Acórdão nº 129/15.0YHLSB.L1-PICRS de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 21 de Abril de 2020

Magistrado ResponsávelANA PESSOA
Data da Resolução21 de Abril de 2020
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na Secção da Propriedade Intelectual, Concorrência, Regulação e Supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa, I. RELATÓRIO.

HERITAGE, HOTÉIS GESTÃO E MARKETING, S.A., moveu contra HERITAGE - INVESTIMENTO E CONSULTORIA PATRIMONIAL, LDA. a presente acção declarativa, pedindo a anulação do registo da marca nacional nº 362589 “Heritage”.

Alegou, em resumo, que: - A Ré requereu o registo da referida marca “HERITAGE”, para assinalar “negócios imobiliários”, na classe 36 da Classificação Internacional de Nice, o que fez em 15/03/2002, pedido que foi deferido por despacho de concessão datado de 06/04/2005, foi publicado a 30/06/2005.

Mais alegou que tal marca constitui uma imitação dos seus direitos prioritários nacionais e comunitários compostos pela expressão Heritage para assinalar “promoção de serviços de hotéis (serviços hoteleiros)”, nas classes 43 e 35 da mesma Classificação, as quais são prioritárias em relação à marca da Ré, já que entre os serviços que as marcas da Autora distinguem - “promoção de serviços de hotéis (serviços hoteleiros)”, existe uma relação de complementaridade e acessoriedade com os “negócios imobiliários” que a Ré presta com a sua marca, que, aliada à clara semelhança fonética entre as expressões, conduzirá o público a um risco de confusão ou associação entre os sinais em confronto e os respectivos titulares, impedindo que as marcas prioritárias da A. possam cumprir a sua função distintiva, possibilitando que os consumidores em geral sejam levados a pensar que a marca “HERITAGE” seja outra da titularidade da Autora e, portanto, associar aquela à origem empresarial desta última.

Referiu que deduziu, junto do INPI, pedido de caducidade da marca da Ré por falta de uso sério, consignando o entendimento de que tal processo constitui causa prejudicial, e pediu a suspensão da instância até que naqueles autos seja proferida decisão definitiva.

* Regularmente citada, a Ré contestou pugnando pela improcedência da acção, argumentando que os serviços a que respeitam as marcas em confronto não são idênticos nem afins, pelo que não induzirão o consumidor em confusão ou associação, que as marcas da Autora respeitam, na sua essência, a serviços enquadrados na área do turismo e os serviços visados pela marca da Ré são, essencialmente imobiliários.

Mais referiu que a sua firma foi constituída em 28/02/2002, que a firma da Autora nessa data ainda era “Agifer – Serviços de Contabilidade, SA”, pelo que nunca existiu intenção por sua parte de imitar a expressão constante da marca da Autora.

Acrescentou que o que consta da descrição das marcas da Autora é a “promoção de serviços de hotéis (serviços hoteleiros)”, que, no entanto, nem da petição inicial nem dos documentos juntos pela A. se vislumbra em que medida a A. tem feito um uso sério da sua marca, que não tem dúvidas de que a A. presta, como sempre alegou, “serviços hoteleiros”, mas que não fez prova do uso sério das mesmas para a referida promoção de serviços, nomeadamente, da marca comunitária n.º 919.779 que se encontra registada na Classe 35, requerendo que a A. faça prova do uso sério das suas marcas, nos termos e para os efeitos do artigo 268.º do CPI.

* Por despacho de 16.12.2015 foi declarada suspensa a instância até à prolação de decisão definitiva no processo em que a Autora formulou o pedido de caducidade da marca da Ré.

Tal decisão foi proferida em 22.11.2018, julgando improcedente o pedido de caducidade, e, determinado o prosseguimento dos autos, realizou-se a audiência prévia, no termo da qual veio a ser proferida sentença que, julgando procedente a acção, determinou a anulação do registo da marca nacional n.º 362589 “HERITAGE”. * Inconformada com tal decisão, veio a Ré dela interpor o presente recurso de apelação, apresentando as seguintes conclusões:

  1. A Recorrente é uma sociedade portuguesa que se dedica à prestação de serviços de consultoria patrimonial e mediação imobiliária, tendo a firma sido registada em 2002, ano em que foi requerido o registo da marca nacional n.º 362589, constituída pelo sinal nominativo “HERITAGE”, para assinalar “negócios imobiliários”, serviços que se encontram incluídos na classe 36 da Classificação de Nice.

  2. A Recorrida apresentou, em 06.04.2016, uma ação declarativa de condenação com o fundamento de que a marca nacional n.º 362589 HERITAGE da Recorrente imitava os seus direitos de marca anteriores, razão pela qual peticionou a anulação da mesma.

  3. A Recorrida pretendeu demonstrar a sua legitimidade e interesse para a apresentação do pedido de anulação de marca com base na invocação da titularidade dos registos da marca nacional n.º 294750 “HERITAGE HOTELS PORTUGAL”, da marca nacional n.º 330065 “HERITAGE”, da marca nacional n.º 489209 , da marca comunitária n.º 919779 “HERITAGE HOTELS PORTUGAL” e da denominação social “HERITAGE, HOTÉIS GESTÃO E MARKETING S.A.”.

  4. A Recorrente não aceita os argumentos invocados pela Recorrida para anulação do registo da marca nacional n.º 362589 uma vez que se limitam a um dos requisitos constantes do n.º 1 do artigo 245.º do CPI.

  5. Só esse requisito foi exposto e apenas sobre esse a douta sentença recorrida se debruça carecendo de fundamentação o cumprimento do requisito da semelhança e, acima de tudo, do requisito da afinidade entre serviços.

  6. A Recorrente demonstrou que não se encontrava preenchido o requisito da “identidade ou afinidade dos produtos ou serviços a que a marca registada e a marca registanda se destinam”.

  7. Todas as marcas da Recorrida assinalam “promoção de serviços de hotéis”, independentemente das Classes.

  8. As marcas da Recorrida assinalam serviços enquadrados na área do turismo, enquanto que os serviços assinalados pela marca da Recorrente são serviços prestados, sobretudo, no âmbito da mediação imobiliária.

  9. A Recorrente requereu na sua Oposição que a Recorrida fizesse prova do uso sério das suas marcas.

  10. A Recorrida não provou o uso sério das suas marcas.

  11. O Tribunal a quo devia ter decidido pela improcedência do pedido de anulação da marca da Recorrente por incumprimento do artigo 266.º, n.º 3 do CPI que exige que “O registo não pode ser anulado se a marca anterior, invocada em oposição, não satisfizer a condição de uso sério”.

  12. O Tribunal a quo decidiu, em suma, o seguinte: “A actividade da R. assinalada para “negócios imobiliários” inclui a prestação de serviços de administração de imóveis, i.e., serviços de locação de bens imobiliários como casas, apartamentos, etc., destinados ao uso permanente sim, mas como bem refere a A., na “época em que vivemos, é frequente agências imobiliárias promoverem imóveis para ocupação sazonal de alojamento temporário, nomeadamente para férias”.

    O consumidor, o turista, tanto poderá optar por, nas suas férias, procurar uma estadia num alojamento temporário, como num hotel. Ora, se assim é, apesar de os serviços assinalados pelas marcas da A. e a da R., não se incluírem na mesma classe de Classificação Internacional de Nice, existe entre ambos uma afinidade, já que há uma relação de substituição, sendo o mercado relevante o mesmo, já que podem satisfazer o mesmo tipo de necessidades.

    (…) Conclui-se, pois que a marca da R. não só é igual à da A., como o consumidor seguramente associará a marca da R. à origem empresarial da A., atenta a predominância do vocábulo HERITAGE em todas as marcas.

    Assim sendo, a presente ação deve, pois proceder, nos termos acima enunciados, anulando-se a marca da R.” m) Assim, não pode a Recorrente aceitar que: (i) A Recorrida tenha legitimidade para apresentar um pedido de anulação da sua marca baseada em imitação das marcas de que é titular uma vez que as marcas da Recorrida não assinalam serviços de negócios imobiliários, nem tampouco a denominação social da Recorrida é anterior à da Recorrente; (ii) Se dê por procedente a anulação da marca “HERITAGE” por imitação das marcas da Recorrida sem que esta faça prova do uso sério das marcas nos cinco anos consecutivos anteriores, compreendidos entre 2011 e 2015, considerando o pedido da Recorrente em sede de Oposição; (iii) Não tenha considerado devidamente que a marca HERITAGE APARTMENTS, que foi anulada por sentença transitada em julgado no processo n.º 267/12.1YHLSB, era usada pela Recorrente especificamente para “serviços de locação de bens imobiliários como casas, apartamentos, etc.” e não a marca HERITAGE; (iv) O facto de a Recorrente ter no seu objeto social a referência a prestação de serviços de administração de imóveis não implica que o faça através do uso da marca HERITAGE e que de facto não faz nem sequer a título de atividade secundária ou acessória; (v) Seja desvalorizado pela douta sentença recorrida o facto da HERITAGE – INVESTIMENTO E CONSULTORIA PATRIMONIAL LDA. ser anterior à denominação social da Recorrida.

  13. Para preenchimento do conceito jurídico de imitação é essencial que os serviços assinalados pela marca da Recorrente e os serviços assinalados pelas marcas da Recorrida sejam idênticos ou que se verifique uma relação de afinidade capaz de induzir o consumidor em erro, incluindo o risco de associação à marca prioritariamente protegida.

  14. Os serviços que constam da descrição das marcas de que a Recorrida é titular são sempre a “promoção de serviços de hotéis (serviços hoteleiros)”, independentemente das “Classes” em que foram incluídos.

  15. Não existe afinidade entre as marcas da Recorrida que assinalam “promoção de serviços de hotéis (serviços hoteleiros)” e a marca da R. que assinala “negócios imobiliários”.

  16. As marcas da Recorrida são, na sua essência, serviços enquadrados na área do turismo, os serviços visados pela marca da Recorrente são, essencialmente, imobiliários.

  17. São serviços estruturalmente diferentes.

  18. A promoção de serviços hoteleiros é intrinsecamente uma prestação de serviços (limitada no tempo).

  19. Os negócios imobiliários, além dos serviços de intermediação inerentes à atividade de qualquer agência imobiliária de compra e venda de propriedades, são...

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