Acórdão nº 2276/19.0BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 28 de Maio de 2020

Magistrado ResponsávelJORGE PELICANO
Data da Resolução28 de Maio de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul.

M...

, que diz ser nacional da Gâmbia, vem interpor recurso da sentença proferida no TAC de Lisboa que julgou improcedente o pedido de anulação do despacho datado de 10/10/2019, da Directora Nacional do SEF, que decidiu que o pedido de protecção internacional por ele apresentado é inadmissível e determinou a sua transferência para Itália.

Formulou as seguintes conclusões: I. “O prazo para o Patrono instaurar uma ação judicial são 30 dias, conforme dispõe o art.33º/1, da Lei n.º34/2004, de 29 de julho; II. Este prazo não tem natureza processual perentória, conforme melhor se alcança do art.33º/3, da Lei n.º34/2004, de 29 de julho, razão pela qual, não pode a douta Sentença fundamentar a sua decisão nesta questão iminentemente formal.

  1. Autor, é um cidadão proveniente da Gâmbia, pessoa que não conhece a língua portuguesa, com uma dificuldade imensa de comunicação, desconhecedor absoluto do ordenamento jurídico português e, apesar de se encontrar devidamente representado por I. Mandatário, carece de tempo para preparar minimamente a sua defesa, aliás seguindo de perto o estatuído no art.6º/1 CEDH sob a epígrafe “Direito a um processo equitativo” – “Qualquer pessoa tem o direito a que a sua causa seja examinada, equitativa e publicamente, num prazo razoável por um tribunal independente (…)”.

  2. O Estado Italiano encontra-se impossibilitado de dar reposta em tempo útil aos procedimentos para acolhimento dos Requerentes de Asilo.

  3. Procedimentos, que se encontram também eles, sujeitos aos prazos legalmente estabelecidos, os quais não podem nem devem prejudicar os direitos dos mais indefesos, de acordo com o disposto no art.3ºCEDH; art.1º, 3º, 18 e 19º/2 CDFUE e art.78º TFUE VI. Incumbe aos Estado Membros, incluindo os órgãos jurisdicionais nacionais (portugueses), não transferir um requerente de asilo para o estado Membro responsável na aceção do Regulamento n.º343/2003, quando não possam ignorar que as falhas sistémicas do procedimento de asilo e das condições de acolhimento dos requerentes de asilo nesse Estado Membro constituem razões sérias e verosímeis de que o Requerente corre risco real de ser sujeito a tratos desumanos ou degradantes, na aceção do art.3º CEDH e art.4º CDFUE. Cf. Acórdão de 21.12.2011, Processo Apensos C-411/10 e C-493/10 do Tribunal de Justiça da União Europeia.

  4. Norma jurídicas violadas: art.33º/1/3, da Lei n.º34/2004, de 29 de julho;art.3º CEDH e art.1º, 3º, 4º, 18º; 19º/2 CDFUE e art.78º TFUE.

  5. Termos em que deve ser concedido provimento ao presente Recurso, revogando-se a douta Sentença recorrida, decidindo-se como peticionado em sede de Petição Inicial, fazendo assim JUSTIÇA!”.

*O Recorrido não apresentou contra-alegações.

O Digníssimo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer em que e em síntese, defende que o presente recurso deve ser declarado improcedente, quer por o Recorrente ter disposto de prazo suficiente para intentar a presente acção, quer por a sentença recorrida não sofrer do erro de julgamento que lhe é imputado ao ter considerado que não existem motivos que obstem à transferência do Recorrente para Itália.

*O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos artigos 144º, nº 2, e 146º, nº 4, do CPTA e dos artigos 5º, 608º, nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC, ex vi art.º 140º do CPTA.

Há, assim, que decidir, perante o alegado nas conclusões de recurso, se a sentença recorrida sofre do erro de julgamento que lhe é imputado por, ao contrário do decidido: - se encontrar violado o direito de defesa do Recorrente, que não fala português e necessitar de mais tempo para preparar a P.I., conforme imposto pelo n.º 1 do art.º 6.º da CEDH, que consagra o direito a um processo justo; - existirem falhas sistémicas no procedimento de asilo e nas condições de acolhimento dos requerentes em Itália, que constituem razões sérias e verosímeis de que o Recorrente corre risco real de aí vir a ser sujeito a tratos desumanos ou degradantes, na aceção do art.3º CEDH e art.4º CDFUE, encontrando-se violados, para além dessas normas, ainda as dos artigos 1.º, 18.º, 19.º, n.º 2 da CDFUE e o art.º 78.º do TFUE.

* Dos factos.

Na sentença recorrida foi fixada a seguinte matéria de facto: “1.

A 15 de Junho de 2017, o A. formulou pedido de protecção internacional e as suas impressões digitais foram registadas no sistema EURODAC em Itália, em Cagliari, sob a referência IT1CA00URH; Cf.

fingerprint form do EURODAC de fls. 31, questionário preliminar de fls. 4 e ss. e entrevista de fls. 21 e ss.

  1. O A. apresentou pedido de protecção internacional junto dos serviços do SEF, em Lisboa, no dia 19 de Setembro de 2019, declarando junto daqueles ser M..., ser nacional do Gâmbia e ter nascido a …., em Fulladou; Cf. o questionário de fls. 4 e ss. e a declaração comprovativa de apresentação do pedido de protecção internacional de fls. 12.

  2. Em 19 de Setembro de 2019, o A. foi entrevistado, no procedimento originado pelo seu pedido, nos serviços do SEF, tendo previamente sido informado pelo funcionário daqueles serviços de que o Regulamento Dublin estabelece os critérios e mecanismo de determinação do Estado-Membro responsável pela análise de um pedido de protecção internacional apresentado num dos Estados-Membros por um nacional de país terceiro ou apátrida, de que apenas um Estado-Membro é responsável, e de que o pedido do A. seria sujeito a um procedimento especial de admissibilidade e de que este procedimento prevê a possibilidade de o pedido de protecção internacional ser considerado inadmissível quando se se verifique que Portugal não é o Estado-Membro responsável pela análise do pedido de protecção internacional; 4.

    Na entrevista aludida no ponto anterior, o A., perguntado sobre a duração da estadia no país onde havia registo no EURODAC, disse que a sua estadia em...

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