Acórdão nº 389/07.0BEBJA de Tribunal Central Administrativo Sul, 02 de Julho de 2020

Data02 Julho 2020
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1998_02

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. Relatório O Ministério Público, ora Recorrente, interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja que negou provimento à ação administrativa especial por si deduzida contra o Município de Ourique, ora Recorrido, visando a impugnação de ato administrativo proferido pelo Presidente da Câmara Municipal de Ourique, de 31.10.2006, que revogou o ato de abertura do Concurso Público Externo de Ingresso para admissão de estagiário com vista ao provimento de um lugar de Técnico Superior de 2ª Classe, na área de Relações Públicas e Publicidade.

Nas alegações de recurso que apresentou (fls. 297 e ss. do SITAF), culminou com as seguintes conclusões: «(…) 1 — Embora se possam suscitar dúvidas sobre a inexistência de questão prévia obstativa do conhecimento de mérito, bem como sobre a correção e suficiência da matéria de facto provada, o recurso restringe-se à impugnação do julgamento de direito e apenas no segmento em que se decidiu não padecer o despacho revogatório impugnado do vício de violação de lei (aceitando-se o julgado quanto à arguida falta de fundamentação do ato).

2 — A única questão a decidir no recurso consiste em determinar se padece ou não de invalidade o ato de revogação de um concurso externo de ingresso para preenchimento de uma vaga de técnico superior, expressa e exclusivamente baseado em razões de oportunidade e conveniência, depois de o procedimento haver sido tramitado durante cerca de dois anos e existir um candidato admitido, classificado, ordenado em 1.° lugar e que realizou estágio probatório durante um ano, com aproveitamento de Bom, cumprindo todas as obrigações que assumira em contrato administrativo de provimento, só não sendo aprovado e nomeado por abstenção exclusivamente imputável ao ente administrativo.

3 — A sentença recorrida considerou válido o ato revogatório, limitando-se a invocar a prevalência do dever de boa administração e de prossecução do interesse público, dada a situação de rutura financeira do município e a natureza não fundamental da tarefa a desempenhar.

4 — Porém, é patente que essa solução ofende a situação jurídica subjetiva do candidato, incorrendo o ato impugnado em intransponível violação de lei (art.° 140.°, n.° 1, alínea b) CPA de 1991).

5 — Por outro lado, a imprevista e legalmente inadmissível revogação do concurso frustrou injustificadamente o investimento de confiança realizado pelo candidato, com base numa antecedente conduta do município que a gerou, pelo que o despacho impugnado vulnera de modo inadmissível os princípios gerais da proporcionalidade (art.° 5.°, n.° 2), da justiça e imparcialidade (art.° 6.°), da boa-fé e proteção da confiança dos administrados (art.° 6.°-A).

6 — O ato administrativo viola igualmente o direito à aprovação e nomeação do candidato que, em estágio probatório, cumpre com sucesso todas as exigências legais e contratuais que sobre ele recaíam, sendo exclusivamente imputável ao ente administrativo a não verificação daquelas formalidades (art.° 5.°, n.° 1, alínea f) do D.L. n.° 265/88, conjugado com os artigos 4.°, n.° 3 do art.° 427/89 e 41.°, n.° 1 do D.L. n.° 204/98).

7 — Ao decidir em contrário, a sentença recorrida violou as normas mencionadas, pelo que deve ser revogada e substituída por decisão que, julgando a ação procedente, anule o ato impugnado.» O Recorrido, Município de Ourique, contra-alegou (fls. 320 e ss. do SITAF), concluindo como segue: «(…) A - A sentença recorrida deve ser mantida, na medida em que bem julgou a matéria em discussão nos autos, fundamentando a decisão com respeito pelos princípios do direito administrativo, apresentando uma ponderação justa e proporcionada do interesse publico face ao interesse do particular.

B - A decisão não viola o art. 140°, n°1, alínea b) do CPA, na medida em que, como bem nela se diz “o direito alegadamente preterido quanto ao candidato D... mais não era do que um putativo direito pois no procedimento ainda não lhe havia sido conferido o direito à nomeação, ao provimento no posto de trabalho colocado a concurso. Ao invés, detinha uma expectativa quanto a tal nomeação somente fundada na classificação obtida em momento prévio que conduziu a uma ordenação em lista jamais homologada.” C - A abertura de um concurso para admissão de um estagiário só confere direito ao candidato à frequência de um estágio e não de colocação numa vaga de técnico superior.

D - O acto de revogar a abertura desse concurso não violou qualquer direito constituído do candidato, uma vez que o estágio foi ministrado e concluído com a correspondente avaliação.

E - A nomeação para a vaga de técnico superior é uma acto administrativo juridicamente distinto do da celebração de um contrato de provimento para estágio, com requisitos e formalidades autónomas.

F - Mas é a própria lei que define a extensão, os limites e o objecto da expectativa de um estagiário admitido num concurso e até já mesmo graduado, ao dispor o artigo 16°, n°4 do DL 427/89 que o contrato administrativo de provimento dos estagiários aprovados no estágio para os quais existam vagas considera-se automaticamente prorrogado até à data da aceitação da nomeação.

G - Significa isto, inevitavelmente, que a administração não fica obrigada, ope legis ou automaticamente a nomear um candidato, mesmo que aprovado, e na contra face significa isto que o candidato não detém qualquer direito subjectivo a essa nomeação.

H - Numa situação de ruptura financeira em que o Município corre mesmo o risco de não dispor de meios financeiros para pagar as remunerações dos funcionários que já integram o quadro a título definitivo, parece evidente que a opção por não contrair mais custos de carácter definitivo é não só proporcional como adequada a proteger o interesse público.

I - E é mesmo a única que uma gestão responsável pode assumir, sendo a comparação exigível a que compara a impossibilidade de assegurar as remunerações já devidas com a possibilidade que o candidato detinha de regressar ao seu posto de trabalho de origem, uma vez que se encontrava numa situação de licença sem vencimento que poderia fazer cessar a qualquer momento, regressando ao seu posto de trabalho, o que aliás fez.

J - Em 2006 o Município de Ourique apresentava uma situação de falência técnica, com 20 milhões de euros de dívida e impossibilidade de pagamento aos fornecedores e incumprimento generalizado, mesmo de pagamentos acordados judicialmente.

K - Pelo que assunção de quaisquer compromissos futuros, ademais em áreas não essenciais como eram as Relações Publicas, revelar-se-ia uma decisão contrária a qualquer gestão prudente e violadora do interesse público que as Câmaras Municipais devem prosseguir ao serviço dos Munícipes.

L - Sendo que a não nomeação pelo não preenchimento da vaga, tivesse ela a forma de revogação do concurso ou de anulação da vaga era a única decisão conforme ao interesse público, sem que tal decisão violasse qualquer interesse relevante do candidato detentor de uma relação laboral estável com o Estado, que ainda hoje mantém.

M - Termos em que não padece a decisão recorrida de qualquer vício, devendo manter-se na íntegra e consequentemente considerar-se o acto de revogação de abertura do concurso válido.» Neste Tribunal Central, o DMMP notificado nos termos do disposto nos artigos 146.º e 147.º do CPTA, não se pronunciou.

Colhidos os vistos legais, importa apreciar e decidir.

  1. 2. Questões a apreciar e decidir: A única questão suscitada pelo Recorrente, delimitada pelas alegações de recurso e respectivas conclusões...

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