Acórdão nº 3551/11.8BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 12 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelANA CELESTE CARVALHO
Data da Resolução12 de Novembro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I – RELATÓRIO R………., SA, devidamente identificada nos autos, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, datada de 17/06/2013, que no âmbito da ação administrativa fundada na responsabilidade pelo sacrifício, instaurada contra a Metropolitano de Lisboa, EPE, julgou procedente a exceção de prescrição, determinando a absolvição da Ré do pedido de condenação ao pagamento da indemnização no valor de € 189.952,79, acrescida de juros de mora.

* Formula a Ré, aqui Recorrente, nas respetivas alegações, as seguintes conclusões que infra e na íntegra se reproduzem: “1.ª Não é correcto, ao contrário do defendido pelo Tribunal a quo que a Autora reporte os danos sofridos «logo ao início das obras subterrâneas em Setembro de 2004, início de 2005»: muito pelo contrário: a Autora é clara ao afirmar que durante o ano de 2005 a evolução da clientela se revelou perfeitamente normal, tendo o Salão, durante esse período, tido uma boa aceitação por parte do público e que é durante o ano de 2006 que se verifica o crescimento anormal na clientela do salão - Cfr. artigos 5.º a 7.º e 40.º da petição inicial.

  1. Nem se entende em que se baseia o Tribunal recorrido para afirmar que a Autora alegou que tenha havido um «agravamento dos danos a partir do ano de 2006» (cfr. fls. 10 da sentença), quando resulta claro da leitura das pecas processuais elaboradas pela Autora que é nessa data que os danos se iniciam.

  2. Não existe, pois, qualquer contradição entre a petição inicial e a réplica (apenas as informações se complementam), não tendo sido produzida nos presentes autos qualquer prova que permita ao Tribunal concluir que a Autora, ao contrário do por si alegado, tinha, em 2004, conhecimento dos danos (note-se que os próprios danos só se iniciam em 2006!).

  3. Em última análise, e se dúvidas existissem quanto ao alegado pela Autora, sempre deveria ter sido ordenada a produção de prova, sendo dada à Autora a oportunidade de demonstrar a veracidade das suas alegações.

  4. Assim, incorreu a Sentença recorrida num erro de julgamento da matéria de facto.

  5. Já nos artigos 34.º e 35.º da petição inicial a Autora havia alegado que aquando dos contactos com as clientes habituais que tinham deixado de frequentar o Salão, se aperceberam que tal facto se deveu devido ao fecho da rua (por força das obras) e a consequente falta de lugares para estacionar.

  6. Posteriormente, em sede de réplica, vem a Autora esclarecer que tais contactos se dão em Abril de 2010, após o fecho de contas relativo ao triénio de 2007 a 2009.

  7. Nunca, em parte alguma, afirmou a Autora que o contacto das funcionárias com as clientes se tinha limitado a «comprovar» que a quebra de clientela estava relacionada com as obras, constando especificamente da petição inicial que os contactos foram encetados «no intuito de apurar qual o motivo dessa alteração» (cfr. artigo 32.º da petição inicial)! 9.ª Ora, também está incorrecta a Sentença recorrida ao afirmar que «já em 2004 e 2005 e de uma forma "drástica" em 2006, a A.. no seu articulado inicial, relaciona a quebra da clientela com a realização das obras em causa».

  8. É certo que, à data em que a acção é intentada a Autora já está na posse de todas as informações, e é, por isso mesmo, capaz de fazer reportar o início dos danos a Janeiro de 2006: mas esta faculdade a Autora tem-na à data da propositura da acção, e não, como se viu, logo em 2006, e menos ainda em 2005, quando os danos ainda nem tinham ocorrido! 11.ª A Sentença recorrida incorreu, assim, novamente, num erro de julgamento da matéria de facto.

