Acórdão nº 010/20.1BEMDL-A de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 18 de Junho de 2020

Magistrado ResponsávelCLÁUDIO RAMOS MONTEIRO
Data da Resolução18 de Junho de 2020
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. Relatório 1.

    O MUNICÍPIO DE MONDIM DE BASTOS – identificado nos autos – requereu no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Mirandela, que se veio a declarar incompetente em razão da hierarquia e determinou a remessa dos autos a este Supremo Tribunal Administrativo (STA), a presente providência cautelar contra o CONSELHO DE MINISTROS, a DIREÇÃO-GERAL DE ENERGIA E GEOLOGIA e a REN – Rede Elétrica Nacional, S.A., o que fez na pendência da ação principal, e peticionando: «a) A suspensão de eficácia da Resolução do Conselho de Ministros nº 178/2019 de 10 de outubro de 2019, publicada em Diário da República nº 204, de 23.10.2019, que determina a suspensão de parcial, pelo prazo de dois anos, do Plano Diretor Municipal de Mondim de Bastos na área destinada à implantação da Linha de Muito Alta Tensão Carrapatelo–Vila Pouca de Aguiar e estabelece as respetivas medidas preventivas; b) Suspender o processo de licenciamento da Direção-geral de Energia e Geologia para a construção da Linha de Carrapatelo-Vila Pouca de Aguiar, a 220/400Kv –Troço entre a subestação do Carrapatelo e a subestação da Ribeira da Pena.

    1. Impedir a REN de praticar qualquer ato relativo à construção da Linha de Muito Alta Tensão Carrapatelo-Vila Pouca de Aguiar, a 220/240Kv, referente ao troço entre a subestação Carrapatelo e a subestação da Ribeira de Pena».

    Alega para o efeito estarem verificados os requisitos exigidos no artigo 120.º do CPTA e, em síntese, que: - O corredor para a instalação da Linha Carrapatelo-Vila Pouca de Aguiar é conhecido como o “Troço G”, cujo traçado consta da Consulta Pública da Câmara Municipal de Mondim de Bastos, no âmbito do Procedimento de Avaliação de Impacte Ambiental nº 2621, de 19 de abril de 2013, cuja proponente é a 3ª requerida e cuja entidade licenciadora é a 2ª requerida; - O “Troço G” corresponde à junção do Troço 6A com o Troço 6B que foram anteriormente objeto de uma decisão de impacte ambiental desfavorável – Declaração de 30.09.2011.

    - Em 15 de janeiro de 2019 foi emitida pela Agência Portuguesa do Ambiente I.P. (APA) uma decisão sobre a conformidade ambiental condicionada do projeto de execução (DCAPE) da Linha de Carrapatelo-Vila Pouca de Aguiar, a 220/440Kv, referente ao troço entre a subestação do Carrapatelo e de Ribeira de Pena, condicionada à verificação de certos requisitos que constam do título único ambiental (TUA), entre eles a obtenção do reconhecimento de interesse municipal através de deliberação da Câmara Municipal de Mondim de Basto, reconhecimento esse que nunca foi solicitado pela REN.

    - A construção da linha de muito alta tensão acarretará graves prejuízos para o território de Mondim de Basto e suas populações, designadamente «problemas ao nível da saúde das populações, da fauna e flora, da paisagem e das atividades adstritas à utilização do solo».

    - A Resolução do Conselho de Ministros n.º 178/2019, que suspendeu o PDM de Mondim de Basto, viola os princípios da autonomia local e da segurança jurídica, pois «ao ingerir de forma infundada e grosseira, pondo em causa os interesses locais, (...) decide por moto próprio levantar uma condicionante que a APA entendeu caber ao Município, por ser de resto o único em condições de avaliar o interesse municipal».

    - A suspensão daquela resolução não causa danos aos interesses tutelados pelas requeridas que, em qualquer caso, não prevalecem sobre os interesses locais por ela lesados.

    1. Citados os requeridos, vieram os mesmos deduzir oposição nos seguintes termos: - O Conselho de Ministros, através da Presidência do Conselho de Ministros, que o representa em juízo, veio deduzir oposição, suscitando a exceção da incompetência em razão da hierarquia do TAF de Mirandela e, no mais, impugnando a factualidade alegada pelo requerente, e concluindo no sentido da não verificação dos requisitos previstos no artigo 120º do CPTA necessários para a decretação da providência.

      - O Ministério do Ambiente e Ação Climática (MAAC), outrora Ministério do Ambiente e Transição Energética, em nome da Direção Geral da Energia e Geologia, excecionando a sua ilegitimidade passiva e a intempestividade da ação; no mais, conclui pela não verificação dos requisitos previstos no artigo 120º do CPTA e, deste modo, pela improcedência do procedimento cautelar.

      Juntou ainda aos autos Resolução Fundamentada nos termos do disposto no nº 1 do artigo 128º do CPTA, que constitui fls. 202 vº a 206 [processo físico].

      - A Rede Elétrica Nacional S.A. também deduziu oposição, impugnando a factualidade alegada pelo requerente e concluindo pelo não preenchimento dos requisitos previstos no artigo 120º do CPTA.

