Acórdão nº 0484/15.2BESNT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 08 de Julho de 2020

Magistrado ResponsávelNEVES LEITÃO
Data da Resolução08 de Julho de 2020
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. RELATÓRIO 1.1.

    A Fazenda Pública interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo - Pleno da Secção do Contencioso Tributário, do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul proferido em 18 abril 2018 que, concedendo provimento a recurso, revogou a sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra em 15 janeiro 2016, julgou procedente a oposição deduzida por A…………. no processo de execução fiscal nº 3654200501095285 (SFOeiras 2) instaurado contra Indústrias de Papel ……., Lda e anulou o despacho de reversão interposto contra responsável subsidiário.

    Invoca oposição com o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul- Secção de Contencioso Tributário proferido em 6 abril 2017 (processo nº 456/13 BELLE) 1.2. Na sequência da admissão liminar do recurso no Tribunal Central Administrativo, a recorrente apresentou alegações de 1º grau e alegações de 2º grau (art. 284º nºs 3 e 5 CPPT) A recorrente sintetizou as alegações de 2º grau (sobre o conflito de jurisprudência) com a formulação das seguintes conclusões: A. Como já foi referido no recente despacho, entendeu-se como verificado uma efectiva contradição de julgados, entre a decisão por acórdão já produzido nos presentes autos e o aresto também proferido pelo T.C.A. Sul no processo 456/13.1BELLE datado de 06.04.2017, pois verifica-se existir uma identidade substancial das situações fácticas e da questão de direito, entendida como a sua subsunção às mesmas normas legais, sobre que recaíram os arestos em confronto.

    B. Porque, em resumo, se considerou que, em ambos os casos, o órgão de execução fiscal fundamentou uma reversão em processo de execução fiscal dos créditos da sociedade devedora originária para os respectivos Oponentes com base na situação líquida negativa declarada pela sociedade na última declaração relativa à Informação Empresarial Simplificada (IES) e na sua insolvência declarada pelo Tribunal.

    C. No acórdão recorrido, como se viu, e, por conveniência, se reproduz, concluiu-se que: “A asserção relativa à «situação líquida negativa declarada pela devedora originária na última declaração referente à Informação Empresarial Simplificada e/ou em face de insolvência declarada pelo Tribunal» não preenche o pressuposto em exame.” D. Ao contrário, no acórdão fundamento, o entendimento foi o seguinte: “In casu”, o órgão de execução fiscal fundamentou a reversão na situação líquida negativa (SLN) declarada pela devedora originária na última declaração referente à Informação Empresarial Simplificada (IES) e na insolvência da sociedade declarada pelo Tribunal. Tais elementos não são postos em causa pelo recorrente (nomeadamente, identificando bens propriedade da sociedade devedora originária suficientes para o pagamento da dívida exequenda), o qual apenas se limita a assacar ao despacho de reversão a sua alegada falta de fundamentação. Face ao exposto, lícita se torna a conclusão de que a mesma empresa não era detentora de património suficiente para pagar a dívida exequenda e acrescidos objecto do processo de execução fiscal nº.1... e apensos, assim estando legitimada a reversão da execução contra responsáveis subsidiários, com a ressalva supra mencionada de que a execução não pode avançar para a fase da penhora de bens do revertido, enquanto o devedor originário tiver (se tiver) património penhorável.

    E. O problema aqui em causa, no nosso entendimento, é o de estabelecer qual será o conteúdo concreto do dever de fundamentação do órgão de execução fiscal em sede de reversão das dívidas societárias para o seu gerente, para que se considere como cumprido o previsto no artigo 23.º, n.º 4 da Lei Geral Tributária.

    F. Como se entendeu no acórdão fundamento, apoiado na jurisprudência e na doutrina: “Nesta sede, à A. Fiscal incumbe o ónus da prova de que se verificam os factos que integram o fundamento, previsto na lei, para que possa chamar à execução os responsáveis subsidiários e reverter contra eles o processo executivo, cabendo-lhe, por isso, demonstrar que não existiam, à data do despacho de reversão, bens penhoráveis do devedor originário ou, existindo, que eles eram fundadamente insuficientes. Só no caso de a Fazenda Pública fazer a prova do preenchimento desses pressupostos, passará a competir ao responsável subsidiário demonstrar a existência de bens, suficientes, no património da sociedade de que aquela não teve conhecimento, fazendo, assim, a prova da ilegalidade do acto de reversão (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 13/4/2005, rec.100/05; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 22/6/2011, rec.167/11; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 16/5/2012, rec.123/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/7/2015, proc.8792/15; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P. Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.65 e seg.; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, 4ª. edição, Encontro da Escrita, 2012, pág.223 e seg.).

