Acórdão nº 159/20 de Tribunal Constitucional (Port, 04 de Março de 2020

Magistrado ResponsávelCons. Teles Pereira
Data da Resolução04 de Março de 2020
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 159/2020

Processo n.º 1192/2019

1.ª Secção

Relator: Conselheiro José António Teles Pereira

Acordam, em Conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – A Causa

1. A., CRL, instaurou, no Juízo Central Cível de Viana do Castelo, uma ação declarativa comum, que ali correu termos com o número 4206/16.2T8VCT, contra B., C., D. e E. (ora Recorrentes). Pediu a declaração de que é proprietária de certo prédio urbano, bem como a condenação dos Réus a demolirem muros nele edificados e a pagarem-lhe uma indemnização. Os Réus contestaram e deduziram reconvenção, pedindo a declaração de propriedade sobre o imóvel a seu favor.

1.1. A ação culminou na prolação de sentença, em primeira instância, datada de 09/07/2018, na qual se decidiu declarar que a Autora é a legítima proprietária do prédio urbano”, condenar os Réus a “absterem-se da prática de atos de violem, perturbem ou diminuam tal direito, e bem assim a restituírem o prédio à Autora respeitando a sua composição (designadamente quanto às parcelas com que ilicitamente se apropriaram), condenando-se os Réus na demolição dos dois muros ilicitamente construídos no prédio urbano da Autora e a retirar do local todos os materiais correspondentes a tal demolição, no prazo de 15 dias após o trânsito em julgado da presente sentença” e julgar improcedente a reconvenção.

1.1.1. Desta decisão apelaram os Réus para o Tribunal da Relação de Guimarães, que, por acórdão de 07/03/2019, julgou improcedente o recurso.

1.1.2. Os Réus pretenderam, então, interpor recurso de revista excecional para o Supremo Tribunal de Justiça.

1.1.3. No STJ, foi proferido acórdão, datado de 12/09/2019, pela formação a que se refere o artigo 672.º, n.º 3, do CPC, no sentido da não admissão da revista excecional.

1.1.4. Desta decisão reclamaram os Réus. Da reclamação consta, designadamente, o seguinte:

“[…]

VIII. Ora, tendo em conta que a questão em apreço, por se tratar do direito à habitação dos recorridos, estando perante uma ação que põe em causa o direito à propriedade dos recorrentes, é de extrema relevância no comércio jurídico, pelo não restam dúvidas que a apreciação da mesma por esta instância se reveste de particular importância para a melhor aplicação do direito.

IX. Efetivamente, o direito à habitação, tal como está consagrado na Constituição, não terá um mínimo de garantia se as pessoas não tiverem a possibilidade de conseguir habitação própria em condições compatíveis com os rendimentos das famílias, cumprindo ao Estado – enquanto sujeito passivo do direito à habitação – adotar os necessários instrumentos de satisfação ou de concretização do direito em questão, entre os quais está a criação de um regime de facilitação do acesso à habitação própria.

X. Numa outra perspetiva, a norma em questão põe em causa a concretização do direito fundamental consagrado no n.º 1 do artigo 36.º da Constituição, pois esta norma constitucional determina que todos têm o direito de constituir família e de contrair casamento em condições de plena igualdade, sendo que a aquisição de casa própria reveste especial importância neste âmbito.

XI. Assim, não restam dúvidas que a apreciação da questão inerente aos presentes autos se reveste de particular importância para a melhor aplicação do direito.

XII. Aplicação que se pugna e requer com a presente reclamação.

[…]”.

1.1.5. A reclamação foi indeferida por acórdão de 31/10/2019, no qual se considerou, designadamente, que a decisão anterior, de 12/09/2019, é definitiva, não sendo suscetível de reclamação ou recurso.

1.2. Os Réus interpuseram, então, recurso para o Tribunal Constitucional – o qual deu origem aos presentes autos – ao abrigo da alínea c) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC (cfr. requerimento de interposição de recurso de fls. 448 e ss., que aqui se dá por integralmente reproduzido).

1.2.1. O recurso foi admitido no STJ, com efeito devolutivo.

1.3. No Tribunal Constitucional, foi proferida decisão sumária, pelo relator, nos termos do artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, no sentido do não conhecimento do objeto do recurso, com os fundamentos seguintes:

“[…]

2. Descrito sumariamente o iter processual, tendo-se destacado os trechos relevantes para a presente decisão, há que apreciar, à partida, a admissibilidade do recurso de constitucionalidade pretendido interpor, sendo certo que a decisão, proferida no Tribunal a quo, no sentido da sua admissão, não vincula o Tribunal Constitucional (artigo 76.º, n.º 3, da LTC).

2.1. Antes de mais, importa notar que os Recorrentes interpõem recurso ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea c), da LTC (cfr. ponto 37. do requerimento de interposição do recurso para o Tribunal Constitucional, a fls. 452).

Nos termos da indicada alínea, cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que recusem a aplicação de norma constante de ato legislativo, com fundamento na sua ilegalidade por violação de lei com valor reforçado.

A “ilegalidade”, para os efeitos ali previstos, deve ser entendida com um sentido específico de relação entre atos legislativos de diferente valor, que o Tribunal vem realçando – cfr., inter alia, a...

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