Acórdão nº 00240/10.4BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 17 de Abril de 2020

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução17 de Abril de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo do Norte: I-RELATÓRIO 1.1. F.

, residente na Avenida (...), (...), propôs ação administrativa especial contra o IFAP – INSTITUTO DO FINANCIAMENTO DA AGRICULTURA E PESCAS, IP, pedindo que a ação seja julgada procedente, e consequentemente, que o ato impugnado seja declarado nulo ou, para o caso de assim se não entender, que o mesmo seja anulado.

Alegou, para o efeito, em síntese, que é agricultor e que nessa qualidade candidatou-se junto do “IFADAP” a um projeto para ajuda na aquisição de um trator e respetivas alfaias, no âmbito do programa AGRIS, tendo sido aprovado o subsídio de € 10.806,46.

As características do trator a adquirir foram especificadas (35 CV 7CE45), tendo o autor, na aquisição, respeitado todos os pressupostos do contrato.

No dia 15.06.2006, o aludido trator foi interveniente num acidente, capotando. Depois de reparado o trator não ficou capaz de responder às necessidades do autor, razão pela qual o seu vendedor propôs a sua substituição urgente, e porque decorria a época de intensos trabalhos, o autor adquiriu um outro trator.

Mais alegou que na sequência da visita à sua exploração agrícola ocorrida no dia 06.09.2006, foi notificado para proceder à reposição no valor de € 10.580,56 invocando-se como fundamento ter sido apurada “uma situação de incumprimento da legislação aplicável à medida/ação acima identificada”.

O autor entende que o referido ato não se encontra devidamente fundamentado, quer de facto, por insuficiência e contradição, quer de direito, por falta de qualquer referência a preceito ou obrigação eventualmente violado, para além de não identificar convenientemente a autoridade que o praticou.

Por fim, sustenta que a substituição do trator subsidiado por outro, motivado por acidente/inutilização do primeiro, não pode constituir motivo para a reposição total da quantia em questão, impondo-se sempre recorrer à equidade, enfermando o ato impugnado de vício de violação de lei.

*1.2.

Regularmente citado, o Réu contestou, defendendo-se por exceção, invocando a inimpugnabilidade do ato e a improcedência da ação, por não se afirmarem nenhum dos vícios que o autor assaca ao despacho impugnado, advogando que o ato se acha cabalmente fundamentado e justificado em razão dos seus pressupostos.

*1.3.

Proferiu-se despacho saneador que julgou a exceção da inimpugnabilidade do despacho impugnado, improcedente.

*1.4.

Em 09 de setembro de 2016, o TAF de Mirandela proferiu sentença que julgou a presente ação procedente, dela constando o seguinte segmento decisório: «Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes deste Tribunal em negar provimento aos recursos interpostos por ambas as Apelantes e, em consequência, confirmam o despacho e a sentença recorridos.

Custas das apelações pelas respetivas Apelantes - artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC.

Registe e notifique.»*1.5.

Inconformado com a referida decisão, o Apelado interpôs recurso jurisdicional que motivou, terminando com a apresentação das seguintes conclusões: «A.O presente recurso jurisdicional vem interposto da sentença datada de 09 de setembro de 2016 nos autos à margem identificados, a qual julgou procedente a ação por vício de falta de fundamentação.

  1. Salvo melhor entendimento, na situação em apreço, o Tribunal faz uma errada avaliação da matéria de facto subjacente ao ato administrativo impugnado ao entender que o ato administrativo impugnado «embora contenha uma fundamentação de facto, não contém uma fundamentação de direito», e, como tal, fez uma incorreta aplicação do direito aplicável.

  2. Razão pela qual se assume como forçosa a conclusão de que a douta sentença recorrida se encontra ferida de error in judicando, determinada pela incorreta apreciação e decisão sobre a matéria de facto e, em consequência, pela incorreta interpretação e aplicação das normas legais e processuais aplicáveis ao caso sub judice, o qual implica que a decisão em crise padeça de uma clamorosa injustiça.

D. Face ao exposto, a presente sentença procedeu a uma clara omissão e errónea avaliação da matéria fáctica subjacente aos presentes autos, e pela análise dos erros de julgamento quanto à interpretação e aplicação das normas relativas à falta de fundamentação no ato administrativo anulado.

E. Importa desde logo salientar que, a sentença proferida, relativamente à matéria de facto dada como provada na alínea 11) é omissa relativamente à afirmação do ora recorrido de que «atendendo a estar em plena campanha de colheita optou pela troca do veículo sem pedir autorização por desconhecimento dessa obrigação» (cfr. fls. 29 a 33/81 da pasta I do PA, cujo teor se considera integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).

F. Tal facto é relevante porque está em manifesta contradição com a alínea 6) da matéria de facto dada como provada pelo Tribunal a quo, na qual o ora recorrido admite que «solicitou [ao IFAP] a alteração de potência do trator de 35cv para 43cv», ou seja, tinha perfeito conhecimento da necessidade contratual e legal de solicitar autorização para alterar a potência do trator do contratado, conforme aliás melhor resulta do facto dado como provado em 5).

