Acórdão nº 00063/08.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 30 de Outubro de 2020
Magistrado Responsável | Paulo Ferreira de Magalh |
Data da Resolução | 30 de Outubro de 2020 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I - RELATÓRIO J.
, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, datada de 18 de fevereiro de 2014, que julgou totalmente improcedente a pretensão por si deduzida contra a Universidade de Aveiro, em que peticionava a condenação desta: «a) reconhecer que o contrato administrativo de provimento que o Autor com ela celebrou em Novembro de 2005 se renovou em Novembro de 2006 pelo período subsequente de três anos, ou seja, até Novembro de 2009; b) condenar a R. a pagar ao A. os salários e os respectivos juros legais até à data do seu efectivo pagamento a que o mesmo A. devia ter auferido desde 28 de novembro de 2007 até 27 de novembro de 2009 a tempo inteiro em substituição daquela sua reintegração durante o mesmo período de tempo e de acordo com as tabelas salariais para as sua categoria [pedido este que veio substituir o pedido inicialmente deduzido na Petição inicial, que visava a reintegração do Autor ao serviço da Ré, cuja alteração (do pedido) foi requerido pelo Autor, sem oposição da Ré, o que foi admitido por douto despacho proferido na audiência preliminar realizada em 15 de março de 2010]; c) pagar ao Autor as diferenças salariais verificadas desde Dezembro de 2006 até Novembro de 2007 e os juros vencidos, à taxa legal em vigor, desde a data de vencimento da obrigação de pagamento da retribuição até integral pagamento; e d) pagar ao Autor as retribuições mensais vencidas desde 28 de Novembro de 2007 e os juros entretanto vencidos, à taxa legal em vigor, desde a data de vencimento da obrigação de pagamento da retribuição até à data da sentença a proferir nestes autos, caso seja proferida antes do prazo de denuncia do contrato em vigor ou até integral pagamento, caso seja ulterior.».
No âmbito das Alegações por si apresentadas [Cfr. fls. 455 a 473 dos autos em suporte físico], elencou a final as conclusões que ora se reproduzem: “CONCLUSÕES: 1. Vem o presente recurso interposto do saneador sentença, com o qual o Recorrente se não conforma, com fundamento em nulidade, errada decisão quanto a matéria de facto e errada interpretação jurídica das normas aplicáveis. Explicitando: 2. A sentença proferida fez total tábua rasa de grande parte da matéria de facto alegada e mesmo já provada documentalmente, com relevância para a solução de direito, não se lhe referindo sequer, para concluir, de forma obscura, que tendo sido o contrato em causa celebrado por um ano não renovável por sucessivos períodos de três anos, atingido o seu termo, o contrato extinguiu-se por caducidade.
-
O Recorrente alegou e depois, a seu requerimento, por prova documental, provou factos que, feita a subsunção, levaria a que se qualificassem os atos da UA como ilegais, contra legem, já que os fundamentos pelos quais esta impôs ao ora Recorrente a alteração substancial do contrato e depois a denúncia são falsos, não têm suporte na realidade, antes são um embuste que facilmente se desmontou.
-
A apreciação destes factos, alegados e provados documentalmente pela junção de documentos pela Ré, que o Recorrente analisou detalhadamente em sede de contraditório o que bem o demonstra o seu requerimento de 10 de Maio de 2013 onde a negrito o Recorrente coloca a matéria de facto que tais documentos provam, não foi, nem ao de leve, feita.
-
O saneador sentença sob análise limitou-se a elencar os factos que basicamente se resumem ao nascimento, alteração e denuncia do contrato e a partir foi lavrado um saneador-sentença que quase transforma em ridícula e vaidosa a pretensão do Recorrente, sem qualquer fundamentação quanto ao não ter sequer considerado a matéria de facto alegada com interesse para a solução de direito, que, por revogação da sentença, deve ser considerada, a saber: 1º Como não houve denúncia, o Autor continuou a exercer as suas funções durante o ano letivo de 2006/2007 e iniciou mesmo o presente ano letivo de 2007/2008 (artº 7º da PI), tendo-lhe sido distribuído alunos, um mestrado e dois estágios (artº 8º da PI)? 2º O Autor dava apoio à lecionação de Violoncelo, ou antes era o professor desse Instrumento, lecionando mesmo Mestrado nesta área (artº 22º da PI)? 3º Houve acordo quanto à reformulação dos termos da contratação, ou antes oposição (artº 23º da PI)? 4º O Autor concedeu alguma autorização pra tal contratação (artº 24º da PI)? 5º Nos anos letivos em causa – 2006 e 2007, houve diminuição do número de alunos; e houve contratação de novos docentes, com redistribuição desses alunos (arts 25º e 26º do PI)? 6º E verificou-se a contratação dos mesmos professores por outra entidade para exercerem a mesmíssima atividade, sob a capa da legalidade de serviços esporádicos, o que se retira da própria ata junta pela Ré, já que a Orquestra Filarmónica das (...) vê serem-lhe atribuídos no corrente ano letivo 370 tempos (mais 40 que no ano anterior!) (artºs 27º e 28º da PI)? 7º Foi a este tipo de “quadro alternativo a equacionar” a que a Ré se refere no seu ofício 421/DeCA, que foi proposto ao Autor? Ou seja, o Autor permaneceria na Ré, com as mesmíssimas funções, caso aceitasse ser prestador de serviços mas para a Orquestra Filarmónica das (...) (artºs 30º a 33º da PI)? 6.
