Acórdão nº 306/20.2BECTB de Tribunal Central Administrativo Sul, 26 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelRICARDO LEITE
Data da Resolução26 de Novembro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal Central Administrativo – Sul: I. Relatório UNIDADE LOCAL DE SAÚDE DA GUARDA, E.P.E., Recorrente/Requerida nos presentes autos, em que é Requerente/Recorrido H…..

, todos com os demais sinais nos autos, veio interpor recurso da decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, datada de 17 de Setembro de 2020, que julgou procedente a presente Intimação para prestação de informações e passagem de certidões e, consequentemente, determinou: (…) julgo a presente intimação procedente e, consequentemente, intimo a Entidade Requerida a, no prazo de 10 dias, facultar ao Requerente cópia do teor das fichas de avaliação de desempenho de todos os funcionários que, no hospital Sousa Martins, se enquadrem na categoria de assistente técnico no período de 2017 a 2018, bem como teor das actas do conselho coordenador da avaliação e do conselho de administração da ULSG relativas à referida avaliação de cada um dos funcionários com aquela categoria, incluindo as respetivas fundamentações efectuadas por estes órgãos, nos termos acima fixados.” Para tanto, o Recorrente formulou as seguintes conclusões: “1 – Vem o presente recurso interposto da sentença proferida nos autos que julgou procedente a presente intimação para prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões, por entender em suma, relativamente aos documentos solicitados, que a Requerida não respeitou o direito à informação exercido pelo Requerente.

2-O Requerente solicitou que lhe fossem cedidas por reprodução por fotocópia ou por qualquer outro meio técnico, designadamente eletrónico, o teor das fichas de avaliação de desempenho de todos os funcionários que, no hospital Sousa Martins, se enquadrem na categoria de assistente técnico no período de 2017 a 2018, bem como teor das atas do conselho coordenador da avaliação e do conselho de administração da ULSG relativas à referida avaliação de cada um dos funcionários com aquela categoria, incluindo as respetivas fundamentações efetuadas por estes órgãos, documentos que podem ser remetidos para o meu mail de serviço em ficheiro PDF sempre se colocariam em causa dados pessoais dos indivíduos a identificar como funcionários com a categoria de assistentes técnicos.

3- O Requerente assenta o seu pedido de acesso ao teor integral das fichas de avaliação de desempenho de todos os funcionários que, no hospital Sousa Martins, se enquadrem na categoria de assistente técnico no período de 2017 a 2018, bem como teor das atas do conselho coordenador da avaliação e do conselho de administração da ULSG relativas à referida avaliação de cada um dos funcionários com aquela categoria, incluindo as respetivas fundamentações efetuadas por estes órgãos no mero imperativo constitucional e no art. 6º da Lei 26/2006 de 22.08.

4- Não se retiram das alegações do Requerente, médico de profissão, quais os fins de tal acesso, tanto mais que é de categoria completamente distinta dos trabalhadores cujas fichas de avaliação pretende obter e os processos de avaliação encontram-se findos.

5- Assim, o interesse que o Requerente revela no acesso aos elementos que solicitou traduz-se num entendimento que o mesmo considera correto.

6- Tendo presente a alegação constante do art. 14º da resposta à ação de intimação segundo a qual a Requerida considera que as atas e fichas de avaliação solicitadas pelo Requerente, “na vertente de apreciação concreta dos trabalhadores contém dados pessoais…”, , pelo que não se subsumem a documentos administrativos, 7- bem como o facto de não resultar dos presentes autos a existência de autorização escrita dos respetivos titulares 8- deveria o Tribunal a quo ter presente o regime especial de acesso aos procedimentos de avaliação no âmbito do SIADAP 3, designadamente a natureza confidencial de tais documentos, exceto em situações muito particulares como é o caso de profissionais que se integram na mesma categoria e que pretendam recorrer da decisão avaliativa da entidade empregadora, o que repita-se não é o caso.

9-Acresce que nos pareceres nº 148/2020, 48/2019 e 4040/2018, a Comissão de Acesso a Documentos Administrativos (CADA) entendeu que a condição para se aceder a documentos da natureza dos solicitados pelo Requerente, aquele devia fazer parte do grupo profissional dos trabalhadores cujos documentos pretende ter acesso.

10- É comummente aceite na doutrina e jurisprudência que o direito de acesso aos arquivos da Administração não é, nem poderá ser, um direito absoluto, importando equacionar e ponderar o mesmo, em função dos demais direitos e valores constitucionais protegidos, com os quais potencialmente poderá colidir.

11- O pedido de documentos feito pelo Recorrido, pese embora o princípio de administração aberta que rege o nosso ordenamento jurídico contende com o estabelecido na Lei, nomeadamente no que concerne à proteção de dados pessoais., art. 18º do CPA e art. 3º da LADA.

