Acórdão nº 078/19.3BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 20 de Maio de 2020

Magistrado ResponsávelSUZANA TAVARES DA SILVA
Data da Resolução20 de Maio de 2020
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1. A………., S.A., com os sinais dos autos, vem, nos termos do artigo 25.º, n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem Voluntária (RJAT), interpor recurso para uniformização de jurisprudência para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo da decisão arbitral n.º 28/2019-T, proferida em 9 de Setembro de 2019, pelo Centro de Arbitragem Administrativa, por considerar que esta decisão colide com o decidido na decisão arbitral n.º 124/2018-T, de 2 de Outubro de 2018, apresentando, para tanto, alegações que conclui do seguinte modo: I. O presente recurso para uniformização de jurisprudência vem interposto da decisão arbitral, datada de 9 de Setembro, proferida no Processo n.º 28/2019-T no qual a ora Recorrente peticionou a anulação das autoliquidações referentes aos exercícios de 2015 e 2016, respectivamente, e da decisão de indeferimento, proferida pelo Exmo. Sr. Director da Direcção de Finanças de Évora, em 10.10.2018, da revisão dos actos de liquidação de IRC de 2015 e 2016, visando a dedução à colecta dos benefícios fiscais decorrentes do SIFIDE no valor de €62.546,55 e €62.891,29, respectivamente, correspondentes à tributação autónoma apurada.

II. Conforme o n.º 2 do artigo 25.º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, o recurso para o Supremo Tribunal Administrativo de decisão arbitral pressupõe, designadamente, que se verifique, entre a decisão arbitral recorrida e a decisão arbitral ou acórdão invocado como fundamento, oposição quanto à mesma questão fundamental de direito não devendo, ainda, o recurso ser admitido se, não obstante a existência de oposição, a orientação perfilhada no acórdão impugnado estiver de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo (cfr. o n.º 3 do artigo 152.º do CPTA, aplicável ex vi do disposto no n.º 3 do artigo 25.° do RJAT).

III. Encontram-se preenchidos os pressupostos para a admissibilidade do recurso porquanto, face à mesma questão fundamental de direito, a de saber se os montantes dedutíveis dos benefícios fiscais previstos no SIFIDE II podem ser deduzidos à colecta de IRC derivada de tributações autónomas, à luz dos artigos 88.º e 90.º do CIRC, a decisão recorrida encontram-se em manifesta contradição com a decisão arbitral de 02 de Outubro de 2018, proferida no Processo n.º 124/2018-T - e que constitui a decisão fundamento do presente recurso.

IV. Por outro lado, desconhece-se jurisprudência recentemente consolidada deste Supremo Tribunal Administrativo no sentido perfilhado da decisão arbitral recorrida.

V. A decisão arbitral recorrida padece de erro de julgamento por errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 90.º do CIRC.

VI. Com efeito, enquanto que na decisão fundamento se considerou que “o artigo 90.º do CIRC refere-se às formas de liquidação do IRC, pelo sujeito passivo ou pela Administração Tributária, aplicando-se ao apuramento do imposto devido em todas as situações previstas no Código.

Por isso, aquele artigo 90.º aplica-se também à liquidação do montante das tributações autónomas, que é apurado pelo sujeito passivo ou pela Administração Tributária, na sequência da apresentação ou não de declarações, não havendo, com vigência no ano de 2014, qualquer outra disposição que preveja termos diferentes para a sua liquidação”, na decisão arbitral recorrida ficou dito que “tendo em conta a compreensão racional, histórica e sistemática da norma em questão, torna-se forçoso interpretar correctivamente a norma do artigo 90.º, n.º 2 do CIRC aplicável, de modo a restringir a remissão que faz para o n.º 1 da mesma norma, na referência que faz “Ao montante apurado nos termos do número anterior”, limitando-a ao montante da colecta de IRC calculada mediante a aplicação das taxas do artigo 87.º à matéria colectável apurada de acordo com as regras do capítulo III do Código, e já não aos montantes apurados a título de tributações autónomas, assim se devolvendo à norma o seu sentido original, que era o que correspondia à sua redacção textual antes da introdução das tributações autónomas no CIRC”.

VII. Erradamente porquanto a tentativa da decisão arbitral recorrida de fazer uma interpretação correctiva ou restritiva do artigo 90.º do CIRC encontra como obstáculo os princípios da legalidade e da certeza jurídicas que, atentadas as especificidades da relação jurídica tributária, devem ser particularmente acautelados.

VIII. Mas encontra igualmente um obstáculo interpretativo porquanto teor literal do n.º 2 do artigo 90.º do CIRC, não resulta qualquer obstáculo à aplicação das deduções à parte do montante apurado nos termos do n.º 1 derivado de tributações autónomas.

IX. Esse é, de resto, o entendimento prevalecente no sentido da consideração de que com a Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março, que aditou ao artigo 88.º do CIRC um n.º 21, passou a existir uma norma em que se afasta a possibilidade de aplicação das deduções previstas no n.º 2 do artigo 90.º do CIRC ao montante apurado com tributações autónomas.

