Acórdão nº 01227/17.1BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 30 de Abril de 2020

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução30 de Abril de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório I., devidamente identificado nos autos, no âmbito da ação administrativa intentada contra a Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores, inconformado com a Sentença proferida em 4 de fevereiro de 2019, no TAF do Porto, que julgou verificada “a exceção da inimpugnabilidade da deliberação impugnada”, e que, consequentemente declarou “a absolvição do Réu da instância”, veio em 11 de março de 2019 Recorrer Jurisdicionalmente da referida Sentença.

Formula a aqui Recorrente nas suas alegações de recurso as seguintes conclusões: “A. A Sentença recorrida ignora, em absoluto, um facto fundamental para a decisão tomada, que conclui pela caducidade do direito da ação da Recorrente – a notificação do ato impugnado referia, expressamente, o seguinte: “Da presente deliberação cabe: Impugnação contenciosa para os Tribunais Administrativos nos termos do CPTA, no prazo de 3 meses a contar da presente notificação, no caso de atos anuláveis” (cf. DOC. 1 junto com a P.I.) B. Por isso, consta do processo um documento que, só por si, implica necessariamente decisão diversa da proferida, o que se argui nos termos e para os efeitos do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 616.º do CPC, obrigando à reforma da Sentença.

  1. O teor literal de tal documento obriga à aplicação do disposto da alínea b) do n.º 3 do artigo 58.º do Código de Processo dos Tribunais Administrativos e Fiscais, uma vez que é evidente que, no caso concreto, a tempestiva apresentação da petição não era exigível à Recorrente, enquanto cidadã normalmente diligente, em virtude de a conduta da Administração – expressa na indicação constante do referido documento quanto ao prazo da impugnação – a ter induzido em erro quanto ao prazo de impugnação.

  2. O direito de ação da Autora também não haveria caducado, pois, atenta a conduta da Ré com o texto da citada notificação, verifica-se a hipótese da alínea c) do n.º 3 do artigo 58.º do CPTA: no momento da impugnação – em 23.05.2017 –, (i) ainda não tinha decorrido um ano sobre a data da prática do ato impugnado (em 28.12.2016); (ii) o atraso na impugnação (de menos de 2 meses) deve ser considerado desculpável, atendendo às dificuldades que, no caso concreto, se colocavam quanto à identificação do ato impugnável; (iii) dificuldades essas a que a própria Recorrida deu causa (o que, aliás, torna a alegação da exceção por parte da Recorrida uma insuportável violação do princípio da boa-fé administrativa, na modalidade de venire contra factum proprium, a que, infelizmente, o Tribunal a quo deu guarida).

  3. É evidente que o ofício através do qual a Recorrida notificou a Recorrente do ato impugnado nos presentes autos, obrigava Tribunal a quo a necessariamente proferir decisão diversa da constante do Despacho Saneador-Sentença, muito concretamente, a aplicar, no âmbito da suscitada exceção de caducidade do direito de ação da Recorrente, as normas especiais que regulam os prazos de impugnação dos administrativos, nomeadamente: (i) aplicando o disposto na alínea b) do n.º 3 do artigo 58.º do CPTA, ou, subsidiariamente, o disposto alínea c) da mesma disposição processual; (ii) e nunca aplicando o disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 58.º do CPTA.

  4. No caso de o Tribunal a quo não proceder, como deve, à reforma da Sentença recorrida, então a decisão recorrida será ilegal por se verificar flagrante erro de julgamento na aplicação ao caso sub iudice da alínea b) do n.º 1 do artigo 58.º do CPTA.

  5. Atento o teor do DOC. 1 junto com a Petição Inicial – do qual resulta, literalmente, a indicação da Recorrida de que se aplicaria um prazo de três meses contado daquele ato pretensamente confirmativo –, constitui flagrante erro de julgamento a aplicação da sobredita norma, que impõe um prazo-regra de três meses.

  6. Era legalmente obrigatório para o Tribunal a quo aplicar ao caso sub iudice a norma especial da alínea b) do n.º 3 do artigo 58.º do CPTA, uma vez que, em face da indicação literal constante do DOC. 1 junto com a Petição Inicial – que manifesta e deliberadamente induziu a Recorrente em erro quanto ao prazo de impugnação –, não se mostrava exigível que a Recorrente apresentasse a petição no prazo-regra de três meses, mas apenas após a cessação do erro em que a Recorrida a induziu.

    I. Assim, incorreu o Tribunal a quo em erro de julgamento, violando, com a decisão quanto à procedência da exceção de inimpugnabilidade, alínea b) do n.º 3 do artigo 58.º do CPTA.

  7. Subsidiariamente e para o caso de assim não se entender – o que verdadeiramente não se antecipa –, sempre ocorreria erro de julgamento por não aplicação da norma especial da alínea c) do n.º 3 do artigo 58.º do CPTA, uma vez que o caso sub iudice sempre se encontraria, no limite, dentro do âmbito de aplicação da referida norma dado que: (i) “não tendo decorrido um ano sobre a data da prática do ato” no momento da sua impugnação – já que a impugnação ocorreu a 23.05.2017 e o ato pretensamente impugnável é de 28.12.2018 –, (ii) o atraso na impugnação – que a Recorrente concretizou, em sede de Réplica, num pedido subsidiário de correção ao pedido – deveria, nos termos da 2.ª parte da alínea c) do n.º 3 do artigo 58.º do CPTA, “ser considerado desculpável, atendendo (…) às dificuldades que, no caso concreto, se colocavam quanto à identificação do ato impugnável”, dificuldades essas que decorrem do teor literal da notificação da Recorrente.

  8. Ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo violou também a sobredita alínea c) do n.º 3 do artigo 58.º do CPTA.

    L. Se não for dado provimento ao pedido de reforma do Despacho Saneador-Sentença, ocorrerá, necessariamente, nulidade do Despacho Saneador-Sentença, resultante do facto de o Tribunal a quo não se ter pronunciado sobre uma questão que deveria necessariamente apreciar: a invocada nulidade do ato impugnado, arguida na Réplica (cf. artigos 7.º a 12.º).

  9. A errada indicação sobre o prazo de impugnação contenciosa constante do ofício de notificação do ato impugnado (cf. DOC. 1 junto com a Petição Inicial), por estar em causa um ato que a Recorrida sabia ser meramente confirmativo e, por isso, sujeito à limitação do n.º 1 do artigo 53.º do CPTA, em vez de ao n.º 1 do artigo 58.º do mesmo Código, implica uma nulidade do ato impugnado: violação do conteúdo essencial do direito de ação, assegurado legal (artigo 2.º do CPTA) e constitucionalmente (artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa), o que redunda na nulidade prevista na alínea d) do n.º 2 do artigo 161.º do Código de Procedimento Administrativo.

  10. Além disso, essa causa de nulidade é, por si só, razão para desaplicar aquela disposição do CPTA que determinou a verificação da exceção de caducidade de direito de ação, uma vez que “a impugnação de atos nulos não está sujeita a [qualquer] prazo”, nos termos do n.º 1 do artigo 58.º do CPTA.

  11. Pelo que, tendo omitido pronúncia relativamente à nulidade imputada ao ato impugnado – que impedira a decisão de procedência da exceção de inimpugnabilidade desse ato – se verifica nulidade do Despacho Saneador-Sentença.

  12. Se, por motivo que verdadeiramente não se antecipa, não for dado provimento à invocação da nulidade da Sentença, ocorrerá, pelas mesmas...

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