Acórdão nº 00580/20.4BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 24 de Setembro de 2020

Magistrado ResponsávelAna Patroc
Data da Resolução24 de Setembro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório R., LDA, NIPC(…), com sede na Travessa (…), (…), (…), interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, proferida em 20/05/2020, que julgou improcedente a reclamação formulada contra a decisão proferida pelo Director de Finanças de (...), que indeferiu o pedido de dispensa de prestação de garantia para obter a suspensão da execução fiscal, no âmbito dos processos de execução fiscal (PEF) n.º 0418201801235494 e apensos, que correm termos no Serviço de Finanças de (...)-1, relativos a dívida exequenda no valor de €381.604,93.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: “A) O presente recurso deve ser admitido com efeito suspensivo, ao abrigo do disposto no artigo 286.º, n.º 2, parte final do CPPT.

  1. O Tribunal «a quo» incorreu em erro de julgamento, porque não deu como provado um facto essencial que, pela prova documental que consta dos autos deveria ter sido dado como provado, por não permitirem extrair outra conclusão que não a da sua comprovação.

  2. O Tribunal «a quo» não deu como provado o seguinte facto: • Se, por um lado, a Reclamante viu sair do seu património três veículos, por outro lado, entrou nas suas contas o montante correspondente ao valor dos mesmos (ponto 46 da petição inicial).

  3. Esse facto resulta, no entender da Recorrente, claramente demonstrado através do documento n.º 6 junto com a petição inicial, que se trata do comprovativo do depósito na conta da Recorrente do valor correspondente à venda dos bens. Resultando provado que associado à venda das viaturas houve a entrada de dinheiro na conta da Recorrente e que, portanto, aquele ato de alienação se tratou de um ato oneroso, não poderia aquele facto ser usado pela AT, e depois pelo Tribunal, para justificar a existência de “fortes indícios de atuação dolosa na insuficiência do património”.

  4. No ponto 11 dos factos provados, encontra-se transcrito o despacho proferido pelo Diretor de Finanças de (...) de concordância com os fundamentos relatados em informação anterior, que propôs a manutenção na ordem jurídica do ato objeto de reclamação judicial, no qual se refere: “Para além disso, nos anos precedentes (2014 a 2017) a gerência daR., LDA, NIPC (…), por via da utilização de faturas emitidas pela C., LDA NIPC(...), que não tinham subjacentes operações reais, retirou da esfera societária os montantes correspondentes a essas faturas: 409.074,52€ (ano de 2014), 175.091,43€ (ano de 2015), 386.704,56€ (ano de 2016) e 262.322,50€ (ano de 2017).” F) Trata-se de um facto controverso, encontrando-se a ser discutido no âmbito das impugnações judiciais que correm termos junto do TAF de Braga, onde se discutem a legalidade das correcções efetuadas em sede inspetiva pela AT, relacionadas com as faturas emitidas pelaC., razão pela qual não poderia o tribunal «a quo» ter dado esse facto como provado.

  5. A douta sentença proferida incorreu em erro em matéria de direito, porquanto não foram dados como provados factos suficientes que permitissem concluir, como fez a douta sentença recorrida, que “a AT invocou e provou, que existem indícios fortes, sérios, consistentes e fundados de que a insuficiência de bens se deveu a atuação dolosa da reclamante, colocando-se deliberada e conscientemente numa situação de insuficiência patrimonial, o que impede a dispensa de garantia”.

  6. A alienação das quotas da sociedadeF., Lda. — atual D., Lda. - não pode ser encarada como um indício de atuação dolosa na diminuição do património da Recorrente, uma vez que as quotas não integravam o património daquela, mas antes o património do seu sócio-gerente e da sua sócia.

  7. A “manifesta falta de meios económicos para prestar garantia” e os “inexistência de fortes indícios de que a insuficiência de bens se deveu a atuação dolosa do executado”, requisitos de que depende a isenção de garantia nos termos do artigo 52.º, n.º 4 da LGT, afere-se em relação ao património do executado, no caso, a sociedade aqui Recorrente, e não em relação ao património dos seus sócios.

  8. As vendas das viaturas trataram-se de transmissões onerosas que em nada diminuíram o património da Recorrente, uma vez que tendo saído do património da Recorrente as referidas viaturas, a Recorrente viu entrar no seu património o valor correspondente àqueles bens.

  9. Ainda que os veículos se mantivessem na esfera patrimonial da Recorrente, considerando o seu valor, que não foi contestado pela AT, sempre se concluiria pela insuficiência de bens penhoráveis da Recorrente para assegurar o pagamento da dívida exequenda, uma vez que o valor global dos bens alienados pela Recorrente é manifestamente inferior ao valor da garantia a prestar, pelo que nunca seriam suficientes para servir de garantia no processo de execução fiscal.

