Acórdão nº 1002/19.9T8VNF-A.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 22 de Outubro de 2020

Data22 Outubro 2020

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães Apelante: X, Unipessoal, Ld.ª (credora embargante) Apelada: P. S. (credora requerente) Insolvente: Peúgas Y, Ld.ª Juízo de comércio de Vila Nova de Famalicão (lugar de provimento de Juiz 2) – T. J. da Comarca de Braga.

*Termos relevantes do processo.

Invocando créditos laborais sobre a requerida e factos tendentes a demonstrar o estado de insuficiência económica da mesma, intentou P. S. processo de insolvência pedindo a declaração de insolvência de Peúgas Y, Ld.ª.

Na oposição, negando o invocado crédito da requerente, invocou a requerida a sua prosperidade – não ter pendentes contra si quaisquer acções executivas (por estarem extintas as que foram interpostas), ter efectuado acordos de pagamento com a Segurança Social e com a Autoridade Tributária, apresentar resultados positivos em todos os anos de actividade, ter cinquenta trabalhadores ao seu serviço, manter sólido nível de vendas, com tendência crescente, estar liquidado integralmente o activo imobilizado de que é proprietária, assim como os bens constantes do inventário (matérias primas), ter créditos para cobrar que ascendem a 634.000.00€, ultrapassar o seu património os dois milhões setecentos e cinquenta mil euros, sendo reputada como cumpridora pelas instituições bancárias com quem lida.

Realizada audiência de julgamento, foi proferida sentença que considerou demonstrada a qualidade de credora da requerente e verificada a situação de insolvência da requerida, nos termos dos artigos 3º, nº 1 e 2 e 20º, nº 1, b), g), ii) e h) do CIRE, insolvência que declarou.

Invocando a sua qualidade de credora da devedora declarada insolvente, apresentou-se a apelante a embargar, no que agora importa alegando factos que entende revelarem ser o activo da devedora superior ao passivo exigível (seja do ponto de vista contabilístico, seja numa perspectiva do valor justo e real dos bens e valores), sustentando estar afastada a presunção de insolvência da requerida (nos termos dos artigos 3º, nº 3, a), b) e c), ex vi art. 20º, nº 1 do CIRE), requerendo provas variadas (documental, pericial, testemunhal e o depoimento de parte do legal representante da devedora), concluindo pela revogação da decisão que decretou a insolvência.

Contestou a requerente da insolvência, sustentando a improcedência dos embargos, impugnando o invocado crédito da embargante e argumentando não diferir a factualidade alegada da já apreciada na sentença declaratória da insolvência.

Apresentado no processo principal pelo administrador da insolvência o relatório a que alude o art. 155º do CIRE e aí realizada a assembleia de credores para discussão e votação do plano de recuperação (art. 209º do CIRE), foi nos presentes autos, terminados os articulados, após junção de elementos solicitados à Segurança Social e Autoridade Tributária (sem que contudo fosse dado à embargante possibilidade de, neste apenso e para os seus efeitos, se pronunciar sobre o relatório apresentado no processo principal), proferida decisão julgando os embargos procedentes.

Apelou com sucesso a embargante, tendo tal decisão sido anulada, determinando-se fosse cumprido o contraditório sobre o relatório apresentado pelo administrador da insolvência nos autos principais e, após, tramitados os adequados e consequentes termos.

Após cumprido o contraditório, foi proferido saneador-sentença que, considerando fornecer o processo condições para prolação da decisão final, sem necessidade da produção doutras provas, julgou improcedentes os embargos.

Apelou novamente a embargante, formulando nas suas alegações as seguintes conclusões: 1- A Sentença proferida não fundamenta a sua decisão respeitante à matéria de facto, já que não especifica, nem concretiza, de uma forma minimamente explicativa e elucidativa quais os concretos meios probatórios dentre os que se encontram juntos aos autos, que conduziram o tribunal a decidir dar como provados uns factos e dar como não provados outros factos, designadamente, todos aqueles que se mostram invocados e articulados em nºs 7, 8, 9, 11, 34, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 41, 42, 43, 44, 45, 46, 48, 50, 51, 52, 53, 54, 55, 56, 57, 58, 59, 60, 62, 63, 65, 68 e 73 da P.I. de Embargos á Insolvência.

2- Na sentença não é feita uma análise crítica das provas com indicação dos documentos em que se fundará a sua convicção, em detrimento de outros que até afirmam o contrário, indicando as eventuais ilações tiradas dos factos instrumentais, se é que os houve…, e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a convicção do juiz, concretizando os meios de prova a que atendeu relativamente a cada ponto da matéria de facto.

3- Faz-se uma referencia genérica a documentos juntos aos autos, mas, ao contrário do expressamente determinado na lei, nenhuma referencia concreta se fazendo relativamente aos indicados meios de prova e não se especificando a quais concretamente se atendeu e relativamente a que ponto factual do elenco dos factos provados os mesmos servem.