  9. Por fim, a sentença recorrida. ao determinar, a fls. 10 que «pelo menos a partir da altura em que as obras em causa passaram a ocorrer à superfície - em Janeiro de 2006 - cfr. artigo 15.º da petição inicial. a A. teve conhecimento dos pressupostos da indemnização» incorreu num erro sobre o julgamento da matéria de direito, na medida em que o mero reconhecimento de que a Autora teve conhecimento da ocorrência do facto (mas não da ocorrência de danos e nem da existência de nexo de causalidade entre ambos), não determina o inicio da contagem do prazo de prescrição.

  10. Jurisprudência e doutrina dominantes têm sido unânimes em considerar que o lesado tem conhecimento da acção «a partir da data em que ele, conhecendo a verificação dos pressupostos que condicionam a responsabilidade, soube ter direito à indemnização pelos danos que sofreu» - Cfr. Antunes Varela. “Das Obrigações em Geral”, volume 1. página 596.

  11. Assim, o lesado terá, na prática, conhecimento do seu direito quando verificar que se encontram preenchidos os requisitos da responsabilidade civil extracontratual do Estado: i) um acto lícito do Estado ou de outra pessoa colectiva pública: ii) praticado por motivo de interesse público: iii) um prejuízo anormal e especial sofrido pelo lesado: iv) a existência de nexo de causalidade entre um tal acto e o prejuízo.

  12. Face ao exposto se conclui que a Sentença recorrida padece do vício de erro de julgamento da matéria de direito, ao considerar que o prazo de prescrição começou a correr sem que, no caso, a Autora tivesse conhecimento da existência de dano e de nexo de causalidade entre o facto e o dano, em violação do disposto no n.º 1 do artigo 498.º do CC.”.

Pede a revogação da decisão recorrida, pedindo a sua substituição por outra que julgue a tempestividade do exercício do direito da Autora e, se assim não se entender, a revogação da sentença e o prosseguimento dos autos para a produção de prova quanto à matéria da invocada prescrição.

* A Ré, ora Recorrida, notificada da interposição do recurso, não apresentou contra-alegações, nada tendo dito ou requerido.

* O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto no art.º 146.º do CPTA, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso e da manutenção da decisão recorrida.

Pugnando por a sentença não primar pela completa fundamentação de facto, entende que pela petição inicial e pelos factos narrados pela própria recorrente, se chega à conclusão que o eventual direito a uma indemnização está prescrito.

Entende que tendo a ação sido instaurada em 30/12/2011, já tinham decorrido três anos desde a ocorrência do facto causador dos danos.

Assim, entende que a prova dos factos alegados pela Autora, alguns não datados, nem devidamente individualizados ou quantificados, em nada poderia alterar a situação da prescrição.

* Notificada, a Recorrente veio pronunciar-se sobre o parecer emitido pelo Ministério Público, reiterando tudo quando alegara no presente recurso, refutando o teor do parecer emitido.

* O processo vai, com vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos, à Conferência para julgamento.

II.

DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, 2 e 3, todos do CPC ex vi artigo 140.º do CPTA, não sendo lícito ao Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso.

As questões suscitadas pela Recorrente resumem-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida enferma de erro de julgamento da matéria de facto e erro de direito, quanto à questão da procedência da exceção perentória de prescrição do direito à indemnização, em violação do artigo 498.º, n.º 1, do CC.

III.

FUNDAMENTOS DE FACTO O Tribunal a quo deu como assentes os seguintes factos: “i) A presente acção deu entrada em tribunal a 30 de Dezembro de 2011(cfr. carimbo a fls. 3 dos autos); ii) Não foi requerida a citação urgente (cfr. fls. 4 a 16 dos autos) iii) Os autos foram distribuídos a 4 de Janeiro de 2012 (fls. 3 idem)”.

* Por ser manifestamente insuficiente a matéria de facto julgada provada na sentença recorrida, no uso dos poderes concedidos pelo disposto no artigo 662.º, n.º 1 do CPC, julga...

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