Acórdão nº 829/14.2BELRA de Tribunal Central Administrativo Sul, 21 de Maio de 2020

Magistrado ResponsávelLURDES TOSCANO
Data da Resolução21 de Maio de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul l – RELATÓRIO G….., LDA, vem recorrer da sentença de fls. 420 a 459 do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial por si deduzida contra o acto de indeferimento parcial do recurso hierárquico que interpusera na sequência do indeferimento da reclamação graciosa dirigida contra as liquidações adicionais de IRC e respectivos juros compensatórios, referentes aos exercícios de 2008 e 2009.

A Recorrente finalizou a sua alegação de recurso com as seguintes conclusões: «A) - À acção de impugnação foi fixado o valor de € 109.946,45, porém as liquidações impugnadas ascendem ao somatório de € 71.743,00, pelo que este deveria ter sido o valor da acção, em vez de € 109.946,45.

  1. - A Recorrente discorda da douta sentença recorrida, na parte em que considerou que não foi feita prova relativamente à correcção por alegada omissão de proveitos no ano de 2008 no valor de € 105.000,00.

  2. - Designadamente, a Recorrente discorda da valoração que foi dada pela douta sentença recorrida dos seguintes factos: - H….. solicitou a transferência para a Impugnante de créditos que detinha sobre as sociedades M….. Ltd., sendo aquela transferência a título de adiantamento por conta do valor de aquisição de um imóvel que pretendia adquirir em Portugal; e - A Impugnante / Recorrente restituiu os valores recebidos das sociedades M….. Ltd., uma vez que H….. não adquiriu qualquer imóvel em Portugal.

  3. - Entende a Recorrente que, da prova produzida, resultam efectivamente provados os factos supra tendo a douta sentença recorrida incorrido em errónea apreciação e valoração dos documentos juntos aos autos, em conjugação com os depoimentos de H….., corroborado pela testemunha J….. e com as regras da experiência comum.

  4. - Com efeito, o Sr. H….. esclareceu que em 2008, para efeitos de compra de um imóvel intermediado pela impugnante, mandou transferir para esta créditos seus que detinha em empresas: "M….." e "C….. LTD", sendo as transferências efetuadas a título de adiantamento não serviram para pagar o preço porque a aquisição não veio a concretizar-se, tendo depois este valor lhe sido devolvido pela Impugnante/Recorrente; mais, a própria testemunha mostrou e entregou ao Tribunal "a quo" manuscritos assinados por si, comprovativos das ordens de transferências dadas a favor da Impugnante/Recorrente (depoimento da 2ª sessão de inquirição de testemunhas realizada a 19 de maio de 2016, aos minutos 00:02:10 e seguintes; minutos 00:03:06; minutos 00:03:40; minutos 00:04:35 e seguintes.

  5. - Os factos supra foram corroborados pelo depoimento do contabilista certificada da Impugnante/Recorrente, o Sr. J….., conforme se constata passagens extraídas da 1a sessão de inquirição de testemunhas realizada a 17 de março de 2016, aos minutos 00:52:00; minutos 00:54:00; minutos 00:56:21, e ainda minuto 00:44:45 quanto à actividade imobiliária desenvolvida pela Recorrente.

  6. - Quanto à restituição dos valores, é a própria AT que no relatório de inspecção confirma que houve restituição de valores ao Sr. H….., conforme resulta de folhas 7 (últimos dois parágrafos), 8, 9 e 10 e ainda do anexo 3 ao referido relatório de inspecção, onde consta declaração da autoria do Sr. H….. confirmando a realização do estorno dos adiantamentos feitos à Recorrente.

  7. - Conjugado com os depoimentos prestados, há ainda que fazer a valoração dos documentos que a testemunha H….. apresentou ao Tribunal "a quo" aquando da sua inquirição, e ambos os documentos são datados (um em 10/01/2008 e outro em 20/03/2008), sendo que num deles refere expressamente "valor destina-se para a compra de um apartamento".

    l) - Os documentos acima referidos foram desvalorizados na douta sentença recorrida por não haver comprovativo de entrega ao seu destinatário, contudo, o facto das ordens expressas dadas pela testemunha H….. coincidirem com as efectivas transferências contabilizadas pela Recorrente demonstram que as ordens dadas às referidas M….. e C….. Ltd. foram efectivamente cumpridas conforme demandado pelo detentor dos créditos juntos das respectivas entidades.

  8. - Além do mais, referindo-se as ordens de transferência de créditos detidos pelo referido H….., as respectivas ordens escritas não eram documentos que estivessem ao alcance da Recorrente, pelo que, em sede de inspecção a Recorrente não poderia ter conseguido provar através de documentos próprios e pessoais do Sr. H…...

  9. - Donde, dos depoimentos supra transcritos, conjugados com a devida valoração dos documentos juntos aos autos, deve ser extraída a conclusão que as transferências ordenadas pelas entidades M….. e C….. Ltd. foram feitas a favor da Recorrente, a pedido do Sr. H….., por daquelas ser credor, e tiveram em vista a compra de um apartamento à Recorrente.

