Acórdão nº 03182/19.4BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Maio de 2020

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Apar
Data da Resolução15 de Maio de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO M., LDA. requereu contra o INSTITUTO DA MOBILIDADE E DOS TRANSPORTES, I. P. (IMT, I.P.), indicando, como Contrainteressada, I., LDA., todos melhor identificados nos autos, o decretamento da providência cautelar de suspensão da eficácia de acto administrativo, tendo por objecto a deliberação do Conselho Directivo do IMT, IP, de 23.07.2019, que autorizou a prorrogação do prazo e, consequentemente, a manutenção do contrato de gestão relativo ao centro de inspecção técnica de veículos de (...), celebrado com a Contrainteressada, e, bem assim, dos actos procedimentais subsequentemente praticados, com proibição da aprovação e autorização de funcionamento do centro de inspecção da Contrainteressada, tudo com pedido de decretamento provisório da providência requerida, nos termos do artigo 131.º do CPTA.

Por sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto foi julgado improcedente o processo cautelar e absolvidas a Entidade Requerida e a Contrainteressada do pedido.

Desta vem interposto recurso.

Alegando, a Requerente concluiu: 1. A questão em causa, e que fundamenta a invocação da ilegalidade da decisão impugnada, tomada pelo Conselho Directivo do IMT em 23 de Julho de 2019, resulta de ter decorrido a caducidade do Contrato de Gestão do CITV (...), celebrado com a I., LDA, na data de 26 de Janeiro de 2017.

  1. Tal caducidade já tinha ocorrido quando o IMT solicitou à I., LDA a apresentação do Alvará de licença de obras de construção, para poder decidir sobre um pedido de prorrogação do prazo contratualmente estabelecido.

  2. Não foi proferida decisão, pelo IMT, sobre a requerida prorrogação de prazo, designadamente porque o tempo se protelou sem que a I., LDA apresentasse o solicitado Alvará de licença de obras, porque este não estava emitido, donde resulta que a prorrogação nunca foi concedida (até à deliberação agora impugnada), e não ocorreu facto constatado e assente, nomeadamente no processo administrativo do IMT, que impedisse a conclusão, sem soluções de continuidade, do prazo de caducidade.

  3. A sentença recorrida, ao escolher os factos de que se socorreu para a apreciação perfunctória da factualidade não apreciou minimamente os factos e argumentos que a Requerente apresentou na sua petição e não apreciou os termos em que o requerido IMT teve em conta e analisou os factos ou, o que é determinante, como fundamentou a sua decisão.

  4. A apreciação perfunctória dos factos efectuada na sentença é notoriamente insuficiente, mas é também contraditória ou contrária aos próprios factos como documentalmente comprovados.

  5. A decisão nem apreciou os termos em que o Requerido IMT fez as suas contas ao decurso do prazo de caducidade em causa, e ignorou os fundamentos de contestação dessa apreciação e decisão do IMT, feita pela Requerente.

  6. Ao não apreciar as questões apresentadas e sobre as quais se devia pronunciar, a sentença incorreu na nulidade prevista no artº 615º, nº 1, alínea d), do C.P.C.

  7. Ficou demonstrado nos documentos juntos ao processo administrativo e dimanados da Câmara Municipal de (...), que a Contra-interessada só em 20 de Fevereiro de 2017 obteve o deferimento do projecto de arquitectura – que não é a aprovação do licenciamento – e todo o procedimento demorou porque a I., LDA não apresentara o projecto em termos de ser aceite e deferido.

  8. O projecto de arquitectura foi aprovado em 20 de Fevereiro de 2017, depois de 26 de janeiro de 2017, data que a sentença acolheu como o dies a quo do prazo de dois anos de que a Contra-Interessada dispunha para, junto da Entidade Requerida, assegurar a aprovação do centro de inspecção técnica de veículos de (...).

  9. Ao contrário do que ficou considerado na decisão, a Câmara Municipal de (...) não dirigiu à Contra-interessada, vários pedidos de esclarecimentos e solicitação de documentos, como se de solicitações discricionárias se tratasse, e a Contra-interessada não reagiu sempre com adequada diligência.

  10. Esta factualidade não foi tida em devida conta pela sentença, que deste modo errou na apreciação da matéria de facto resultante do processo administrativo.

  11. A decisão também peca por confundir ou desconsiderar o prazo agora apreciado com o prazo (total, único e definitivo) de dois anos, estabelecido na lei e no contrato e proceder a uma análise errada do teor da lei e das regras regulamentares atinentes.

  12. A sentença assumiu, como motivo de eventual justificação em abono da Contra-interessada no atraso do procedimento de licenciamento de construção, que haveria também que ter em conta “… que, a Câmara Municipal de (...), na pendência do pedido de licença de obras de construção da edificação destinada ao centro de inspecção técnica de veículos de (...), pediu pareceres a entidades terceiras…” 14. O pedido de parecer à Comissão da Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro, resulta apenas necessário por o projecto apresentado pela Contra-interessada não corresponder em termos de implantação e acessos aos da certidão emitida pela Câmara Municipal de (...), com a qual instruiu a sua candidatura e obteve a concessão do CITV, e se correspondesse à proposta com que instruiu o contrato de gestão que veio a celebrar com o requerido IMT.

