Acórdão nº 154/20 de Tribunal Constitucional (Port, 04 de Março de 2020

Magistrado ResponsávelCons. Teles Pereira
Data da Resolução04 de Março de 2020
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 154/2020

Processo n.º 993/2019

1.ª Secção

Relator: Conselheiro José António Teles Pereira

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – A Causa

1. A. (ora Recorrente) interpôs recurso par ao Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), do acórdão do Tribunal da Relação do Porto datado de 25/09/2019, que julgou improcedente a reclamação para a conferência deduzida relativamente à decisão sumária do relator que, por sua vez, rejeitou o recurso interposto de despacho do Tribunal de Execução das Penas do Porto que declarou o Recorrente contumaz.

1.1. No requerimento de interposição do recurso para o Tribunal Constitucional, o Recorrente enunciou quatro questões de inconstitucionalidade:

“[…]

1 – A norma do artigo 97.º, n.º 2, do CEP interpretada no sentido de que o pressuposto para a declaração de contumácia de o arguido se eximir dolosamente à execução da prisão subsidiária resultante da conversão da pena de multa se tem por preenchido se ao arguido tiver sido enviada a notificação do despacho da conversão da pena de multa em prisão subsidiária para a morada do TIR, e o arguido a não ter recebido por aí se não encontrar, é inconstitucional por violação do processo equitativo consagrado no artigo 20.º, n.º 4, “in fine”, da Constituição da República Portuguesa.

2 – A norma do artigo 97.º, n.º 2, do CEP interpretada no sentido de que o Tribunal da Execução das Penas se limita a declarar a contumácia em face à certificação do Tribunal da condenação do transito em julgado do despacho que decidiu a conversão da pena de multa em prisão subsidiária, sem que tenha de verificar se está preenchido o pressuposto da declaração de contumácia de o arguido se eximir dolosamente à execução da prisão subsidiária, é inconstitucional por violação do princípio do contraditório e da proibição da indefesa com consagração na constituição da República.

3 – A norma do artigo 97.º, n.º 2, do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade, aprovado pela Lei n.º 115/2009, de 12 de outubro, interpretada no sentido de que é aplicável a declaração de contumácia aos casos de pena de prisão subsidiária, resultante da conversão de pena principal de multa, é inconstitucional por violação do disposto nos artigos 18.º, n.º 2, e 26.º, n.º 1, da CRP.

4 – A norma do artigo 420.º, n.º 3, do CPP, na interpretação segundo a qual deve haver lugar a um agravamento de sancionamento da taxa de justiça como efeito moralizador e dissuasor da utilização do recurso, é inconstitucional por violação do princípio do acesso ao direito consagrado na Constituição da República.

[…]”.

1.2. No Tribunal Constitucional, foi proferida a Decisão Sumária n.º 772/2019, não impugnada pelo Recorrente, na qual se decidiu: (a) não conhecer do recurso quanto à primeira, segunda e quarta questões de constitucionalidade erigidas como objeto do recurso; e (b) determinar a notificação das partes para efeito de prolação de alegações quanto à norma contida no artigo 97.º, n.º 2, do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade, aprovado pela Lei n.º 115/2009, de 12 de outubro (doravante, CEPMPL), interpretado no sentido de que é aplicável a declaração de contumácia aos casos de pena de prisão subsidiária, resultante da conversão de pena principal de multa.

1.2.1. O Recorrente apresentou alegações que culminaram nas seguintes conclusões:

“[…]

1) No caso sub judice, a pena aplicada foi uma pena de multa, posteriormente convertida em pena de prisão subsidiária.

2) A prisão subsidiária resultante da conversão da pena principal de multa não cabe na previsão do artigo 97.º, n.º 2, do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade, aprovado pela Lei n.º 115/2009, de 12 de outubro.

3) Efetivamente, não se pôde afirmar que a declararão de contumácia esteja prevista na lei para as situações de prisão subsidiária, sem que isso implique um raciocínio de analogia ou um alargamento da letra da lei.

4) Por força do princípio da legalidade, é necessário que se esteja perante a execução de pena de prisão ou medida (de segurança) de internamento para que mereça aplicabilidade a declaração do agente como contumaz.

5) O n.º 2 do artigo 97.º do CEPMPL constitui intrusão em direitos, liberdades e garantias (direito à capacidade civil conforme o n.º 1 do artigo 26.º da Constituição da República) apenas consentida em face a um interesse legitimador específico (cfr. n.º 3 do artigo 18.º da Constituição da República).

6) A prisão subsidiária resultante da conversão da pena principal de multa ao abrigo do artigo [49.º] do CP, tem natureza e regime diferente, ou seja, um regime próprio e específico de execução relativamente a uma verdadeira pena de prisão aplicada a título principal.

7) Por conseguinte, as diferenças de natureza e de regime entre a pena de prisão primária e a pena de prisão subsidiária conduzem a que a declaração de contumácia decorrente do n.º 2 do artigo 97.º do CEPMPL apenas se aplica àquela e já não a esta.

8) Assim pois mesmo com a conversão da pena de multa em prisão subsidiária como forma de constrangimento de cumprimento daquela, a natureza da pena de multa mantém-se, ou seja, conserva a sua natureza originária de pena de multa.

9) Pelo que a norma do artigo 97.º, n.º 2, do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade aprovado pela Lei n.º 115/2009, de 12 de outubro, na interpretação no sentido de que o Tribunal de Execução das Penas se encontra legalmente habilitado a proferir despacho de declarado de contumácia, com os efeitos que podem decorrer dessa declaração, nos casos de pena de prisão subsidiária resultante da conversão de pena de multa não cumprida ofende princípios consagrados na Constituição da República.

Assim, e com o douto suprimento de V.as Ex.as, e no provimento do recurso, deve ser julgada inconstitucional a norma do artigo 97.º, n.º 2, do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da...

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