Acórdão nº 00835/11.9BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 30 de Abril de 2020

Magistrado ResponsávelHelena Canelas
Data da Resolução30 de Abril de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I. RELATÓRIO M., Lda.

(devidamente identificada nos autos) instaurou no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto ação administrativa comum contra a A., S.A.

(igualmente devidamente identificada nos autos) peticionando a condenação desta, por referência a licença de ocupação e utilização de espaço na aerogare do Aeroporto (...) para exercício da atividade de venda de artigos de ourivesaria e relojoaria, de que era titular, a pagar-lhe a quantia total de 240.246,42€, decomposta nas seguintes verbas: - 70.088,34€ com fundamentos nos factos alegados nos artigos 14º a 21º da Petição Inicial; - 25.700,00€ com fundamentos nos factos alegados nos artigos 69º a 76º da Petição Inicial; - 105.000,00€ com fundamentos nos factos alegados nos artigos 78º a 81º da Petição Inicial; - 10.000,00€ com fundamentos nos factos alegados nos artigos 86º a 90º da Petição Inicial; - 28.758,98€ com fundamentos nos factos alegados nos artigos 91º e 92º da Petição Inicial; - 210,00€ com fundamentos nos factos alegados no artigo 94º da Petição Inicial; - 507,00€ com fundamentos nos factos alegados no artigo 93º da Petição Inicial.

Por sentença datada de 31/05/2017 (fls. 789 SITAF) o Tribunal a quo, julgando a ação parcialmente procedente condeno a ré a pagar à autora a quantia de 10.534,22 € acrescida de juros à taxa legal contados desde a citação e até efetivo e integral pagamento absolvendo-a do demais peticionado.

Inconformada com a procedência apenas parcial do pedido a autora M., Lda.

interpôs recurso de apelação (fls. 820 SITAF) circunscrevendo-o à parte em que decaiu quanto ao pedido de pagamento da quantia de 59.554,12 € a título de investimento feito na terceira loja por ela ocupada e não amortizado, pugnando pela sua revogação nessa parte com condenação da ré a indemnizá-la naquele montante, formulando as seguintes conclusões, nos seguintes termos: A)- Não pode o ora Recorrente estar mais em desacordo com a decisão posta em crise que julgou improcedente a pretensão de ser indemnizada pela ora Recorrida pelo valor não amortizado dos investimentos referentes à terceira loja no valor de € 59.554,12, absolvendo a Ré, ora Recorrida, desse pedido; B)- A douta decisão posta em crise fundamenta-se no facto de se ter entendido que a situação ocorrida com a terceira loja, encerramento da loja devido a não prorrogação da licença, não se encontra contemplada na previsão, quer da licença, quer do Decreto-Lei nº 102/90, de 21/3; C)- Os termos da licença, mais concretamente o seu artigo 13º, não se limita a prever a indemnização na situação de mudança de instalações, bastando atentar na expressão constante do seu nº2: “... sem prejuízo do direito de indemnização previsto no número anterior...”; D)- Embora o artigo 13º do Decreto-Lei nº 102/90, de 21.03, se aplique aos casos de mudança de localização das instalações, o seu artigo 12º aplica-se aos casos de revogação da licença, prevendo-se o direito à indemnização quer numa, quer noutra situação (veja-se artigo 12º, nº3 e artigo 13º, nº2, ambos do referido Decreto-Lei); E)- A terceira loja da ora Recorrente encerrou devido à revogação da licença pela ora Recorrida por motivo de interesse público da exploração aeroportuária, não tendo ocorrido, por isso mudança de instalações (Pontos 15, 16, 24 e 33 dos factos provados); F)- A revogação da licença por motivo de interesse público da exploração aeroportuária é uma das situações previstas, quer pela própria licença (artigo 13º, nº2), quer pelo Decreto-Lei nº102/90, de 21.03 ( artigo 12º, nº3), como conferindo direito a indemnização; G)- O custo da terceira loja da ora Recorrente no aeroporto (...) orçou em € 64.732,72, cuja amortização programada era de 50 anos, encontrando-se por amortizar o valor de € 59.554,12 (Pontos 53,54 e 55 dos factos provados); H)- Deste modo, é indubitável que se encontram reunidos todos os pressupostos para que a ora Recorrente tenha direito a ser indemnizada pelo valor não amortizado dos investimentos referentes à terceira loja no valor de € 59.554,12, devendo, assim, ser revogada a douta decisão posta em crise, condenando-se a ora recorrida a indemnizar a ora recorrente por tal montante.

Igualmente inconformada com a decisão de procedência parcial do pedido a ré A., S.A.

interpôs recurso de apelação (fls. 828 SITAF) quanto à parte em que foi condenada a pagar à autora a indemnização de 10.534,22€ acrescida de juros à taxa legal, pugnando pela sua revogação, formulando as seguintes conclusões, nos seguintes termos: 1. O presente recurso vem interposto da Sentença proferida pelo TAF do Porto, no dia 31 de Maio de 2017, na parte em que condenou a A., S,A. no pagamento a Autora M., de uma indemnização no valor de €10.534,22, acrescida de juros a taxa legal, para ressarcimento de investimentos por ela realizados nas lojas que ocupou no Aeroporto do Porto entre 1999 e 2006.