X. Ou seja, com referência ao período temporal anterior, a letra do n.º 2 do artigo 90.º do CIRC apontava no sentido da aplicação das deduções à colecta resultante das tributações autónomas.

XI. Inexistem fundamentos para qualquer interpretação restritiva do artigo 90.º, n.º 2 do CIRC porquanto deverá considerar-se que sendo as tributações autónomas previstas no CIRC, em última análise, formas indirectas de tributar o rendimento empresarial, não se vê que haja necessariamente incompatibilidade entre elas e as regras gerais que prevêem a forma de efectuar a liquidação de IRC.

XII. E, no presente recurso, a conclusão a que se chega encontra justificação nos diplomas que aprovaram o SIFIDE e o SIFIDE II não referem que os créditos aí previstos são dedutíveis a toda e qualquer colecta de IRC, antes definem o âmbito da dedução aludindo, nos n.º 1 dos seus artigos 4.º, “ao montante apurado nos termos do artigo 83.º do Código do IRC, e até à sua concorrência” e ao e “ao montante apurado nos termos do artigo 90.º do Código do IRC, e até à sua concorrência”.

XIII. Assim, a decisão arbitral recorrida centra-se num esforço interpretativo do n.º 2 do artigo 90.º do CIRC mas olvida por completo a natureza especial prevista na Lei n.º 55-A/2010.

XIV. O elemento literal dos artigos 4.º do SIFIDE I e do SIFIDE II é inequívoco no sentido de a dedução se aplicar também à colecta de IRC derivada de tributações autónomas a apurada nos termos do artigo 90.º do CIRC.

XV. O elemento literal é apoiado pela consideração de que sendo as normas que criam benefícios fiscais de natureza excepcional as mesmas devem ser interpretadas nos seus precisos termos, apenas sendo admitida a interpretação extensiva da mesma.

XVI. É precisamente aqui que falha a decisão recorrida ao considerar que “Não está, por outro lado, em causa uma interpretação correctiva (ou restritiva) do regime do benefício fiscal- SIFIDE - mas do art. o 90.º, como se viu, para o qual aquele remete. Dito de outro modo, não se está a corrigir ou restringir o texto normativo do art.º 4.º da Lei n.º 55-A/2010, mas o do art.º 90.º do CIRC (nos termos previamente expostos), cujos termos aquele primeiro impõem que sejam observados”.

XVII. Não se percebe a premissa lógica da decisão arbitral recorrida uma vez que ao remeter para o artigo 90.º do CIRC ao fazer-se uma interpretação restritiva deste estar-se-á quase que automaticamente a corrigir ou interpretar a Lei n.º 55-A/2010.

XVIII. E ao aceitar-se a interpretação vertida na decisão recorrida estaria posto em causa o próprio espírito legislativo subjacente à dedutibilidade do benefício fiscal do SIFIDE I e do SIFIDE II à colecta das tributações autónomas.

XIX. Ou seja, nesta sede, não se pode fazer uma interpretação isolada do artigo 90.º do CIRC sem atendar que, neste recurso, terá de acautelar-se a coerência lógica e sistemática que a sua convocação pela Lei n.º 55-A/2010 exige.

XX. Ao ser a solução legislativamente consagrada deverá considerar-se a mesma como a mais acertada atendendo ao princípio geral previsto no n.º 3 do Código Civil de que “Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados”.

XXI. O SIFIDE ao estabelecer um regime de natureza excepcional, visou prosseguir determinados interesses públicos, os quais não podem ser derrogados pelo intérprete sob pena de, na prática, ser retirado um incentivo que encontra justificação legislativa nas finalidades de natureza económica dos incentivos à investigação.

XXII. É essa mesma natureza excepcional que reclama que não seja atribuída relevância à norma do n.º 21 do artigo 88.º do CIRC, aditado pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março, na parte em que se refere que não são “efetuadas quaisquer deduções ao montante global apurado”, apesar da pretensa natureza interpretativa que lhe foi atribuída.

XXIII. O legislador não deu qualquer indicação de que, com o aditamento no artigo 88.º do CIRC de uma norma geral proibindo deduções ao montante global apurado de tributações autónomas, se pretendesse interpretar restritivamente a expressão “deduzir ao montante apurado nos termos do artigo 90.º do Código do IRC” que consta de normas especiais de diplomas avulsos, como são o SIFIDE I e o SIFIDE II.

XXIV. A correcta compreensão da questão decidenda leva-nos à consideração de que o n.º 21 do artigo 88.º do CIRC, na redacção da Lei n.º 7-A/2016 é materialmente inconstitucional na medida em que sejam interpretados como afastando o direito à dedução à colecta de IRC derivada de tributações autónomas que resulta de investimentos abrangidos pelo SIFIDE I e pelo SIFIDE II, efectuados antes da sua entrada em vigor.

XXV. Bem se vê o desacerto da decisão arbitral recorrida porquanto convergindo os elementos literal e racional da interpretação do...

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