A sentença ora recorrida não considerou pois factos de interesse para a decisão da causa, e que resultaram provados documentalmente por junção de documentos pela Ré, a requerimento do próprio Recorrente.
-
A sentença enferma pois, no nosso entendimento, de erro na apreciação da prova, sendo por isso nula, nos termos do artigo 615º alínea b) e c) do CPC.
-
Quanto à factualidade provada, na sentença recorrida é patente a omissão de conhecimento/pronúncia em que incorreu o tribunal a quo: não analisou de todo a questão da alteração unilateral do contrato, nem a ilegalidade da alteração e depois denúncia face a determinadas realidades de facto, factos e questões invocados na PI e amplamente repetidos no requerimento de contraditório face à junção de documentos pela Recorrida.
-
Por esse motivo, a sentença é nula, nos termos do artigo 615º alínea d) do CPC.
Sem prescindir, 10. Sendo o contrato de provimento o acordo bilateral pelo qual uma pessoa não integrada nos quadros assegura, a título transitório e com carácter de subordinação, o exercício de funções próprias do serviço público, com sujeição ao regime jurídico da função pública -artigo 15º nº 1 Dec. Lei nº 427/89, de 7/12 e estando todos os contratos administrativos abrangidos pelo princípio da primazia da lei, pelo que, em nenhum caso, as cláusulas contratuais podem albergar conteúdos contrários à lei, nem o acordo pode ser pretexto para a ilegalidade (Pedro Gonçalves, in “Contrato Administrativo-Uma Instituição do Direito Administrativo do Nosso Tempo”, pág. 138), e sendo ainda verdade, à data, que os assistentes convidados são providos por contrato anual, renovável por sucessivos períodos de três anos, sendo que a renovação dos contratos depende de deliberação favorável do conselho científico, então o art. 32º do Estatuto da Carreira Docente é claro ao aí consignar expressamente as formas de cessação do contrato, onde não se inclui a caducidade, portanto.
-
Errou pois a sentença ao concluir, a fls 17, que o contrato se extinguiu por caducidade.
-
E igualmente errou ao considerar que existiu um contrato de provimento que não era renovável já que o contrato de 2006 não chegou a ter existência jurídica porque não foi assinado pelo ora Recorrente como muito bem consta do elenco dos factos provados – alínea L), onde expressamente se faz notar que o contrato datado de 28/11/2006 “..está apenas assinado pela Reitora da Ré,…”.
-
Se o Recorrente não o assinou, não existiu aquele contrato, mantendo-se o anterior, de 28/11/2005, que ao fim de um ano de existência (2006) se renovou por três outros, isto é, até 27 de Novembro de 2009.
Ainda sem prescindir, 14. A denúncia contratual dada como provada, vertida numa decisão do Vice-Reitor da UA, baseia-se na proposta definitiva emanada do Presidente do Conselho Diretivo do Departamento de Comunicação e Arte da Recorrida que decidiu denunciar o contrato de provimento celebrado e renovado com o Recorrente, com fundamento na redução do número de alunos na área vocacional lecionada pelo ora Recorrente [ponto P da matéria de facto provada].
-
O único e decisivo fundamento que levou a entidade recorrida a denunciar o contrato administrativo de provimento do ora recorrente como assistente convidado foi, pois, a diminuição do número de alunos.
-
Ora, a denúncia, como forma de pôr termo à eficácia de um contrato, configura-se como faculdade existente na titularidade do empregador, aqui UA, nos contratos de renovação automática.
-
Na essência deste poder, que para alguns se circunscreve a mera faculdade, mas para outros é um verdadeiro direito potestativo, não se encontra necessariamente a invocação da justificação da denúncia, sindicável pela contraparte, mas apenas a necessidade de proteger os interesses desta mediante o cumprimento de um pré-aviso. (AC STA de 14.10.2004, Rº071/04 e AC STA de 14.07.2008, Rº0803/2007).
-
Temos, portanto, que a parte que denuncia o contrato não tem, necessariamente, de justificar à contraparte os motivos que a levam a isso, encontrando-se a contraparte num estado de quase sujeição.
-
Todavia, se, como neste caso, a entidade pública contratante opta por declarar expressamente o motivo da sua denúncia, a contraparte passa a ter a possibilidade de impugnar a veracidade desse invocado motivo, a par do desrespeito por princípios estruturantes do procedimento e mérito das decisões administrativas.
-
É esta, precisamente, a situação dos autos, pelo que os vícios que foram imputados à alteração e depois denúncia do contrato em causa deverão ser abordados sempre, não podendo fazer-se tábua rasa dos mesmos.
-
A sentença recorrida, ao assim não entender, violou os artigos 615º...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO