Acórdão nº 819/19.9BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 30 de Abril de 2020

Magistrado ResponsávelCARLOS ARAÚJO
Data da Resolução30 de Abril de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul 1 – RELATÓRIO B... FARMACÊUTICA, LDA, inconformada com o acórdão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que julgou improcedente o pedido cautelar de adopção de providência de suspensão do acto, intentado contra a ADMINISTRAÇÃO CENTRAL DO SISTEMA E SAÚDE, IP, tendo por objecto a suspensão da decisão de emissão de certidão de dívida e respectiva remessa para a Autoridade Tributária e Aduaneira para cobrança coerciva, dela veio interpor o presente recurso jurisdicional.

Formula, para tanto, as seguintes conclusões: “A. O presente recurso vem interposto da douta sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que julgou improcedente o pedido de adoção de uma providência cautelar de suspensão de eficácia de ato administrativo, por referência à comunicação enviada pela Recorrida à Recorrente, datada de 15 de abril de 2019, de acordo com a qual seria emitida uma certidão de dívida, caso a Recorrente não pagasse os montantes alegadamente em dívida, que seria posteriormente remetida à Autoridade Tributária para que se iniciasse um processo de cobrança coerciva da dívida.

  1. O processo de execução fiscal instaurado nestes termos poderá causar prejuízos irreparáveis (ou de difícil reparação) na esfera jurídica da Requerente, por levar à irregularidade da sua situação tributária, e, consequentemente, a uma situação de impedimento de participação em procedimentos de contratação pública.

  2. As garantias de suspensão da execução que existem em sede de execução fiscal não podem afastar a possibilidade de se adotar uma medida cautelar, dado que não são adequadas a dar resposta a essa pretensão da Recorrente, devendo a verificação dos requisitos da adoção de providências cautelares ser feita por referência ao próprio ato objeto do pedido de suspensão.

  3. Ademais, existem diferenças entre os objetivos da providência cautelar e da suspensão da cobrança coerciva: uma pretende a suspensão do efeito do ato e a outra pretende a suspensão do processo de execução fiscal, sendo estas situações completamente distintas.

  4. A possibilidade de apresentar oposição à execução fiscal, prestar garantia, ou requerer a dispensa da prestação de garantia não exclui a necessidade de existir, antecipadamente, uma tutela diretamente relacionada com o próprio ato administrativo causador de danos na esfera jurídica da Recorrente.

  5. A própria execução fiscal consubstancia um prejuízo decorrente da permanência da decisão na ordem jurídica – uma sua consequência – que é precisamente aquilo que se pretende prevenir com a adoção de tutela cautelar.

  6. Não pode a Autoridade Tributária assumir a responsabilidade por decidir se suspende ou não um ato, quando essa é uma decisão que deve ser tomada pelo Tribunal.

  7. Adicionalmente, o recurso aos meios de defesa e de suspensão da cobrança existentes em sede de execução fiscal é uma solução manifestamente incompatível com as necessidades e com os direitos da Recorrente.

    I. Isto porque, quer o pedido de suspensão da execução fiscal aconteça antes ou após a apresentação de reclamação graciosa, impugnação judicial, recurso judicial ou oposição à execução, estará sempre sujeito à constituição de uma garantia.

  8. Sendo também implausível sujeitar a Recorrente à decisão que for tomada pela Autoridade Tributária no âmbito do pedido de dispensa da prestação de garantia, uma vez que essa é uma decisão tomada discricionariamente pela Autoridade Tributária, que não permite assegurar ao executado que a sua situação tributária se manterá regularizada.

  9. A própria prestação de garantia é, ainda, manifestamente onerosa, porque deverá corresponder ao valor da dívida exequenda, acrescida de juros de mora e de 25% do valor desses montantes, o que atendendo aos montantes em causa ascenderá a valores superiores a dois milhões de euros.

    L. A decisão recorrida é, assim, claramente excessiva principalmente quando comparada a uma forma mais rápida, menos custosa e mais apropriada de fazer suspender os efeitos do ato suspendendo: a concessão de uma providência cautelar.

  10. Finalmente, considerando as várias opções em sede de execução fiscal, bem como as várias vicissitudes inerentes à prestação de garantia, a Recorrente, na veste de Executada, poder-se-á ver privada, expectavelmente durante um período de quase quatro meses, período durante o qual a sua situação tributária não estará regularizada para efeitos de contratação pública.

  11. Pelo que, desta perspetiva, não é possível que os meios de garantia existentes em execução fiscal protejam a Recorrente da criação de um dano irreparável, ou de difícil reparação.

  12. Em rigor, apenas a concessão da tutela cautelar requerida será idónea a evitar a produção de prejuízos de difícil reparação para a Recorrente, que se traduzem na instauração de um processo de execução fiscal, na necessidade de apresentação de oposição e de prestação de garantia por parte da Recorrente e na praticamente certa inviabilidade de participação em procedimentos de contratação pública durante um hiato temporal que poderá ser extenso, com a necessária impossibilidade de fornecimento de medicamentos, por parte da Recorrente, mormente às instituições do Serviço Nacional de Saúde.

