anunciada, com a fundamentação inerente.
XVIII.
Só depois de ter recebido o texto integral do acto administrativo, sobretudo depois de conhecer a fundamentação que o amparava, reuniu o interessado os elementos necessários e essenciais para formalizar o recurso contencioso que veio a interpor.
XIX.
O regime de notificação dos actos administrativos consta dos artigos 110.º a 114.º, do CPA, reportando-se o art. 114.º, nº 2, ao conteúdo da notificação. Por sua vez, o nº 1, do art. 60.º, do CPTA, estabelece o...
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