Acórdão nº 1952/19.2T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelMARIA DOS ANJOS NOGUEIRA
Data da Resolução15 de Outubro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I – Relatório A. S., casado, Industrial, residente na Rua …, Guimarães, intentou contra “Banco ..., S.A.”, com o número identificativo de pessoa colectiva ……… e sede na Rua …, Lisboa, acção declarativa comum, pedindo a condenação do réu a pagar-lhe a quantia de € 149.518,99, acrescida de juros à taxa legal de 4%, contados desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Como fundamento invocou ter adquirido, sob intermediação do réu, 900 títulos obrigacionais da empresa X, S.A, à taxa de 9,75%, no valor nominal de 1.000,00, na moeda de denominação BRL, totalizando, assim, o montante global de 900.000,00 BRL, e que a X, S.A. se encontra em processo de recuperação judicial que corre termos no Tribunal de Justiça da Comarca do Rio de Janeiro, no qual se realizou assembleia geral de credores, com votação quanto ao plano de recuperação, havendo credores que ali individualizaram e reclamaram os seus créditos.

Referiu, concretamente, que o plano de recuperação foi votado e aprovado em assembleia geral de credores em 19 e 20 de Dezembro de 2017 e foi homologado em 8 de Janeiro de 2018, tendo o prazo para que os credores individualizassem os seus créditos terminado em 8 de Março de 2018.

Ficou determinado que os credores que reclamaram e individualizaram os seus créditos, receberiam metade do capital no prazo de seis anos, acrescido de juros de 6% ao ano, ao contrário dos credores que não reclamaram e individualizaram os seus créditos que ficaram sujeitos às decisões e votações do T., concretamente a um período de vinte anos de carência para reaver o capital e sem quaisquer juros.

Neste contexto, referiu que o réu nunca informou o autor do referido processo de recuperação judicial da X, S.A, seus procedimentos e prazos para agir, o que fez com que o mesmo não fosse ao processo de recuperação individualizar o seu crédito, sendo agora um credor geral.

Aduziu que o réu participou activamente na votação e aprovação do plano de recuperação, sendo exigível que informasse o autor dos passos a dar para evitar o prejuízo maior, sujeitando-o a um prazo de carência de vinte anos para eventualmente reaver o capital, ao invés de receber metade do capital no prazo de seis anos e com juros de 6 % ao ano.

Fundamenta, assim, o dano patrimonial alegadamente causado pelo réu, no quantum indemnizatório apurado pelo cálculo aritmético de metade do capital investido no prazo de seis anos e com juros a 6 % ao ano que receberia se tivesse reclamado e individualizado o seu crédito.

Concretiza, como tal, que à data da propositura da acção, 900.000,00 BRL correspondiam a € 205.174,97, sendo metade do referido capital € 102.587,49, que com a incidência de juros de 6%/ano, dá € 139.518.99.

Aduz, ainda, ter sofrido danos não patrimoniais consubstanciados na grande ansiedade e instabilidade psicológica, perturbação física e psicológica e temor da iminente gravidade do acto ofensivo que lhe estava a ser infligido, devendo ser compensado pela quantia de € 10.000,00.

*Regularmente citado o Réu apresentou contestação invocando, entre o mais, a ilegitimidade activa, por preterição de litisconsórcio necessário activo, já que as obrigações em causa nos autos eram tituladas pelo autor e pela sua mulher, a qual, entretanto, faleceu.

Invocou também a caducidade do direito de acção, por aplicação analógica do disposto no artigo 243.º, al. b), do CVM.

Por impugnação, alegou, no que interessa ao mérito da causa (já que, olhando à causa de pedir, tudo o que respeite à vontade de contratar não interessa, apenas importando a actuação subsequente ao processo de recuperação da X), que, na qualidade de custodiante dos títulos ou intermediário financeiro, não está sequer a exercer actividade bancária, o que tem consequências ao nível da delimitação dos deveres de informação que se si impendem.

Mais alegou que o autor sabia, pelo menos desde Outubro de 2016, que a sociedade emitente das obrigações estava em processo de recuperação, sendo que sobre o réu não pende qualquer dever de lhe dar acompanhamento nesse processo. Aliás, se o fizesse estaria a incorrer em procuradoria ilícita.

Concluiu que, de qualquer das formas, não há nexo de causalidade entre a alegada falta de informação quanto à necessidade de reclamar créditos na insolvência da X e o dano invocado, quer porque o autor teve a comunicação social a anunciar diariamente o que se passava no processo da X, podendo, se nisso tivesse interesse, praticar os actos necessários à reclamação do seu crédito, quer porque, como o próprio admite, o capital investido ser-lhe-á reembolsado, só que em lugar de um período de carência de 6 anos (como sucederia no caso de ter reclamado créditos) terá um período de carência de 20 anos. Acresce que, apesar de ter que esperar mais tempo, receberá mais valor. Não há, pois, dano efectivo ou dano decorrente da perda de qualquer chance.

