Acórdão nº 2224/19.8BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 02 de Julho de 2020

Magistrado ResponsávelPEDRO NUNO FIGUEIREDO
Data da Resolução02 de Julho de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul I. RELATÓRIO C….. instaurou ação administrativa, tramitada como processo urgente, contra o Ministério da Administração Interna, na qual vem impugnar a decisão da Diretora Nacional do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) datada de 03/10/2019, na qual se considerou inadmissível o seu pedido de proteção internacional, pedindo a sua anulação e substituição desse por outro ato que permita a análise do seu pedido.

Alega, em síntese, que o ato impugnado viola o princípio da não expulsão, ao não considerar as deficiências sistémicas nas medidas de acolhimento em Itália dos requerentes de proteção internacional, onde será colocado em situação de tratamentos desumanos e degradantes.

Citada, a entidade requerida apresentou resposta no sentido da improcedência do pedido.

Por sentença de 17/01/2020, o TAC de Lisboa julgou a ação improcedente e, em consequência, absolveu a entidade requerida do pedido.

Inconformado com esta decisão, o requerente interpôs recurso, terminando as respetivas alegações com a formulação das conclusões que de seguida se transcrevem: “Do erro de direito, por a sentença concluir não haver indícios, no caso sub judice, a existência de razões sérias para crer que há falhas sistémicas no procedimento de asilo e nas condições de acolhimento dos requerentes em Itália, que impliquem, para o Autor, o risco de tratamento desumano ou degradante ou de expulsão para o país de origem.

5.º Ora, mais uma vez não pode o ora recorrente concordar com esta decisão, de acordo com os fundamentos seguintes: 5.1 - O ato impugnado ao não considerar a situação económica e social atual e o contexto de pressão migratória do Estado italiano, designadamente, quanto às deficiências sistémicas nas medidas de acolhimento dos autores de proteção social — viola o principio da não expulsão, previsto nos artigos 33.°, n° 1, 1ª parte da Convenção de Genebra de 1951, 3.° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 1.°, 3.° 18.° e 19. °, n. ° 2, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e 78.° Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.

5.2 - O facto de Itália não se ter pronunciado no prazo de duas semanas não pode, em concreto, significar que tomou todas as diligências, não podendo o seu silêncio equivaler a uma aceitação tácita antes significando que aquele Estado está sobrelotado de pedidos.  5.3 - De referir que a forte pressão migratória pode em determinadas circunstâncias, exigir a repartição de esforços entre todos os Estados-Membros, sob pena de se deixar os Estados com fronteiras externas impossibilitados de cumprir as suas obrigações de respeito pelos direitos procedimentais, como acontece com Estado italiano que, por se encontrar com tais dificuldades, coloca em causa direitos, liberdades e garantias dos requerentes de proteção internacional, por ausência de capacidade sistémica organizacional social e económica para receber tantos requerimentos de apoio internacional o que levanta inevitavelmente a questão do destino dos requerentes, a qual nunca poderá ser no sentido voltarem ao seu país de origem.

5.4 Assim a Itália, devido à sobrelotação migratória de que foi alvo, não tem capacidade para oferecer meios humanos e condições para o acolher e promover pela sua segurança, facto que não pode ser ignorado, pelo que a decisão em, causa viola as disposições normativas acima referidas não restando dúvidas de que ao ser deslocado para Itália, será colocado numa situação de tratamentos inumanos e degradantes dada a conjuntura atual do Estado”.

Não foram apresentadas contra-alegações.

* Perante as conclusões das alegações do recorrente, sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso, cumpre aferir do erro de julgamento da sentença ao concluir inexistirem indícios de que há falhas sistémicas no procedimento de asilo e condições de acolhimento em Itália, implicando para o autor risco de tratamento desumano ou degradante ou de expulsão para o país de origem.

Dispensados os vistos legais, atenta a natureza urgente do processo, cumpre apreciar e decidir.

* II. FUNDAMENTOS II.1 DECISÃO DE FACTO Na decisão recorrida foram considerados provados os seguintes factos: 1) O Autor, nacional da Guiné-Bissau, apresentou um pedido de protecção internacional em Portugal em 27/08/2019, que foi registado sob o processo nº …..

– cfr. fls. 1, 2 e 20 do PA junto aos autos; 2) Em 28/04/2017, o Autor apresentou um pedido de protecção internacional em Itália, tendo as suas impressões digitais sido recolhidas e inseridas na base de dados EURODAC – cfr. fls. 3 e 33 do PA junto aos autos; 3) Em 17/09/2019, as autoridades portuguesas dirigiram um pedido de “Retoma a Cargo” ao Estado Italiano, ao abrigo do art. 18º, nº 1, al. b), do Regulamento (UE) nº 604/2013 – cfr. fls. 29-34 do PA junto aos autos; 4) Em 30/09/2019, foi realizada uma entrevista com o ora Autor, nos termos do instrumento de fls. 41-47 do PA junto aos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido e do qual se extrai, designadamente, o seguinte: “(…) (…) cfr. fls. 41-47 do PA junto aos autos; 5) Com data de 03/10/2019, o SEF comunicou às autoridades italianas que, em face da ausência de resposta, em duas semanas, ao pedido formulado, identificado no ponto 3) antecedente, de acordo com o art. 25º, nº 2, do Regulamento Dublin III, considera que a Itália aceitou a retoma a cargo do ora Autor – cfr. fls. 47 do PA junto aos autos; 6) Em 03/10/2019, o Gabinete de Asilo e Refugiados do SEF elaborou a informação nº …..

, cujo teor se considera aqui integralmente reproduzido e do qual se extrai o seguinte: “(…) Pelo exposto, e tendo em consideração que os pedidos são analisados por um único Estado, que será aquele que os critérios enunciados no Capítulo III do Regulamento (CE) N.º 604/2013 do Conselho de 26 de junho designarem como responsável, propõe-se que a Itália seja considerada o Estado responsável pela retoma a cargo, ao abrigo do artigo 25º, Nº 2 do Regulamento (CE) N.º 604/2013 do Conselho de 26 de junho.” – cfr. fls. 50-53 do PA junto aos autos; 7) Em 03/10/2019, foi proferida pela Directora Nacional do SEF a “Decisão” que ora se reproduz: “”– cfr. fls. 54 do PA junto aos autos; 8) Em 16/10/2019, a decisão referida no ponto anterior foi comunicada ao ora Autor – cfr. fls. 58 do PA junto aos autos.” * II.2 APRECIAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO Conforme supra enunciado, a questão a decidir neste processo cinge-se a saber se ocorre erro de julgamento da sentença ao concluir inexistirem indícios de que há falhas sistémicas no procedimento de asilo e condições de acolhimento em Itália, implicando para o autor risco de tratamento desumano ou degradante ou de expulsão para o país de origem.

Invoca o recorrente, em síntese, o seguinte: - a desconsideração das deficiências sistémicas nas medidas de acolhimento em Itália viola o principio da não expulsão; - a falta de pronúncia de Itália não pode equivaler a uma aceitação tácita, antes significando que aquele Estado está...

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