Acórdão nº 1729/19.5T8STR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 27 de Fevereiro de 2020
Magistrado Responsável | EM |
Data da Resolução | 27 de Fevereiro de 2020 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Proc. n.º 1729/19.5T8STR.E1 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora[1]♣Acordam os Juízes da 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório (…) apresentou processo especial para acordo de pagamento (PEAP), nos termos do art. 222.º C do CIRE, assinado por si e pelo credor (…), formulando o pedido que, em virtude de a requerente não ser uma empresa e se encontrar em situação económica difícil, o presente processo especial para acordo de pagamento deve ser procedente, devendo ser dado início às negociações conducentes à elaboração de acordo de pagamento e nomeado, por despacho, como administrador judicial provisório (…).
…Admitido o presente processo especial para acordo de pagamento, foi dado início ao mesmo, tendo sido nomeado como administradora judicial provisória (…).
…Em 30-07-2019, foi elaborada a lista provisória de créditos, na qual constava como 1.º crédito, o crédito no valor de € 895.693,30, equivalente a 98,42% dos créditos, a favor do Banco Comercial Português, S.A.”; e, como segundo, o crédito no valor de € 14.400,00, equivalente a 1,58% dos créditos, a favor de (…).
…Por não ter sido efectuada qualquer impugnação, a lista de créditos tornou-se definitiva.
…Em 04-10-2019, por requerimento assinado pela devedora, através do seu mandatário judicial, e pela administradora judicial provisória, foi concedido o prazo adicional de um mês para a conclusão das negociações encetadas com vista à aprovação de uma proposta para pagamento dos montantes em dívida.
…Em 04-11-2019, a requerente apresentou o seguinte plano para pagamento dos seus créditos: 1) Propôs a redução do crédito reclamado pelo Banco Comercial Português para a quantia de € 310.000,00, a qual seria paga em três períodos distintos e por formas distintas, a saber: a.
Nos primeiros 2 anos, seriam pagos os juros calculados à taxa anual de 1%, vencendo-se a primeira prestação no último dia do mês seguinte ao do trânsito em julgado da sentença homologatória.
b.
Nos 9 anos e 11 meses seguintes ao período referido no número anterior, seria paga a quantia de € 150.000,00, em prestações mensais e sucessivas de igual valor, vencendo-se a primeira prestação no último dia do mês a que corresponder cada prestação.
c.
Findos os períodos de pagamento acima referidos, seria pago o remanescente do preço no valor de € 160.000,00, numa única prestação, que se vence no último dia do mês a que corresponde a prestação.
d.
Perdão da totalidade dos juros vencidos, dos juros moratórios, de todas as comissões, encargos e outros custos com a implementação deste plano; e.
Caso o plano seja aprovado, tal não constitui novação da dívida, mantendo-se as garantias nos exatos termos inicialmente prestados; 2) Relativamente a todos os outros credores propôs: a.
Pagamento de 5 % do capital em 16 anos, 192 prestações mensais, e iguais, de capital, com início após um ano sobre o trânsito em julgado da sentença de homologação do plano; b.
Perdão de 95% do capital, da totalidade dos juros vencidos, dos juros moratórios, de todas as comissões, encargos e outros custos com a implementação deste plano; c.
Caso o plano seja aprovado, tal não constitui novação da dívida, mantendo-se as garantias nos exatos termos inicialmente prestados; d.
Perdão total de quaisquer penalidades legais, contratuais, acordadas, ou resultantes de sentença judicial, quaisquer multas, coimas e respetivos juros, bem como custas de parte.
…Em 18-11-2019, procedeu-se à contagem dos votos relativos à votação do plano apresentado, tendo relativamente aos 100% dos créditos reconhecidos resultado a seguinte votação: - votos a favor: 0; - votos contra: 98,42% dos créditos; - Abstenções: 1,58% dos créditos.
…Em virtude da não aprovação do plano apresentado, o tribunal a quo, nos termos dos arts. 222.º-F, n.º 5 e 222.º-G, ambos do CIRE, por não aprovação, determinou o encerramento do presente processo especial para acordo de pagamento, fixando as custas do encerramento a cargo da devedora/requerente.
…Inconformada com este despacho, veio a requerente (…) recorrer, apresentando as seguintes conclusões: A.