4- É óbvio que sem tal concretização e especificação na fundamentação da decisão respeitante à matéria de facto, fica violado a obrigação legal estipulada no nº 4 do art. 607º do CPC, tal como fica dificultado ou até impossibilitado que o tribunal “ad quem” possa sindicar a reapreciação do juízo valorativo que permitiu ao tribunal “a quo” decidir, como decidiu, a questão de facto.

5- Verifica-se desse modo que a douta sentença recorrida é omissa ou, pelo menos, deficiente relativamente à fundamentação da matéria de facto declarada provada e não provada, designadamente, nenhuma referência sendo feito aos documentos em referência e com reporte aos indicados pontos de facto e sua indicação e valoração.

6- Também nenhuma valoração é feita relativamente aos pontos de facto declarados não provados.

7- Deve o julgador pronunciar-se relativamente a todos os meios de prova produzidos e, em particular, os que valorou e relativamente a cada ponto de facto assim considerado, com vista a possibilitar o reexame e análise dos fundamentos da decisão – art. 607º nº 4 e 662º nº 2 al. d) do CPC “ex vi” do art. 17º do CIRE.

8- “O tribunal deve indicar os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela convicção sobre o julgamento do facto provado ou não provado.

A exigência da motivação da decisão não se destina a obter a exteriorização das razões psicológicas da convicção do juiz, mas a permitir que o juiz convença os terceiros da correcção da sua decisão.

Através da fundamentação, o juiz passa de convencido a convincente.

” - Teixeira de Sousa, in Ac. R.L. de 8.07.99, in Col. Jur., Ano 99, Tomo IV, pág. 110. (sublinhados nossos).

9- O vício da falta de fundamentação da decisão relativa à matéria de facto que afecta a sentença proferida deverá conduzir a que este Venerando Tribunal “ad quem” decrete a anulação da sentença recorrida, determinando que a MMª Juiz do tribunal “a quo” proceda à fundamentação da matéria de facto declarada provada e não provada, com base na prova produzida nos autos e, com expressa referência, especificada e individualizada a cada ponto de facto e meio de prova em que se fundou, de forma crítica e fundamentada.

Sem prescindir, 10- A sentença recorrida padece ainda do vício de omissão de declarar e elencar os factos que julga “não provados” analisando, também aqui e a propósito dos mesmos, criticamente as provas produzidas e especificando e indicando as que foram decisivas para a sua convicção de julgar “não provados” o elenco de factos aí incluídos.

11- E não tendo havido, como efectivamente não ocorreu, a discriminação e identificação dos factos que o tribunal entende como “não provados”, também a propósito dos factos, genericamente, declarados “não provados”, os mesmos, sejam eles quais forem…, não mereceram a imprescindível e cuidada fundamentação para a decisão, respeitante a essa questão de facto, que uma sentença obrigatoriamente deve conter.

12- A fundamentação das decisões cumpre, em geral, duas funções: - Uma de ordem endoprocessual, que visa essencialmente impor ao juiz o momento de verificação e controlo crítico da logica da decisão, permitir às partes o recurso da decisão com perfeito conhecimento da decisão e ainda colocar o tribunal de recurso em posição de exprimir, em termos mais seguros, um juízo concordante ou divergente; - Outra, de ordem extraprocessual, que procura tornar possível um controlo externo sobre a fundamentação factual, lógica e jurídica da decisão, garantindo a «transparência do processo e da decisão».

13- Falta na douta sentença a relação dos factos “não provados”; 14 - Falta na douta sentença a fundamentação para essa decisão e opção por declarar “não provados” “os restantes factos invocados pela Embargante”; 15- Falta na douta sentença, para além da análise crítica da prova documental junta aos autos, a especificação, identificação e concretização de quais foram os documentos que conduziram o raciocínio logico do julgador para a decisão, respeitante à questão de facto, proferida.

16 - Este vício afecta a validade da sentença nos termos do conjugadamente disposto no art. 607º nº 4 e 662º nº 2 al. d) do CPC, “ex vi” do art. 17º do CIRE.

Ainda sem prescindir, Omissão da realização de diligências probatórias 17 - Sem prejuízo do Tribunal “a quo” ter deferido parte do requerimento probatório apresentado, acabou por “decidir” sem permitir à Apelante/Embargante a produção da prova por si requerida, não permitindo a produção dos meios de prova indicados e solicitados pela Apelante no seu requerimento inicial.

18- Salvo o devido respeito, a douta sentença proferida, ao dispensar/indeferir a realização de diligencia probatórias, omitiu acto processual com absoluta influência na decisão da causa, o que acarreta a nulidade da decisão respeitante à questão de facto e consequentemente da sentença proferida.

19- Ora, atentos aqueles relevantíssimos Princípios...

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