Acórdão nº 154/07.5BEFUN de Tribunal Central Administrativo Sul, 02 de Julho de 2020

Magistrado ResponsávelDORA LUCAS NETO
Data da Resolução02 de Julho de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. Relatório F...

, não se conformando com a decisão proferida pelo TAF do Funchal que julgou improcedente a ação administrativa especial por si intentada, contra a Secretaria Regional da Educação da Região Autónoma da Madeira, veio interpor recurso jurisdicional, tendo nas alegações de recurso que apresentou - cfr. fls. 414 e ss. do SITAF -, culminado com as seguintes conclusões: «(…) 1) Ocorre erro no julgamento da matéria de facto dada como provada pelo douto acórdão recorrido, na medida em que a decisão omite os seguintes factos que deveriam dar- se como provados nos autos, essenciais que são à justa composição do litígio: i. O A. possuía (à data do concurso) 365 dias de tempo de serviço docente antes da profissionalização e 1341 dias de tempo de serviço após a profissionalização — cfr. doc. n.° 4 junto pelo A., na parte referente aos Dados do Candidato, “Habilitações e Tempo de Serviço”, e does. n.°s 7, 8 e 9 juntos pelo A. com a pi., e pa, a fls.; ii. O A. detinha a pontuação final, em sede de habilitação profissional, de 17.174 valores (não de 15.837 valores, como em erro se considerou) — cfr., docs. n.°s 4, 7, 8 e 9 juntos pelo A. com a pi. e documento junto pelo A. aos autos em 18/07/2007; iii. A requerimento do A., a Escola de Santa Cruz remeteu, via fax, o registo biográfico daquele, para o júri do concurso em apreço, o que ocorreu antes da publicitação da lista de ordenação final — cfr. docs. n.°s 9, 10, 11 e 12 juntos pelo A. com a pi. e pa. a fls.

2) A douta decisão recorrida, ao omitir da matéria de facto dada como provada os factos que vimos de expor, que resultam provados pelos documentos juntos aos autos, incorre em erro de julgamento quanto aos factos, por insuficiência, devendo os factos elencados ser aditados à matéria de facto dada como provada e considerados na decisão do mérito do presente recurso.

*** 3) O A. assacou ao ato impugnado o vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto, na medida em que o mesmo detinha 17.174 valores de pontuação final no concurso e não 15.837 valores, como em erro considerou a Administração — cfr., designadamente, arts. 56.° e 64.° da pi.

4) Acontece que a douta decisão recorrida não conheceu o mencionado vício imputado ao ato, em afronta ao art 95.°, n.° 2 do CPTA, que impõe a pronúncia judicial sobre todas as causas de invalidade invocadas contra o ato impugnado.

5) Deste modo, a decisão recorrida incorre em nulidade ao omitir a pronúncia sobre o vício de erro nos pressupostos de facto invocado pelo A., nos termos do art. 615.°, n.° 1, al. d), 1.ª parte do CPC, aplicável ex vi dos arts. 1.° e 140.° do CPTA, nulidade que se impõe que seja suprida mediante o conhecimento do vício mencionado.

6) No caso concreto, releva determinantemente que a alegada irregularidade formal existente na candidatura do A. ao concurso foi suprida pelo mesmo, pois aquele diligenciou no sentido de serem remetidos à Administração decisora, atempadamente e de molde a poderem ser considerados na decisão, os dados necessários a uma decisão factualmente acertada.

7) É isso que resulta documentalmente provado nos autos: que, a pedido do A., a Escola da RAM onde aquele lecionara no ano letivo anterior (Escola de Santa Cruz) remeteu ao júri do concurso o registo biográfico do A., do qual resulta expressa e ostensivamente a prioridade concursal em causa.

8) Pode dizer-se que, ao trazer-se estes factos ao procedimento (material e formalmente), os mesmos passaram a integrar o pedido do A. consubstanciado na sua candidatura ao concurso.

9) A não se entender assim, tem necessariamente que entender-se que a Administração R. não podia desconsiderar os factos trazidos ao procedimento e nele existentes e documentados, que eram do seu conhecimento, proferindo uma decisão conscientemente errónea quanto aos factos.

10) Neste sentido pugna desde logo o dever consagrado no art. 76.°, n.° 2 do (antigo) CPA, de suprimento oficioso das deficiências dos requerimentos dos particulares, de molde a evitar prejuízos para os mesmos, decorrentes de meras irregularidades dos pedidos (como c ostensivamente o caso).

11) E pugna, bem assim, o princípio do inquisitório, que se assume como vetor orientador da instrução do procedimento, na medida em que o fim último instrutório e o único que serve o interesse público é alcançar a decisão factualmente acertada (verdadeira) c, assim, justa.

12) O art. 87.° do CPA (antigo) consagra os deveres instrutórios da Administração de averiguar os factos relevantes para uma decisão acertada, bem como de considerar todos os factos que sejam trazidos ao seu conhecimento e que sejam do seu conhecimento oficioso.

