Acórdão nº 0204/17.7BECTB 01467/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 03 de Junho de 2020

Magistrado ResponsávelNUNO BASTOS
Data da Resolução03 de Junho de 2020
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1. Relatório 1.1. A…………, com o número de identificação fiscal ………, residente na Rua ………, ……, ……, 6200-…… Covilhã, interpôs recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco que indeferiu liminarmente a acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária que instaurou contra a Fazenda Pública pedindo o reconhecimento de que não foi gerente da sociedade executada e não lhe pode ser exigido o pagamento das quantias a esta cobradas coercivamente, bem como a anulação das decisões de reversão contra ele já proferidas, o levantamento das penhoras existentes e a consequente devolução das quantias já penhoradas.

Recurso este que foi admitido com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Notificado da sua admissão, apresentou alegações e formulou as seguintes conclusões: «(…) I. A douta decisão recorrida enferma de erro de julgamento, fazendo errada aplicação da lei e do direito ao caso sub judice; II. A interpretação feita pela douta decisão recorrida do artigo 145.º do CPPT, em especial do seu n.º 3, consubstancia uma interpretação inconstitucional de tal comando legal por violação do direito à tutela jurisdicional efectiva plasmado no artigo 20.º da CRP e concretizado, no que respeita à jurisdição administrativa, no n.º 4 do artigo 268.º da CRP; III. Cotejando o petitório da acção apresentada em juízo pelo Recorrente, verifica-se que apenas com recurso à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária previsto no artigo 145.º do CPPT será possível assegurar uma tutela plena, eficaz, efectiva e definitiva dos seus direitos e/ou interesses legalmente protegidos.

  1. O Recorrente com a presente acção pretende que de forma efectiva e definitiva a sua situação fique resolvida perante a autoridade tributária através do reconhecimento de que não foi gerente de facto da supra referida sociedade e respectivos efeitos desse reconhecimento, e consequente vinculação da Administração Tributária não só relativamente aos atos já praticados, mas também no futuro.

  2. Conforme refere o Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, em anotação ao artigo 145.º do CPPT, in CPPT Anotado, II Vol, pág. 497 “parece resultar do n.º 3 do art. 145º do CPPT que, quando a acção para o reconhecimento de direito ou interesse legítimo for o meio mais adequado para obter a tutela judicial efectiva, esse meio pode ser utilizado «sempre», o que significa que pode ser utilizado mesmo nos casos em que exista um acto administrativo ou acto tributário não impugnado no respectivo prazo.” VI. No acórdão do STA, datado de 02/06/2010, processo n.º 118/10, disponível in www.dgsi.pt pode ler-se com extrema relevância o seguinte: “Se o contribuinte se encontra numa situação de facto em que se geram sucessivas relações semelhantes com a administração tributária e pretende definir o seu conteúdo não só quanto ao passado (actos já praticados) mas também quanto ao futuro, será possível o uso da acção para reconhecimento de um direito ou interesse legítimo, pois só esta tem potencialidade para esta definição futura. Por isso, quando justificadamente o contribuinte pretende a definição judicial dos seus direitos em matéria tributária para além da mera impugnação contenciosa de actos de liquidação, não há obstáculo a que utilize a acção para reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária, em que cumule com o pedido de anulação de actos os pedidos que entender adequados.”(negrito e sublinhado do Recorrente).

  3. A douta decisão recorrida, ao não conhecer do mérito da acção, indeferindo-a liminarmente com os fundamentos vertidos na mesma, violou de forma clara e evidente os princípios antiformalista, “pro actione” e “in dubio pro favoritate” inserto no artigo 7.º do CPTA aplicável por força da al. c) do artigo 2.º do CPPT; VIII. Em prol da garantia da prevalência do mérito sobre a forma, isto é, no âmbito da ponderação dos pressupostos processuais, os princípios antiformalista, “pro actione” e “in dubio pro favoritate instanciae” impõem uma interpretação que se apresente como a mais favorável ao acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efectiva, proferindo-se decisões que conheçam da pretensão apresentada em juízo pelas partes (neste sentido, vide acórdãos do STA de 9.4.02, no Recurso n.º 48200, de 11.5.00, no Recurso n.º 45903 e de 10.7.97, no Recurso n.º 35738, disponíveis in www.dgsi.pt); IX. Viola a douta decisão recorrida, de forma clara, evidente e inadmissível os artigos 20.º e 268.º, n.º 4 da CRP, bem como o artigo 9.º da LGT que no seu n.º 1 determina que é garantido o acesso à justiça tributária para a tutela plena e efectiva de todos os direitos e interesses legalmente protegidos”, e ainda o artigo 7.º do CPTA aplicável por força da al. c) do artigo 2.º do CPPT violando, pois, o acesso ao direito, à justiça e à tutela jurisdicional efectiva do Recorrente.