  13. A decisão recorrida incorre, por todos os motivos acima expostos, em manifesto erro de julgamento, não podendo ser mantida, razão pela qual se impõe seja a mesma revogada e substituída por outra que julgue procedente o pedido cautelar de adoção da providência de suspensão do ato.

    Nestes termos e nos demais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, requer-se a V. Exas. se dignem julgar o presente recurso procedente, por provado, sendo a sentença recorrida revogada e substituída por outra que julgue procedente o pedido cautelar de adoção da providência de suspensão do ato, pois só assim se fará a acostumada Justiça!” * A ADMINISTRAÇÃO CENTRAL DO SISTEMA E SAÚDE, IP, apresentou contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso interposto e pela manutenção da sentença.

    * O Digno Magistrado do MºPº junto deste Tribunal, foi regularmente notificado.

    * Dispensados os vistos legais, cumpre decidir.

    2 - FUNDAMENTAÇÃO 2.1. De facto É a seguinte a decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida: “

  14. Em 14.05.2012 foi celebrado um Acordo entre os Ministérios da Saúde, da Economia e do Emprego e das Finanças e a Indústria Farmacêutica, que aqui se dá por integralmente reproduzido e onde consta, nomeadamente, o seguinte: «(…) Cláusula 2.ª Âmbito O presente Acordo regula os termos e as condições em que os Ministérios das Finanças (…), da Economia e Emprego (…) e da Saúde (…) e a Indústria Farmacêutica, por via das empresas aderentes cujo instrumento de adesão se encontre depositado junto do INFARMED nos termos previstos na cláusula 9.ª do presente Acordo, se comprometem para que os objectivos orçamentais para os anos de 2012 e 2013 com a despesa com medicamentos em ambulatório e hospitalar sejam alcançados.

    Cláusula 3.ª Objectivos financeiros 1 – (…) 2 – As empresas aderentes ao presente Acordo, num esforço adicional de cooperação com o Estado Português, aceitam colaborar numa redução da despesa no valor de 300 milhões de euros, face aos valores verificados no ano de 2011, sendo os valores de diminuição da despesa pública do mercado hospitalar de 170 milhões de euros e do mercado ambulatório de 130 milhões de euros.

    3 – (…) 4 – (…) Cláusula 4.ª Controle da Despesa 1 – O objectivo de despesa pública com medicamentos definido na Cláusula 3.ª para o ano de 2012 é fixado em 2038 milhões de euros, tendo como referenciais de despesa em mercado hospitalar 842 milhões de euros e em mercado ambulatório 1196 milhões de euros.

    2 – Para o ano de 2013, o objectivo de despesa pública com medicamentos será definido pelo Ministério da Saúde em conformidade com os compromissos estabelecidos pelo Governo no âmbito do Programa de Assistência Económica e Financeira (PAEF).

    Cláusula 5.ª Contributo da Indústria Farmacêutica para a contenção da despesa em medicamentos 1 – Nos termos do presente Acordo, a Indústria Farmacêutica compromete-se a colaborar com o Estado Português no esforço de sustentabilidade da despesa pública em medicamentos nos anos de 2012 e 2013, mediante o pagamento de uma contribuição a prestar pelas empresas aderentes, na parte que exceder os objectivos de despesa pública com medicamentos definidos na cláusula 4.ª.

    2 – Caso os objectivos de despesa pública com medicamentos no Serviço Nacional de Saúde, inscritos nos Orçamentos de Estado para 2012 e 2013 e previstos na Cláusula 4.ª, seja alcançados, não haverá lugar a contribuição da Indústria Farmacêutica, mesmo que a diminuição da despesa pública do mercado hospitalar ou do mercado ambulatório seja inferior aos valores previstos na referida cláusula.

    3 – Os mecanismos da repartição da Contribuição pelas empresas da Indústria Farmacêutica e os critérios de dedução dos encargos de Investigação e Desenvolvimento serão especificados no momento da adesão das empresas, nos termos da cláusula 9.ª, e farão parte integrante do presente Protocolo.

    (…) Cláusula 9.ª Adesão pelas empresas da Indústria Farmacêutica 1 – A adesão ao Acordo, por parte de cada empresa titular de autorização de introdução no mercado de medicamentos comercializados, é formalizada mediante declaração escrita e inequívoca nesse sentido, sem ressalvas ou reservas.

    2 – (…) 3 – A A... fará entrega no INFARMED, IP, das declarações de adesão nos termos dos números anteriores.

    (…) Cláusula 20.ª Acompanhamento da execução do Acordo 1 – Para efeitos da concretização e monitorização do presente Acordo é criada uma Comissão de Acompanhamento composta por um representante do Ministério das Finanças, dois do Ministério da Economia e do Emprego, três do Ministério da Saúde, um dos quais presidirá, e três da Indústria Farmacêutica, podendo ainda o Ministério da Saúde e a Indústria...

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