Antes da entrada do PEAP, o Banco Comercial Português, S.A., figurava como exequente no processo executivo que corre sob o n.º 524/11.4TBCTX.
B.
A Devedora deduziu embargos de executado no âmbito do referido processo executivo. Os embargos foram considerados procedentes em primeira instância.
C.
O Banco Comercial Português, S.A., para o Tribunal da Relação e foi revogada a sentença da primeira instância. O Supremo Tribunal de Justiça confirmou o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa.
D.
Nesta senda, a acção executiva prosseguiu os seus termos normais.
E.
Acontece que no dia 14 de Maio de 2019 foi a Devedora notificada para se pronunciar “quanto à proposta de aquisição do imóvel, apresentada pela Exequente no valor de € 310.000,00.”, conforme documento que se junta sob o n.º 1 e que se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
F.
Contudo, ficou surpreendida com o voto negativo do Banco Comercial Português, S.A., sem qualquer justificação. O que frustrou por completo as expectativas da Devedora.
G.
Caso o Banco Comercial Português, S.A., tivesse manifestado a sua intenção de não aprovar o plano nos termos nele exarados, certamente que a Devedora teria apresentado proposta diferente, dentro das possibilidades que tivesse.
H.
Não é lícito que o Banco Comercial Português, S.A., num momento refira que pretende adjudicar o bem imóvel para liquidação das responsabilidades da Devedora pelo valor aproximado de € 310.000,00 (trezentos e dez mil euros) e quando lhe é proposto o pagamento da quantia já não aceitar o valor proposto.
I.
Em face dos factos constantes das presentes alegações, verifica-se que o Banco Comercial Português, S.A., agiu em abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium, na medida em que, ao ter manifestado que pretendia a adjudicação do bem imóvel para liquidação das responsabilidades da Executada pelo valor aproximado de € 310.000,00 (trezentos e dez mil euros), criou a expectativa que aprovaria o plano proposto pela Devedora, em função das declarações proferidas no âmbito do processo executivo.
J.
Os referidos comportamentos são imputáveis ao Banco Comercial Português, S.A., e são contraditórios entre o que haviam declarado no processo executivo antes da entrada do PEAP e o voto contra a aprovação do plano que foi nos termos negociados.
K.
Ademais, o encerramento do processo sem que o Banco Comercial Português, S.A., tenha manifestado as circunstâncias susceptíveis de levar à não homologação do plano, deveria a Devedora ter sido informada desse facto para propor alterações ao plano.
L.
Aliás, o PEAP tem a mesma finalidade do PER.
M.
Assim, sendo as normas do PER aplicáveis ao PEAP com as devidas adaptações e, por conseguinte, foi negada a possibilidade de a Devedora propor alterações ao plano, nos termos analogicamente aplicáveis do n.º 2 e 3 do artigo 17.º-F do CIRE.
N.
Face ao exposto, a decisão de encerramento do PER é precoce e viola dos direitos da Devedora, motivo pelo qual deve a decisão de encerramento ser anulada e substituída por outra que conceda à Devedora o prazo previsto no n.º 3 do artigo 17.º-F do CIRE para propor alterações ao Plano para ser submetido novamente a votação.
O.
Nestes termos, deve a decisão de encerramento ser anulada e repetido o acto de junção do plano com novo prazo para votação, permitindo assim que o Banco Comercial Português, S.A., haja de acordo com as expectativas que criou e, por conseguinte, aprove o plano de pagamentos para ser posteriormente homologado.
Assim, nestes termos e nos demais de direito que V. Exa., doutamente suprirá, deve julgar o presente recurso procedente por provado e, por conseguinte, deve anular o despacho de encerramento do processo, substituindo esta decisão pelo despacho convite para a Devedora fazer alterações ao Plano para ser submetido posteriormente a votação dos credores.
…O requerido “Banco Comercial Português, S.A.” veio contra-alegar, pugnando pela improcedência do recurso, apresentando as seguintes conclusões: A) As presentes contra-alegações surgem no âmbito do recurso interposto pela Devedora da douta Sentença que ordena o encerramento do PEAP em consequência da não homologação do Acordo de Pagamento apresentado; B) A decisão ora em crise deverá ser mantida uma vez que aplicou de forma criteriosa o direito.
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No que concerne ao efeito do presente recurso, a Apelante pretende que o mesmo tenha efeito suspensivo, no entanto, e de...
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