Acórdão nº 00433/13.2BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 30 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução30 de Outubro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório A Santa Casa da Misericórdia de (...), devidamente identificada nos autos, no âmbito da ação administrativa especial, intentada contra o Município de (...), tendente à impugnação do despacho de 21/03/2013 e, cumulativamente, que o R. seja condenado a dar cumprimento ao projeto de desaterro e de licenciamento de muros de contenção de terras aprovado em reunião da Câmara Municipal de (...) de 16/07/2001, bem como às conclusões constantes do relatório de inspeção efetuado no dia 29/01/2013 sobre o talude existente nas traseiras dos lotes n.ºs 17 a 35 do Loteamento n.º 427/99, em nome da M., Lda., inconformado com a decisão proferida em 18 de abril de 2020, no TAF de Coimbra, na qual a Ação foi julgada improcedente, veio interpor recurso jurisdicional.

Formula o aqui Recorrente/Misericórdia nas suas alegações do Recurso Jurisdicional, apresentado em 29 de junho de 2020, as seguintes conclusões: “1- Foi proferida sentença à ordem dos presentes autos na qual o Município de (...) (Réu, ora Recorrido) foi absolvido dos pedidos formulados pela Santa Casa da Misericórdia de (...) (Autora, ora Recorrente), através dos quais se pretendia que aquele fosse condenado a dar cumprimento ao projeto de desaterro e de licenciamento de muros de contenção de terras aprovado em reunião camarária do dia 16/07/2001, nos exatos termos da sua aprovação, bem como a dar cumprimento às conclusões que constam do relatório da inspeção realizada no dia 29/01/2013 ao talude das traseiras dos lotes 17 a 35 do loteamento n.º 427/99, sito na Estrada de (...), em (...); 2- Na sentença recorrida, justifica-se a decisão com a urgência que haveria na resolução do problema que havia com o talude e que tal circunstância seria suficiente para que se considerasse que naquele contexto nada mais seria exigível ao Município a não ser deixar que as obras efetuadas pelos contrainteressados pudessem ser finalizadas (apesar de elas desrespeitarem por completo os projetos inicialmente aprovados). Do mesmo modo, considerou-se que jamais deveria ficar o Recorrido com o ónus de dar cumprimento às conclusões inscritas no relatório relativo à inspeção realizada em 29/01/2013 na medida em que esse encargo cabe somente ao proprietário dos terrenos afetados (a ora Recorrente); 3- Deverá ser dado como provado o seguinte facto: A execução das escavações por parte dos contrainteressados teve como consequência, nomeadamente, um aumento da inclinação do terreno (20.º a 30.º) e a descompressão superficial dos pelitos, expondo-os a grandes variações do teor em água, por força do disposto no Doc. 10 junto com a petição inicial; 4- Do mesmo modo, em função do teor da informação n.º 161/2006 do Gabinete Jurídico e de Contencioso, também deverá integrado na lista do acervo probatório dado como provado o seguinte facto: A Santa Casa da Misericórdia de (...) nunca deu autorização aos contrainteressados para que estes pudessem fazer obras ou outras intervenções similares nos seus terrenos, situação que foi atestada pelo próprio Município na informação n.º 161/2006 do Gabinete Jurídico e de Contencioso, datada de 06/07/2006; 5- O ponto 5) dos factos dados como provados na sentença sublinha que (e citando) “Nos termos da informação n.º 187/01, de 11/02/2001, a DGUC alertou para a possibilidade de ocorrerem deslizamentos e/ou derrocadas, uma vez que tinham sido efetuados pela M., Lda. «trabalhos de desmonte na crista dos taludes posteriores dos lotes, do lado Poente, tendo-se prolongado pela encosta adjacente, propriedade da Santa Casa da Misericórdia» tendo, em consequência, aquela sociedade sido notificada, através de ofício de 02/03/2001, para apresentar, no prazo de 30 dias, um «projeto de contenção/arranjo/estabilização dos taludes e encosta adjacente onde tinham sido ou viessem a ser efetuados trabalhos»”; 6- Contudo, não foi tido em consideração o facto de a necessidade de se proceder à estabilização do talude ter decorrido diretamente da atuação dos contrainteressados (nomeadamente a M.), sendo essa a única razão para que a partir do ano de 2001 tivesse passado a haver sinais evidentes (e preocupantes, segundo a informação prestada por aquele organismo) de instabilidade na encosta (tal como evidenciado pelo Doc. 10 junto com a petição inicial); 7- A Recorrente sempre se opôs à realização e prolongamento das obras feitas pelos contrainteressados ao abrigo do alvará n.º 427/99 para terrenos que são sua propriedade, facto que foi por inúmeras vezes reportado ao Município (como se pode constatar nos pontos 11), 13), 30) e 34) da matéria de facto dada como provada), ao contrário do que havia sido transmitido pelos contrainteressados, de tal forma que a aprovação das obras de estabilização ficou pendente de apresentação de comprovativo de consentimento que nunca foi junto; 8- O Município, ora Recorrido, deveria ter usado os mecanismos previstos nos art. 102.º e ss. do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, nomeadamente lançando mão da medida de reposição do terreno no estado em que se encontrava antes do início das obras.