Pediu fosse concedido provimento ao recurso e fosse revogada a douta decisão recorrida, com todas as consequências legais.

A Fazenda Pública, apesar de notificada da admissão do recurso e para os termos da causa, não apresentou contra-alegações.

1.2. Remetidos os autos a este tribunal, foi ordenada a abertura de vista ao Ministério Público.

O Ex.mo Sr. Procurador-Geral Adjunto lavrou douto parecer, opinando pela procedência do recurso.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

◇ 2. Dos fundamentos É o seguinte o teor do despacho recorrido: «(...) «A………, NIF ………, vem ao abrigo do artigo 145.º do CPPT deduzir Acção para o Reconhecimento de um Direito ou interesse em matéria Tributária, peticionando, a final, a condenação da AT a: “a) Reconhecer que o A. não foi gerente de facto da Sociedade B……….. Lda.; b) Reconhecer que o A. não é devedor de quaisquer quantias à Fazenda nacional na sequência dos processos de execução fiscal que tenha instaurado contra a sociedade referida na al. a); c) Reconhecer a violação do artigo 24.º da LGT e consequentemente condenada a Anular todos os processos de reversão fiscal que tenha operado contra o A.; d) Proceder ao levantamento das penhoras existentes contra o A., devolvendo-lhe todas as quantias indevida e abusivamente penhoradas”.

Funda a sua pretensão, em suma, no facto de “embora tenha sido gerente de direito da Sociedade B…………, Lda. no período compreendido entre 20/07/2000 e 11/11/2006, data em que renunciou à gerência, a verdade é que não exercia funções de gerente de facto, conforme também se afere da sentença proferida no âmbito do supra referido processo n.º 3040/12.3TALRS” não obstante, a AT “considerou e ainda considera que aquele é responsável subsidiário tendo operado no âmbito dos processos de execução em que a sociedade é parte a respetiva reversão fiscal” estando actualmente em curso, “processos de execução fiscal em que o A. é revertido constante do print anexo retirado da área reservada do portal das finanças, sendo que, em 7/09/2015 a dívida às finanças totalizava o valor global de 867.171,92€” Mais alega o autor que a “AT mantém a sua pensão penhorada desde o ano de 2009, sendo que, a título de exemplo no mês de novembro de 2015 foi-lhe penhorado o valor global de 247,22€, tendo penhorado até 31/03/2017 o valor global de €22.062,24”, sendo certo que a AT “tem arrecadado, à custa do A. quantias que são manifestamente indevidas, na medida em que ilegalmente procedeu à reversão fiscal no âmbito de processos de execução que não deveria ter operado”.

Nestes termos, defende, que se tem “visto abraçado com uma situação manifestamente ilegal e injusta, tanto mais que, não obstante ter lançado mão dos respetivos meios judiciais ao seu dispor, a Ré abusivamente manteve sempre a sua decisão continuando, aliás, a proceder à penhora da pensão do Autor, sendo tal situação tanto mais grave se tomar em consideração que este se encontra na listagem de valores ao fisco no escalão de €250.000 a €1.000.000”, pelo que, “apenas lhe resta lançar mão da presente ação de reconhecimento de direitos e/ou de interesse legítimo em matéria tributária, a fim de obter uma decisão judicial que de forma definitiva atual, presente e futura assegure e acautele devidamente os direitos e interesses legalmente protegidos do A. pondo termo a uma situação que se tem vindo a protelar no tempo e que por errada subsunção dos factos ao direito tem vindo a ser ignorada pela Ré que de forma abusiva e ilegal mantém a penhora da pensão do A. a fim de serem liquidadas”.

Ora, verifica-se assim que através da presente acção, pretende o autor que lhe...

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