Acórdão nº 02774/10.1BELRS de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 28 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelISABEL MARQUES DA SILVA
Data da Resolução28 de Outubro de 2020
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:- Relatório - 1 – O Município de Mafra, vem, ao abrigo do disposto no artigo 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) interpor para este Supremo Tribunal recurso de revista do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 21 de maio de 2020, que concedeu provimento ao recurso interposto por A……….. – SOCIEDADE DISTRIBUIDORA DE GÁS NATURAL DE ………., S.A., com os sinais dos autos, da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgara improcedente a oposição por esta deduzida à execução fiscal instaurada pela Câmara Municipal de Mafra para cobrança coerciva de dívida por taxa relativa a abertura de valas na via pública no montante de €28.464,90, revogando a sentença recorrida e julgando procedente a oposição, com a consequente extinção da execução fiscal.

O recorrente termina as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: A. É pacifica a admissibilidade do recurso de revista excecional, previsto no artigo 150.º do C.P.T.A., no contencioso tributário, conquanto o mesmo se revele claramente necessário para uma melhor aplicação do direito e/ou que se esteja perante uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental, importância esta detetada pelo seu interesse prático e objetivo, medido pela utilidade da revista em face da capacidade de expansão da (presente) controvérsia ou da sua vocação para ultrapassar os limites da (presente) situação singular.

B.

Como ficou demonstrado, os indicados requisitos de admissibilidade encontram-se preenchidos, sendo o presente recurso de revista necessário quer para uma melhor aplicação do direito quer por se tratar de questões de relevância jurídica e (também) social com interesse prático e objetivo, uma vez que as mesmas se colocarão mais vezes aos Tribunais, em processos de terceiros contribuintes.

C. Como ficou demonstrado, na petição inicial que deu origem aos presentes autos em 1.ª instância, a ora Recorrida A………. invocou e fundamentou a oposição deduzida em (i) ilegalidade da liquidação da taxa liquidada pelo Município de Mafra, uma vez que a EN9 faz parte da rede rodoviária nacional complementar, atribuída por concessão à Estradas de Portugal, SA e, portanto, subtraída ao domínio da CMM; por integrar a sua jurisdição, é a Estradas de Portugal que tem direito a liquidar e cobrar taxas, inexistindo, além do mais, da parte da autarquia, uma prestação concreta e individualizada dirigida ao sujeito passivo, pelo que a taxa se aproxima de um inadmissível imposto; e ii) duplicação de colecta, uma vez que pagou a ora Recorrente pagou à Estradas de Portugal, S.A., a quantia de € 15.912,24 pela emissão de licença para abertura de vala na EN9 entre os kms 29+000 e 30+000, tendo a Camara Municipal de Mafra liquidado taxa pela abertura de vala nesse meso espaço.

D. O Douto Tribunal Tributário de Lisboa, conhecendo o primeiro dos fundamentos invocados, julgou que o mesmo se reconduz a “... uma questão de competência do credor tributário para liquidação do tributo, não se subsumindo a nenhum dos fundamentos válidos de oposição, não se integrando no preceito da alínea a) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT, por não se enquadrar no conceito de ilegalidade abstrata.” E.

Este julgamento do 1.º fundamento, objeto de recurso, foi confirmado pelo Douto Acórdão Recorrido, tendo este apreciado e julgado que, estando em causa a cobrança de taxa devida pela utilização do solo e subsolo pertencente ao domínio público municipal da exequente, por parte da executada, através da colocação de infraestruturas da rede distribuidora de gás, a invocação da inexistência do facto tributário subjacente à liquidação da dívida exequenda reconduz-se a fundamento que envolve apreciação da legalidade concreta da liquidação, por alegada falta de incidência objetiva (inexistência do facto tributário).

F.

Tendo ainda o Douto Acórdão Recorrido igualmente julgado e apreciado que a premissa que partia a recorrente – que a EN9 não integrava o domínio público municipal – não só não tinha ficado provado, como tinha ficado demonstrado precisamente o contrário, que integrava e integra o domínio público municipal – alíneas F), M) e N) do Probatório G.

