Acórdão nº 0242/11.3BELLE 0449/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 30 de Setembro de 2020

Magistrado ResponsávelARAGÃO SEIA
Data da Resolução30 de Setembro de 2020
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo A…………. e B………….., melhor identificados nos autos, vêm interpor recurso por oposição de acórdãos, ao abrigo do disposto nos artigos 280º, nº 2, e 284°, ambos do CPPT, do Acórdão n.º 0449/14, de 15/03/2017, deste Supremo Tribunal, considerando que perfilhou decisão oposta à tomada no acórdão também deste Tribunal de 17/12/2014, proferido no processo n° 0454/14.

Apresentaram alegações que concluíram nos termos seguintes: “

  1. O douto Acórdão proferido nos presentes autos e aqui recorrido está em manifesta oposição com o douto Acórdão proferido em 17 de Dezembro de 2014, pelo Supremo Tribunal Administrativo – Secção de Contencioso Tributário, no Processo nº 0454/14, em que foi Relator o Venerando Conselheiro Aragão Seia; B) Ademais os dois acórdãos em oposição foram proferidos em recurso jurisdicionais interpostos pela Fazenda Pública de decisões proferidas em primeira instância em duas impugnações judiciais deduzidas pelos aqui ora Recorrentes contra as liquidações de IRS de 2006 e 2007, respectivamente; C) Sendo certo que ambas liquidações de IRS de 2006 e 2007 se alicerçavam nos mesmos fundamentos invocados pela Administração Tributária, como por outro lado, as impugnações deduzidas pelos aqui ora Recorrentes também assentavam nos mesmos fundamentos de facto e de direito em que sustentavam a ilegalidade dessas mesmas liquidações e as duas sentenças objecto dos referidos recursos jurisdicionais pronunciaram-se pela procedência das impugnações com os mesmos fundamentos de facto e de direito.

  2. Sendo inquestionável a oposição verificada nos dois citados Acórdãos, a questão aqui sub judice é a de saber se o acto de reforma do acto administrativo que decidiu a reclamação graciosa foi ou não extemporâneo.

  3. Ora, salvo melhor opinião e sempre com o devido respeito que é muito, ao contrário do que se decidiu nos presentes autos de recurso, o prazo de recurso de contencioso a que se refere o nº 1 do artigo 141º do CPA não pode, no caso concreto da revogação do deferimento de reclamação graciosa nos termos do CPPT, ser outro que não o dos 15 dias a que se referia o nº 2 do artigo 112º do mesmo Código (na redacção à data dos factos).

  4. Desde logo, porque estamos no âmbito de um procedimento fiscal especial, o da reclamação graciosa e, por seu lado, do recurso contencioso a interpor da decisão de indeferimento desta reclamação a que corresponde o processo de impugnação judicial que se encontra regulado no CPPT e cujo prazo de interposição se encontra prevista no artigo 102º deste Código.

  5. E é este prazo especial (que era de 15 dias à data dos factos) previsto para o recurso contencioso específico da decisão da reclamação administrativa que deve ser considerado no âmbito da aplicação do nº 1 do artigo 141º do CPA; H) E não qualquer outra norma de carácter mais geral como sejam as regras do CPTA que apenas se aplicam ao processo tributário de forma supletiva e sempre que para um determinado processo fiscal não se encontre norma aplicável na legislação especial que o regula (designadamente, o CPPT).

  6. Ora, o prazo de 1 ano (que é o prazo relativo ao Ministério Público) a que se refere o artigo 58º, nº 2, alínea a) do CPTA, não é aplicável no âmbito do recurso de contencioso a deduzir contra as decisões da reclamação graciosa; J) Sendo certo que o Ministério Público não em qualquer intervenção no âmbito do recurso a interpor destas decisões administrativas proferidas em sede de reclamação graciosa de âmbito tributário.

  7. Termos em que o despacho de reforma da decisão que recaiu sobre a reclamação graciosa é ilegal por ser extemporâneo e violar o disposto no artigo 141º do CPA, sendo consequentemente ilegal a liquidação oficiosa que dai resultou, a qual, como tal deve ser anulado.

    Nos termos sobreditos, verificada a alegada oposição de acórdãos e sempre com o mui douto suprimento de V. Exas, deve o presente recurso ser julgado procedente e, consequentemente, ser anulada a douta decisão recorrida que deverá ser substituída por outra que, advogando o entendimento vertido no douto Acórdão proferido no Processo nº 0454/14, julgue ilegal o despacho de reforma em causa e, consequentemente, julgue improcedente o recurso interposto pela Fazenda Pública e mantenha a decisão da primeira instância que mandou anular a liquidação oficiosa do IRS de 2006 impugnada, como é de inteira JUSTIÇA TRIBUTÁRIA.” Não foram produzidas contra-alegações.

    O exm.º Magistrado do Ministério Público teve “vista”, pronunciando-se no sentido de ser adoptado o entendimento vertido no acórdão recorrido.

    Cumpre apreciar e decidir, começando por verificar se ocorrem os requisitos de que depende o recurso por oposição de acórdãos, e passando a seguir a conhecer da dita oposição e consequentemente da decisão ainda a proferir.

    Dos requisitos do recurso por oposição de acórdãos.

    O recurso por oposição de acórdãos, interposto nos termos do artigo 284.º do C.P.P.T., identifica que o proferido nos presentes se encontra em oposição com o proferido pelo S.T.A. a 17-12-2014, no processo n.º 0454/14.

