Acórdão nº 714/20.9BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 01 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelPEDRO NUNO FIGUEIREDO
Data da Resolução01 de Outubro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul I. RELATÓRIO L….., natural da Gâmbia, intentou ação administrativa contra o Ministério da Administração Interna, peticionando a anulação da decisão da Diretora Nacional do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, datada de 14/02/2020, a qual considerou como inadmissível o pedido de proteção internacional e a sua substituição por outro que permita a respetiva análise.

Alega, em síntese, a falta de capacidade sistémica do Estado Italiano e que o regresso ao país de origem consubstanciaria uma violação do princípio da não expulsão.

Citada, a entidade demandada deduziu oposição, pugnando pela improcedência da ação.

Por sentença de 01/06/2020, o TAC de Lisboa julgou a ação procedente e condenou a entidade demandada na instrução e apreciação do pedido.

Inconformada com esta decisão, a entidade demandada interpôs recurso, terminando as respetivas alegações com a formulação das conclusões que de seguida se transcrevem: “1ª - Resulta evidente que o Tribunal a quo na sua ponderação e julgamento do caso sub judice, e refutando a decisão do recorrente, não deu cumprimento às normas legais vigentes em matéria de asilo, mormente no que respeita ao mecanismo da Retoma a Cargo, ao qual a Itália está vinculada; 2ª - Com a devida Vénia, afigura-se ao recorrente que a Sentença, ora objeto de recurso, carece de fundamentação legal, porquanto não logrou fazer a melhor interpretação do regime que regula os critérios de determinação do estado membro responsável, em conformidade com o Regulamento (EU) que o hospeda; 3ª – Verifica-se, assim, que a Entidade Demandada observou as exigências previstas no artigo 5º do Regulamento supra mencionado, tendo realizado, antes da decisão que determinou a transferência, uma entrevista pessoal com o requerente, ora Autor e, bem assim, elaborado um resumo escrito, através de relatório/formulário, do qual constam as principais informações facultadas pelo requerente e facultada ao requerente a possibilidade de pronúncia quanto à eventual decisão de tomada a cargo a proferir pelo Estado onde o pedido foi apresentado, bem como alegar elementos suscetíveis de afastar a aplicação dos critérios de responsabilidade e, consequentemente, a sua transferência para Itália; 4ª - Saliente-se que o ora recorrido nada referiu quanto à falta de acolhimento ou que esta se traduziria numa falta de respeito pelos seus direitos, decorrendo das suas declarações que não são as condições de acolhimento que estiveram na origem da sua saída do território italiano, não fazendo qualquer alusão a riscos efetivos ou potenciais do seu receio de regressar a Itália; 5ª - Apenas referiu que quando esteve em Itália não foi vítima de maus tratos ou de outras medidas persecutórias, não referindo que durante o período em que esteve naqueles países, mormente em Itália, tivesse sofrido qualquer situação de ofensa aos seus direitos fundamentais ou tivesse sido alvo de tratamento desumano ou degradante na aceção do Artigo 4.º da CDFUE; 6ª - Compulsados os autos verifica-se que não foi feita uma alegação concreta, densa e particularmente grave pelo Recorrido para que se possa concluir pela aplicação da “cláusula de salvaguarda”, previsto no art.º 3°, 2º parágrafo do nº 2, do Regulamento Dublin ou para imposição à Entidade Administrativa da promoção de diligências instrutórias; 7º - Não se vislumbra, por força das declarações do próprio Recorrido, que a Entidade Demandada omitiu qualquer dever instrutório, isto é, que devesse ter averiguado outros factos que se revelassem adequados e necessários à tomada de decisão, antes de ditar a transferência do A. para Itália; 8ª - Contrariamente ao que a douta sentença refere, ao ora recorrente outra solução não restava que não fosse propalar a competente decisão de inadmissibilidade e de transferência, a qual não padece de qualquer vicio de facto ou de direito; 9ª - No âmbito do Procedimento Especial previsto no Capítulo IV da Lei de Asilo (artigos 36.º a 40.º) relativo à determinação do Estado-membro responsável pela análise o pedido, na medida em que não se vai analisar o mérito do pedido nem os fundamentos em que se baseiam a pretensão do requerente, não se impõe à Administração que adotasse quaisquer outras diligências de prova ou de instrução do pedido, ao contrário do invocado pela douta sentença ora recorrida; 10º - Idêntico entendimento foi sufragado em diversos Acórdãos do TCAS (processos nºs 1353/18.0BELSB, 1740/18.3BELSB, 559/19.9BELSB, 743/19.5BELSB, 1069/19.0BESNT, 1258/19.7BELSB, 1361/19.3BELSB, 2195/19.0BELSB, 2206/19.0BELSB, 2368/19.6BELSB, entre outros); 11ª - Acresce também o Acórdão proferido pelo STA aos 16/01/2020, no Proc. 2240/18.7BELSB bem como Acórdão de 23 de abril, proferido no âmbito do Processo 916/19.0BELSB. Assim como decorre do comunicado de imprensa n.º 33/19 do Tribunal de Justiça da União Europeia, Luxemburgo, de 19 de março de 2019; 12ª - Neste contexto, e ao invés da douta sentença, o ato administrativo anulado encontra-se legalmente enquadrado face ao disposto nos comandos imperativos ínsitos na legislação supra invocada, devendo assim ser acolhido, porquanto se mostra irrepreensível; 13ª - Em suma, o entendimento plasmado pelo recorrido conduz à ilegalidade da sentença, devendo, por isso, ser revogada.” O recorrido não apresentou contra-alegações.