12- O Tribunal a quo não verificou a legitimidade do Recorrido em obter os documentos solicitados, em função da C.R.P., Lei 26/2006 de 22.08 e art. 44º da Lei nº 66-B/2007 de 28.12, bem como da sua justificação, de modo a que se pudesse concluir que a obtenção dos documentos em causa não se trataria de mero capricho, insuscetível de proteção jurisdicional.

13- É incontornável e o Tribunal a quo não considerou que o Recorrido em momento algum justificou e fundamentou a razão subjacente a pretender que lhe seja facultada um conjunto de fichas nominativas de avaliação dos assistentes técnicos da Recorrente nos anos 2017 e 2018, que não seja pela mera invocação normativa, sem que se percecione as razões objetivas de tal pedido; 14- Como se disse o Recorrido limita-se a justificar o seu pedido normativamente, invocando para além do principio constitucional, normativos da LADA, sem que tal, só por si, permita evidenciar a razão subjacente.

15- Assim em face do que precede, sempre o Recorrido, à luz do disposto da LADA, art. 18º, nºs 1 e 2 do art. 268º da CRP e art. 44º da Lei nº 66-B/2007 de 28.12, deveria evidenciar o interesse direto, pessoal e legítimo, na obtenção dos documentos, para além da demonstração constitucional.

16- Uma vez que o Requerente não demonstrou a qualquer título a razão do requerido, ao que acresce a circunstância de não demonstrar igualmente ser titular de qualquer interesse legitimo que justifique o pedido formulado, a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, porquanto fez uma errada interpretação e aplicação da Lei nº 26/2016, de 22 de agosto, sendo ainda, inconstitucional, por violação do princípio da proporcionalidade, violando os arts. 18º e nºs 1 e 2º do artº 268º da Constituição da República Portuguesa.

17- Pelas razões e com os fundamentos que se deixam alegados, a douta sentença recorrida deve ser revogada quanto à cedência dos documentos pretendidos pelo Requerente.

18- A douta sentença recorrida viola, além de outras indicadas disposições e princípios supra indicados, o disposto nos nºs 5, 6 e 9 do art. 6º da Lei nº 26/2016 de 22.08, arts 18º nºs 1 e 2 do art. 268º da C.R.P. e bem assim o art.º 44º da Lei nº 66-B/2007 de 28.12.” * A recorrida, por sua vez, apresentou contra-alegações nos seguintes termos: “I. Encontrando-se estabilizada a factualidade dada como assente, o Requerente tem direito a aceder à informação que solicitou, não tendo de invocar e demonstrar ser titular de um interesse directo, pessoal, legítimo e constitucionalmente protegido suficientemente relevante que justifique o acesso à informação, pois não resulta dos autos que as fichas de avaliação cuja cópia foi solicitada contenham dados pessoais que revelem a origem étnica, as opiniões políticas, as convicções religiosas ou filosóficas, a filiação sindical, dados genéticos, biométricos ou relativos à saúde, ou dados relativos à intimidade da vida privada, à vida sexual ou à orientação sexual dos funcionários em causa, ou juízos que não sejam juízos de mero carácter funcional, o que, por si só, basta para que o presente recurso seja julgado improcedente.

  1. No entanto, não pode deixar de dizer-se que a ficha de avaliação consubstancia-se num documento administrativo, produzido pelo avaliador (superior hierárquico), no uso de uma competência territorial e material legalmente cometida, no qual, grosso modo, se encontra vertido (quase) todo o procedimento administrativo da avaliação do desempenho do trabalhador público, mormente o respetivo acto de homologação da avaliação.

  2. Por assim ser, o Autor tem legitimidade para aceder à informação requerida porquanto, como já decidiu lapidarmente o douto acórdão do TCA Sul, de 08-03-2012, tirado no proc. nº 08369/11: “[a]s fichas anuais com a avaliação do desempenho de um servidor do Estado não contêm, em regra, nada de íntimo, pelo que estão efectivamente cobertas pelo princípio geral do arquivo aberto decorrente do art. 268º-2 CRP e da LADA, sendo por isso de livre acesso público.”- sublinhado e destacado nossos , IV. Porém, ainda que assim não fosse, sempre se dirá que “(…) o princípio da prossecução do interesse público (artigo 266º, nº 1) pode justificar o acesso a documentos administrativos que contenham dados pessoais, sem a invocação de qualquer finalidade, desde que integrados em documentos administrativos cujo propósito fundamental não consista em identificar pessoas” – Cfr. ALEXANDRE SOUSA PINHEIRO, in Revista de Direiro Administrativo, Maio - Agosto 2020, pág. 73 -.

  3. O que sucede no caso concreto, pelo que ainda que se tratassem – que não tratam, como acima se deixou vertido - de documentos administrativos que contivessem dados pessoais, sempre o Autor tem direito a aceder à informação requerida sem a invocação de qualquer finalidade.

  4. Por outro lado, caso a Entidade Requerida entendesse que, nos documentos solicitados, existiam informações sob domínio reservado – por, por exemplo, dizerem respeito à intimidade da vida privada dos funcionários ou...

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