    G. Em termos abstractos, tem sido entendimento pacífico da jurisprudência e da doutrina que um acto se encontra devidamente fundamentado sempre que é possível pelo seu destinatário conhecer o percurso cognitivo que o seu autor utilizou para chegar à decisão tomada, variando, portanto, o seu conteúdo, conforme o tipo de acto em causa.

    H. E caso concreto, encontra-se perfeitamente estabelecido que o destinatário do acto é o gerente de facto sociedade devedora originária, nos termos do artigo 24.º, n.º 1 da LGT, com o conhecimento e domínio da situação da empresa que essa qualidade naturalmente implica.

    1. E do despacho de reversão, igualmente reproduzido no acórdão recorrido (II.3., fls. 3), consta, para o que aqui nos interessa, os seguintes elementos: i) A identificação da sociedade devedora originária INDÚSTRIA DE PAPEL ………., LDA, EM LIQUIDAÇÃO, ou seja, já consta da firma a expressão “em liquidação”, averbada na sequência da sua insolvência judicialmente decretada, como é obrigação legal (artigo 38.º, n.º 2 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa) cujo gerente, aqui revertido e oponente, terá de ter um completo conhecimento; ii) E que o processo executivo encontra-se “Suspenso por Declaração de Falência”; iii) No ofício de citação (também reproduzido no acórdão recorrido, II.5., fls. 3 e 4 e a fls.8), como fundamento da reversão, o órgão de execução fiscal diz, para o que aqui nos traz, “Insuficiência de bens da devedor(a) originária (art.º 23/2 e 3 da LGT): decorrente da situação líquida negativa declarada pela devedora originária na última declaração referente à Informação Empresarial Simplificada e/ou em face da insolvência declarada pelo Tribunal” J. Na sua análise, logo a seguir, (fls. 8) considerou-se no acórdão recorrido: “Salvo o devido respeito, tal asserção não permite aceder às razões que determinaram o órgão de execução fiscal decidir no sentido do preenchimento do conceito de insuficiência referido. Nem existem dados objectivos, nem consta dos autos qualquer avaliação técnica do património que permitam o preenchimento do conceito e o eventual questionamento do mesmo por parte do revertido, tendo em vista o exercício cabal das garantias de defesa do revertido em que se insere a garantia de excussão prévia dos bens do devedor originário.” (sublinhado nosso).

      K. Concluindo-se seguidamente que: “Em face do exposto, a sentença recorrida, ao julgar improcedente o vício referido da falta de fundamentação do despacho de reversão, incorreu em erro, pelo que não se pode manter na ordem jurídica. A procedência do vício formal determina a anulação do despacho de reversão.” L. Mas diz-nos o n.º 3 do artigo 23.º da LGT, que “Caso, no momento da reversão, não seja possível determinar a suficiência dos bens penhorados por não estar definido com precisão o montante a pagar pelo responsável subsidiário, o processo de execução fiscal fica suspenso desde o termo do prazo de oposição até à completa excussão do património do executado, sem prejuízo da possibilidade de adopção das medidas cautelares adequadas nos termos da lei.” M. E no recente Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul (Processo n.º 626/10.4BESNT de 19/09/2017), seguindo de perto o entendimento do S.T.A. (processo n.º 0257/12 de 12.04.2012) já longamente citado (cfr. artigo 21) entendeu-se que: “Portanto, no caso de impossibilidade de apuramento da suficiência dos bens penhorados, ou seja, quando ainda não é possível quantificar a responsabilidade do revertido, o despacho de reversão não produz o efeito de prosseguir a execução contra o revertido, salvaguardando-se desse modo o benefício da excussão.

      N. Mas este não é o momento de funcionamento da excussão prévia dos bens do devedor originário. Aqui, através da reversão, apenas se está a accionar a responsabilidade subsidiária do gerente da sociedade em termos qualitativos, cujo efeito é que, o sujeito passa a ser parte no processo de execução fiscal originariamente instaurado contra a sociedade que dirigia, como Executado, com os respectivos direitos e obrigações, entre outros, o de reclamar ou impugnar a dívida ali em causa, nos termos do artigo 22.º, n.º 5 da LGT.

      O. Resulta, portanto, claro que este não é o momento de funcionamento da excussão prévia dos bens do devedor originário. Só em momento posterior se desenvolverão as diligências...

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