Acórdão nº 02193/18.1BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 30 de Abril de 2020

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução30 de Abril de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo do Norte: I. RELATÓRIO 1.1. M., S.A.

pessoa coletiva nº (…), com sede na Rua (…), (…), (…), moveu ação administrativa contra o MUNICÍPIO DE (...), com sede na Rua (…), (…), pedindo a condenação do Réu: a) i- a promover, pela forma própria e junto da C.G.D., a extinção da garantia bancária nº 2503.008656, em prazo a indicar por esse Tribunal, reputando a Autora como suficiente e adequado o prazo de 10 dias.

ii- caso a Ré não cumpra com o peticionado na alínea anterior, no prazo que lhe for fixado, que a Ré seja também condenada a pagar à Autora uma sanção pecuniária compulsória, à razão de €106,80 por cada dia de atraso no cumprimento dessa mesma obrigação; b) a pagar-lhe a quantia global de €12.518,12 a título de retenções não devolvidas e custos suportados com garantias bancárias, acrescida do valor das comissões que a Autora vier a suportar até à extinção da garantia bancária identificada na alínea a) do presente pedido; c) a pagar-lhe a quantia total de €19.860,06 a título de juros vencidos e liquidados até à presente data e ainda a pagar os juros vincendos até efetivo e integral cumprimento das obrigações a que subjazem e ainda, d) a pagar-lhe a quantia de €40,00 a título de indemnização pelos custos com a presente cobrança nos termos do artigo 7º do D.L. 62/2013 de 10 de maio.

Alegou, para o efeito, em síntese, que a 23/07/2007, celebrou um contrato de consórcio externo com a sociedade “N., Lda.”, e que entre este consórcio e o Réu, a 09/05/2007, foi celebrado um contrato de empreitada referente à obra “Requalificação Urbana da Avenida 5 de Outubro”.

No âmbito do referido contrato, prestou uma garantia bancária- número 13202- no valor de € 34.509,16, tendo a obra em causa sido executada e recebida, provisoriamente em junho de 2008 e, definitivamente, em 2016.

Não obstante ter ocorrido a receção da obra, o Réu não procedeu à liberação da garantia prestada, a qual, porém foi cancelada pela entidade bancária em 30.04.2018, mas não tendo ainda entregue à Autora as quantias devidas a título de pagamento e retidas, nos termos previstos no artigo 211º do Decreto-Lei nº 59/99, de 2 de março.

Juntamente com a sua consorciada “N.”, celebrou ainda com o Réu, em janeiro de 2008, um contrato de empreitada designado “Requalificação e Alargamento da Av. D. Afonso Henriques”, no âmbito da qual também prestou uma garantia bancária no valor de € 65.640,29 – número 10989- , e outra no valor de € 64.080,34, em substituição das retenções previstas no artigo 211º do referido Decreto-Lei nº 59/99 – garantia número 2503008656193.

A referida obra também já foi definitivamente recebida, no ano de 2016, sem que o Réu tivesse procedido à liberação das respetivas garantias, pese embora a entidade bancária tivesse cancelado, em 30.04.2018, a garantia número 10989.

Assim, encontra-se por libertar a garantia número 2503008656193, e por liquidar os montantes em dívida, acrescidos dos encargos suportados e dos juros de mora vencidos.

Deve o Réu ser condenado a promover a extinção da garantia bancária nº 2503.008656; a pagar-lhe a quantia global de € 12.518,12 a título de retenções não devolvidas e custos suportados com garantias bancárias; a pagar-lhe quantia de € 19.860,06 a título de juros de mora vencidos, bem como os juros vincendos, até efetivo e integral pagamento; e a pagar-lhe a quantia de € 40,00, a título de indemnização pelos custos com a presente cobrança.

1.2.

Regularmente citado, o Réu apresentou contestação, na qual se defendeu por exceção e por impugnação.

Na defesa por exceção suscitou a incompetência territorial do TAF de Braga para apreciar e decidir o presente litígio.

Invocou a exceção dilatória de ilegitimidade ativa, por preterição de litisconsórcio necessário, alegando, em suma, que respeitando a presente ação administrativa a dois contratos de empreitada celebrados com o Réu, em consórcio externo com a entidade “N., Lda.”, a relação jurídica estabelecida entre as partes é plural, exigindo a intervenção de ambas, do lado ativo, pugnando, a final, pela sua absolvição da instância.

Mais arguiu a inimpugnabilidade e ausência de objeto da presente ação, bem como a exceção de caducidade do direito de ação.

E que contrariamente ao alegado pela Autora, aduziu que ainda não se verificou a receção definitiva das obras em causa, motivo pelo qual não pode vir exigir a liberação das cauções e garantia, uma vez que foi deliberado devolver os termos de receção definitiva.

Na defesa por impugnação, alegou, em suma, que a Autora não procedeu à correção e reparação das deficiências detetadas na obra, que determinaram a devolução dos autos de receção definitiva, pugnando, a final, pela sua absolvição do pedido.

1.3.

A Autora replicou, afirmando a competência do TAF de Braga para apreciar do mérito da lide.