    Não se concretizando em que consiste a dita oposição, consideramos na linha do que vem sendo decidido há muito pelo STA que inserindo o recurso em causa entre os de uniformização de jurisprudência, deve obedecer aos requisitos previstos quanto ao mesmo no CPTA.

    Assim, depende, nomeadamente, de se existir contradição expressa quanto a idêntica questão fundamental de direito, no quadro de idêntica regulamentação jurídica aplicável e de idênticas situações de facto, e ainda da decisão proferida não estar de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada, tal como resulta dos artigos 27.°, n.°1, b), do E.T.A.F. e 152.°, n.°s 1 e 3, do C.P.T.A. – nesse sentido, entre outros, acórdãos de 26-9-07 e de 2-5-2012, proferidos pelo Pleno nos processos 0452/07, 0307/11 e 0895/11 (estes 2 últimos com a data de 2-5-2012).

    Ora, vejamos se se verificam tais requisitos, começando pela matéria de facto constante em ambos os acórdãos.

    No acórdão recorrido n.º 449/14, de 15/03/2017 foi reputada como relevante a seguinte matéria de facto:

  8. Relativamente aos rendimentos obtidos no ano de 2006 os Impugnantes não apresentaram a declaração modelo 3 de IRS no prazo legalmente previsto — cfr. fls. 2 do processo de Reclamação Graciosa n° 1082201004000765 apenso e por acordo.

  9. Em 12.10.2009 a Administração Tributária elaborou Boletim de Alteração Oficiosa (BAO) em relação ao Impugnante marido preenchendo o quadro 10 — “Enquadramento” com o Regime de Contabilidade Organizada (art. 28° do CIRS) desde 01.01.2005, com fundamento na seguinte informação, descrita no quadro 28 do BAO: «O presente BAO destina-se a enquadrar o sujeito passivo no regime de contabilidade organizada com referência aos anos de 2005 e 2006 em virtude dos seguintes volumes de vendas (...): 2004—€826.049,42 2005—€754.498,17 — cfr. fls. 58 a 61 da Reclamação Graciosa n° 1082201004000765 apensa.

  10. A Administração Tributária elaborou declaração oficiosa para cada um dos ora Impugnantes, nas quais fez constar os rendimentos de cada um, individualmente, não levando em consideração o seu estado civil de casado e considerando a totalidade do rendimento líquido da categoria B no ano mais próximo que se encontrava determinado e de acordo com as regras do regime simplificado de tributação — cfr. a informação de fls. 79 da Reclamação Graciosa 1082201004000765 apensa, e por acordo.

  11. Em 05.02.2010 foi efectuada, em relação ao sujeito passivo marido, a liquidação oficiosa de IRS n° 2010 5000038819, que apurou imposto no valor de € 79.853,67, e juros compensatórios no montante de € 8.694,92 — cfr. fls. 28 da Reclamação Graciosa 1082201004000765 apensa.

  12. Em 03.02.2010 foi efectuada, em relação ao sujeito passivo mulher, a liquidação oficiosa de IRS n° 2010 5000038821, que apurou imposto no valor de € 30.504,02, e juros compensatórios no montante de € 3.349,59 — cfr. fls. 14 a 16 da Reclamação Graciosa 1082201004000773 apensa.

  13. Em 15.03.2010 os Impugnantes apresentaram, ambos, reclamação graciosa alegando, em síntese, que a liquidação efectuada não corresponde aos rendimentos obtidos; que se encontravam impossibilitados de apresentar a declaração de rendimentos porque o sujeito passivo marido se encontrava mal enquadrado quanto ao regime de tributação, que os rendimentos obtidos foram enviados à Administração Fiscal através de declaração apresentada em 12.03.2010, e que são casados, devendo ser considerado o seu estado civil — cfr. fls. 2 e 3 dos processos de Reclamação Graciosa apensos 1082201004000773 e 1082201004000765 apensos.

  14. Em 17.06.2010 foi proferido pelo Director de Finanças Adjunto de Faro despacho de deferimento da reclamação graciosa com os fundamentos que, em síntese, se transcrevem: «(...) constata-se que os reclamantes não conseguiam proceder à entrega das declarações de rendimentos em falta, por divergência de regime de tributação, por causa que não lhes era imputável. Pelo que, o Serviço de Finanças procedeu à elaboração do BAO, em 03-11-2009, tendo o sujeito passivo A para o ano de 2006 ficado enquadrado no regime de contabilidade organizada (doc. fls. 58 a 61 dos autos).

    Relativamente ao sujeito passivo B, B…………, verifica-se que no ano de 2006 se encontrava enquadrada no regime simplificado de tributação (fls. 84 dos autos), contudo, à data em que a Administração Fiscal elaborou o respetivo DC (26-10-2010), já detinha em seu poder, não só os elementos declarados nas declarações periódicas de IVA referentes ao ano de 2005, atempadamente entregues, cuja base tributável ascendeu ao montante global de € 143.099,22 (fls. 86 a 91), assim como a declaração anual rececionada em 27-02-2009, que indica um montante total de prestações de serviços no valor de € 188.278,51 (fls. 96 a 102).

    Determinava o então em vigor art. 28°, n° 2 do CIRS que ficavam abrangidos pelo regime simplificado os sujeitos passivos que, não tendo optado...

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