Acórdão nº 0688/11.7BECBR 0330/18 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 03 de Junho de 2020

Magistrado ResponsávelJOAQUIM CONDESSO
Data da Resolução03 de Junho de 2020
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACÓRDÃOX RELATÓRIO XO DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mº. Juiz do T.A.F. de Coimbra, exarada a fls.59 a 65 do processo, a qual julgou procedente a presente impugnação pela sociedade recorrida, "A…………, L.da.", intentada e tendo por objecto o acto de liquidação de I.R.C., referente ao ano de 2007 e no montante total de € 58.134,84.

XO recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.84 a 89-verso do processo físico) formulando as seguintes Conclusões: A-A presente impugnação foi interposta contra a liquidação de IRC do ano de 2007, no valor de € 58.134,89, que teve por base correções aritméticas, em sede de ação inspetiva, tendo a ação sido julgada procedente, por o Tribunal “a quo” ter entendido que os nºs 8 e nº9 do então art.º47.º do CIRC não estavam de acordo com os ditames da jurisprudência comunitária; B-Na realidade, é entendimento da Recorrente que o Tribunal “a quo” não fez uma acertada interpretação das normas legais aplicáveis ao caso sub judice, incorrendo em errado julgamento de direito e violação das normas dos n.ºs 8 e 9 do art.º47.º do CIRC, por não se verificar qualquer violação destas normas aos ditames e princípios ínsitos na jurisprudência comunitária; C-Ora, dos presentes autos, verifica-se que a inspeção tributária detetou, através do registo comercial da sociedade que, em 27/03/2007, foi transferida e dividida uma quota correspondente a 50% do capital social da sociedade, da qual era titular a ora recorrida no valor de € 500.000,00 para B…………., NIF:……….. e C…………, NIF: ……….., que ficaram titulares de duas quotas no valor de € 250.000,00; D-Tendo resultado como facto provado, na douta sentença (ponto III, alínea C) que “Em março de 2007, foi deliberado alterar o contrato da sociedade ora impugnante, sendo que o Sr. D………… manteve a sua quota de € 500.000,00, tendo a outra quota de igual valor sido dividida em duas de valor idêntico, perfazendo, cada uma, o montante de € 250.000,00, sendo detentores destas o Sr. B…………. e o Sr. C………… e figurando como gerentes o Sr. B………… e o Sr. E…………. (cfr. docs. a fls. 12 a 17 dos autos que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).”; E-Desta factualidade provada judicialmente resultou que os prejuízos fiscais apurados em 2007 não poderiam ser deduzidos aos lucros tributáveis porque ocorreu a alteração da titularidade de, pelo menos 50% do capital social, por aplicação do nº8 do art.º47.º do CIRC; F-Tendo a Recorrida, a faculdade prevista no nº9 do então art.º47.º do CIRC para afastamento da aplicação do nº8 da aludida norma, de forma a demonstrar que a operação não revestia carácter abusivo, sendo certo que, no caso em concreto nunca tal pedido foi apresentado; G-Ora, o Tribunal “a quo” entendeu que as condições normativas expressas nas normas citadas do nº8 e 9 do art.º47.º do CIRC na redação então em vigor não estavam de acordo com os ditames da jurisprudência comunitária, em primeiro lugar, quanto ao nº8 entendeu que impunha um conjunto de condições de carácter geral e abstrato para se desconsiderar os prejuízos obtidos como fiscalmente consideráveis e por outro lado referiu que o nº9 “(…) faz depender a eventual consideração desses prejuízos de um ato autorizador assente em critérios desconformes com a directiva citada, cujo alcance da clausula anti abuso impõe uma apreciação casuística do caso à luz de um padrão de evasão/fraude fiscal e não, como faz a legislação nacional, na perspectiva de uma «reconhecida utilidade económica»”; H-Ora, a RFP está em total desacordo com a decisão judicial proferida, porque entende que não houve qualquer violação das normas comunitárias ao aplicar-se, ao caso em concreto, o nº8 e 9 do art.º47.º do CIRC; I-Por outro lado, as normas submetidas a apreciação e interpretação (nº8 e 9 da então redação do art.º47.º do CIRC – atual nº8 e 12 do art.º52.º do CIRC – com pequenas alterações de redação) não constituem normas de carácter geral e abstrato; J-Ora, estatui o nº1 do art.º47.º do CIRC a possibilidade da dedução dos prejuízos fiscais, no entanto o nº8 daquela norma refere que, “deixa de ser aplicável quando se verificar, à data do termo do período de tributação em que é efectuada a dedução, que, em relação àquele a que respeitam os prejuízos, (…) se verificou a alteração da titularidade de, pelo menos, 50% do capital social ou da maioria dos direitos de voto”; K-Ora, a redação da norma quanto aos factos que despoletam a aplicação desta norma é bastante clara e objetiva, constituindo uma clausula especifica anti-abuso, de tal modo que, os sócios de uma sociedade com prejuízos fiscais reportáveis sabem de antemão que, ao alienarem, pelo menos 50% das suas participações sociais ou a maioria dos direitos de voto, a sociedade verá excluído o direito ao reporte dos prejuízos; L-Conforme defende J. L. SALDANHA SANCHES, na obra “Os Limites do Planeamento Fiscal: Substância e Forma no Direito Fiscal Português, Comunitário e Internacional”, Coimbra Editora, 2006, cit., p. 206., a “(…) vantagem das normas anti-abuso específicas, de aplicação mais ou menos automática, é a dispensa da administração fiscal (e dos tribunais), quer do esforço da indagação, quer da responsabilidade da decisão”. Neste sentido, o autor acrescenta que, uma vez concebidas na lei para evitar determinados comportamentos específicos dos contribuintes, estas normas são de aplicação vinculada pela AT; M-Pelo que, o que de deixou dito, e ao contrário do que foi decidido pelo Tribunal “a quo” entendemos que a norma estabelecida no nº8 do então art.º 47.º do CIRC não é abstrata, nem é de carácter geral, estando de acordo com os ditames da jurisprudência comunitária; N-E quanto à então redação do nº9 do art.º47.º do CIRC, que permitia o afastamento da limitação prevista no nº8, ou seja, fazia reverter o ónus probatório para o contribuinte, cabendo a este demonstrar que a operação não revestia carácter abusivo, parece-nos que constituía um mecanismo que permitia ao contribuinte demonstrar o contrário à Inspeção Tributária; O-Com efeito, podemos questionar-nos sobre se a determinação de um “reconhecido interesse económico” previsto no nº9 do então art.º47.º do CIRC que sustente o afastamento da limitação prevista no n.º 8 equivale a dizer-nos que a pretensão de dedução dos prejuízos fiscais nestes casos específicos tem por base razões económicas válidas que justifiquem o afastamento; P-Ora, tendo em conta a letra da lei e o modo como a expressão se encontra prevista no contexto em que se insere, parece-nos que o legislador quis estabelecer um critério mais lato que o critério das “razões económicas válidas”, parecendo-nos que se trata aqui de considerar ponderações de cariz macroeconómico, mas sobretudo também evitar operações abusivas; Q-Ou seja, não nos parece adequado sustentar que o Sr. Ministro das Finanças venha a determinar ou permitir a dedutibilidade de prejuízos fiscais por sociedades que operam abusivamente nos termos do n.º 8 só pelo simples facto de lhe estar associado um “reconhecido interesse económico”; R-Isto é, a...

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