*O A. respondeu, mantendo a sua posição, pedindo a improcedência da excepção de caducidade do direito de acção invocada pelo réu Banco ..., S.A, e, a final, que o pedido do autor seja julgado procedente por provado.

*O autor veio requerer a intervenção das filhas V. E., residente na …, Guimarães, e J. C., residente na Rua …, Guimarães, o que foi deferido, nos termos conjugados dos arts. 316.º, n.º 1 e 318.º, n.º 1, al. a), do CPC.

Após citação das chamadas, as mesmas declararam fazer seus os articulados do A., aceitando a causa no estado em que se encontrava e todo o processado.

*Proferido despacho saneador, com a intervenção das filhas do autor, julgou-se prejudicado o conhecimento da excepção de ilegitimidade activa – art. 130.º do CPC -, relegando-se para final o conhecimento da excepção de caducidade, por se considerar controvertida a matéria que a sustenta.

*Após a realização da audiência final foi proferida sentença que julgou a acçâo improcedente, absolvendo o réu “Banco ..., S.A.” do pedido.

*II. O Recurso Não se conformando com a decisão proferida vieram os AA. apresentar recurso, nele formulando as seguintes conclusões: 1º- A sentença recorrida, dá como provado que o plano de recuperação foi votado e aprovado em assembleia geral de credores em 19 e 20 de Dezembro de 2017, veja-se pontos 5. e 6. da sentença.

  1. - A sentença dá como provado que foi consignado no plano de recuperação que os credores que reclamaram e individualizaram os seus créditos recebem metade do capital no prazo de seis anos, acrescido de juros, depois de um período de carência de 6 anos e ainda que o recorrido não informou o autor do prazo em que o mesmo poderia ter ido reclamar créditos ao processo de recuperação judicial da X, S.A., nem quanto aos procedimentos para que deveria adotar para o fazer, veja-se pontos 7. e 8. da decisão.

  2. - A sentença, dá, ainda, como provado que se os aqui recorrentes tivessem sido informados pelo aqui recorrido da possibilidade e prazos para reclamar e individualizar o seu crédito, tê-lo-ia feito e que o valor que pudesse obter seria por si reinvestido em valores mobiliários, veja-se pontos 9. e 10.

  3. - Da factualidade dada como provada nos pontos 5., 6., 7., 8., 9. da 10 da sentença, resulta cristalino que os factos constantes das alíneas b) e c) dos factos não provados, estão em contradição e deveriam ter sido dado como provados.

  4. - Ainda que, os factos constantes das alíneas b) e c), sejam julgados não provados, ou seja, que a data da homologação do plano de recuperação não tivesse sido 08 de Janeiro de 2018 e que o prazo para que os credores individualizassem os seus créditos não tivesse tenha terminado em 08 de Março de 2018, o que não se concede e apenas por mera hipótese de raciocínio de dever de patrocínio se equaciona, os factos julgados provados nos pontos 5., 6., 7., 8., 9. da 10 da sentença, deveriam levar à condenação do recorrido, atento que são claros de que foi consignado no plano de recuperação que os credores que reclamaram e individualizaram os seus créditos recebem metade do capital no prazo de seis anos, acrescido de juros, de pois de um período de carência de 6 anos e que o recorrido não informou os recorrentes do prazo em que os mesmos poderiam ter ido reclamar créditos ao processo de recuperação judicial da X, S.A 6º- Da transcrição das declarações de parte do recorrente A. S., nestas alegações transcritas, sobressai a exatidão e clareza das declarações do recorrente ao explicar em pormenor que a data da homologação do plano de recuperação ocorreu em 08 de Janeiro de 2018 e que o prazo para que os credores individualizassem os seus créditos terminou em 08 de Março de 2018 7º- Resulta seguro que estes factos, constantes das alíneas b) e c) dos factos não provados, deveriam ter sido dado como provados.

    8ª- A decisão recorrida refere expressamente as declarações de parte do recorrente A. S. foram francas e objetivas tendo sido positivamente valoradas.

  5. - Ademais, o recorrido nunca refutou ou sequer colocou em causa que a data da homologação do plano de recuperação foi 08 de Janeiro de 2018 e que o prazo para que os credores individualizassem os seus créditos terminou em 08 de Março de 2018, tendo apenas colocado em causa que não tinha a obrigação de informar, o que por si só deveria ter levado o tribunal a concluir pela prova daqueles factos constantes das alíneas b) e c) da matéria não provada.

  6. - Desde final do ano 2018 que é público e notório que no âmbito do processo de insolvência da empresa X S.A, o plano de recuperação foi homologado em 08 de Janeiro de 2018 e que o prazo para que os credores individualizassem os seus créditos terminou em 08 de Março de 2018, bem como notório e público é que as entidades credoras que não o fizeram, ficaram sujeitos a um prazo de carência de vinte anos.

  7. - Tratando-se de factos públicos e notórios, deveria, por si só levar o tribunal recorrido a efetuar um juízo de prognose no sentido de julgar provados esses mesmos factos, isto é, dar como provados na sentença os factos das referidas alíneas b) e c).

  8. ...

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