  10. - Assim, a Recorrente logrou fazer prova de que os valores transferidos não resultaram em obtenção de proveitos (por venda ou comissões na venda de imóvel) porquanto o negócio não chegou a concretizar-se, tendo sido devolvido o adiantamento feito, conforme confirmação do próprio H….. e do contabilista da Recorrente.

  11. - Assim se conclui que a douta sentença recorrida incorreu em errónea apreciação da prova efetuada, incorrendo, consequentemente, em errónea valoração dos factos, ao dar por não provados os factos acima identificados na conclusão C).

  12. - Face ao supra exposto, entende a Recorrente que a douta sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, na parte em que mantém as correcções da AT relativamente ao montante de €105.000,00, no exercício de 2008, indevidamente considerado proveitos.

    Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente, e em consequência ser e anulada a douta sentença recorrida ser fixada à acção o valor de € 71.743,00 e na parte em que julgou não provados os factos enunciados na conclusão C) supra, e em consequência ser anulada a liquidação de IRC de 2008 na parte em que tributa como proveito o montante de 105.000,00.» * Não foram apresentadas contra-alegações.

    * O Ministério Público, junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido da procedência parcial do recurso (cfr. fls. 488 e 489 dos autos).

    * Colhidos os Vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

    * Sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é pelas conclusões com que o recorrente remate a sua alegação (aí indicando, de forma sintética, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida: art. 639°, n°1, do C.P.C.) que se determina o âmbito de intervenção do tribunal ad quem.

    Acresce que, constituindo o recurso um meio impugnatório de decisões judiciais, neste apenas se pode pretender, salvo a situação de questões de conhecimento oficioso, a reapreciação do decidido e não a prolação de decisão sobre matéria não submetida à apreciação do Tribunal a quo.

    Assim, atento o exposto e as conclusões das alegações do recurso interposto, temos que no caso concreto, o objecto do mesmo está circunscrito às seguintes questões: - Da correcção do valor da causa fixado; - Do erro de julgamento da matéria de facto, nomeadamente, por errónea apreciação da prova efectuada e, consequentemente, errónea valoração dos factos; - Do erro de julgamento de direito.

    *** II - FUNDAMENTAÇÃO II.1.

    De Facto A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto: «A.

    Em 2007/2008, C….., D….. e M….. solicitaram empréstimos a B….., sócio da Impugnante, tendo posteriormente restituído, através de cheque, de forma faseada, o valor recebido – cf. depoimento das testemunhas C….., D….. e M…..; B.

    Em 26.01.2012, ao abrigo das Ordens de Serviço n.os OI….. e OI….., foi iniciada pela AT uma acção de inspecção à Impugnante, em sede do IRC e do IVA, relativamente aos exercícios de 2008 e 2009 – cf. fls. 1 a 23 do PAT, que se dão por integralmente reproduzidas; C.

    Em 24.10.2012, foi concluído o RIT elaborado na sequência da acção de inspecção referida no ponto B. que antecede, no qual, além do mais, consta o seguinte: “III. Descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas à matéria tributável (…) III.1.4– Cheques depositados na sociedade G….. Lda sendo referentes a empréstimos de sócios: (…) Na data acordada na notificação, o sujeito passivo na pessoa do seu sócio-gerente, o Sr. B….., apenas exibiu um documento (em ANEXO Nº 4), não assinado, com o título “cheques como empréstimo de sócio”, no qual refere “os cheques abaixo descriminados, representam valores que me foram restituídos pelos seus titulares (…)” e menciona para cada número de cheque solicitado, um nome que pretende identificar como sendo o titular do mesmo: a) “- Cheque nº ….. no montante de 6.606,00 €, cujo titular é: J…... Na contabilidade consta como documento o talão de depósito de cheques contabilizado a 31-1-2009 – nº de documento interno 11; b) - Cheque nº ….. no montante de 2.400,00 €, cujo titular é: A…... Na contabilidade consta como documento o talão de depósito de cheques contabilizado a 30-09-2009 – nº de documento interno 129; b) - Cheque nº ….. no montante de 2.400,00 €, cujo titular é: A…... Na contabilidade consta como documento o talão de depósito de cheques contabilizado a 31-10-2009 – nº de documento interno 141; b) - Cheque nº ….. no montante de 2.400,00 €, cujo titular é: A…... Na contabilidade consta como documento o talão de depósito de cheques contabilizado a 30-12-2009 – nº de documento interno 170; c) - Cheque nº ….. no montante de 3.000,00 €, cujo titular é: A…... Na contabilidade consta como documento o talão de depósito de cheques contabilizado a 30-11-2009 – nº de documento interno 158; c) - Cheque nº ….. no montante de 3.000,00 €, cujo titular é: A…... Na contabilidade consta como documento o talão de depósito de cheques contabilizado a 30-12-2009 – nº de documento interno 169; d) - Cheque nº ….. no montante de 2.071,80 €, cujo titular é: M…..; d) - Cheque...

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