Acórdão nº 01058/10.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 30 de Abril de 2020

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução30 de Abril de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo do Norte.

* I - RELATÓRIO 1.1.J.

, residente na Rua (…), (…), instaurou ação administrativa comum para efetivação de responsabilidade civil extracontratual, contra o ESTADO PORTUGUÊS, representado pelo Ministério Público, pedindo a condenação deste a pagar-lhe a quantia de 120.000,00 euros, a título de compensação por danos não patrimoniais sofridos, e a quantia de 59.500 euros, a título de danos patrimoniais, acrescido de juros de mora vencidos e vincendos.

Para tanto alega, em síntese, ter sido constituído arguido em 20 de junho de 2002, no âmbito do Processo-crime n.º 1043/06.2TAGDM, que correu termos pelo 1.º Juízo de Competência Criminal do Tribunal de Gondomar, no qual prestou termo de identidade e residência em 20 de junho de 2002; Em 26 em novembro de 2004 alterou a sua residência, tendo vindo a ser declarado contumaz, do que o seu defensor oficioso foi notificado.

Por sua iniciativa deslocou-se no dia 16.05.2007, ao Tribunal Judicial de Gondomar para prestar novo TIR; Em 15 de junho de 2007 foi detido pela 6.ª esquadra da PSP, onde teve de prestar novo TIR; Em 06 de julho de 2007 foi declarada cessada a contumácia por despacho da juíza do referido processo.

Apesar disso, a sua inscrição como contumaz continuou válida em vários processos; Após requerimentos efetuados, obteve resposta por parte da Direcção-Geral da Administração da Justiça em 05 de maio de 2008, de que o boletim relativo à cessação da contumácia foi recebido nos serviços daquela apenas em 02 de maio de 2008, o que indicia que existiram erros grosseiros e inadmissíveis, por parte de algum funcionário judicial a prestar funções ao serviço do ora Réu, junto da Secretaria do 1.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Gondomar; Esse facto acarretou-lhe avultados danos morais e patrimoniais na sua vida pessoal e profissional, cuja indemnização reclama.

1.2.

O Réu contestou impugnando os factos alegados pelo Autor e reputando as quantias indemnizatórias reclamadas como exageradas.

Conclui pela improcedência da ação e solicita a sua absolvição do pedido.

1.3.

Realizou-se audiência prévia, onde se fixou o valor da ação, proferiu-se despacho saneador tabelar, fixou-se o objeto do litígio e os temas da prova, conheceu-se dos requerimentos de prova apresentados pelas partes e designou-se data para a realização de audiência final.

1.4.

Foram apensados aos presentes autos o Processo n.º 1043/01.2TAGDM.

1.5.

Realizada audiência final proferiu-se sentença, julgando a ação improcedente e absolvendo o Réu do pedido e que consta do seguinte segmento decisório: «Termos em que, face ao que deixamos expendido supra, julgo os pedidos deduzidos pelo Autor totalmente improcedentes, e consequentemente, deles absolvo o Réu.

Custas a cargo do Autor - nos termos do disposto no artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC, e artigos 6.º, n.º 1, 11.º e 13.º, n.º 1, todos do RCP -, sem prejuízo do benefício de apoio judiciário de que ainda goze – Cfr. fls. dos autos».

1.6.

Inconformado com o decidido o Autor interpôs o presente recurso de apelação, em que apresenta as seguintes conclusões: «A.

Cumprindo o disposto no artigo 640.º, nº 1, alínea a) do CPC, indica-se que, na opinião do apelante, foi errada a decisão proferida sobre a matéria de facto constante dos pontos 27 e 28 dos factos provados na sentença, bem como alíneas A, D e H dos factos não provados.

B.

Nos termos do disposto no artigo 640.º, nº 1, alínea c) do CPC, o recorrente entende que a decisão correta quanto à matéria de facto constante do ponto 27 dos factos provados deveria ser: “No dia 16 de Junho de 2007, com fundamento em que o automóvel do arguido (ora autor) tinha sido furtado, o mesmo dirigiu-se à 6ª Esquadra da P.S.P (...) para apresentar a respetiva participação criminal, o que o fez por volta das 14 horas”.

C.

Na verdade, a seguir à determinação do ponto 27 como facto provado, o tribunal recorrido fundamenta tal decisão com recurso à hora em que ficou registado o furto (15,55h).

D.

Porém, a hora do registo do furto não é a hora em que o autor se dirigiu à esquadra, mas apenas a hora em que a participação ficou registada no término de tal procedimento.

E.

O concreto meio probatório que nos permite chegar a tal conclusão, para além da experiência comum, consiste nas declarações do autor e no depoimento da testemunha A. que o acompanhou.

F.

Na verdade, refere a este propósito o autor em sede de declarações de parte, cujo depoimento ficou gravado em CD, em formato digital, com o programa Cícero: - A partir do minuto 12:05 da gravação até ao minuto 13:00 – explica que se apresentou na esquadra para apresentar uma denúncia de furto e ficou detido quase a tarde toda até cerca das cinco horas da tarde porque ficou à espera do envio de toda a documentação por parte do comando da (...).