Tendo por isso julgado que “no caso em exame, da matéria de facto assente, não impugnada pela recorrente, resulta que, pela ocupação da via pública com as obras a realizar pela recorrente com vista à implantação da estrutura de distribuição de gás, está a ser cobrada pela exequente uma taxa (alíneas F), K), do probatório), e que por isso não se extraia que a alegação de que o tributo cobrado corresponde a imposição sem qualquer contrapartida por parte do Município exequente não se mostrava confirmado pelos dados coligidos nos autos.” H.

Quanto ao segundo e último fundamento de oposição da A………. – duplicação de coleta – julgou-o também o Tribunal de 1.ª Instância, improcedente, desde logo por se não verificar coincidência quanto ao credor tributário.

I.

Mas também, e analisando mais pormenorizadamente, porque os fundamentos legais em que as 2 entidades suportam a respectiva liquidação não são iguais, porquanto: i) por um lado, a taxa emitida pela CMM foi liquidada ao abrigo do Regulamento de Obras e Trabalhos na Via Pública Relativo à Construção, Instalação, Uso e Conservação de Infra- Estruturas no Município de Mafra, decorrendo, além do mais, do ofício descrito em E) do probatório que se trata de uma situação semelhante à cobrança de taxas para emissão de licença para construção, em que a edificação é propriedade privada (cfr. igualmente, alínea C) do probatório); ii) Por outro lado, embora integrem a mesma licença e recibo, foram liquidadas pela EP duas taxas, ao abrigo do artigo 15.º, n.º 1, alíneas a) e b) do Decreto-lei n.º 13/71, de 23/01: uma referente a ocupação do subsolo na zona da estrada, e outra por ocupação temporária de zona de estada com construções (cfr. alínea F) da factualidade assente).”.

J.

Tendo ainda o Douto Tribunal de 1.ª Instância julgado que, embora o Oponente atribuísse as taxas ao mesmo facto tributário – obras e abertura de valas -, não tinha sido aplicado mais do que uma vez o mesmo preceito legal, mas dois normativos distintos, não tendo ficando comprovado que os tributos liquidados tenham igual ou idêntica natureza ou finalidade; K.

Apreciando, por último, que a liquidação em causa nos autos foi emitida pela CMM em momento prévio à liquidação efetuada pela E.P, e ao pagamento desta pela Oponente (confrontar alíneas E) e F) do Probatório), pelo que a liquidação sindicada nunca poderia estar afetada do vício de duplicação de coleta.

L.

Também o Douto Acórdão Recorrido julgou não verificado o fundamento de duplicação de coleta.

M.

Contudo, entendeu o Douto Acórdão Recorrido, sem que tal fizesse parte do objeto do recurso deduzido pela A……….., ou dos fundamentos da sua petição inicial, apreciar e decidir que, a existência de eventual conflito de jurisdições entre as entidades administrativas envolvidas, não podia fazer olvidar que pela mesma contrapartida – utilização do solo e subsolo, com a implantação da estrutura de distribuição de gás – estaria a ser exigida à A………., pelo menos duas taxas, ainda que por entidades distintas, a EP – Estadas de Portugal, S.A., de um lado, e o Município de Mafra, do outro.

N.

Entendendo que pelo mesmo facto tributário (implantação das estruturas de distribuição de gás, na mesma via rodoviária), no mesmo período de tempo (respeitante à utilização da via pública pela realização das obras necessárias à referida implantação), estava a ser cobrada pelo Município uma taxa, quando antes outra taxa, correspondente à mesma contrapartida, havia sido liquidada e paga à E.P, Estradas de Portugal, pela Recorrente.

O.

Apreciação e julgamento em contradição com os factos do probatório e até com anterior apreciação sua, quanto à (não) verificação do 1.º fundamento de recurso, ao ter decidido que: “(...) No...

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