O Ministério Público emitiu parecer no sentido da procedência do recurso, pois o recorrido não alegou quaisquer factos que fundamentem a invocação das alegadas falhas sistémicas no âmbito do tratamento concedido aos refugiados pelo Estado italiano e não estar a entidade demandada obrigada a averiguar da existência dessas falhas.

* Perante as conclusões das alegações do recorrente, sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso, cumpre aferir do erro de julgamento da sentença, ao considerar que ocorre défice instrutório do procedimento.

Dispensados os vistos legais, atenta a natureza urgente do processo, cumpre apreciar e decidir.

* II. FUNDAMENTOS II.1 DECISÃO DE FACTO Na decisão recorrida foram considerados provados os seguintes factos: 1 – Em 09.12.2019, o A. apresentou pedido de protecção internacional, no Gabinete de Asilo e Refugiados do SEF ( cfr. procº. instrutor, e admissão por acordo).

2 – Em 09.12.2019, o A. foi objecto de entrevista, cujo teor aqui se dá por reproduzido, e do qual extrai-se o seguinte (cfr. procº. instrutor, e admissão por acordo): “…” “…” 3 – O SEF desencadeou processo de determinação de responsabilidade pela análise do pedido de protecção internacional, sob o nº. ….., ao abrigo do Regulamento (EU) 604/2013, endereçado ao Estado-Membro Alemanha, que recusou expressamente o pedido, remetendo a responsabilidade para a Suíça ou Itália, conforme documentos patentes no processo instrutor, cujo teor aqui se dá por reproduzido ( cfr. procº. instrutor, e admissão por acordo).

4 - O SEF desencadeou processo de determinação de responsabilidade pela análise do pedido de protecção internacional, sob o nº. ….., ao abrigo do Regulamento (EU) 604/2013, endereçado ao Estado-Membro Suiça, o qual remeteu a responsabilidade para a Itália, conforme documentos patentes no processo instrutor, cujo teor aqui se dá por reproduzido ( cfr. procº. instrutor, e admissão por acordo).

5 - O SEF desencadeou processo de determinação de responsabilidade pela análise do pedido de protecção internacional, sob o nº. ….., ao abrigo do Regulamento (EU) 604/2013, endereçado ao Estado-Membro Itália, que aceitou tacitamente o pedido, conforme documentos patentes no processo instrutor, cujo teor aqui se dá por reproduzido ( cfr. procº. instrutor, e admissão por acordo).

6 - O GAR – Gabinete de Asilo e Refugiados emitiu a informação nº. ….., cujo teor aqui se dá por reproduzido, e do qual extrai-se o seguinte ( cfr. procº. instrutor, e admissão por acordo): “…” 7 – Em 14.02.20., Directora Nacional Adjunta...

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