- A partir do minuto 23:20 até 25:30 - Refere que entrou na esquadra (...) perto das duas horas da tarde para apresentar uma queixa-crime e os documentos que vieram do comando da (…) é chegaram por volta das cinco horas da tarde, tendo ficado detido sem poder sair, tendo ficado na esquadra entre 3 a 4 horas.

G.

Refere ainda a este propósito a testemunha A. cujo depoimento ficou gravado em CD, em formato digital, com o programa Cícero: - Do minuto 1:58:35 até ao minuto 2:04:30 – Refere que acompanhou o autor à Esquadra no dia da apresentação da queixa-crime por furto, na sequência de um encontro no café “Velasquez” após o almoço, tendo ficado à espera do demandante entre as duas e as seis horas, explicando tal circunstancialismo.

H.

Nos termos do disposto no artigo 640.º, nº 1, alínea c) do CPC, o recorrente entende que a decisão correta quanto à matéria de facto constante do ponto 28 dos factos provados deveria ser: “Na sequência da deslocação do Autor À 6ª Esquadra da P.S.P (...), e dentro da esquadra, perante o agente que o recebeu, o arguido foi identificado como estando contumaz, tendo sido detido e privado da sua liberdade cerca das 14 horas e sujeito a novo T.I.R. (o 3º), tendo sido devolvido à liberdade às 17,10 horas.” I.

Com efeito, mesmo seguindo as regras de experiência comum, não seria crível que o autor tivesse estado detido apenas durante 10 minutos, quando na fundamentação a tal matéria é o próprio Tribunal a referir que foi aquando da apresentação da participação por furto (o qual terminou até às 15,55 horas, conforme fundamentação do ponto anterior) que o sistema informático o remeteu para detenções a cumprir.

J.

E os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa são precisamente os mesmos referidos quanto à impugnação da decisão da matéria de facto do ponto anterior e que se reproduzem por uma questão de economia processual.

K.

Nos termos do disposto no artigo 640.º, nº 1, alínea c) do CPC, o recorrente entende que a decisão correta quanto à matéria de facto constante da Alínea A) dos factos não provados deveria ser considerada provada nos seguintes termos: “A constituição do autor no regime de contumaz em 29 de abril de 2007, assim como a manutenção da sua inscrição sob esse regime, até 2 de maio de 2008, depois de declarada a sua cessação em 06 de julho de 2007 provocou ao Autor danos morais e patrimoniais na sua vida pessoal e patrimonial.”.

L.

Na verdade, refere a este propósito o autor em sede de declarações de parte, cujo depoimento ficou gravado em CD, em formato digital, com o programa Cícero: No minuto 14:45 da gravação até ao minuto 17:15 - Entre 2007 e 2008 houve várias situações que lhe causaram prejuízos, nomeadamente nos processos em que era assistente em processos-crime e num processo em que era expropriado na (...), bem como nas empresas de que era titular, tendo tido problemas nos registos de atos dessas sociedades em virtude da contumácia que ainda figurava nos registos.

No minuto 17:20: Refere que procurou o nome no google e que aparecia o seu nome como contumaz.

No minuto 19:00 da gravação até ao minuto 20:55: explica que a questão da contumácia registada continuava ainda em 2015 a ter influência noutros processos, pois foi peticionada a invalidade de vários negócios por si realizados nesse período com base na contumácia registada, situação reforçada do minuto 22:30 até ao minuto 23:00.

No minuto 20:55: refere que neste momento já desapareceu toda a informação do google em virtude de reclamações do mesmo, mostrando-se visível até 2014.

M.

Nos termos do disposto no artigo 640.º, nº 1, alínea c) do CPC, o recorrente entende que a decisão correta quanto à matéria de facto constante da Alínea D) dos factos não provados deveria ser considerados os mesmos provados.

N.

Não só é uma consequência legal da contumácia, como o autor em sede de declarações de parte, no minuto 14:45 da gravação até ao minuto 17:15 refere - Entre 2007 e 2008 houve várias situações que lhe causaram prejuízos, nomeadamente nos processos em que era assistente em processos-crime e num processo em que era expropriado na (...), bem como nas empresas de que era titular, tendo tido problemas nos registos de atos dessas sociedades em virtude da contumácia que ainda figurava nos registos.

O.

Nos termos do disposto no artigo 640.º, nº 1, alínea c) do CPC, o recorrente entende que a decisão correta quanto à matéria de facto constante da Alínea H) dos factos não provados deveria ser toda ela considerada provada.

P.

O concreto meio probatório que nos permite chegar a tal conclusão consiste nas declarações do autor: No minuto 17:20: Refere que procurou o nome no google e que aparecia o seu nome como contumaz; e No minuto 20:55: refere que neste momento já desapareceu toda a informação do google em virtude de reclamações do mesmo, mostrando-se visível até 2014.

– Da aplicação do direito aos factos Q.

O entendimento de que uma privação da liberdade que ocorreu única e exclusivamente por ineficácia do sistema judiciário não é indemnizável, viola inequivocamente o disposto nos artigos 22.º e 27.º da Constituição da República Portuguesa e o...

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