  1. A Sentença recorrida considerou, para o efeito, que a remissão feita no artigo 13º/2 (mudança de localização da loja) e apenas para o nº 3 do artigo 13º e não também para o seu nº 4, que afasta a indemnização quando tenha havido prorrogação da licença, regime, este, que só valeria para os casos de revogação de licença (e não também, portanto, para os casos de mudança de localização da loja).

  2. Há erro de julgamento da Sentença porque ela atende estritamente a formula verbal da lei (a letra do artigo 13º/2), descurando o elemento sistemático (a coerência interna do sistema) e o elemento racional.

  3. Com efeito, se a lei estabelece que no caso de cessação prematura da licença não há indemnização quando tenha havido prorrogação da licença, tal regime, por maioria de razão ou, no mínimo, por identidade de razão, há-de valer para os casos de mudança de localização da loja (em que o lojista continua a exercer a sua atividade).

  4. Em segundo lugar, há erro de julgamento porque a remissão constante do artigo 13º/2 do DL nº 102/90 deve entender-se como uma remissão dirigida ao regime global do direito de indemnização, seja a norma que o estabelece (nº 3 do artigo 12º), seja a norma que o afasta (nº 4 do artigo 12º).

  5. Dessa forma, considerando que: - por expressa previsão legal contida no artigo 12º/3, a indemnização nele prevista não deve ter lugar nos casos em que na lei se disponha “em sentido diverso”; - o artigo 12º/4 contém uma disposição “em sentido diverso”, excepcionando do dever de indemnizar os casos em que tenha ocorrido uma previa prorrogação da licença; - então, dirigindo-se a remissão feita no artigo 13º/2 a todo o número 3 do artigo 12º, incluindo, naturalmente, as ressalvas nele mesmo contidas, há-de valer também para os casos de mudança de localização o regime do nº 4 do artigo 12º.

  6. Em terceiro lugar, no espirito do regime da lei (artigo 12º/4), a prorrogação do prazo da licença afasta a indemnização porque ela é vista como uma espécie de indemnização, como uma espécie de reposição do equilíbrio financeiro da licença (dando mais tempo ao lojista para recuperar o seu investimento) ¯ tal como sucede tipicamente nos contratos de concessão de obras e serviços, em que a prorrogação do prazo da sua vigência e vista como um mecanismo de reposição do equilíbrio financeiro.

  7. Neste enquadramento, não há nada que permita justificar a diferença de tratamento atribuída aos casos de indemnização por revogação e aos casos em que a indemnização se fique a dever a uma alteração (por relocalização das instalações) da licença, devendo eles ser tratados por igual ¯ existindo assim erro de julgamento na Sentença recorrida.

  8. Por último, há também erro de julgamento porque a Sentença recorrida deu relevância jurídica aos prazos de amortização que “foram livremente escolhidos” pela Autora e que dependiam somente da política por si prosseguida, quando e evidente, julga-se, que os prazos de amortização tem de ser estabelecidos dentro do prazo da licença e não fora dele, como aqui aconteceu, em que a Autora definiu, para licenças dadas, por exemplo, por 3 anos, prazos de amortização de 50 anos (não e erro, e mesmo 50 anos); 10. Ora, se os prazos de amortização juridicamente relevantes para efeitos de saber se há ou não indemnização tem de ser estabelecidos dentro do prazo da licença e se no caso em apreço a licença cessou pelo decurso do seu prazo de vigência, e não por causa de um qualquer outro facto anómalo e prematuro, então não há, não pode haver, indemnização.

  9. Se não for assim, se pudesse ser relevante para estes efeitos o prazo arbitrariamente constante dos documentos internos dos lojistas, então isso significaria o seguinte: Se um lojista, titular de uma licença de 2 anos, que termina em 31 de dezembro de 2017, estabelece o prazo de amortização dos seus investimentos (de 10.000€) em 10 anos e a A., S,A. fizer cessar a licença prematuramente, no dia 30 de dezembro de 2017, ela teria de indemnizá-lo por conta de praticamente 8.000€, pois faltariam ainda 8 anos para a amortização do investimento.

  10. E assim? A resposta, negativa, serve perfeitamente ao caso aqui em analise, em que a licença cessa pelo mero decurso do seu prazo… Relativamente ao recurso interposto pela autora M., Lda.

    a recorrida ré A., S.A.

    contra-alegou pugnando pela sua improcedência, formulando a final o seguinte quadro conclusivo: 1. O presente recurso veio interposto da sentença proferida pelo TAF do Porto, no dia 31 de Maio de 2017, na parte em que absolveu a A., S,A. do pagamento a M., Lda. de uma indemnização de €59.554,12, para ressarcimento dos investimentos por ela realizados na loja que ocupou no Aeroporto do Porto entre 2006 e 2008.

  11. A licença atribuída pela A., S,A. a M., Lda. para ocupação de uma loja no Aeroporto do Porto chegou ao termo da sua vigência (i.e. caducou) e a Recorrente vem pedir a este Alto Tribunal que lhe conceda uma indemnização ao abrigo do regime previsto no artigo 12º do Decreto-Lei n.º 102/90, de 21 de Marco, para os casos de revogação...

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