G. Face ao exposto, atento o teor de fls. 29 a 33/81 da pasta I do PA, propõe-se o aditamento à alínea 11) da matéria de facto dada como provada da seguinte expressão in fine: «atendendo a estar em plena campanha de colheita optou pela troca do veículo sem pedir autorização por desconhecimento dessa obrigação» (cfr. fls. 29 a 33/81 da pasta I do PA, cujo teor se considera integralmente reproduzido para todos os efeitos legais), aditamento ao facto 11).

H. Acresce ao exposto que a sentença proferida relativamente à matéria de facto dada como provada é omissa relativamente ao teor de fls. 50 a 52/76 da pasta II do PA, pelo que se propõe o aditamento entre o facto 11) e o 12) do facto 11a) com o seguinte teor: 1

  1. A Autoridade de Gestão do PO Norte (AG), onde se insere este projeto da medida AGRIS, através da ficha de decisão e identificação da dívida, em 31/07/2007, confirma a irregularidade e decide a recuperação de verbas neste projeto, no valor de EUR 8.312,71, remetendo-a ao Instituto, para que proceda à recuperação do referido montante (cfr. fls. 50 a 52/76 da pasta II do PA, cujo teor se considera integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).

I. Tal facto é relevante porque comprova que com fundamento na referida visita de acompanhamento, facto dado como provado em 10), o projeto foi considerado irregular no que respeita ao trator apresentado aquando da visita, porque não correspondia ao trator efetivamente subsidiado.

J. O ora recorrido não podia alegar o desconhecimento da obrigatoriedade de comunicar ao Instituto a alteração da potência do trator e troca do mesmo, porque tal decorre das regras e normativos referentes ao projeto a que se candidatou, dos quais tomou conhecimento aquando da apresentação da candidatura e, posteriormente, aquando da assinatura do contrato de atribuição de ajudas que reflete, no geral, as regras estabelecidas normativamente.

K. Aliás, tal alegação é inclusive contraditória com a posição anteriormente assumida pelo próprio recorrido no âmbito do presente projeto, o qual através de comunicação de 08/10/2002, aquando da primeira alteração referente ao trator, solicitou por escrito à DRAP Norte essa alteração de potência do trator e a mesma foi aprovada (cfr. facto 6) da matéria de facto dada como provada e fls. 60 e 61/81 da pasta I do PA).

L. Como resulta do facto 6), dado por provado pelo Tribunal a quo, em 8/10/2002, o ora recorrido solicitou a alteração de potência do trator de 35 cv para 43 cv.

M. Deste modo, não se compreende como, posteriormente, ao ter o alegado acidente e ter trocado o trator aprovado por um novo de 65cv, conforme resulta do facto dado como provado em 11), o recorrido “esqueceu-se de comunicar/informar o IFAP” e solicitar autorização para o efeito, à semelhança do que já fizera anteriormente, conforme obrigação que resulta do clausulado do contrato subscrito pelo ora recorrido e constante da matéria de facto dada como provada em 5).

N. Atento o referido, o ora Recorrente entende que o Tribunal “a quo” errou na decisão da matéria de facto, tendo julgado incorretamente os factos 5), 6), 10) e 11) dos factos provados, face à errada apreciação da prova produzida a respeito de cada um deles, e ao omitir a matéria cujo aditamento se propôs como 11a), uma vez que da conjugação dos referidos factos resulta que o ora recorrido tinha perfeito conhecimento das normas contratuais aplicáveis, e em especial, da obrigação de comunicar, para efeitos de autorização do IFAP, qualquer alteração nos termos e para os efeitos das Cláusulas C.3, C.6 e C.7 do contrato celebrado, facto dado como provado em 5).

O. Face ao exposto, a presente sentença procedeu a uma clara omissão e errónea avaliação e contradição da matéria fáctica subjacente aos presentes autos, ignorando deliberadamente que o ora recorrido tinha perfeito conhecimento das razões de direito que estiveram subjacentes ao ato impugnado, designadamente, o recorrido, conforme resulta da matéria de facto dada como provada, revela perfeito conhecimento das cláusulas contratuais e obrigações legais assumidas com a celebração do contrato, pelo que a sentença proferida deve ser revogada.

P. Assim, salvo melhor entendimento o Tribunal recorrido decidiu a nosso ver mal ao entender que o ato administrativo impugnado se encontrava fundamentado de facto, mas não de direito, concluindo que o ato padece do vício de falta de fundamentação, porquanto o ato impugnado foi praticado ao abrigo de cláusulas contratuais, as quais conforme melhor resulta dos factos dado como provados pelo Tribunal a quo em 5) e 6), eram do conhecimento do ora recorrido.

Q. De facto, o ora recorrido não pode legalmente alegar o desconhecimento das mesmas, uma vez que tal obrigação incumprida resultava diretamente das obrigações contratuais...

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