    2. O requerente foi notificado para se pronunciar acerca das exceções invocadas, tendo-se conformado com a exceção da incompetência em razão da hierarquia do TAF de Mirandela, requerendo a remessa dos autos a este Supremo Tribunal e, no mais, pronunciando-se no sentido da não verificação da exceção de intempestividade, bem como da exceção de ilegitimidade passiva da Direção Geral de Energia e Geologia – cfr. fls. 566 a 570.

    3. Por decisão proferida no TAF de Mirandela, foram os autos remetidos a este Supremo Tribunal Administrativo.

    4. Sem vistos, dada a natureza urgente do processo, nos termos da alínea f) do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 36.º do CPTA.

  2. Matéria de facto 6.

    Consideram-se indiciariamente provados os seguintes factos, tendo em atenção a prova documental produzida e as alegações das partes: a) Em 23 de outubro de 2019 foi publicada no DR, 1ª série, a Resolução do Conselho de Ministros (RCM) nº 178/2019, com o seguinte teor: «O Programa Nacional de Barragens de Elevado Potencial Hidroelétrico (PNBEPH) contempla dez aproveitamentos hidroelétricos, nos quais se incluem o de Gouvães, nos rios Torno/Tâmega, bem como os de Alto Tâmega e Daivões, no rio Tâmega.

    O PNBEPH constitui-se como uma alavanca importante para o cumprimento dos objectivos nacionais de redução de emissões de gases com efeito de estufa, designadamente os fixados no Pacote Energia-Clima, bem como para os objetivos da Estratégia Nacional para a produção de energia por fontes renováveis.

    O conjunto de centrais de Gouvães, Daivões e Alto Tâmega tem a sua localização numa zona do território nacional onde, no presente, não existem infraestruturas da rede nacional de transporte de eletricidades (RNT) que possibilitem a integração e transporte da energia destes aproveitamentos hidroelétricos.

    Face a esta limitação e tendo em consideração o elevado montante de potência instalada previsto para este conjunto de centrais, ascendendo a cerca de 1150 MW, nos estudos de rede desenvolvidos no âmbito do PNBEPH foi identificada a necessidade de expansão da RNT com o futuro eixo 400 kV Ribeira de Pena-Feira, no qual a nova subestação de Ribeira de Pena constitui o ponto da RNT onde serão diretamente ligadas as referidas centrais.

    Neste enquadramento, a abertura da futura subestação da RNT em Ribeira de Pena tem como um dos seus principais objetivos reduzir, na medida do possível e tecnicamente razoável, a distância das infraestruturas da RNT relativamente aos mencionados aproveitamentos hidroelétricos, minimizando deste modo o impacto da ligação à rede destes centros eletroprodutores, mediante uma redução da extensão necessária de novas linhas.

    Adicionalmente, a subestação de Ribeira de Pena poderá vir a consubstanciar também um futuro ponto de receção de nova geração renovável a 60 kV, assim como providenciar um melhor apoio aos consumos da rede local de distribuição, com a instalação, mais tarde, de transformação a 400/60 kV.

    Simultaneamente, a região de Trás -os -Montes, constitui uma zona do país caracterizada por um potencial eólico significativo, estimando-se que novos projetos de produção eólica possam vir a instalar-se futuramente nesta região. Atendendo a este potencial e à insuficiência de capacidade local na RNT para receção de nova produção, foi identificado o interesse no reforço da atual rede de 220 kV na zona, mediante a constituição de uma ligação a 220 kV entre as atuais subestações de Vila Pouca de Aguiar e do Carrapatelo. Essa ligação, quando implementada, no seu traçado entre Ribeira de Pena e Carrapatelo tirará partido do eixo Ribeira de Pena -Feira, através de uma partilha de apoios.

    A Linha Carrapatelo-Vila Pouca de Aguiar, a 220/400 kV, no troço entre a subestação do Carrapatelo e a subestação de Ribeira de Pena, abrange áreas do concelho Mondim de Basto, em que é aplicável o Plano Diretor Municipal de Mondim de Basto, publicado pelo Aviso nº 11884/2015, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 203, de 16 de outubro. De acordo com a planta de ordenamento do referido plano diretor municipal, a Linha Carrapatelo -Vila Pouca de Aguiar, a 220/400 kV, no troço entre a subestação do Carrapatelo e a subestação de Ribeira de Pena, localiza-se em espaços cujas utilizações exigem uma compatibilidade com os usos que agora se pretendem atribuir para a execução desta linha, tornando-se necessário proceder à suspensão parcial daqueles instrumentos de gestão territorial.

    Por outro lado, face ao risco de ocorrência de alterações na ocupação, uso e transformação de solos que possam comprometer a futura concretização da Linha Carrapatelo-Vila Pouca de Aguiar, a 220/400 kV, no troço entre a subestação do Carrapatelo e a subestação de Ribeira de Pena, ou torná-la mais difícil ou onerosa, é necessário estabelecer medidas preventivas que acautelem a necessidade de programação e a possibilidade de execução desta.

    Portugal não possui reservas significativas de combustíveis fósseis, pelo que os recursos energéticos endógenos exploráveis se resumem às energias renováveis, de entre as quais sobressaem as energias hídrica e eólica, pela sua maturidade tecnológica e competitividade de custos para o sistema energético nacional. A exploração destes recursos permitirá, por conseguinte, o aumento da segurança energética e a redução de emissões, pelo que as infraestruturas de transporte são essenciais e de...

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