  10. O Tribunal «a quo» considerou existirem “indícios de atuação dolosa” baseado em factos que, por um lado, não dizem respeito ao património da Recorrente, mas ao património pessoal dos seus sócios e, por outro lado, baseada em factos que não implicaram a diminuição do património da Recorrente.

  11. Nos presentes autos a AT não alegou nem demonstrou a existência de intenção por parte da Recorrente de, através dos atos de alienação do património — realce-se, atos onerosos e que não implicaram a diminuição do património — diminuir as garantias do credor tributário, pelo que incorreu o tribunal «a quo» em erro em matéria de direito quando considerou existirem fortes indícios de atuação dolosa na insuficiência do património.

  12. A AT apresentou, já em sede de reclamação judicial do despacho de indeferimento do pedido de dispensa de garantia um “indício novo” que não constava do despacho que indeferiu o pedido de dispensa de garantia (ponto 11 dos factos provados), tratando-se, portanto, de fundamentação à posteriori pelo que não poderia ser considerado como motivo justificativo para indeferir o pedido de dispensa de garantia.

  13. A AT através do facto elencado no ponto 11 dos factos provados remete para os factos alegadamente apurados em sede de inspeção tributária, não demonstrando que a conduta da Recorrente foi no sentido de, com intenção dolosa, diminuir a garantia e frustrar a cobrança do crédito tributário. Aliás tal facto é anterior ao processo executivo e ao próprio procedimento Termos em que: a) Deverá ser concedido provimento ao presente recurso, declarando-se, em consequência, nula a douta sentença por verificação de erro de julgamento, porquanto não deu como provado um facto essencial que, pela prova documental que consta dos autos deveria ter sido dado como provado; b) deverá ser concedido provimento ao presente recurso, declarando-se, em consequência, nula a douta sentença por verificação erro de julgamento em matéria de direito, uma vez que não foram dados como provados factos que permitissem concluir pela existência de fortes indícios de atuação dolosa na insuficiência do património, nos termos do n.º 4 do artigo 52.º da LGT.

    Pede deferimento.”***A Recorrida não apresentou contra-alegações.

    ***O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.

    ***Dada a natureza urgente do processo, há dispensa de vistos prévios (artigo 36.º, n.º 2 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos ex vi artigo 2.º, n.º 2, alínea c) do Código de Procedimento e de Processo Tributário).

    ***II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de facto e de direito, por considerar que a AT não alegou nem provou factos demonstrativos do preenchimento do pressuposto de que depende a dispensa de prestação de garantia, contido na última parte do n.º 4 do artigo 52.º da LGT.

    1. Fundamentação 1. Matéria de facto Na sentença prolatada em primeira instância foi proferida decisão da matéria de facto com o seguinte teor: “FACTOS PROVADOS Julgo provados os seguintes factos relevantes para a decisão da causa: 1.

    Correm termos no Serviço de Finanças de (...)-1, os processos de execução fiscal nº 0418201801235494 e apensos, contra a ora reclamante, com vista à cobrança coerciva de dívidas de IVA de diversos períodos dos anos de 2014, 2015, 2016 e 2017 e de IRC dos anos de 2014 e 2015, no valor exequendo global de 381.604,93 € – cfr. certidões de dívida de fls. 63 a 142 e informação de fls. 151-154; 2.

    Com data de 23/11/2018 a reclamante solicitou ao BANCO (...) uma Garantia Bancaria a ordem da AT no valor de 492.432,67€ - cfr. documento de fls. 148; 3.

    Por ofício datado de 29/11/2018 o BANCO (...)comunicou à reclamante o seguinte – cfr. ofício de fls. 149: “Assunto: Não aprovação de pedido de crédito - Garantia Bancária Ex.mo(s) Senhor(es), Tendo presente o pedido de crédito acima identificado, o qual mereceu a nossa melhor atenção, o BANCO (...) informa que decidiu pela sua não aprovação.”; 4.

    Em 06/12/2018 a ora reclamante apresentou no Serviço de Finanças de (...)-1 requerimento a solicitar a dispensa de prestação de garantia, do qual consta, entre o mais, o seguinte – cfr. requerimento de fls. 143-150: “(…)1. A Requerente foi notificada pelo V. Serviço de Finanças, das demonstrações de liquidação de IVA referentes aos períodos 201401, 201402, 201403, 201404, 201405, 201406, 201407, 201409, 201410, 201411, 201412, 201501, 201503, 201504, 201505, 201506, 201507, 201508, 201509, 201603, 201604, 201605, 201606, 201607, 201608, 201609, 201610, 201611, 201703, 201704, 201705, 201706, 201707, 201709 e das respectivas liquidações de juros de IVA.

    2. E irá apresentar reclamação graciosa cujo prazo termina em 15-02-2019.

    3. A Requerente foi também notificada das demonstrações de liquidação de IRC de 2014, 2015, e das...

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