  13. Esse passo procedimental foi resultante da actuação da Contra-interessada, sendo-lhe assacável qualquer atraso que daí tenha ocorrido, mas que tampouco se mostrou com peso no atraso de todo o procedimento.

  14. A sentença assumiu também como motivo de eventual justificação em abono da Contra-interessada no atraso do procedimento de licenciamento de construção, o facto desta ter solicitado à Câmara municipal de (...), licença de obras provisória, por impossibilidade de imediata obtenção de documentos por esta pretendidos, destinados a instruir o processo de licenciamentos das obras de edificação do centro de inspecção técnica de veículos de (...).

  15. Esta constatação é duplamente inadmissível porque não há nem estão previstas na lei licenças de obras provisórias, e nunca poderia ser considerada, na sentença, ou no procedimento administrativo, uma licença provisória de construção que ultrapassasse um processo legalmente exigido, principalmente destinado a um equipamento sujeito a regras especiais e ao uso pelo público.

  16. Assim, a sentença faz uma errada interpretação da exigência legal e contratual de assegurar a aprovação do centro nos termos previstos no artigo 14.º da Lei n.º 11/2001, de 26 de abril com a redação dada pelo Decreto-Lei n.º 26/2013, de 19 de fevereiro, no prazo máximo de dois anos a contar da data de assinatura do presente contrato.

  17. Depois da obtenção do Alvará de licença de construção o Centro teria de ser construído e, só então, o concessionário – a Contra-interessada – poderá requerer a aprovação do centro de inspecção, nos termos do artigo 14º, da Lei n.º 11/2011, de 26 de Abril, na redacção do Decreto-Lei n.º 26/2013, para o que tem de requerer a vistoria a realizar pelo IMT e apresentar comprovativo, emitido pelo IPAC, I. P., de que estão reunidas as condições documentais necessárias para avançar com as fases subsequentes de avaliação do pedido de acreditação.

  18. Só então cessava o prazo estipulado de dois anos, e se podia considerar assegurada a aprovação do centro, nos termos da lei.

  19. E tudo isto tem de estar assegurado no prazo de 2 anos, seguidos, como estabelece a lei, que entendeu tal prazo como suficiente até porque o mesmo já resulta de um aumento promovido pelo Decreto-Lei n.º 26/2013.

  20. Deste modo a sentença não analisou o mais importante: saber se o prazo foi cumprido, ou se não o foi se havia fundamentos jurídicos que permitissem uma reavaliação ou ponderação do prazo, e assim não sindicou nem avaliou os termos da actuação do IMT, ou os fundamentos da sua decisão que no processo está impugnada.

  21. A sentença não podia concluir que não se perspetiva a elevada probabilidade de, em sede de acção principal, vir a Requerente a obter uma decisão de procedência da sua pretensão, porque a sentença nem analisou a decisão em causa, nem a contrapôs minimamente com a fundamentação da impugnação.

  22. Estas razões motivam e fundamentam a revogação da sentença ora recorrida e a sua substituição por uma decisão que efectivamente aprecie os termos da pretensão da Requerente e a decisão suspendenda, para concluir sobre a verificação do requisito do fumus boni iuris, nomeadamente tendo em conta o teor dos pontos 64º a 131º da petição inicial.

  23. A sentença tampouco apreciou em termos cabais a verificação do requisito do periculum in mora, tendo a Requerente alegado (nos termos do artº 120º, nº 1, do CPTA) a existência de fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado e da produção de prejuízos de difícil ou impossível reparação.

  24. O artº 118º, nº 1, do CPTA institui que, sendo o processo concluso ao juiz, pode haver lugar a produção de prova, quando este a considere necessária, mas tal deve ser entendido em conjugação com o nº 5 do mesmo artigo, que estabelece a necessidade de despacho fundamentado, para o Juiz recusar a utilização de meios de prova requeridos pela parte.

  25. Ora, não foi proferido despacho expresso sobre a prova testemunhal requerida pela Requerente, nem esta se pronunciou sobre a sua dispensa.

  26. A Requerente privada do seu direito à prova, que faz parte do direito à tutela jurisdicional efectiva, plasmado no artº 20º da Constituição da República Portuguesa, e reconhecido em várias decisões do Tribunal Constitucional.

  27. A prova testemunhal não devia ter sido excluída e resulta contraditório, na sentença, concluir que a requerente não cumpriu o ónus que sobre si impendia de demonstrar ou provar os factos integradores do periculum in mora e, ao mesmo tempo que a produção de prova lhe é impossibilitada.

  28. Tal constitui uma causa de nulidade da sentença (vide artº 615º nº 1, alínea c) do C.P.C.) porque ocorreu oposição entre a consideração de...

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