Acórdão nº 286/18.4T8MNC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelFIGUEIREDO DE ALMEIDA
Data da Resolução15 de Outubro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO A) M. A.

veio intentar ação especial de interdição por anomalia psíquica contra M. P.

, onde conclui entendendo dever a presente ação ser julgada procedente por provada e, consequentemente, decretar-se a interdição do requerido M. P., por se mostrar incapaz, devido a anomalia psíquica, de governar a sua pessoa e bens.

Alega, em síntese, que o requerido padece de uma deficiência mental, apresentando dificuldades cognitivas graves, que lhe provocam alterações no comportamento, quer afetivas, quer emocionais, na sua personalidade, que determina a completa incapacidade do requerido de realizar as tarefas mais elementares do dia a dia, não conhece o valor do dinheiro, nem se encontra orientado no tempo, nem no espaço.

Foi publicitada a ação e citado o requerido para contestar, que apresentou contestação onde conclui dever a ação ser julgada improcedente por não provada e, em consequência, ser o requerido absolvido dos pedidos formulados pela requerente, alegando, em síntese, não sofrer de qualquer anomalia psíquica e não necessitar de apoio de terceiros para gerir a sua vida.

Procedeu-se ao interrogatório do requerido e a exame pericial.

Procedeu-se à audição do beneficiário.

O Mº Pº, entendendo que o beneficiário é capaz de compreender e de responder de forma adequada, conhece o valor do dinheiro, orienta-se espácio temporalmente e não apresenta limitações cognitivas que o impeçam de exercer os seus direitos e cumprir os seus deveres, apresenta dificuldades motoras que necessitam de ser colmatadas com o auxílio de terceiro na medida do estritamente necessário à sua locomoção pelo que entende que, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 145º, nº 2, e 147º, nº 1, do Código Civil, se revelam adequadas e ajustadas as seguintes medidas, cuja aplicação promove: 1) Acompanhamento nos atos do quotidiano, nomeadamente na alimentação, vestuário, cuidados de saúde e de higiene; 2) Acompanhamento no tratamento de assuntos pessoais, designadamente em repartições ou entidades públicas (Serviços de Finanças, Segurança Social, Conservatórias ou outras) e entidades bancárias, na medida do necessário para a sua locomoção e para eventual auxílio na compreensão de documentos; 3) Acompanhamento no seu tratamento clínico, nomeadamente marcação de consultas, comparência às mesmas e cumprimento das terapêuticas prescritas.

O beneficiário apresentou requerimento em que afirma não necessitar de qualquer medida de acompanhamento, uma vez que as suas limitações cognitivas e físicas não o impedem de exercer os seus direitos e de cumprir os seus deveres, no entanto, devido a limitações motoras, necessita do auxílio de terceiros, decidindo socorrer-se do seu irmão L. J..

*B) Foi proferida sentença onde foi decidido julgar procedente por provada, a presente ação especial e, em consequência: 1. Decretado o acompanhamento de M. P.; 2. Fixado o início da necessidade de acompanhamento em 31/03/2016; 3. Nomeado como acompanhante, o seu irmão, L. J., atribuindo-lhe os seguintes poderes: I. Representação especial (cfr. artigos 145º, nº 2 e 147º, nº 1, a contrario, do Código Civil) que abranja: a) Acompanhamento na celebração de negócios jurídicos que envolvam aquisição, venda ou oneração de bens imóveis, ou quaisquer outros de valor superior a 50 UC´s; b) Acompanhamento no tratamento dos seus assuntos pessoais, nomeadamente em repartições/entidades públicas (serviço de finanças, segurança social ou outras) e entidades bancárias que não importem autorizações judiciais supervenientes; c) Acompanhamento e tratamento clínico, designadamente a decisão na marcação de consultas, na sua comparência às mesmas, na adesão às terapêuticas prescritas, mormente na toma de medicação e à necessidade de intervenções cirúrgicas (cfr. artigo 145º, nº 2, alínea e), do Código Civil); II. O requerido, em função das limitações já conhecidas e das necessidades delas decorrentes ficará impedido de exercer, designadamente, os seguintes atos de carácter pessoal (cfr. artigo 147º, nº 2, do Código Civil): a) Ser tutor, vogal do conselho de família e administrador de bens de incapazes (cfr. artigos 1933º, nº 2, 1953º, nº 1 e 1970º, todos do Código Civil); e b) Desempenhar, por si, as funções de cabeça-de-casal (cfr. artigo 2082º, do Código Civil).

Foi consignado que não há notícia de que o Beneficiário tenha celebrado testamento vital ou outorgado mandato para a gestão dos seus interesses.

*D) Inconformado com tal decisão, veio o requerido (beneficiário) M. P. interpor recurso que foi admitido como sendo de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos, com efeito devolutivo (fls. 100).

*D) Nas alegações de recurso do apelante M. P., são formuladas as seguintes conclusões: 1. Apelante recorre da matéria de Facto e de Direito; 2. Existe uma clara incongruência entre o afirmado no facto 9º e os factos 10º, 13º, 15º e 17º do rol de factos provados; 3. Mas, também, entre as afirmações tecidas ao longo do texto do próprio facto 9º; 4. Afirmar que as limitações cognitivas do beneficiário não interferem na sua capacidade volitiva para gerir pessoas e bens, é o mesmo que dizer que essas dificuldades de aprendizagem e baixa escolaridade não interferem com tal capacidade; 5. Logo, depois de proferir tal afirmação, não é congruente dizer-se que «suas dificuldades de aprendizagem e a baixa escolaridade, podem impedi-lo de compreender os contornos de eventuais negócios»; 6. As medidas de acompanhamento revestem um caráter supletivo; 7. Destarte, a ideia não é incapacitar o sujeito, mas auxiliá-lo, dando-lhe o apoio necessário, para que exerça na plenitude a sua capacidade jurídica; 8. Inultrapassável é, com efeito, a regra segundo a qual o acompanhamento se deve limitar ao necessário; 9. Diante elencados constantes do rol de factos provados na sentença da qual se recorre; das informações constantes dos dois relatórios periciais anexos aos autos do processo; e do conteúdo do próprio despacho de promoção do Ministério Público, é de concluir, desde logo, que não se encontram, preenchidos os requisitos substantivos para o decretamento do acompanhamento do réu.

10. Não se verifica qualquer razão de saúde, deficiência ou comportamento, impeditivos do exercício dos seus direitos, bem como do cumprimento dos seus deveres; nem existe qualquer alteração nas suas capacidades intelectuais, bem como no seu domínio da vontade, que implique uma incapacidade de compreensão dos atos por ele praticados; 11. Ao igual que é de concluir, que tampouco se verifica a condição positiva, orientada pelo princípio de necessidade, que implica a existência de uma justificação para decretar o acompanhamento do maior; 12. E, finalmente, atendendo, a que após o seu internamento passou a residir com o irmão, J. L., que desde 2016 o vem auxiliando em todas as suas tarefas diárias, especialmente ao nível de locomoção, tampouco se verifica o preenchimento da condição negativa de decretamento do acompanhamento.

13. Dado que a medida...

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