9- Ao invés, autorizou uma alteração ao projeto original que fez com que passasse a haver trabalhos em terrenos da Santa Casa da Misericórdia, sem a sua autorização e sem ter sido consultada para o efeito pelo Município, com a agravante de ter sido crucial para o Recorrido deliberar no sentido da aprovação o facto de os contrainteressados terem insistido na tese de que haveria autorização verbal por parte do então Provedor da ora Recorrente, sem que alguma vez tivesse sido apresentado documento comprovativo (ver, neste âmbito, o ponto 36) dos factos dados como provados); 10- O Recorrido, salvo melhor opinião, demitiu-se na totalidade das suas obrigações enquanto garante da legalidade urbanística, até porque tanto no momento em que teve conhecimento da instabilidade da encosta (em 2001), como à data da primeira comunicação remetida pela Recorrente (em 2002) seria certamente muito mais fácil adotar na íntegra qualquer medida, sobretudo aquela que foi acima indicada, que repusesse a legalidade (razão pela qual, entre tantas outras, a Recorrente estranha que na sentença recorrida se refira que não seria adequado que se adotassem medidas de tutela de legalidade urbanística nesta situação em apreço); 11- Perante este problema, o Recorrido sempre teve a intenção de se demitir das responsabilidades que lhe cabiam, focando-se antes em passá-las para outras entidades, sobretudo a Recorrente (veja-se, neste âmbito os pontos 25), 35) e 36) da matéria de facto dada como provada na sentença ora recorrida); 12- O Recorrido não fez o que lhe competia para que ficasse garantida a legalidade urbanística no caso em apreço e é apenas e só isso que está aqui em discussão, não obstante em vários pareceres e recomendações ter querido dar à questão em análise uma aparência de problema do foro privado. A Recorrente nunca teve o intuito de discutir nesta sede danos ou montantes indemnizatórios (por isso mesmo fez os pedidos constantes da petição inicial e apresentou ação num tribunal administrativo); 13- A Recorrente não fez obras no local, não as autorizou nos terrenos que são sua propriedade e opôs-se de forma evidente às mesmas. Como tal, não poderá ser onerada com o cumprimento de obrigações decorrentes de uma situação que não criou nem tão-pouco agravou; 14- Apesar do conhecimento que o Recorrido tinha da situação desde o seu início e de nada ter feito para repor a legalidade, acresce ainda que, a título de exemplo, não desempenhou devidamente as suas funções de fiscalização, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 93.º do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação; 15- As obras relativas à contenção, arranjo e estabilização do talude são parte integrante do projeto de obras de urbanização na medida em que o projeto que lhes diz respeito foi considerado projeto complementar (ver ponto 8) da matéria de facto provada), ou seja, é parte integrante do projeto de obras de urbanização do alvará n.º 427/99; 16- Sabendo que a deliberação camarária de aprovação da receção definitiva das obras de urbanização nunca foi comunicada à Recorrente, não se poderá considerar, ao contrário do que consta da sentença recorrida, que este aspeto já se encontra consolidado na ordem jurídica; 17- O Recorrido cometeu uma ilegalidade ao ter prescindindo das garantias bancárias com a aceitação da receção definitiva das obras, sabendo que parte delas não respeitaram o projeto aprovado (mais concretamente, o projeto de desaterro, de construção de muros de suporte e de contenção); 18- Crê a Recorrente que, em sede destes autos, resulta devidamente provado que a atuação do Município, ora Recorrido, foi insuficiente; 19- Serão violados princípios tais como os da legalidade, da proporcionalidade, da razoabilidade e da boa-fé caso a Recorrente, por força de tão pobre desempenho do Recorrido na defesa da legalidade urbanística, venha a ter em cima dos seus ombros o ónus de legalizar obras que não executou, não autorizou e que ultrapassaram os limites do loteamento, ainda para mais sabendo que tais intervenções tiveram origem em trabalhos dos contrainteressados que causaram danos à estrutura da encosta, simplesmente porque aquela é proprietária de um terreno afetado; 20- A argumentação da sentença recorrida vai, na sua generalidade, totalmente ao encontro do exposto na petição inicial, tendo resultado, porém, num veredicto oposto àquele que deveria ter sido proferido, pelo que importa aqui adequar a decisão aos fundamentos invocados na sentença (para além da inclusão no catálogo da factualidade dada como provada os factos a que já se fizeram referência em momento anterior nestas alegações, constantes dos pontos 5 e 7 das conclusões aqui vertidas); 21- Finalmente, em face do exposto, deverá caber ao Recorrido a obrigação de dar cumprimento ao projeto de desaterro e de...

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