Acórdão nº 00010/13.8BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 17 de Abril de 2020

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução17 de Abril de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório A E., SA, devidamente identificada nos autos, no âmbito da ação administrativa comum, intentada pela Fundação C.

, na qual peticionou a condenação daquela na reparação do muro identificado, suportando todos os custos e encargos inerentes, mais peticionando a sua condenação na reparação ou revestimento da valeta, inconformada com a Sentença proferida em 4 de fevereiro de 2014 no TAF de Mirandela, na qual a ação foi julgada parcialmente procedente, tendo sido condenada a suportar metade dos custos de reparação do muro em causa, bem como a proceder à reparação/revestimento da valeta, veio interpor recurso jurisdicional para esta instância da referida Sentença, em 5 de março de 2014.

Formulou a aqui Recorrente/E., SA nas suas alegações de recurso as seguintes conclusões: “I. Face ao exposto, e assumindo a alteração da matéria de facto como antecede, nos termos do Artº 640º nº 1 alíneas a) e b) e c) do CPC, para fazer a costumada justiça, deve resultar como provado que a EP atuou de forma diligente e no cumprimento estrito das suas atribuições, Pois, II. As causas para a queda do muro, não se prendem de todo com a via rodoviária, cuja única ligação que tem é ser confinante com a parte do muro da Casa de (...).

  1. Resulta que, a estrada é também ela centenária, desde pelo menos 1929, e desde sempre a valeta coexistiu com o muro.

  2. Acresce que "queda do muro, não tem implicações com estrada nacional, porque a queda do muro não implicou qualquer destruição das condições da estrada, manteve-se intacta a nossa estrada, portanto é uma razão que não há ligação entre o muro e a estrada, digamos assim, são coisas independentes, se houvesse teria que haver deslizamento da valeta e do pavimento ... neste caso o muro não tem nada a ver com a estrada, é um muro de vedação que tem um bocadinho de suporte mas que não afeta a via" Vd transcrição do Depoimento no Ponto 14 do presente Recurso.

  3. A parte do muro que ruiu foi a referente ao muro de vedação, mantendo-se a que exerce função de suporte à plataforma da estrada e respetiva valeta.

  4. A aqui Recorrente, fez várias intervenções na via, desde logo, para dotar de betuminoso, a via, em 1981, sendo que, tais Intervenções, se inserem no cumprimento das obrigações legais a que a Recorrente se encontra adstrita.

  5. Tais intervenções não provocam qualquer tipo de ação horizontal sobre o muro, as referidas recargas nos pavimentos betuminosos visam antes devolver à estrutura, a sua capacidade de suporte, isto é melhorar a capacidade de suportar e distribuir uniformemente as tensões provocadas pela ação do tráfego, gerando assim o efeito contrário.

  6. Caso fosse a pressão exercida pela estrada a perca de verticalidade e embarrigamento não se faria sentir em todos os muros que circundam a Fundação C.: "Todos os muros, desde a entrada até ao limite da quinta, todos os muros estão com a perda de verticalidade ..., os muros mais acima tem inclinação para a estrada." Cassete nº 3 Lado A, min 19,30 a 20,17.

  7. O Juiz a quo, para prova da pressão da estrada sobre o muro, alega ainda a existência de fissuração, no pavimento, desvalorizando o depoimento das testemunhas A. e A-., quanto à explicitação técnica dada sobre a fissuração existente, diferente de deformação, e associada unicamente à questão de rodado das viaturas e não se verifica no local a existência de qualquer fissura de rotura delimitando a "concha de escorregamento".

  8. O pavimento não apresenta nenhum tipo de deformação ou abatimento da estrada, consequente da queda do muro.

  9. O pavimento apresenta fendilhação irregular em malha fechada, que ocorre essencialmente na zona de passagem dos rodados. Do ponto de vista técnico, este tipo de fissuração tem como origem a fadiga das camadas betuminosas por ação dos rodados.

  10. A "aplicação de um revestimento superficial em Junho de 2013 ...", demonstra desde logo a inexistência de deformação do que foi dado como provado, pois a aplicação desse tipo de revestimento não pode ocorrer em pavimentos que "apresentem essas deformações, existem sim "Fissuras de envelhecimento do ligante, ... em termos estruturais o pavimento encontra-se ainda bom ... " XIII. A acumulação de água na valeta, é tecnicamente improvável, tendo em conta desde logo que a referida valeta apenas drena as águas de meia plataforma da estrada, e a estrada é em sentido descendente, pelo que, assim sendo, mesmo em situações de chuva torrenciais, não seria possível criar as tais banheiras de água. (Vd depoimentos constantes no ponto 32, 33 e 48, do presente Recurso).