13) Inexiste, atento o circunstancialismo do caso concreto, razão legítima para a Administração ter desconsiderado o facto e a realidade e não ter graduado o A. na 1.ª prioridade, em violação do dever de suprimento oficioso de irregularidades do pedido, dos princípios do inquisitório e da descoberta da verdade material que lhe está ínsito, da boa-fé, da justiça e da proporcionalidade, bem como das normas legais que os consagram - arts. 76.°, n.° 2, 87.°, 56.º, 5.°, n.° 2, 6.° e 6 °-A do antigo CPA, aqui aplicável.

14) Ou, por outras palavras, a ponderação a tecer no caso concreto entre o princípio do pedido (auto-responsabilidade do candidato no preenchimento da candidatura) e o princípio do inquisitório (oficiosidade e verdade material) resultava inequivocamente no sentido da preponderância do segundo sobre o primeiro, considerando a atuação do A. no procedimento, já que este alegou e provou no mesmo, e por duas vezes até, o facto que deveria ter sido relevado — de que concorria em 1.ª prioridade.

15) Atento, pois, o circunstancialismo do caso vertente, o mínimo que se exigia a um Decisor diligente, justo e preocupado em servir o interesse público era que averiguasse a factologia e decidisse cm conformidade - isto porque, repise-se, essa factologia relevante e determinante para decidir com verdade material foi trazida ao procedimento, pelo A., por duas vezes.

16) A Administração não podia, pois, no caso que nos ocupa, optar, como optou conscientemente, por ignorar a verdade que lhe foi servida, antes tinha aqui o dever vinculado de atuar em conformidade com os elementos trazidos ao procedimento, a principiologia supra referenciada (boa-fé, justiça, proporcionalidade, prossecução do interesse público) ditava que atendesse aos factos provados.

17) A douta decisão recorrida incorre, assim, em erro de julgamento, por violação dos princípios e normas legais mencionados, constantes dos arts. 76.°, n.° 2, 87.°, 56.°, 5.°, n.° 2, 6.° e 6.°-A do antigo CPA (aqui aplicável), ao decidir nos termos expostos, impondo-se a sua revogação por este Digníssimo Tribunal ad quem e substituição por decisão que julgue procedentes os vícios assacados ao ato impugnado, anulando-o.

*** 18) Sem jamais conceder quanto ao que vimos de expor, cumpre acrescentar que atenta a formulação do art. 12.°, n.° 3 da Portaria n.° 102-A/2006 (que afasta a realização da formalidade de audiência prévia no pressuposto de que o procedimento concursal é urgente), e atenta, bem assim, a função corretiva reconhecida às normas legais gerais do CPA que consagram a matéria referente à audiência prévia, 19) O único entendimento daquela norma que é conforme com o princípio constitucional da participação dos interessados na formação das decisões que lhes dizem respeito (subjacente à audiência prévia), é que, no caso dos concursos de que cuidamos, só não deverá haver lugar à audiência prévia quando se verifique uma concreta situação de urgência, que terá que ser devidamente alegada e concretizada.

20) Ou seja, exige-se a fundamentação da urgência, em sede da motivação do ato, para uma legítima não realização da audiência prévia.

21) Fundamentação essa que inexiste no caso vertente: o júri reporta-se apenas, em ata datada de 14/12/2006, a “proximidade da data prevista para iniciar funções” e invoca a al. b) do n.° 1 do art. 103.° do CPA, sem concretizar quaisquer factos concretos e específicos: no mínimo, exigir-se-ia que dissesse a concreta “data” a que se refere.

22) Assim, a Administração incorre em vício de falta de fundamentação e em consequente omissão de audiência prévia, pois do procedimento não resulta que a formalidade não devesse ser realizada.

23) Determinantemente, a realização desta formalidade seria essencial para o A. poder vir demonstrar que concorria na 1.ª prioridade do concurso, uma vez que, atento o art. 101.°, n.° 3 do (antigo) CPA e a jurisprudência superior, a audiência prévia permite aos interessados vir suprir deficiências detetadas no requerimento (neste caso, na candidatura ao concurso).

24) Ao entender diversamente do que vimos de expor, a decisão recorrida incorre em erro de julgamento, por violação dos arts. 100.° e ss. e 8.° do CPA (antigo), impondo-se a sua revogação. (…)» A Recorrida, Secretaria Regional da Educação da Região Autónoma da Madeira, contra-alegou (fls. 445 e ss. do SITAF), concluindo como segue: «(…) I - Não tem razão o Recorrente porquanto é o único e exclusivo responsável e consequentemente culpado pelas informações prestadas no modelo de candidatura ao concurso a que foi opositor e de cuja classificação recorreu judicialmente.

II - Carece de razão o Recorrente quando insiste em proceder a interpretações exaustivas e desadequadas da situação em pleito, visando a obtenção de uma nesga de razão, na razão que lhe não assiste.

III - Tão pouco assiste razão ao Recorrente quando alega princípios como o do inquisitório em situações como a que opõe o Recorrente à Administração Pública, onde, reafirma-se, não é a Administração Pública quem deve averiguar condições não alegadas por um opositor a um concurso.

IV - Em nenhuma ordem legal ou constitucional é acolhido tal princípio, absolutamente absurdo, mesmo aos olhos de um leigo.

V - Como absurdo seria...

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