Acórdão nº 02368/09.4BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 13 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelRicardo de Oliveira e Sousa
Data da Resolução13 de Novembro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:* * I – RELATÓRIO INFRAESTRUTURAS DE PORTUGAL, S.A, com os sinais dos autos, vem intentar o presente RECURSO JURISDICIONAL da decisão judicial do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de 03.08.2020, promanada no âmbito da Providência Cautelar de Suspensão de Eficácia de Ato Administrativo intentada por J. e Outra, também com os sinais dos autos, que, na sequência de requerimento da Recorrente a peticionar a revogação da providência cautelar proferida nos autos, julgou o incidente de revogação da decisão cautelar improcedente, Alegando, o Recorrente formulou as seguintes conclusões: “(…) I – Os Requerentes solicitaram ao tribunal que suspendesse a ordem de desocupação de terreno sito na EN 13 ao km 16+600, alegando serem eles os donos dessa parcela.

II – Para o efeito exibiram escritura de justificação notarial e registo predial do citado terreno.

III – Aquele pedido foi deferido atenta a aparência do direito no que concerne à titularidade do terreno.

IV - Por sentença proferida nos autos principais foi dado como assente: A parcela de terreno sita no lado esquerdo da EN 13 ao km 16+600, ocupada pelos Autores e utilizada no exercício do comércio de venda de frutas e legumes, confina com a EN 13, com a rua das (...), sendo delimitada por quatro árvores de grande porte na restante parte e foi construída pela Ré aquando da construção da EN 13, para ser usada como zona de descanso dos utentes da estrada e parque de estacionamento e integra o domínio público rodoviário. (doc. fls. 970, 1118, 1317, 1318 do proc. físico; 1.º PA e 2.º PA; fls. 204 do proc. Cautelar apenso; depoimentos) (negrito nosso) V - Requerida a revogação da providência, o TAF do Porto, apesar de se ter dado como assente que a parcela integra o domínio público rodoviário do Estado, entendeu que aquele não deveria ser deferida atento o recurso interposto da decisão final, com efeito suspensivo, e onde se põe em causa tal facto.

VI - Conclui o TAF que “Tal alegação em sede recursiva, com provável efeito suspensivo, é suficiente para indeferir o presente pedido de revogação.” (SIC) VII - Ora, o tribunal julgou o pedido de revogação com um fundamento formal, que, aliás, afirma ser o suficiente, ou seja, o da interposição de recurso, sem sequer abordar a eventual procedência ou improcedência da causa principal.

VIII - Trata-se, assim, de manifesta omissão de pronúncia sancionada com nulidade da decisão, nos termos do disposto no artigo 615.°, n.° 1, alínea d), do CPC ex vi artigo 1.° do CPTA.

IX - Por outro lado, antes da decisão final, e após duas sentenças transitadas em julgado (2282/09.3TBVCD e 1375/16.5T8PVZ), os Autores/Recorridos confessaram não serem proprietários da parcela.

X - Considerando que os Autores/Recorridos apostaram tudo no direito de propriedade sobre a parcela, nada invocando além daquela qualidade, isto é, recusaram-se a sair com a alegação de serem proprietários, tal confissão é o bastante para se julgar a ação improcedente por ilegitimidade material daqueles.

XI - Além disso, mesmo antes da prolação da decisão final nos autos principais, conjugando a aparência de legalidade da execução do ato administrativo, já que beneficiava do privilégio da execução prévia (cfr: artigo 149.° n.° 2 do CPA de 1991) que foi reforçada com a confissão dos Autores/Recorridos de que não eram proprietários do terreno, é manifesto que a providência cautelar já era suscetível de ser revogada.

XII - Por fim, e como se disse, os Autores/Recorridos confessaram que não são donos da parcela, passando depois a defender que aquela pertence a um vizinho, por força de um reconhecimento da Recorrente, quando tal facto não corresponde à verdade, além de que o particular em causa foi condenado a reconhecer que não era dono da parcela (2282/09.3TBVCD) e teve ainda, por sua vez, de pedir a condenação dos Autores/Recorridos a entregarem a parte do seu terreno, situada para além da parcela do Estado, entretanto ocupada por aqueles (1881/13.3TBVCD), o que foi deferido.

XIII - Portanto, temos prova abundante, com sentenças transitadas em julgado, de que a parcela não pertence nem aos Autores/Recorridos, nem ao citado vizinho.

XIV - Assim, ultrapassada que foi a presunção de dominialidade na fase graciosa, em sede judicial, a Recorrente contrapôs aos Autores/Recorridos matéria de facto que sustenta a integração da parcela em domínio público, superando o ónus da prova que lhe era imposto.

XV - Deste modo, e porque as cautelas em que assentou o deferimento da suspensão da desocupação já não se justificam, ou seja, porque é manifesta a falta de fundamentação da pretensão formulada (fumus boni juris), deve a providência ser revogada nos termos do disposto no artigo 124.° do CPTA, pois o aparente direito e interesse alegados pelos Requerentes nunca existiram.

XVI - Pelo que ao ter decidido como decidiu, o T.A.F. do Porto violou o disposto nos artigos 9.° e 124.° do CPTA e artigo 149.°, n.° 2 do CPA de 1991 (…).”*Notificados que foram para o efeito, os Recorridos produziram contra-alegações, defendendo a manutenção do decidido no sentido da improcedência do incidente de revogação da providência cautelar.

* *O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso, fixando os seus efeitos e o modo de subida, não tendo, todavia, emitido pronúncia sobre a imputada nulidade de sentença, por falta de fundamentação de direito, o que se aceita, por não se reputar a mesma como indispensável [cfr. nº. 5 do artigo 617º do CPC].

*O/A Digno[a] Magistrado[a] do Ministério Público junto deste Tribunal Superior emitiu parecer no sentido da procedência do presente recurso jurisdicional.

* Com dispensa de vistos prévios, cumpre, pois, apreciar e decidir, já que nada a tal obsta.

* *II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do C.P.T.A. e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.

Neste pressuposto, as questões essenciais a dirimir são as de saber se a decisão judicial recorrida incorreu (i) em nulidade de sentença, por omissão de pronúncia, bem como em (ii) em erro de julgamento em matéria de direito, por violação dos artigos 9.º e 124.º do C.P.T.A. e artigo 149.º, n.º 2 do CPA de 1991.

Assim sendo, estas serão, por razões de precedência lógica, as questões a apreciar e decidir.

* * * *IV – FUNDAMENTAÇÃO IV.1 – DE FACTO O Tribunal a quo não fixou factos, em face do que aqui se impõe estabelecer a matéria de facto, rectius, ocorrências processuais, mais relevante à decisão a proferir: 1) Em 11.09.2009, J. e Outra deduziram no T.A.F. do Porto providência cautelar contra a E.P. – Estradas de Portugal, S.A. e o Vice-Presidente do Conselho de Administração da E.P...

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