  11. A referida valeta em terra, drena apenas metade da plataforma, e drena apenas as águas que caiem da chuva na plataforma da estrada, razão pela qual, “... estamos a falar de uma quantidade de água mínima" Cassete nº 3 Lado A, min 7,41 " ... temos ali cerca de 200 m de estrada, que drenam com uma largura média de 2,5 m/3m, e que drena só a água que cai no pavimento ... a água não pode ser muita, do terreno do vizinho não vem água ... é talude de aterro ...a agua que vai para a valeta é agua de metade da via em cerca de 200m, ... são cerca de 600m2, que drena para lá mas toda muito espalhada" Cassete nº 3 Lado A, min 7,44 a 8,34 XV. A causa bastante provável do desmoronamento do muro, resulta da associação entre a limpeza/corte) (recente) da vegetação arbustiva (com algum porte) dos muros de alvenaria, pelo lado interior e retiradas raízes das juntas da alvenaria de pedra, e o embarrigamento do muro com a perda de verticalidade e desalinhamento, próprio da idade e da falta de intervenção de origem reabilitante nesses muros por parte da Recorrida Fundação da Casa de (...), o que gerou a queda do muro, conforme descrito no ponto 37 do presente Recurso.

  12. Na Inspeção ao local, foi possível constatar visualizar na parte interior existência de árvores encostado à parte do muro que ruiu, e ainda a existência de heras ao ponto de as mesmas passarem de um lado para o outro, o que sustenta a relação causa-efeito entre a vegetação e a derrocada do muro.

  13. Forçoso é concluir que não se verifica a ilicitude e culpa da R., pelo que não estando preenchidos todos os pressupostos da responsabilidade civil, não pode a Recorrente ser condenada.

  14. Resulta que, quando um lesado Invoca a violação de disposições, princípios ou deveres que protegem interesses, para que proceda o pedido, também é necessário que o seu interesse esteja protegido pelas normas e disposições alegadamente violadas pela Recorrente, isto é necessário demonstrar que o dever/obrigação da Recorrente de revestir a valeta, tinha como objetivo proteger os interesses da Recorrida, de evitar a infiltração de água no muro e evitar assim a sua derrocada.

    XIX Como ensina Antunes Varela, das Obrigações e Geral, vol. I, pagina 540, nos casos em que a lesão invoque que a ilicitude da conduta decorre da violação de disposições, princípios ou deveres que protegem interesses alheios "é preciso que a tutela dos interesses privados não seja (...) um mero reflexo de proteção dos interesses coletivos que como tais a lei visa salvaguardar .... Não basta que a norma também aproveite ao particular é preciso que ela tenha também em vista proteção dele ..." Ora.

  15. Existe por um lado a desnecessidade de revestimento da valeta, contrariamente ao referido pela sentença "a quo".

  16. A norma de traçado referenciada tem um âmbito de aplicação (a exemplo de qualquer Norma), definindo neste caso "princípios básicos, métodos e valores limite e de referência para o projeto de estradas novas e para a reconstrução e ampliação de estradas já existentes, situadas em zonas rurais." (Norma Traçado JAE P3I94, 1994).

  17. A EN322, é uma obra anterior a 1894, nem foi alvo de intervenção de reconstrução e ampliação após a entrada em vigor das Normas la Traçado JAE (1994), não se encontra abrangida pelas disposições normativas referenciadas.

  18. Ainda que, assim não fosse, acrescia o erro factual em dar-se como provado que, decorre da Norma que "as valetas serão sempre revestidas com betonilha e associadas a drenos", pois resulta que: "... O porquê da valeta ser revestida? Temos em termos técnicos, duas condições para a valeta ser revestida: A primeira condição; "..:terá uma reduzida pendente, ... melhorar as condições de escoamento de forma a garantir o escoamento ... não é aquela condição porque temos um trainel descendente, e a pendente está assegurada, temos um outro problema que é uma inclinação mais elevada, uma elevada pendente, temos que aumentar, colocar lá o revestimento para diminuir' fenómenos de erosão, a velocidade de escoamento, a velocidade daquele escoamento exceder determinados limites que o solo não é capaz aguentar, e então iria acontecer um aprofundamento, e a degradação da própria plataforma da estrada não é isso que está acontecer ali, por isso não vejo qualquer interesse ou qualquer vantagem em aquela valeta ser revestida, não temos o problema da pendente, não temos a erosão, ... ", Cassete nº 5 Lado B, min 26,31 a 27,46 XXIV. A necessidade de revestimento com dreno, não é de todo extensível a todo o tipo de valetas, mas tão-só e quando se demonstre a necessidade de associação da captação de águas freáticas e a sua condução através de um dreno, associando-se ainda o facto de no lado esquerdo estarmos perante um talude de escavação, como foi demonstrado também pelos depoimentos.

  19. A aqui Recorrente, cumpriu com todas as suas atribuições legais, mantendo valeta e bom estado de manutenção, pelo que, não carece de quaisquer obras de reparação/revestimento.

  20. A EP, SA, não violou qualquer dever de cuidado, nem foi negligente, pois no âmbito das suas atividades de manutenção - conservação corrente, a EP. Estradas de Portugal, procede, sistematicamente a duas limpezas periódicas por ano, a todo o sistema de drenagem das estradas (por via de Contratos de Conservação Corrente), a que acrescem intervenções pontuais, caso...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT