Acórdão nº 1577/17.7T8ENT-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 27 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelCRISTINA D
Data da Resolução27 de Fevereiro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Apelação n.º 1577/17.7T8ENT-A.E1 (1.ª Secção) Relator: Cristina Dá Mesquita Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Évora: I. RELATÓRIO I.1.

A sociedade Agro-Vínicola (…) e Filhos, Lda., (…) e (…), embargantes nos autos de execução movidos por (…), interpuseram recurso da sentença proferida pelo Juízo de Execução do Entroncamento, Juiz 2, do Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, o qual julgou parcialmente procedentes os embargos de executado e consequentemente determinou que os juros de mora fossem contabilizados apenas desde a data da citação dos embargantes nos autos principais e ordenou o prosseguimento da execução após recálculo dos juros.

Na ação – oposição à execução – os executados pediram ao tribunal que julgasse a inexequibilidade do documento dado à execução e, subsidiariamente, que julgasse a inexequibilidade da obrigação por falta de vencimento e/ou por incumprimento do acordo de pagamento da própria exequente e, ainda, que julgasse a inexequibilidade dos juros liquidados.

Para tanto, os executados alegaram que o documento dado à execução é inexequível porquanto é omisso quanto à data de vencimento e porque o valor da obrigação exequenda não está determinado nem é determinável por simples cálculo aritmético, estando, ao invés, dependente de um “acerto de contas” que a exequente e os executados ainda não realizaram, o qual se relaciona com um acordo de pagamento celebrado entre a exequente e a sociedade executada que perdurou entre 2007 e 2014 e por força do qual a exequente ficou com a totalidade das vendas realizadas no estabelecimento comercial da segunda. Mais invocaram os executados a invalidade da garantia pessoal prestada pelos executados (...) e (...), porquanto no documento dado à execução não consta a “razão” ou a “causa” da obrigação assumida por aqueles executados pelo que por este motivo também o documento dado à execução não é dotado de força executiva contra aqueles executados.

Os embargos de executado foram liminarmente recebidos e a exequente/embargada foi notificada para contestar, tendo esta pugnado pela total improcedência dos embargos de executado.

Foi realizada audiência prévia e proferido despacho saneador no qual o tribunal a quo fixou o valor da causa, conheceu das exceções de inexigibilidade do título e da invalidade da garantia pessoal, julgando-as improcedentes, tendo, ainda, proferido despacho a fixar o objeto do litígio e temas de prova.

Foi realizada a audiência final, finda a qual foi proferida a sentença objeto do presente recurso.

I.2.

Os recorrentes formulam alegações que culminam com as seguintes conclusões: «a) Entendem os recorrentes que os factos dados como não provados, designadamente que: - Que, em data que os Executados não conseguem precisar, mas no ano de 2007, foi celebrado, entre exequente e executada sociedade, um acordo de pagamento. - Que o acordo aludido em 1 dos factos não provados compreendesse a seguinte operação: a. A sociedade explorava um estabelecimento comercial de venda de vinhos, no Entroncamento, na Rua (...); b. A sociedade fornecia os vinhos para tal estabelecimento já que o seu objeto social consiste, precisamente, na produção de vinhos; c. A sociedade suportava os custos inerentes ao estabelecimento; d. A exequente ficaria com a totalidade do produto da venda desses mesmos vinhos. - Que o acordo aludido em 1 dos factos não provados tenha perdurado entre 2007 e 2014, ficando a exequente com a totalidade das vendas realizadas no estabelecimento da executada sociedade. b) Deveriam ter sido dado como provados por entendem os recorrentes que a prova constante dos autos e produzida na audiência, nomeadamente, o depoimento das partes e testemunha (...), (...) e (...), nas partes transcritas e que aqui se dão por integralmente reproduzidas, permitia ao douto tribunal a quo ter fixado factualidade diversa. c) Conforme resulta do seu depoimento, a própria embargada reconheceu e confessou que a cláusula 8 constante do título executivo: os juros e despesas bancárias e/ou de seguros relativos ao empréstimo atrás referido na cláusula terceira, suportados pela primeira, serão objeto de acerto de contas com o valor dos fornecimentos de vinho que a sociedade lhe forneceu e continuará a fornecer até integral pagamento do valor do empréstimo referenciado em 3. “significa que o pagamento da dívida assumida pelos embargantes será feito através de fornecimento de vinho”. d) Mas, sendo a embargada médica de profissão e não comerciante de vinhos, tais fornecimentos têm que ser compreendidos e enquadrados na atividade do estabelecimento comercial de venda de vinho que a sociedade embargante explorava no Entroncamento, gerido de facto pelo ex-cônjuge da embargada, conforme devidamente esclarecido pelas testemunhas e partes. e) As declarações do embargante (...) foram corroboradas pelo depoimento da testemunha (...), ouvida por determinação do douto Tribunal a quo ao abrigo do disposto no art.° 411.º do C.P.C.. f) Essa testemunha, para além de não ter qualquer interesse na causa, teve intervenção direta na factualidade relevante para os presentes, mormente no que concerne à atividade e destino das receitas do falado estabelecimento de venda de vinho. g) Da análise conjugada dos depoimentos das referidas testemunhas, s.m.o., é imperioso concluir que: 1) A embargante sociedade era titular de um estabelecimento de venda de vinho sito no Entroncamento; 2) A partir de certa data – não concretamente apurada mas antes da outorga do título dado à execução – tal estabelecimento passou a ser gerido de facto pelo, atualmente, ex-marido da embargada/exequente que com ela vivia; 3) Do produto das vendas tal gerente de facto pagava as despesas de renda, água, luz e a sua comissão, depositando o excedente na conta bancária de que a embargada / exequente era titular no Millennium BCP; 4) Tais depósitos destinavam-se a amortizar a dívida que os embargantes / recorrentes têm para com a embargada; 5) Essa gestão assumida pelo ex-marido da embargada perdurou até, pelo menos, 2014; 6) Por decisão do ex-marido da embargada e com a concordância desta, o estabelecimento foi encerrado; 7) Nos termos da cláusula 8.ª do título executivo, os embargantes, devedores, comprometeram-se a pagar a dívida que têm perante a embargada com entregas de vinho, devendo, tendo em conta toda a prova produzida – designadamente as próprias declarações da embargada aqui reproduzidas –, considerar-se que, quando as partes referiram entregas de vinho, aludiam ao fornecimento de vinho ao citado estabelecimento, vinho esse que era vendido em benefício da embargada. h) Mesmo que com as divergências inerentes à matéria e decorrentes de conturbadas relações familiares, as declarações – com carácter de confissão – da embargada, do embargante e, principalmente, da testemunha (...), ouvido por iniciativa do Tribunal ao abrigo do artigo 411.º do C.P.C. e interveniente direto nos factos que demonstrou isenção e equidistância relativamente às partes, expuseram uma factualidade que permitiam ao douto tribunal a quo dar por assente a matéria descrita na alínea anterior, ao contrário da matéria dada como não provada. i) Foi feita prova dos factos elencados em g) e o douto tribunal a quo fez uma incorreta apreciação da prova o que levou, no entendimento dos recorrentes, à igualmente incorreta fixação dos factos não provados que deveriam integrar a matéria de facto assente. j) Como é sabido, o princípio da livre apreciação da prova, estabelecido no art.° 607.º, n.º 5, do CPC, vigora para a 1.ª instância e, bem assim, para a Relação quando esta é chamada a reapreciar matéria de facto. k) Assim sendo, é da competência do Tribunal da Relação a reapreciação de todos os elementos de prova, constantes dos autos e produzidos nas sessões de julgamento, com base na qual formará convicção própria e consignará a factualidade provada, coincidente, ou não, com a alcançada no douto tribunal a quo, exercitando assim, de facto e efetivamente, os poderes estabelecidos na Lei. I) Tais documentos particulares tinham, atento o disposto no artigo 46.º, n.º 1, alínea c), do CPC na sua versão anterior (1961), lugar no leque de instrumentos a que a Lei geral atribuía força executiva. m) Ainda assim, o art.° 43.º impunha a verificação de dois requisitos: “- um requisito de fundo: que deles conste a obrigação de pagamento de quantia determinada ou determinável por simples cálculo aritmético...; - um requisito de forma: que, quando se trate de documento assinado a rogo, a assinatura do rogado esteja reconhecida por notário ...” (José Lebre de Freitas, A Ação Executiva, Coimbra Ed., 5.a Edição, pg. 57). n) Aos dois referidos requisitos, acresce um outro, comummente fixado pela jurisprudência, que consiste na exigibilidade da dívida, ou seja que a divida esteja vencida. o) No caso em apreço, verifica-se que o documento dado à execução é omisso quanto a dois dos pressupostos inerentes à sua exequibilidade, designadamente: - A data de vencimento; - A determinabilidade da obrigação pecuniária. p) No que concerne ao vencimento da obrigação, o documento dado à execução é totalmente omisso. q) Em nenhuma parte dele consta a data do vencimento da obrigação ou o evento que determinaria esse mesmo vencimento, razão pela qual é inexigível a obrigação. r) A ausência de fixação da data de vencimento está diretamente relacionada com a forma de cumprimento acordada – entrega de vinho – que, igualmente, determina a indeterminação do valor da obrigação e importa a insusceptibilidade da sua determinação por simples cálculo aritmético. s) A determinação do eventual valor em débito está dependente de "acerto de contas" que credora e devedores terão que realizar. t) Sendo esse "acerto de contas" insuscetível de atingir por simples cálculo aritmético. u) As apontadas lacunas retiram ao documento dado à execução a sua força executiva. v) Suscitada a exceção da inexigibilidade do título dado à execução em sede de petição de embargos, foi a mesma...

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