Quanto à exceção de ilegitimidade ativa pugnou pela sua improcedência, alegando, em suma, por um lado, que os contratos de consórcio celebrados com a “N.” se extinguiram, pelo decurso do prazo de 10 anos previsto no nº 2 do artigo 11º do Decreto-Lei nº 231/81, de 28 de julho e, por outro, que não veio reclamar direitos comuns a ambas as consorciadas, mas apenas o pagamento de créditos exclusivos, sublinhando que as garantias foram prestadas apenas por si e que as retenções incidiram apenas sobre pagamentos a si devidos.

Ademais, o «efeito útil normal» da presente demanda apenas carece da intervenção da única credora, a aqui Autora.

Quanto às demais exceções sustentou a respetiva improcedência, concluindo como na petição inicial.

1.4.

Por sentença proferida a 25/02/2019, o TAF de Braga julgou-se incompetente, em razão do território, para apreciar do mérito da presente lide, tendo os autos sido remetidos ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu.

1.5.

Em 11.10.2019 o Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu proferiu saneador-sentença que julgou procedente a exceção da ilegitimidade ativa da autora, lendo-se no mesmo: «Face a tudo o que antecede, julga-se a Autora parte ilegítima e, consequentemente, absolve-se o Réu da instância.

* Custas pela Autora (artigo 527º do CPC, aplicável ex vi artigo 1º do CPTA; artigo 6º do RCP, Tabela I).

* Registe e notifique.» 1.6.

Inconformada com esta decisão, a Autora interpôs o presente recurso de apelação, pedindo que a decisão recorrida seja revogada e substituída por outra que considere que é parte legítima e que ordene o prosseguimento dos autos.

Concluiu as suas alegações da seguinte forma: « 1- O Tribunal a quo decidiu na sentença ora em crise que a Apelante não podia estar nestes autos desacompanhada da outra consorciada, por três motivos: a alegação de que se tratam de direitos exclusivos da Apelante e que não são comuns à consorciada dependem da produção de prova; o efeito útil normal da decisão pretendida pela Apelante só pode ser garantido pela intervenção de ambas as contraentes do consórcio; a Apelante não cuidou de requerer a intervenção principal provocada da empresa consorciada, apesar de a Apelada ter invocado a ilegitimidade daquela por preterição do litisconsórcio necessário ativo, atenta a falta da empresa consorciada.

2- A Apelante, com todo o respeito, considera que cada um daqueles fundamentos está errado e por isso a decisão neles alicerçada contém erros de julgamento que por via do presente recurso a Apelante pretende ver corrigidos, pelos motivos expostos.

3- São várias as decisões proferidas por diversos Tribunais superiores que confirmam de forma peremptória a necessidade de fazer intervir todos os membros do consórcio nas ações judiciais por via das quais um desses membros pretende fazer valer um direito que se constata que afinal é comum aos demais membros – e a Apelante concorda com todas essas decisões.

4- Aceita-se por a necessidade de fazer intervir na ação todos os consorciados nos casos em que apenas um deles pretende, por exemplo, ver declarada a nulidade de cláusulas do contrato de empreitada ou impugnar contenciosamente um ato do concurso a que o consórcio concorreu, ou até mesmo exigir o pagamento da sua quota-parte dos valores devidos pela entidade adjudicante.

5- Em todos aqueles casos, tratados na jurisprudência, os direitos que se pretendiam fazer valer ou eram comuns aos consorciados ou ainda que podendo até não o ser, não deixavam de radicar nos contratos de empreitada ou consórcio e/ou punham em causa o efeito útil normal da decisão - e como tal afiguram-se legítimas todas aquelas decisões no mesmo sentido.

6- Mas no modesto entender da Apelante, o caso dos autos é diferente e é por isso que o aresto agora em crise não terá sido bem decidido.

7- E é diferente porque nem se reclama nenhum tipo de direito comum a ambos os consorciados, tal como não se pretende aqui fazer valer nenhum dos termos previstos nem nos contratos de empreitada nem nos contratos de consórcio, e, por último, a decisão que a Autora pretende do Tribunal não põe em causa o efeito útil normal da mesma.

8- A causa de pedir nestes autos radica principalmente nos contratos de garantias bancárias autónomas à primeira solicitação. E este elemento é essencial para o enquadramento e apreciação do presente recurso.

9- A garantia autónoma é, no essencial, um contrato celebrado entre o interessado e o garante, a favor de um terceiro, o garantido. E por definição tem por base um contrato entre o interessado e o garantido (contrato-base) mas ao qual a garantia é totalmente alheia, principalmente no caso das garantias autónomas à primeira solicitação, fazendo assim nascer uma obrigação autónoma, subtraída em princípio à incidência dos meios de defesa relacionados com os contratos-base que possam haver.

10- No caso destes autos estamos precisamente perante garantias bancárias à primeira solicitação que por definição são autónomas e independentes dos contratos-base em que assentam. E neste caso, essas independência e autonomia saem ainda mais reforçadas pelo facto de as garantias nem sequer terem sido...

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